LUZ ESPÍRITA
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Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz

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Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz - Página 9 Empty Re: Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:56 am

Ao contrário, a felicidade se construía, pedaço por pedaço, renúncia por renúncia, esforço por esforço, sem prejudicar a ninguém por sua causa.
Como era diferente a sua história daquela que seu próprio filho relatava aos seus ouvidos, principalmente quando lhe deu conhecer os detalhes da viagem da Gália Narbonensis até à Hispânia Tarraconense, inspirada pela acção durante o sono, de entidades generosas, a exibirem suas mãos luminosas nos entroncamentos difíceis do caminho para que, ao final, conseguissem chegar em segurança ao destino.
Aos ouvidos de Serápis, aquela epopeia era a demonstração clara da intervenção superior nos desígnios humanos, sempre que os homens se permitem suficiente humildade para saberem escutar os conselhos luminosos e as orientações das forças do Bem.
E, emocionada, seus pensamentos divagavam pelo seu passado de erros e intrigas, a envergonhar-se diante daquele cego que, mesmo às portas da morte física, se fazia sentir ao seu coração como um credor de seu afecto, um credor que, vestido de dores e limitações, havia visto e descoberto as coisas lindas que ela, visualmente perfeita e fisicamente forte, se fizera cega e impotente para notar.
O estado de saúde débil de Lúcio impusera uma pausa na conversação e, por mais que o jovem se esforçasse em prolongar aquele entendimento, sua voz não tinha mais força e seu abdómen ferido se recusava a dar-lhe trégua para que a menor palavra pudesse ser articulada.
Chamando uma ajudante, Serápis a informou da gravidade e de que não poderia permanecer ali para que o rapaz não se esforçasse em falar ainda mais.
Afagando-lhe a cabeça suarenta, Serápis cochichou-lhe palavras de carinho, informando-o de que deixaria que descansasse para que continuasse a conversa um pouco depois.
Disse, no entanto, que permaneceria por ali porque passaria a ser sua enfermeira pessoal, a cuidar de suas necessidades mais básicas, inclusive responsabilizando-se por sua alimentação e pela limpeza de seus dejectos já que, a essas alturas, Lúcio não tinha mais condições de se deslocar do leito.
Por causa do esforço e da emoção, Lúcio se entregou ao sono rapidamente, enquanto a mãe, recém-chegada de Roma, se dava pressa em informar-se de um local para estabelecer-se, já que tudo indicava que ali não lhe seria possível a permanência, pela absoluta falta de espaço.
Saiu à rua em companhia de outra colaboradora que, conhecendo as necessidades como as dela, encaminhou-a à hospedaria mais próxima, que fosse compatível com suas necessidades e que lhe garantisse a segurança e o singelo conforto de um leito limpo.
- A senhora fique aqui até que Lúcio possa acordar enquanto nosso paizinho não regressa.
Assim que ele chegar, nós a informaremos para que possa ir conhecê-lo - afirmou a voz amiga que se despedia logo a seguir.
Emocionada por tudo aquilo que acabara de vivenciar, sentiu que somente o estado precário de Lúcio se impunha como impeditivo para que ela permanecesse junto dele para sempre, como que a beneficiar-se de suas palavras reflexivas e luminosas, agora que as dores orgânicas se tornavam mais cruéis.
Apesar de Serápis atribuir tais expressões sábias a circunstâncias pessoais produzidas pelo amadurecimento que a dor favorece, não sabia ela que, naquela hora de entendimentos decisivos, Lívia se valia das forças de Lúcio e de suas expressões para fazê-la escutar o que era indispensável para que reflectisse e se transformasse.
Era o carinho espiritual daquela que lhe fora vítima da intriga mesquinha do passado que, transformada em benfeitora e celestial protectora, se fazia ouvir aos seus ouvidos e sentimentos através da boca carnal de Lúcio, influenciado directamente por suas energias espirituais.
Serápis, a mesma Fúlvia de outrora, precisava entender, de uma vez para sempre, que suas dores eram efeito de suas próprias escolhas e não perseguições de uma Justiça Injusta.
Precisava sentir que tudo o que fizera atrapalhara os planos de resgate que haviam sido elaborados antes, graças aos quais ela poderia estar ao lado de um homem que a amava, que a sustentaria nas horas difíceis e que a ajudaria a reparar os erros e dívidas com aqueles espíritos que vieram à vida para se reajustarem com a Divina Lei através de seu auxílio directo e pessoal.
Era indispensável que ela pudesse perceber a absoluta discrepância que existe entre o destino dos que lutam, aceitando as estradas que Deus abre para serem palmilhadas e o destino dos que lutam, acreditando, porque rebeldes, serem capazes de esculpir suas estradas por si mesmos, com as ferramentas da própria ignorância.
Serápis, assim, se pusera pensativa e a perquirir que leis seriam aquelas a que Lúcio se referia, a atender suas mais importantes necessidades, a revestir seu caminho ora com a doçura de Décio, ora com o amparo de uma gruta no meio da chuva, ora com a solidariedade de crianças inocentes, ora com a decisiva empreitada de Tito, enquanto para ela mesma, a vida parecia ter sido madrasta.
E sem poder negar a situação trágica de seu filho, Serápis igualmente se perguntava por que foram deslocados de tão longe, tanto ele quanto ela, para que o encontro entre ambos não durasse mais do que algumas horas ou, quando muito, alguns dias, como tudo indicava que seria.
Como pode haver lógica nessas coisas que Lúcio lhe revelava, quando tudo mais parecia uma brincadeira de mau gosto, uma ironia do destino a tirá-la de Roma para fazê-la encontrar o único filho legítimo que restava, apenas para levá-lo à sepultura, depois de anos de afastamento?
Seu olhar não era capaz de entrever no meio da bruma da noite os clarões convidativos da aurora, a surgirem por detrás da escuridão, revelando a sabedoria solar que apaga a mais densa neblina e a substitui pela alvorada.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:56 am

- Por que motivo, então, Lúcio percorreu todo este trajecto, Décio perdeu sua vida, Tito e Fábio se arriscaram, nós fomos deslocados da capital do Império para esta região remota, com o sonho de reconstruirmos nossas vidas se, agora, quase nada há para ser reconstruído? - perguntava-se Serápis, quase em pranto de dor.
Ao seu lado, Lívia afagava-lhe os cabelos despenteados, a sussurrar-lhe aos ouvidos que não se entregasse ao desânimo, que não se permitisse pensamentos infelizes, porquanto a Misericórdia do Pai jamais fazia algo inútil e que não tivesse a função de nos ajudar a crescer.
Perdida em seus pensamentos, Serápis não viu o tempo passar no pequeno quarto que a abrigara, nas proximidades da pousada em que Lúcio era tratado.
Adormecida, viu-se na presença de Lívia, que procurava acalmá-la com palavras de carinho, enquanto Serápis a tratava como se estivesse diante de um anjo de Deus, tal o quase temor que a sua beleza espiritual lhe inspirava.
Sem entender de onde vinha a sensação, Serápis identificava naquele espírito uma alma para com a qual ela própria havia falhado e produzido muitos males.
Lívia a enlaçava com a doçura de uma mãe compreensiva e amiga, falando-lhe aos ouvidos para que não se ocupasse do passado.
- Agora, Serápis, somos verdadeiras irmãs, unidas por Jesus e pelo amor aos espíritos de que estamos cuidando.
Prepare-se para entender os motivos de Deus, porquanto, em breves horas, nosso Pôncio estará regressando aos nossos meios, enquanto você deverá prosseguir na jornada terrena, velando das coisas de Jesus com o olvido de toda queda.
Já perdemos muito tempo nas lágrimas de nossos erros do passado.
Chegou a hora de nos ocuparmos da única coisa que vale a pena.
O suor do Bem, o serviço a Jesus, o zelo pela Casa do Pai que é o nosso coração, para que nela residam as sementes de esperança do celeste armazém.
Você é jovem ainda, plena de forças e carregada de cicatrizes da dor e do equívoco.
Agora é a hora de extrair as vantagens dessa experiência uma vez que, diante das armadilhas da vida, não haverá mais aquelas que conseguirão iludi-la facilmente.
Já não mais a beleza estonteante, a facilidade das riquezas, a importância do mando, a exuberância do corpo, as euforias das emoções.
Curtida como o velho vinho no esforço do tempo que o doma, você está sendo preparada para ser o néctar de esperanças nas quais a Misericórdia de Deus encontrará a compreensão para atender os caídos no mundo das sensações.
Prostitutas encontrarão em você a compaixão para com suas ilusões, amantes iludidos encontrarão em seu verbo a palavra sábia daquela que já provou o venenoso líquido das aventuras ilícitas.
Os aventureiros das conquistas encontrarão em suas experiências as advertências daquela que se viu surpreendida pelos espinhos que não havia previsto antes do começo da aventura.
Os famintos encontrarão a força daquela que se fez mãe de quatro filhos desditosos, abandonados, enfermos, de forma que você tem em si mesma a verdade que falta a todos eles, e seus exemplos serão fecundas manifestações de Deus - o Pai Misericordioso - no caminho de todos os aflitos.
Embevecida com todas estas referências à suas tarefas futuras, Serápis chorava por se achar indigna, sobretudo na nova terra desconhecida, sem contar com recursos maiores do que aqueles modestos meios que rapidamente se consumiriam.
Lúcia se encaminhava para o matrimónio com Fábio e Lélia tinha a Tito para compartilhar as suas aspirações de mulher.
Ela, todavia, não se sentia suficientemente capaz para sair da tragédia da escuridão para a batalha da luz.
Talvez Jesus estivesse esperando muito dela - pensava consigo mesma - sem ter coragem para verbalizar suas ideias diante da luminosa entidade que olhava em seus olhos e sorria em silêncio.
Percebendo suas reticências diante de tais vaticínios inspiradores, os quais Serápis interpretava como eloquência exagerada de uma alma pura que desejava inspirá-la, Lívia se fez mais próxima e sussurrou-lhe aos ouvidos espirituais, enquanto o corpo repousava, cansado:
- Serápis, nunca duvide de Deus e de Jesus.
Vocês conhecem o império do mundo nas expressões de uma Roma de mármores e mentiras.
Mas o império do poder e do medo, dos exércitos e das intrigas, da morte e do crime não são nada diante do Império que Jesus exerce por delegação directa do Criador.
Nunca se esqueça de que você vive SOB AS MÃOS DA MISERICÓRDIA.
E percebendo que Serápis se emocionava ainda mais, sem atinar para a profundidade daquelas palavras, Lívia concluiu, dizendo-lhe:
- Prepare-se, minha filha. Volte ao corpo agora para que você entenda, finalmente, o que significa o que estou lhe dizendo.
Conduzindo seu espírito até as proximidades do organismo físico adormecido, Lívia incumbiu-se de recolocá-lo suavemente junto às células biológicas, quase que ao mesmo tempo em que fortes pancadas na porta anunciavam que alguém a chamava.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:57 am

Meio atontada pelo torpor do sono e pela noção sublime que lhe invadia a alma, Serápis dirigiu-se para porta.
Naturalmente, como lhe haviam falado antes, alguém a vinha chamar para regressar junto ao filho infeliz.
No entanto, assim que a porta se abriu plenamente, seus olhos se iluminaram e um grito de surpresa se fez ouvir por todo o ambiente.
Diante de seus olhos, estava Cláudio Rufus.
- Cláudio,... Cláudio... - foram as suas únicas palavras, antes de atirar-se em seus braços, em lágrimas de alegria a traduzirem a sensação de sonho, como se suspeitasse ainda não ter acordado.
- Sim, Serápis, SOU EU.
Estou aqui para levá-la até Lúcio.
E sem entender bem tudo aquilo, a mãezinha do enfermo só conseguiu dizer:
- Quer dizer que foi por isso que Jesus me trouxe para cá...
Abraçados, seguiram pelas ruelas até a pousada que Cláudio mantinha para o atendimento dos necessitados, em nome de Jesus.
- Sim, Serápis, agora também entendo por que Jesus me trouxe para cá!
Ali, ao contacto daquele que, por fim, reencontrara também o próprio destino, na compreensão do porquê de ter sido deslocado da longínqua Roma para os confins daquela província, Cláudio e Serápis iriam dar seguimento à mesma trajectória de bondade aprendida com Licínio, com Décio, com Lélia: a de servirem por amor aos que de amor necessitavam como o mais importante remédio para suas feridas, tanto as do corpo quanto as do espírito.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:57 am

40 - Sob as mãos da misericórdia

No recinto, que impressionava pela sobriedade e pela beleza, encontravam-se reunidos os espíritos amigos que, desde há mais de cem anos vinham se desdobrando em auxílio daqueles companheiros que se haviam feito parte integrante da própria razão de viver e por cuja recuperação todos trabalhavam.
Trazendo Zacarias à frente, na sua postura apostólica humilde que, em momento algum, se fazia chefe ou superior aos outros, mas com a autoridade moral daquele que recebera do Cristo a principal incumbência dos cuidados ao ex-governador da Galileia, ao seu lado se podiam vislumbrar o seu antigo ajudante em tais esforços, o centurião Lucilio, o mesmo Licínio, tanto quanto o igualmente devotado apóstolo da Samaria, o velho Simeão, ladeado por aquela que abrigara da perseguição de Suplício em sua modesta casinha, Lívia, postada igualmente ao lado de João de Cléofas ao lado do qual fora devorada pelas feras no Circo Máximo, por ocasião dos festejos de Nero.
Era o cortejo nobre dos que, apesar das próprias limitações pessoais, se haviam entregado ao trabalho do Bem, pela instauração do Reino de Deus no coração das criaturas.
Todos, ali, sem excepção, na pobreza, na dor, na injustiça, na força da coragem, haviam dado a vida por seus semelhantes, como houvera afirmado Jesus não haver amor maior do que aquele que sucumbe por amor aos que considera seus amigos.
Zacarias, envenenado para salvar Pilatos.
Lucilio, queimado no circo para salvar Lélia e ajudar Marcus e Serápis.
Simeão, crucificado, espancado e ferido até a morte para salvar Lívia e Ana.
Lívia, devorada pelas feras para dar testemunho de sua fé, salvando a serva e amiga que a acompanhava, Ana.
João de Cléofas, morto junto com Lívia, para dar testemunho de obediência às determinações superiores que o haviam levado a Roma a fim de preparar a todos para as perseguições que se avizinhavam e das quais fora ele uma das primeiras vítimas.
Nenhum deles, no entanto, deixara de acolher com carinho verdadeiro, aquele que deixara a condição de gladiador feroz de outrora para tornar-se, na última jornada física, o devotado Décio, aquele que se fizera instrumento do Bem para que os planos da Misericórdia pudessem ser cumpridos.
Décio se ajuntava aos outros naquele momento, já retirado do corpo físico depois das heróicas lutas protectoras do destino de muitos, entre os quais, de Demétrio e Lúcio.
Graças ao seu devotamento fiel, os espíritos elevados que agora o circundavam haviam conseguido levar até o final os planos daquele projecto reencarnatório que visava iniciar o processo de resgate de Suplício, Serápis, Pôncio Pilatos, Sávio e todos quantos pudessem ajudar na esteira de tais esforços.
E por isso, sua figura recebia de todos aqueles espíritos que o cercavam, as vibrações de carinho e gratidão, nas demonstrações de ternura a que se entregaram todos os que foram beneficiados pelos actos de humanidade que ele devotara, graças aos quais, a Misericórdia encontrara caminho para amparar as aflições do mundo.
Tão intensa era a gratidão de todos, que Décio se sentia constrangido por não ver, em si mesmo, merecimento para tal demonstração de afecto dos demais.
No entanto, ele também dera a própria vida para salvar a de Demétrio, rebelde e iludido, e a de Lúcio, a quem conduzira ao seguro porto depois de todos os esforços ingentes da longa viagem.
Ele também morrera para salvar um amigo.
O ambiente se fazia impregnado de brilhos e perfumes, enquanto suave e emocionante cavatina, como se por detrás das altivas colunas de material desconhecido dos humanos, corais de crianças angélicas se pusessem a entoar as melodias que desafiavam os corações mais indiferentes a não chorarem de emoção.
À frente de todos, a razoável distância, sobre uma discreta elevação, à guisa de palco, lavrado na alvura que o mais puro mármore terreno é incapaz de traduzir, se punha uma bancada ampla, como mesa imponente e preciosa, na qual se podia perceber importante local de decisões, à frente da qual se esculpiam três palavras que representavam a função daquela assembleia: VERDADE, JUSTIÇA, MISERICÓRDIA.
Três poltronas simples e confortáveis dariam sua cooperação às entidades que se fariam apresentar para a direcção daqueles trabalhos.
As entidades que se congregavam ao redor de Zacarias mantinham-se em discreta conversação, naturalmente, nos comentários sobre tudo quanto iria acontecer em breve.
Ao mesmo tempo em que se mantinham unidas, no mesmo ambiente daquela galeria de indescritível beleza se posicionavam Públio Lentulus, o amado companheiro de Lívia, Ana, a sua amiga e fiel serva, Flamínio, o senador seu amigo e Calpúrnia, sua esposa, espíritos que estavam ligados aos eventos que envolviam os desígnios divinos que ali se decidiriam, em respeitoso e emocionado silêncio.
Não tardou para que suave toque cristalino se fizesse escutar no recinto e que, com a modificação do teor da melodia, como se as mais puras belezas da composição estivessem esperando por aquele momento, todos entendessem que se iniciava a cerimónia para a qual todos concorriam com especial participação.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:57 am

Sem qualquer ritualismo ou retumbância, os três anciãos que judiciavam naquela corte celeste se fizeram no ambiente, impregnando aquele salão de um magnetismo tão emocionante que os presentes não conseguiam conter as próprias lágrimas.
Almas preparadas para o importante ofício de estabelecerem os juízos e despertarem os homens para as próprias realidades eram, os três, a expressão da Verdade, da Justiça e da Misericórdia.
Nimbados de celestial atmosfera aliavam a simpatia veneranda à sapiência natural, como se não houvessem conquistado tais virtudes por seus próprios esforços e sacrifícios, mas por um inexplicável favoritismo divino, já tivessem sido criados por Deus com aqueles atributos.
Tomando seus lugares indicados naquele amplo parlatório espiritual, sem maiores cerimónias, o magistrado que representava a Verdade, vestido de sua toga simplíssima e lirial levantou-se e falou a todos, reverente:
- "Em nome do Senhor da Vida, reunimo-nos novamente para o reencontro com nossa própria consciência.
Sejam bem-vindos todos os irmãos que aqui se congregam e que a luz da verdade represente a própria existência."
Voltando a sentar-se, fez soar delicada campainha, dando início à audiência.
E, assim que a mesma teve início, todos os presentes foram convocados para tocante cena que se apresentava aos seus olhos húmidos.
Por um desvão lateral, acompanhados por duas entidades que tinham funções específicas de amparo dos que chegavam àquele Tribunal, surgiram duas entidades sofridas, dois espíritos que transportavam em si mesmos as marcas das próprias tragédias.
O que vinha à frente, espantado e impressionado como ambiente que o circundava, caminhava amparado pelos dois espíritos que, delicadamente, o endereçava para o local que o aguardava, à frente da bancada luminosa.
Parecia querer recuar diante da luz circundante, como que petrificado pelas forças que o recebiam ali.
No entanto, os braços firmes das entidades amigas impediam que ele retrocedesse.
A emoção do ambiente, no entanto, se intensificara à medida que os presentes puderam ver que, segurando o ombro da primeira entidade sofredora e, por esta conduzida, vinha a outra, cega e ferida.
Ali estavam Demétrio e Lúcio, conduzidos para o encontro com a Verdade, a Justiça e a Misericórdia.
Seus espíritos guardavam a forma da sua última existência, da qual haviam acabado de sair pelas portas da morte.
Mantinham-se, desse modo, vinculados às formas que suas lembranças gravavam em seu psiquismo individual, o que fazia com que Demétrio se apresentasse sem os braços e, fruto da tortura grotesca a que fora submetido antes de morrer, trazia seu corpo espiritual marcado e dilacerado, o que, igualmente, produzia nele certa dificuldade em deslocar-se.
De semelhante forma, Lúcio se deixava levar pelo antigo irmão, cego e curvado pela lesão no ventre, que parecia tão real quanto aquela que o havia acompanhado desde o nascimento no novo corpo.
Ambos foram encaminhados até o centro do recinto, bem defronte ao púlpito dos magistrados.
A emoção se fizera muito particular para todo o grupo que, já há quase cem anos, se desdobrava em auxílios para aquelas duas almas, entre outras.
As duas entidades sofridas que seriam colocadas diante de seus próprios feitos não tinham condições de lucidez plena para perceber a presença de seus benfeitores.
Demétrio, que vinha à frente, fora conduzido por um dos espíritos amparadores até pequeno pilar cristalino no qual iria vislumbrar, em breves momentos, as cenas de suas vivências pessoais para que as pudesse reconhecer.
À medida que ia sendo mostrada a sequência de imagens, que só podiam ser vislumbradas pelo próprio interessado, as expressões de sua face iam apontando transformações, como se, ao contacto com sua memória real, as expressões de sua forma começassem a se transformar de acordo com o impulso de suas próprias recônditas lembranças.
É assim que, à medida que as recordações iam surgindo, Demétrio foi perdendo a forma de rapaz infeliz e deformado, aquela que o havia marcado na última existência, para apresentar-se, novamente, trajado à moda romana.
Sua aparência tornou-se a de um homem adulto, transformado em funcionário do Estado, nas feições próprias do antigo lictor Suplício.
Para seu espanto, seus braços faltantes surgiram como que por milagre e, em vez de se visualizar como o rapaz apaixonado da Gália Narbonensis, via-se como o braço direito de Pilatos, na antiga Palestina.
A prática das atrocidades, as injustiças espalhadas indiscriminadamente, a ligação estreita com o governador, as visões de suas orgias, os abusos contra as jovens indefesas, o desfrute dos recursos do governo, usurpados do trabalho digno e sacrificial dos que eram obrigados a pagar tributos a Roma para que, logo a seguir, fossem gastos em festas e obscenidades, transtornavam a face de Suplício que, de forma muito fácil e rápida, deixara a forma de Demétrio para regressar à condição ancestral, inclusive com as expressões pouco modificadas.
Poucos minutos demorou a operação.
Assim que se deu por encerrado o processo de rememoração, Suplício foi encaminhado pela entidade que o ajudava até a presença do primeiro magistrado que, sereno e inspirado por luzes que caíam do alto, perguntou-lhe, directamente:
- Meu filho, aquilo que você pôde ver corresponde à verdade dos factos?
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:57 am

Aturdido com sua nova situação, Suplício/Demétrio respondeu:
- Estou confuso, sem saber quem sou.
Em um momento era um rapaz aleijado e, agora, depois daquelas cenas, parece que sou outra pessoa.
- É assim que a Lei do Universo nos concede novas oportunidades para o resgate de nossas faltas, Suplício.
Você vive muitas vidas e, em cada uma delas, seus actos vão se somando para que o aprendizado possa se dar, tanto pelo sofrimento do erro quanto pela alegria do acerto.
- Quer dizer, então, que eu sou mesmo esse homem que vi?
- Sim, meu filho.
Em uma de suas vidas você foi aquela personagem.
O silêncio se fez mais amplo.
- E o que você me diz, Suplício?
As cenas são mentirosas ou verdadeiras?
Engasgado e procurando uma forma de safar-se das próprias verdades, o ex-lictor de Pilatos respondeu, reticente:
- Bem, senhor juiz, elas são verdadeiras em parte, porque, para mim, eu fora usado por um mais culpado do que eu, aquele governador que me mandava fazer tudo aquilo.
Entendendo as maneiras imaturas daquela alma, o magistrado falou, calmamente:
- Meu filho, aproveite este momento decisivo para sua alma.
Aqui você não está para ser acusador e, sim, para apresentar-se diante de seus próprios actos, reconhecendo-os como seus ou não.
E se você for honesto consigo mesmo, poderá ver que há muitas coisas que foram produzidas por sua exclusiva vontade.
Rebelde e desafiador, Suplício respondeu, infantilmente:
- Pois com todo o respeito, senhor juiz, meu espírito não se recorda...
- Para nós, Suplício, seria muito fácil levá-lo ao mesmo aparelho para que sua lembrança fosse reavivada... - falou o magistrado, enquanto Suplício dava mostras de contrariedade.
No entanto, isso não será necessário porque poderemos nos valer de outro recurso.
E dizendo isso, atendendo a um sinal específico de sua destra, o espírito amparador que se mantinha junto a Lúcio aproximou-se de Simeão e de Ana, pedindo que os acompanhasse até as proximidades de Suplício.
A chegada de ambos à presença do ex-lictor, que não se achava plenamente responsável pelos actos praticados pessoalmente, fez com que ele se petrificasse.
- Diante desses dois irmãos que os seus olhos podem constatar, talvez a sua lembrança se torne mais clara.
A visão de Simeão já lhe era bastante conhecida e, à sua presença, toda a cena de sua execução lhe voltava à mente espiritual lúcida.
E apesar de ter sido recolhido por ele quando da sua execução pelos que o acusavam pela morte da jovem romana nas terras da Gália, a postura de arrependimento não era duradoura em sua alma, desaparecendo tão logo Simeão dele se afastava.
Assim, na sua essência, Suplício não havia aprofundado a lupa da investigação para que a plenitude de seus defeitos pudesse ser combatida.
Tanto era assim que, ao primeiro retrocesso ao passado, sua personalidade estampara em seu corpo espiritual a forma que mais dominava seu carácter, aquela da qual não conseguira se desapegar, mesmo depois de quase duas décadas de sofrimento na condição de aleijado e sofredor.
No entanto, se Simeão era o venerável e paciente ancião que o fazia voltar à vergonha do passado, Ana era a jovem cobiçada e que motivara o pedido particular dele a Pilatos para que fosse autorizado a persegui-la na velha Samaria.
Realmente, a visão de Ana fizera surgir em seu espírito as palavras proferidas diante de Pilatos que, ecoando em sua mente, eram o atestado lídimo da verdade a condená-lo, conforme se pode encontrar na beleza de " Há Dois Mil Anos..." história relatada pelo espírito Emmanuel, em livro assim conhecido.
Vendo que Ana, a mulher desejada fugira em companhia de Lívia para abrigar-se à sombra de Simeão, na Samaria distante, e, percebendo que Pilatos se conformava com a impossibilidade de encontrar a desejada Lívia, desistindo de seguir ao seu encalço, Suplício se adianta e exclama, apaixonado:
"- Mas, agora, - exclamou o lictor, com interesse - se não é por vós, deve ser por mim, porque me sinto escravizado a uma mulher que devo possuir de qualquer maneira.
Sou eu agora quem vos pede, humildemente, a concessão dessas providências - acentuou ele, desesperado, no auge de seus pensamentos impuros."
Aquelas poucas palavras eram o atestado de culpa do qual ele desejava fugir, alegando esquecimento.
Já não tinha como esconder-se de si próprio.
- E então, meu filho, os fatos e cenas que você presenciou correspondem à verdade ou são frutos de mentirosa ilusão?
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:58 am

Sem recursos diante dos fatos, Suplício abaixou a cabeça e respondeu:
- Não, senhor juiz.
Tudo o que vi corresponde exactamente a tudo o que fiz.
Notava-se a dor em suas palavras, tanto quanto a dificuldade em pronunciá-las.
Logo a seguir, foi conduzido ao segundo magistrado.
.- Meu filho, o que você fez foi justo?
Aquela pergunta, a colocá-lo como juiz de si mesmo, representava uma punhalada em seu orgulho, em sua vaidade pessoal, em seu desejo de parecer aquilo que, efectivamente, ainda não era.
Inicialmente, pensou em voltar a colocar a acusação sobre Pilatos, como forma de dividir com ele o peso de suas atitudes.
No entanto, a presença de Ana e Simeão espelhavam nele próprio a noção da injustiça cometida.
Desse modo, ainda que com os sentimentos extremamente conturbados, sua expressão verbal deu a resposta seca, como se emitida por entre os dentes cerrados:
- Não. Mas o outro também tem culpa pior do que a minha.
- Não se ocupe de ninguém mais a não ser de si mesmo, meu filho.
Ninguém ilude o Senhor da Vida, Suplício.
Nem tronos fazem melhores os reis, nem farrapos são capazes de empobrecer as almas ricas dos verdadeiros valores do espírito.
Deus não julga pelas aparências.
Deus é o Senhor das Essências e lê nos nossos corações o quanto a Verdade do seu Reino já se fez dentro de nós.
Uma vez assumindo as próprias atitudes e sem conseguir deixar de reconhecer as próprias injustiças, Suplício houvera perdido, na sua aparência, aquela altivez da autoridade arrogante e prepotente que voltara a assumir por alguns minutos, logo após a recordação do passado.
Agora se apresentava como que alquebrado e vencido, trémulo e sem forças.
Seus cabelos como que tomaram a cor esbranquiçada e sulcos de velhice marcaram a face, a anunciar que seu íntimo se apresentava realmente vitimado pela verdade que sua consciência assumia.
Amparado agora pelos braços luminosos de Simeão e Ana, que sustentavam suas pernas trémulas, foi levado até o terceiro Juiz que, serenamente, sem se deixar impressionar pela resposta física do avaliado, dirigiu-se a ele, carinhoso:
- Meu filho, qual é a punição que você acha que merece pelos crimes que cometeu?
Sem entender por que se prolongava aquilo que, para ele, se apresentava mais como uma tortura do que como um julgamento, Suplício dirigiu-se ao magistrado com passivo que se punha diante de seus olhos, meigamente:
- Eu fui especialista em punições, meu senhor.
Feri, matei, persegui, destruí sonhos, abusei.
Aqui estão minhas vítimas.
Talvez elas possam dizer melhor do que eu qual, dentre todo o arsenal de meus crimes, é o mais adequado ao meu sofrimento.
- É certo que todos teremos que encarar nossas vítimas, Suplício.
No entanto, neste momento é a você que se pergunta qual a punição que você merece por tudo o que foi praticado por suas próprias mãos.
- Qualquer uma que me faça padecer ao extremo, senhor juiz -falou ele, elevando a voz como se tivesse de gritar para seu próprio interior escutar suas palavras.
Mereço todo tipo de castigo, de tortura, de lágrima.
E é isso que eu peço. Imaginava que os deuses de Roma tivessem formas de garantir nossa impunidade, concedendo-nos favores pelas oferendas que lhes fizéssemos.
No entanto, não os encontro aqui, neste julgamento.
E ainda que os encontrasse, não conseguiriam me afastar daquilo que eu fiz e do que minhas culpas me acusam.
Emocionado diante da postura do lictor, o magistrado se dirigiu aos dois entes delicados que o sustentavam e indagou:
- Suplício pede que o cortejo de crimes que praticou, os piores dos quais a envolvê-los pessoalmente, seja a punição a lhe fazer justiça perante as dores produzidas.
Na condição de vítimas directas de sua ignorância agressiva, concedo-lhes a palavra para que se manifestem sobre esse pleito do réu, nesta casa da Verdade, da Justiça e da Misericórdia.
Assim surpreendidos pela convocação directa do magistrado, Simeão e Ana se entreolharam e, sem saber o que dizer, coube ao ancião, por primeiro, responder ao condutor daquele inquérito celeste:
- Nobre magistrado, faltam em nós condições para avaliarmos sobre as faltas alheias porquanto somos igualmente impuros de espírito.
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Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz - Página 9 Empty Re: Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:58 am

Apenas gostaria que a sua sabedoria pudesse conceder à minha alma a ventura de ajudar Suplício nos resgates necessários, oferecendo minha pobre vida para servir de altar à sua recuperação.
Simeão não sabia mais o que dizer, tal o estado de emoção sincera que lhe invadia o peito.
Olhando para a jovem Ana, o magistrado esperava-lhe a resposta.
Tocada pela mesma comoção que invadia o antigo tio generoso, Ana se prostrou diante do juiz e falou, com os olhos brilhantes:
- Senhor, este irmão não é mau.
Antes de tudo, é imatura e frágil semente divina, iludida pelas forças do mundo e da ignorância.
E na medida em que o que motivou a desgraça que o fustiga estava enraizado em um sentimento de seu coração endereçado a mim, gostaria de suplicar às autoridades, que me pudessem conceder a virtude de oferecer-lhe meu ventre para que, na condição de mãe amorosa, pudesse lhe orientar os passos pelas veredas do amor, através dos pobres exemplos de virtude que lhe for capaz de infundir.
Não importa qual seja a sua condição.
Peço-vos me concedam a oportunidade de amá-lo como mãe e dele receber o amor de filho.
Suplício não conseguia compreender que tipo de tribunal era aquele.
O réu é que dizia sobre a verdade.
O réu é que falava sobre a justiça ou injustiça e, ainda que o réu fosse aquele que pedisse a punição para as próprias culpas, encontrava amparo no coração das próprias vítimas, que advogavam a seu favor, oferecendo-lhe a mão estendida.
Enquanto meditava, emocionado, o terceiro magistrado se dirige ao interrogado e lhe pergunta:
- Meu filho, você pediu a desgraça, a dor, o abandono, a fome, a tortura, a miséria.
No entanto, suas vítimas se apresentam a pedir outra coisa para você.
Oferecem o amparo de seus braços, o calor do próprio ventre e o alimento do próprio seio, para que você recomece nova jornada amparado pelo afecto real, mesmo que sua vida necessite dos correctivos para lembrá-lo dos deveres do espírito perante a própria evolução.
Você pede a tortura e eles oferecem a nova vida ao seu lado.
O que você escolhe, Suplício?
Entre lágrimas de arrependimento verdadeiro e sem conseguir mais manter-se de pé, o envelhecido lictor cai aos pés de Ana e abraça-lhe as pernas a rogar perdão.
- Vamos, meu filho - continuou o magistrado que representava a Misericórdia - escolha agora, para que possamos seguir com nossos trabalhos.
Diante da palavra firme do juiz, Suplício foi tomado de coragem e sinceridade para dizer:
- Eu nunca tive isso para com nenhuma de minhas vítimas, mas, diante de meus deméritos, a reconhecer que mereço o peso de um sofrimento destruidor de minhas esperanças, seria louco se não aceitasse a única coisa que será capaz de me fazer outra criatura.
Sem merecê-lo, aceito o ventre de mãe daquela que quis possuir como mulher, tanto quanto o braço forte daquele que saberá conduzir meus braços para que nunca mais me sirva de chicotes ou espadas para ferir como o fiz com ele próprio.
Repito, senhor juiz.
Eu não o mereço.
Mas entre as escolhas que me deu, esta é a única que me concede esperanças de me tornar outra pessoa.
Enlevado diante daquele que se fazia miserável pelo peso de seu arrependimento, o magistrado termina sua apreciação, dizendo:
- Meu filho, seu estado demonstra a sinceridade de suas escolhas.
Nenhum de nós possui méritos capazes de justificar a nossa condição de filhos de Deus.
Todos somos devedores eternos de um Pai generoso e verdadeiro.
Seus crimes são a expressão de sua humanidade, mas as mãos de suas vítimas, que se estendem para você, meu filho, são a expressão da Misericórdia do Senhor da Vida, que não se esqueceu de você.
Que você se erga diante de si próprio, Suplício.
Este é o nosso decreto.
Mais do que vítima do erro, você é filho da Misericórdia que lhe garantirá o apoio necessário para as novas lutas da vida que o esperam.
Esta é a vontade do Pai, que estamos encarregados de zelar nesta Corte.
Que assim, Ela seja feita para você também.
E dizendo isso, fez soar suave sinal sonoro, como a informar que aquele caso havia sido encaminhado à solução temporária, com vistas ao futuro evolutivo daquela alma.
Restava o julgamento de Lúcio.
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Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz - Página 9 Empty Re: Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:58 am

Novamente, os dois espíritos amparadores se fizeram ao seu lado para conduzi-lo até o mesmo local para a visualização do seu passado.
No entanto, um problema surgia de imediato.
Lúcio se mantinha cego, sem condições de visualizar nenhuma das imagens que se projectariam diante de seus olhos.
Diante disso, o primeiro magistrado passou a lhe perguntar se, apesar de não ver nada, ele podia descrever o que estava sentindo:
- Meu senhor, eu não compreendo muito o que se passa comigo.
Dentro de minha mente, sinto-me como um rapaz enfermo, envolvido pelo carinho de uma mulher a quem chamo de mãe, mas que, ao mesmo tempo me confunde o sentimento porquanto se me apresenta ao sentimento como desejada amante.
Minhas roupas, eu as sinto ora como pobres andrajos, ora como sumptuoso manto a pesar-me sobre o corpo.
Ora me sinto menino, ora me sinto velho.
E enquanto explicava seus sentimentos íntimos, sua forma permanecia como a do garoto que se deixara morrer nas mãos de Serápis e Cláudio, na longínqua Hispânia Tarraconense.
O magistrado que representava a Verdade não se deu por vencido diante da aparente impossibilidade de Lúcio em vencer a própria cegueira.
Falando aos seus mais próximos amigos espirituais que presenciavam a cena de seu despertamento, sinalizou para que Zacarias e Lucilio dele se aproximassem.
Achegando-se ao antigo protegido, impuseram-lhe as mãos sobre a fronte e, em silenciosa prece, passaram a oferecer de si mesmos elementos fluídicos para auxiliar o jovem no doloroso transe de relembrar sua vida passada.
Envolto por essa capa de energia, Lúcio voltou a dizer, mais agitado:
- Senhor, senhor, eu continuo cego, mas algumas imagens me voltam ao pensamento.
Vejo minha figura imponente, minhas vestes luxuosas, o povoa gritar... crucifiquem... crucifiquem...
Não sei do que estão tratando, mas sinto que sou eu quem vai decidir.
Um corrupto, um devasso, um ladrão, um criminoso, tudo isso sou eu e sou eu quem vai ter que decidir...
Crucifiquem - grita a multidão ensandecida.
Trazem um jarro tosco e uma bacia dourada.
Vejo minhas mãos serem molhadas naquela água, lavadas diante do povo.
Oh! Senhor.....é a Jesus que estão se referindo...
Meu Deus... - falava Lúcio agitando-se, agora, agoniado.
Eu sei que aquele homem sou eu, mas não posso acreditar.
Ele é Pilatos, o maldito covarde...
Somente a voz indignada de Lúcio transformava aquele ambiente.
Ninguém mais ousava proferir qualquer expressão.
- Ele lavou as mãos dizendo que não via culpa naquele homem...
Não! Não! Faça alguma coisa...
Chame os guardas, afaste o tumulto... não lave as mãos, seu inútil - gritava Lúcio, perturbado.
Novo intervalo, nova retomada:
- Agora que as mãos estão lavadas, eu as vejo com sangue...
Não entendo.
Acabei de lavá-las e elas estão vermelhas.
Mancham minhas roupas, mancham os despachos que assino, mancham a comida que como, mancham tudo o que toco...
Não é possível, a morte do Justo caiu sobre minha alma e eu sucumbo ante minha própria miséria.
Sou chamado a Roma, onde perco tudo e sou preso, para humilhação de todos os meus antigos amigos e comparsas que, agora, se afastam de mim.
Somente uma alma luminosa me acompanha.
Um velho sapateiro.
Um velho bom, ao lado da representação da maldade.
Agora estou em um barco.
Vejo que tramam minha morte.
Um soldado romano, ajudando o velho, igualmente me protege.
Chego ao destino e sou preso para sempre.
O velho morre envenenado por minha culpa...
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 08, 2015 10:58 am

Desejo morrer para sempre.
Senhor juiz, como é que vejo tudo isso se estou cego? - pergunta, exclamando, o depoente.
Agora vejo uma espada ser colocada em minha cela.
Meus desejos de morrer se estimulam pela concessão de meus companheiros de armas, que anseiam pela minha morte para se livrarem da vergonha de minha presença.
Sinto-me morrer.
A dor no ventre, a mesma que matou meu corpo jovem nos braços de minha mãe, essa dor sem solução nem remédio...
Agitando-se com os braços a contrair o próprio ventre, Lúcio se mantinha envolvido pelas lágrimas do descobrimento de si próprio.
Amparados, agora, pelas forças de Zacarias, o velho sapateiro e de Lucilio, o centurião romano que o ajudara no cárcere derradeiro, Lúcio continuava sofrendo com as visões interiores, sem, contudo, recuperar a visão do ambiente onde estava.
- Como posso eu ser Pilatos e Lúcio, senhor Juiz?
Emocionado com a sua pergunta, o primeiro magistrado, dando cumprimento às suas atribuições, perguntou-lhe:
- Meu filho, o que você acabou de ver dentro de si próprio, corresponde à verdade?
Entre as aflições dolorosas que sentia em seu corpo, decorrentes da visão interna que testemunhava em sua própria alma, respondeu Lúcio, controlando-se ao máximo:
- Eu não sei, senhor, se isso é verdade ou não.
Mas posso dizer que me vi como Pilatos e me senti o pior dos homens da Terra.
O mais sujo , o mais indecente, o mais vil dos seres, a envergonhar as próprias cobras mais peçonhentas se me visse nascido entre elas.
Não entendo o que se passa, mas respondendo com respeito à sua pergunta, posso dizer que, apesar de me saber Lúcio, também me vejo como Pôncio a praticar todas as misérias e a não impedir a mais cruel de todas as injustiças.
Senhor, fui eu quem matou Jesus....
ESSA É A VERDADE... veja minhas mãos cheias de sangue... - gritava Lúcio, em estado de transe doloroso, erguendo os braços na direcção do magistrado.
Sobre o chão límpido e quase transparente daquela sala, suas mãos de rapaz começaram a transpirar o líquido vermelho que, por elas escorrendo, pingavam sobre aquele mármore celeste, como a expressão mais triste - a da consciência de culpa.
Ao sinal do magistrado, ele foi levado ao segundo, que representava, ali, a da Justiça.
- Meu filho - perguntou paternalmente, emocionado, o segundo juiz - o que você fez foi justo?
Escutando a indagação cheia de ternura, Lúcio, cego, quase descontrolado, repetiu:
- Meu senhor, desculpe meu descontrole, mas acabei de dizer que EU MATEI O JUSTO.
Como é que eu poderia ter agido com justiça?
Eu me confesso culpado diante de todos vocês.
Eu sou a pior espécie de homem que poderia estar sendo julgado.
Judas foi ingénuo e enganado pelas próprias ambições.
Anás e Caifás eram zelosos de suas crenças judaicas, vendo no Justo a ameaça para suas tradições.
Eu, no entanto, era romano, magistrado e general, detentor dos poderes sobre as guardas, zelador da ordem e da lei, dispensador de sentenças, juiz das questões gerais, dominando a pena e a espada.
Eu matei.... eu matei...
Não existe justiça em nada do que fiz.
Nos menores delitos envolvendo os interesses mais baixos até a miseranda condição de covarde, com ares de santo, ao lavar minhas mãos.
Veja, nobre Juiz, sinto o odor acre do sangue que pinga de minhas mãos.
Só não entendo por que estou cego...
Estou cego, senhor Juiz, talvez para não me ver tão horrendo como devo ser...
Sim, isso é uma punição pequena para a minha perversidade...
Todos naquele ambiente choravam.
Lívia, Públio, Zacarias, Lucilio, João de Cléofas, Flamínio, Calpúrnia, e os próprios magistrados, tocados de compaixão por aquele sofrimento tão verdadeiro, não conseguiam esconder as lágrimas a escorrerem por seus rostos, como gotas de cristal luminosas e puras.
Todos testemunhavam o tamanho da culpa daquela alma que, de forma sincera, não se escondia por detrás de ninguém diante da nudez dos próprios factos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Jan 09, 2015 9:56 am

Vendo o tamanho da auto incriminação, todos os espíritos ali presentes se inclinavam para o réu, num gesto de amparo espontâneo, de fraternal solicitude.
Todos queriam envolvê-lo com os próprios braços, coisa que só Zacarias e Lucilio podiam, efectivamente, realizar.
Não deixavam de fazê-lo, entretanto, com as próprias orações.
Encaminhado por seus dois sustentáculos vivos, Lúcio foi encaminhado ao terceiro juiz.
- Meu filho - falou o último magistrado - minhas atribuições junto a esta casa me impedem de exercer qualquer deliberação antes que você seja reconduzido à plenitude de seus sentidos de espírito. Será necessário que recupere a visão, antes que possamos prosseguir.
Sem saber o que fazer e, despreparado para qualquer outra conduta que não aquela que demonstrava a sua sinceridade, Lúcio respondeu:
- Nobre senhor, eu não sei como fazer isso.
Estou cego.
Sem se espantar com essa informação, o amoroso indagador o repreende, fraternalmente:
- Ora, meu filho, como pôde se esquecer de que na sua viagem em companhia de Décio, era você quem enxergava o caminho a seguir?
Lembra-se?
Como que transportado para aqueles momentos difíceis de sua última viagem, Lúcio levantou a cabeça, como se fitasse o céu, e respondeu:
- Sim, meu senhor, é verdade... não sei como, mas eu via.
Décio me ajudava com a prece e, graças a ela, meus olhos cegos conseguiam vislumbrar o caminho a ser tomado.
Atendendo ao sinal silencioso do magistrado, Décio se aproximou de Lúcio para que o rapaz o sentisse e falou:
- Pois então, meu filho querido, estou aqui a orar com você para que sua cegueira, novamente, possa identificar o caminho a seguir.
- Paizinho.. paizinho... é você, meu paizinho....
- Sim, meu filho, sou eu, Décio, seu paizinho que não o abandona.
Vamos orar juntos, novamente?
E acolhendo entre as suas as mãos postas de Lúcio, cheias de sangue, Décio ergueu a prece a Jesus:
- Amado Mestre de nossas vidas, aqui estamos novamente no escuro da estrada do crescimento, cegos pelos nossos erros, envolvidos na noite de nossa ignorância, conduzindo a carroça generosa da vida.
Como outrora, nos caminhos humanos, carecemos da vossa misericórdia para que não nos percamos nos cipoais da incerteza, aproveitando o momento crucial de nossos equívocos para transformá-los em adubo para nossos acertos.
A vossa solicitude nos ensinou a buscar-vos sempre que estivéssemos aflitos, porque ela nos aliviaria.
Aqui, as nossas mãos estão sujas do sangue de nossos erros.
Ajudai-nos a nos limpar e a encontrar nossos caminhos.
Dai-nos a vossa luz para sempre...
Todos os presentes oravam inclusive os próprios magistrados que, cabisbaixos, haviam-se transformado em sóis a irradiarem força e luz por todos os lados.
As colunas marmóreas e cristalinas do amplo salão reverberavam ante as emanações luminescentes e, sem entenderem como aquilo acontecia, parece que a atmosfera se fizera opalina e cintilante.
E diante das vistas de todos os presentes, o teto abobadado do ambiente se fez flexível ao contacto de duas mãos rutilantes que desciam do alto e penetravam ali.
- As mãos, paizinho, as mãos.... estou vendo as mãos - gritava, eufórico, o cego Lúcio.
As mãos que nos guiaram pelos caminhos, elas me aparecem novamente.... irão nos guiar de novo, meu pai.
Os presentes não se continham mais.
Enquanto aquelas duas mãos de luz se apresentavam diante deles, não houve quem não se prostrasse de joelhos no mármore celeste daquele templo de esperanças.
Diante da chegada daquela projecção luminosa, os próprios magistrados se levantaram de seus assentos e se fizeram reverentes.
Para o júbilo dos participantes eleitos para aquele encontro, as mãos se achegaram até as que se uniam em preces e que se mesclavam com o sangue de Lúcio/Pilatos.
O rapaz continuava cego no olhar esgazeado e perdido, mas sua voz continuava a descrever o que seu interior vislumbrava.
- Paizinho, as mãos estão chegando... são as mesmas de nossa viagem...
Elas estão aqui, tão perto de nós.
Não, paizinho, elas estão se unindo às nossas mãos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Jan 09, 2015 9:57 am

Não! Não! Minhas mãos têm sangue... - falava Lúcio, exasperado.
Minhas mãos têm sangue do Justo...
E ao pronunciar aquele nome, diante de todos os presentes embevecidos, as duas mãos vão se transformando, agregando-se os braços, o tronco, os cabelos longos e a túnica lirial, formada das luzes das estrelas.
Diante do olhar de todos, as mãos se transformam em Jesus.
- Paizinho - gritava Lúcio, em transe de emoção - é Jesus, é Jesus.
Aquelas mãos luminosas que nos guiaram, paizinho, elas são as mãos de Jesus...
Ninguém tinha palavras para exclamar.
Ao toque suave das suas mãos sobre as mãos unidas de Décio e de Lúcio, a visão espiritual se abriu e, então, o rapaz se transformou em homem.
Nesse mesmo instante, ambos se fizeram ajoelhar aos pés do Divino Mestre, de mãos postas.
- Bem-aventurados os que sofrem, porque serão consolados.
Bem-aventurados sois, meus amigos, que a bondade de meu Pai me permitiu guardar no profundo de meu coração.
Dirigindo-se ao jovem, agora com as aparências de um romano de estirpe, ainda que envolvido em trajes pouco exuberantes para o seu cargo, Jesus o afaga e pergunta:
- Pôncio, onde está o sangue de tuas mãos?
E observando as palavras do Senhor, Pilatos vislumbra as mãos limpas.
Sentindo-lhe as íntimas cogitações, Jesus lhe fala ao coração:
- Filho amado, limpa tua consciência também.
A obra do Pai é vasta e não precisa de mais doentes. Suas mãos operosas são aquelas que o Pai vai usar para transformar o erro em acerto, o crime em bênção, o Mal em Bem.
Vê tua volta todas as almas que se têm ocupado com a tua própria recuperação. Não desdenhes da luta nem do sofrimento, porquanto o espinho que fere nos faz acordar dos sonhos da ilusão.
No entanto, nunca te esqueças de que, se um dia serviste ao império dos homens, nunca deixaste de estar "Sob as Mãos da Misericórdia".
Pilatos agarrava-se ao manto do Divino Amigo, enquanto seus olhos não desgrudavam do rosto do Celeste Emissário de Deus.
Os três magistrados haviam descido de seus postos e se colocado junto ao Cristo de Luz, como a recusarem-se exercer qualquer autoridade naquele ambiente visitado pela mais sublime autoridade que existia, a representar a autoridade de Deus no meio dos homens.
Olhando a reverência daqueles serviçais do Tribunal Celeste, o Mestre lhes sorriu e disse:
- Nobres cumpridores da vontade de meu Pai, eu vos entrego o irmão Pôncio para que prossigais com vossos deveres.
Emocionados pelo respeito com que Jesus os considerava nas funções para as quais haviam sido nomeados pelas instâncias espirituais ligadas à fixação dos destinos das criaturas, as três autoridades espirituais ali se fizeram, igualmente, ajoelhar diante da soberana demonstração de respeito e, através do magistrado que representava a Misericórdia, aduziram:
- Óh Mestre dos Mestres, neste tribunal ocupais o cargo de Soberano de Deus, a dispensar as dádivas da Celeste Misericórdia.
Tomai a vosso cargo o que vos pertence por direito e exercitai sobre todos nós o império de vossa doce Misericórdia. Não apenas este irmão falido, mas todos nós, igualmente falidos moralmente, necessitamos dela.
Envolvendo os seus dignos representantes naquela casa que, acima e antes de ser uma casa de Justiça, era um templo de Compaixão Sublime, o Senhor, então, deliberou:
- Nobres magistrados, velem para que receba as lições DO AMOR que o fortaleçam e disciplinem. Todavia, atendendo à Vontade de meu Pai, desejo ser as mãos luminosas no caminho deste filho amado em todas as etapas de sua jornada. Por isso, que ele jamais se esqueça das mãos luminosas que o seguirão por onde for, mãos que nunca lavarei e que estarão sempre estendidas sobre sua alma.
- Senhor, suas vontades são ordens para nós.
No entanto, o amor que nos pedes para este filho é exactamente o que nos recomendas para todos os outros filhos de Deus.
- SIM, MEUS QUERIDOS, O "AMOR" DE DEUS É PARA TODOS IGUAL TANTO QUANTO A SUA JUSTIÇA. NO ENTANTO, NEM TODOS TÊM QUE CARREGAR POR MILÉNIOS O PESO DO JULGAMENTO INJUSTO DA HUMANIDADE SOBRE AS COSTAS. POR ISSO, A MISERICÓRDIA É SEMPRE MAIOR PARA OS QUE MAIS SOFREM.
COMO PARA JUDAS, PARA PILATOS TAMBÉM A COMPAIXÃO SE ESTENDE COM MAIOR PODER, PARA QUE SE TORNE DOS MEUS MAIS CEDO DO QUE OS OUTROS, A FIM
DE QUE, SENTINDO-SE AMPARADO PASSO A PASSO, POSSA, UM DIA NO FUTURO, TORNAR-SE UM SERVIDOR DA HUMANIDADE, O MESMO QUE RESGATA AQUELES QUE, POR SÉCULOS, O CONDENAM.
MISERICÓRDIA QUERO, NÃO O SACRIFÍCIO.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Jan 09, 2015 9:57 am

Eis aí, leitor(a) querido(a), a mensagem da Misericórdia de Deus, através da compaixão maior aos que mais sofrem, aos que são mais perseguidos pelos erros que cometem, aos que são injustiçados em grau superlativo.
Se o Amor e a Justiça do Universo são igualmente distribuídos pelos filhos, de forma a revelarem a igual preocupação do Pai e a correcta avaliação de todos os actos, sem engodos ou trapaças, a Misericórdia segue outros parâmetros para poder abarcar cada ser, na exacta medida da compaixão celeste, em cada caso específico.
Nunca se esqueça de que você pode contar com ela, desde que, ao contacto com o Tribunal da Verdade, seja capaz de assumir seus erros, sem acusar os outros, sem desculpar-se de nada, sem pretender fingir-se de perfeito.
Que aprendamos de uma vez por todas, o que significa a expressão contida no Pai Nosso a que Jesus se refere, proferindo a frase SEJA FEITA A VOSSA VONTADE.
O querer do Criador, acima de nossos desejos ou pretensões.
O desejo do Pai Sábio, a suplantar nossos anseios e a transformar nossas considerações sobre justiça, merecimento, direito ou virtude.
Que já não haja tanto ego em nosso Eu. Que cada um de nós possa vislumbrar que também haveremos de enfrentar esse mesmo tribunal que, de uma forma ou de outra, nos perguntará se os nossos actos, entrevistos pela nossa consciência, são verdadeiros ou estão desproporcionados.
De igual maneira, deveremos avaliar se foram justos, se estiveram embasados nos critérios de elevação e correcção, de sinceridade e pureza de sentimentos.
Por fim, nos será apresentada a avaliação sobre que tipo de pena acreditamos ser merecedores.
Se você leu esta última parte com olhos de ver, poderá ter percebido que, em momento algum, a Misericórdia deixara ao desamparo as personagens desta história.
Quando tudo parecia apenas injustiça dos homens, a sua acção discreta e sábia preparava os passos do futuro, ampliando a rede de amparo aos espíritos que, injustiçados pelas ambições da ignorância, seriam deportados para que morressem ao desabrigo.
Se, portanto, os homens são avarentos no afecto, nunca se esqueça de que a Misericórdia tudo vê, e a tudo atende como a mão augusta da Augusta Providência.
E quando pareça que a Justiça vai desferir seus golpes sobre o caído no erro ou no delito, um mísero gesto de carinho por parte do falido, uma pequena demonstração de esforço sincero para vencer as más inclinações, representa material que a Misericórdia apresenta ao Tribunal Celeste, a invocar o adiamento da pena para o aproveitamento da centelha luminosa do Bem que começa a brotar no coração desditoso.
Não eternize seus sofrimentos, leitor querido. Faça todo o Bem que estiver ao alcance de suas mãos.
É certo que há uma espada afiada sobre todas as nossas cabeças, como se a Justiça estivesse pronta a vir cobrar nossos débitos longamente acumulados ao correr dos milénios.
No entanto, forneçamos à Misericórdia o material para que estabeleça a nossa defesa, adiando a incidência da Justiça para que o Tempo nos favoreça nas realizações do Bem.
O Amor nunca esquece, a Bondade é fortaleza, mas quem nos governa os destinos é a AUGUSTA MISERICÓRDIA, graças à qual, nós ainda nos encontramos vivos, sendo tão imperfeitos como temos sido.
Se não fosse por ela, certamente a Terra estaria desabitada de seres humanos até os dias de hoje.
Nunca desista de si mesmo. Sobre as dores que o fustiguem, a Misericórdia trabalha para atenuá-las a fim de que você aprenda a crescer e a superá-las.
Por onde andar o espírito Pilatos e todos os demais que compuseram as pobres linhas destas três mensagens que terminam neste momento, lembremo-nos de que eles, tanto quanto todos nós, somos aqueles que Jesus está esperando para que o Reino de Deus se concretize nos corações dos homens.
Se você for daqueles que entendem o quanto sofre a consciência que falhou nos caminhos do mundo, tenha um pouco de compaixão ou de Misericórdia e, ao invés de malhar Judas no sábado de Aleluia, julgar Pilatos como um covarde ou assassino, ou condenar qualquer irmão que falhou no caminho da vida, faça uma oração por eles.
Você vai perceber que, enquanto Jesus se ocupou pessoalmente de Judas, seu apóstolo fracassado, e de Pilatos, seu juiz tíbio, desde que você se fez um cristão assumido e talvez, até os dias de hoje, jamais tenha orado, sinceramente, por estes dois espíritos.
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Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz - Página 9 Empty Re: Série Lúcius - Sob as Mãos da MISERICÓRDIA / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Sex Jan 09, 2015 9:57 am

Assim, para você, O ESPIRITISMO PERGUNTA
Meu irmão, não te permitas impressionar apenas com as alterações que convulsionam hoje todas as frentes de trabalhos e descobrimentos na Terra.
Olha para dentro de ti mesmo e mentaliza o futuro.
O teu corpo físico define a actualidade do teu corpo espiritual.
Já viveste, quanto nós mesmos, vidas incontáveis e trazes, no bojo do espírito, as conquistas alcançadas em longo percurso de experiências na ronda dos milénios.
Tua mente já possui, nas criptas da memória, recursos enciclopédicos da cultura de todos os grandes centros do Planeta.
Teu perispirito já se revestiu com porções da matéria de todos os continentes.
Tuas irradiações, através das roupas que te serviram, já marcaram todos os salões da aristocracia e todos os círculos de penúria do plano terrestre.
Tua figura já integrou os quadros do poder e da subalternidade em todas as nações.
Tuas energias genésicas e afectivas já plasmaram corpos na configuração moríológica de todas as raças.
Teus sentidos já foram arrebatados ao torvelinho de todas as diversões.
Tua voz já expressou o bem e o mal em todos os idiomas.
Teu coração já pulsou ao ritmo de todas as paixões.
Teus olhos já se deslumbraram diante de todos os espectáculos conhecidos, das trevas do horrível às magnificências do belo.
Teus ouvidos já registaram todos os tipos de sons e linguagens existentes no mundo.
Teus pulmões já respiraram o ar de todos os climas.
Teu paladar já se banqueteou abusivamente nos acepipes de todos os povos.
Tuas mãos já retiveram e dissiparam fortunas, constituídas por todos os padrões da moeda humana.
Tua pele, em cores diversas, já foi beijada pelo sol de todas as latitudes.
Tua emoção já passou por todos os transes possíveis de renascimentos e mortes.
Eis por que o Espiritismo te pergunta:
- Não julgas que já é tempo de renovar?
Sem renovação, que vale a vida humana?
Se fosse para continuares repetindo aquilo que já foste e o que fizeste, não terias necessidade de novo corpo e de nova existência -prosseguirias de alma jungida à matéria gasta da encarnação precedente, enfeitando um jardim de cadáveres.
Vives novamente na carne para o burilamento de teu espírito. A reencarnação é o caminho da Grande Luz.
Ama e trabalha. Trabalha e serve.

Perante o bem, quase sempre, temos sido somente constantes na inconstância e fiéis à infidelidade, esquecidos de que tudo se transforma, com excepção da necessidade de transformar.
Militão Pacheco
(Extraído do livro O Espírito da Verdade, Espíritos Diversos, psicografado por Francisco Cândido Xavier/Waldo Vieira.)

Seja, então, a expressão que constrói o mundo melhor a partir de seus próprios sentimentos, a transformar os que o cercam com a doçura dos seus actos, com a compreensão de suas palavras, com o carinho de sua entrega porque, relembrando as palavras do Cristo:
"NO FIM DOS TEMPOS, POR CAUSA DA INIQUIDADE DE MUITOS, A BONDADE ESFRIARÁ NO CORAÇÃO DAS PESSOAS. NO ENTANTO, TODO AQUELE QUE PERSEVERAR ATÉ O FIM, ESSE SERÁ SALVO."
PERSEVERAI NO BEM, MEU IRMÃO, MINHA IRMÃ. É POR ISSO QUE O PAI VOS CRIOU.
BRILHE VOSSA LUZ! MUITA PAZ!


Com carinho, para você,
Lucius (Campinas, 05/08/2005)

André Luíz de Andrade Ruiz, iniciou-se no conhecimento espírita através dos exemplos recebidos de seus pais, Miguel D. D. Ruiz e Odete de Andrade Ruiz, igualmente admiradores da doutrina codificada por Kardec desde a juventude, oriundos que eram de famílias espíritas. Nascido na cidade de Bauru, Estado de São Paulo, aos 11/08/1962, desde a infância estabeleceu residência em Birigui, no mesmo Estado, de onde transferiu-se para Campinas, no ano de 1977.
Em 1979 passou a frequentar a sociedade beneficente Bezerra de Menezes onde se encontra até os dias actuais e no qual, ao lado de muitos companheiros dedicados no ideal cristão, desenvolve o labor fraterno de atendimento aos irmãos de caminhada evolutiva.

Fim

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