LUZ ESPÍRITA
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:42 am

Esculpindo o próprio destino
André Luíz Ruiz

Espírito Lucius

1 - A suíte presidencial
2 - Leonor
3 - Oliveira e Eulália
4 - Os mecanismos da hipnose
5 - Começando o trabalho
6 - Pedindo a enfermidade ou criando a doença
7 - Explicando
8 - Os ambientes inferiores
9 - A rotina nas furnas
10 - A astúcia das trevas
11 - Encarando a si mesma
12 - O auto-exame
13 - Atmosfera de cada enfermo
14 - O bem amparando o mal
15 - A selecção para o carnaval
16 - O carnaval
17 - A chuva
18 - Enquanto o pai trabalhava, seus filhos descansavam
19 - As furnas quase vazias
20 - Protegendo os encarnados de si próprio
21 - Recebendo ajuda de quase todos os lados
22 - Resolvendo um problema e criando três
23 - Prosseguindo as lutas
24 - O encontro redentor
25 - “Ajuda-te que o céu te ajudará”
26 - A volta da folia
27 - Diante do maioral
28 - Desdobramentos
29 - O culto, a missa e a reunião espírita
30 - O jogo mesquinho
31 - Coragem e decisão, doença e descoberta
32 - Agitação nos abismos e no parlamento
33 - As acções do bem e os verdadeiros objectivos do mal
34 - Bendito câncer
35 - Relembrando
36 - Misericórdia x Justiça
37 - O reencontro
38 - Aproximando-se da luta derradeira
39 - O encontro do Maioral, Geroboão e Caifás
40 - Cada qual em suas buscas
41 - Vencendo a prostituição
42 - Definindo novos rumos
43 - Esculpindo o próprio destino
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:43 am

1 - A SUÍTE PRESIDENCIAL

Em tarefa de amparo e aprendizado espiritual naquele ambiente difícil, encontravam-se Jerónimo e Adelino, Espíritos enviados por Bezerra de Menezes para fortalecer Leonor, que se mantinha imóvel em um canto do recinto.
Sua expressão facial denotava a melancolia a esconder a preocupação que se enraizava em seu pensamento havia alguns dias.
O lugar não ajudava muito.
A conjugação fluídica desagradável produzia reacções nauseantes em qualquer Espírito menos adestrado nos trabalhos de socorro às aflições humanas.
Várias salas, repletas de entidades desequilibradas acompanhando os vivos ali presentes.
Se analisados pelo estado mental em desequilíbrio, poder-se-ia dizer que o ambiente não diferia do de um sanatório.
Espíritos enlouquecidos perambulavam por todos os lados, entrando em todos os compartimentos, procurando tocar nos humanos, gritando impropérios ou bradando maldições.
Se analisássemos o local pela leviandade dos presentes, poderíamos compará-lo a um mercado onde todos comparecem falando de seus interesses, comentando as frivolidades da vida e praguejando contra os sofrimentos e injustiças, entre piadas sussurradas e maldades proferidas com ares de respeito.
Não fugiam de suas observações as conversas dos desencarnados que, ali, na companhia de tantos encarnados de vibração similar, se faziam mais estimulados para darem vazão aos seus instintos grosseiros.
Não muito distante, entidade de aparência repulsiva se expressava sem pudores:
– Já chegou o seu ocupante da suíte presidencial? – gritava como quem se via responsável pela organização de importante evento.
– Já chegou, já chegou... está sendo preparado para entrar na suíte... – espondeu um outro, colocando a cabeça para fora da porta de pequeno quarto que dava acesso ao ambiente principal.
– Vamos logo, estamos todos esperando para assistir ao grande evento...
Os vivos no corpo jamais poderiam imaginar o que se passava ao seu redor.
E se a espera pela ocupação da chamada suíte presidencial era algo tão importante para aquela aglomeração de entidades viciosas e degeneradas, os demais compartimentos, já ocupados também, possuíam a sua plateia específica.
A algazarra, no entanto, era a marca comum, misturando-se os encarnados desatentos e invigilantes à multidão dos Espíritos maliciosos, usurpadores, interessados em extrair de cada fornecedor humano o melhor de suas forças.
O recinto e suas inúmeras salas e gabinetes estava repleto de vivos e mortos, homens e mulheres, nas manifestações da emoção desajustada, sem maiores ligações com as coisas superiores da existência.
Raros se postavam em atitude de consideração adequada à circunstância.
Muitos Espíritos curiosos eram atraídos para o local, como a assistirem a um bizarro espectáculo que os divertiria um pouco, dando novo tempero às monótonas ocupações persecutórias do mundo invisível sobre o mundo visível.
Outros vinham acompanhando os próprios encarnados como parasitas, a eles tão agregados que não se poderia dizer quem é que se alimentava das forças de quem.
Não tardou muito para que se completasse o quadro dantesco.
Com a algazarra própria das entidades inferiores congregadas em um único recinto, como se uma cerimónia ritualística fosse iniciada ao comando da mesma entidade de aparência desagradável, observou-se algo que os olhares humanos não acreditariam existir, se tivessem o desprazer de conseguir captar as imagens do mundo espiritual.
O alvoroço de uma verdadeira multidão de duendes, mendigos, homens e mulheres dilacerados, Espíritos perdidos na devassidão, todos a formar dois vastos cordões no meio do qual o verdadeiro e importante cortejo passaria em direcção à chamada suíte presidencial.
Enquanto tais entidades providenciavam a grotesca recepção, como se fossem dar passagem a importante autoridade que se fizera admirada por todos aqueles Espíritos pervertidos, outra gritaria tinha início, um pouco mais afastada do tal corredor principal, de onde choviam impropérios e ameaças, palavrões e xingamentos, contrastando com a obsequiosa e ridícula atenção dos outros Espíritos, demonstrando a certeza de que, na dimensão espiritual, dois grupos opostos estavam prestes a entrar em conflito.
Separando as duas turmas, encontravam-se Espíritos cuja aparência física grotesca e ameaçadora desestimulava qualquer tentativa de assalto por parte das entidades revoltadas que gritavam ofensas de longe.
Essa era a barreira que os mantinha mais afastados, não impedindo, entretanto, que permanecessem no local, esperando o momento adequado para uma maior aproximação.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:43 am

Enquanto isso, a suíte presidencial ia sendo ocupada por toda a multidão das entidades curiosas que não desejava perder os detalhes daquele verdadeiro espectáculo sob suas vistas.
No ambiente material, sumptuosa em suas apresentações, as acomodações físicas da suíte correspondiam aos seus qualificativos.
Flores em profusão guarneciam a entrada.
O local era revestido de granito polido e, aqui e ali, se podiam observar os cuidados nos mínimos detalhes.
Bandejas com refrigerantes e biscoitos, café e chá para consumo abundante dos encarnados, temperatura regulada para afastar o calor excessivo, discretos serviçais em uniforme, oferecendo o melhor atendimento.
Enquanto isso, o cortejo espiritual continuava com seus rituais esdrúxulos, como a lembrar as antigas cerimónias do paganismo ancestral, com Espíritos travestidos de seres mitológicos, envergando peles de animais sagrados, carregando tochas acesas, fazendo-se anteceder pelos tocadores de tambores e pelos alucinados dançarinos e dançarinas, no desfile deprimente do estilo erotizante e libertino que caracterizavam as cerimónias desse tipo, tão comuns na antiga Roma pagã.
Não imaginavam os vivos o teor da bacanal espiritual que ocorria naquele recinto que, aos olhos dos encarnados, era uma luxuosa alcova destinada somente para pessoas ilustres e detentoras de recursos abundantes em condições de poder desfrutar de seu luxo e ostentação.
Ao mesmo tempo em que se alvoroçavam os desencarnados, vislumbrando o início do festival, os encarnados também eram convocados para a atitude adequada em vista do importante momento que se desenrolaria ante seus olhares.
Rapidamente fez-se o silêncio falsamente respeitoso no rico ambiente, transformando aquele já citado mercado humano em uma quase abadia religiosa.
Depois de conseguida a calmaria na efervescência dos vivos, seis homens vestidos de negro deixaram a pequena sala já referida carregando, cerimoniosamente, pesado esquife de madeira lavrada, passando entre os presentes e as inúmeras coroas de flores ali enfileiradas, antecedido e sucedido por guardas uniformizados em gala própria para o evento lutuoso, a fim de depositar o corpo frio no local preparado à recepção das homenagens funerárias no salão amplo e solene daquele prédio, especialmente edificado para o legislativo daquela cidade, transformado de improviso em velório do desencarnado ilustre, antes de seu sepultamento no cemitério não muito distante dali.
Diante dos olhos de todos estava o corpo físico de importante político da cidade, homem cuja vida fora marcada pelo discurso de honradez e correcção, mas que, em realidade, encobria uma vida de desmandos, de crimes sórdidos, de corrupção indecente e toda sorte de delitos contra a honra e a dignidade do ser humano.
Tornara-se rico e poderoso naquela localidade para, logo depois, ao preço de alianças e interesses escusos, conchavos e ilegalidades, ganhar realce nacional.
Entretanto, nem sua riqueza material nem seus poderes políticos impediram que as forças da morte o arrastassem, colocando um fim em toda a longa série de equivocações e crimes mal disfarçados pelo manto da falsa dignidade.
Ao longo de sua vida pública, sua fama regional ampliara-se com o tempo, o que tornara muito concorrido o seu velório na Câmara Legislativa, sem se falar no público curioso que se acumulava fora do prédio, como a reclamar a possibilidade de uma última olhada no falecido.
Alguns chegavam como quem se despedia de um benfeitor.
Outros queriam ver se era verdade.
Muitos, no entanto, vociferavam impropérios mentais, no sarcasmo típico do rancoroso ser humano que, sem poder competir com o poder e a influência do falecido, agora destituído de todas as suas armas humanas, podia dar o troco, amaldiçoando-lhe o nome e desejando as piores coisas para a alma do defunto.
A “suíte presidencial”, como os Espíritos inferiores se referiam à sala principal do prédio legislativo, fora, finalmente, ocupada pela principal estrela.
Aturdido e ainda preso ao corpo físico exposto ao olhar do povo, o Espírito do referido homem público era digno de compaixão de todos os que ali o observavam, perdido diante da confusão no meio da qual se encontrava, já que o pobre não sabia discernir entre o que acontecia no plano material, nas homenagens e discursos ridículos que os homens corruptos se prestam uns aos outros mescladas à bacanal festiva que o recebia no ambiente espiritual, mistura de festival erótico, galhofa colectiva e manifestação de protesto violento, tendo a sua figura como ponto central.
Via-se-lhe o desejo de sair dali.
No entanto, os laços intensos que o prendiam ao corpo carnal ainda não permitiam a sua fuga.
Ao lado do caixão sumptuoso, os familiares carnais se postavam esboçando falsa emoção, apenas para que pudessem sair nas fotografias de jornais ou fossem captados pelas câmaras de televisão que registariam aquele evento jornalístico sem o menor respeito pela situação em si.
Entre uma e outra imagem, se podia observar a preocupação de alguns repórteres em obter entrevistas com os políticos vivos que haviam comparecido à cerimónia funerária e que, de uma certa forma, também se expunham para que fossem flagrados pelas lentes e conseguissem um bom espaço na mídia, além de aproveitarem a oportunidade para se fazerem notar, conhecer e divulgar suas ideias sobre os projectos de sua autoria.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:43 am

A situação de Oliveira(*), o finado, era das piores.
Desacostumado à elevação de pensamentos e a orações verdadeiras, relegara suas obrigações espirituais às práticas ritualísticas da religião católica, a da maioria de seus eleitores, transferindo ao sacerdote as tarefas de garantir-lhe a entrada no paraíso enquanto que, através de concessões materiais e favores políticos agradáveis ao clero, selava essa sociedade de interesses inferiores, demonstrando aos religiosos que poderiam encontrar nele, Oliveira, um hábil aliado e um generoso fornecedor de favores.
Durante sua vida, esta havia sido a relação espiritual que o político desenvolvera com Deus, através da religião formal na qual via um trampolim para sua ascensão política e material.
Aliado aos líderes religiosos mais importantes, criara um sistema de trocas e apoios através do qual usava o Reino de Deus para conquistar o Reino dos homens.
Trocavam-se, dessa forma, os interesses.
Oliveira garantia aos sacerdotes o reino do mundo e estes lhe prometiam o Reino dos Céus.
Agora, no entanto, nem a presença das inúmeras autoridades eclesiásticas de diversos níveis hierárquicos era capaz de facultar o acesso do finado aos bens do Espírito, já que, contrariamente a todas as suas expectativas, o que via diante de seus olhos atónitos e amedrontados era a surreal cerimónia de duendes deformados e entidades fantasmagóricas misturadas aos encarnados de forma tão íntima, que ele não sabia dizer quem era Espírito e quem era corpo.
Em seu pensamento despreparado para tal situação, perguntava por que as autoridades haviam permitido a entrada daquele tipo de gente horripilante no ambiente legislativo, o que era flagrantemente incompatível com a sala das sessões oficiais.
Dirigindo o olhar para o seu corpo estendido dentro do caixão, também se surpreendia perguntando o que fazia ele ali, dormindo no meio de tanto barulho?
Quando seria declarada aberta a sessão?
Mas por que seu corpo estava naquele estado?
Oliveira se perdia em conjecturas inapropriadas para um cérebro pouco afeiçoado às questões transcendentes.
A cena era por demais reveladora.
Estava diante do próprio velório.
Tudo indicava a ocorrência funesta a atrapalhar seus planos mundanos.
Uma incoercível dor atingia seu cérebro espiritual obrigando-o a manter-se agarrado à borda do esquife para não cair ao solo.
Para cada antigo comparsa de partido político ele tinha uma expressão de desespero, gritada ao ouvido e não respondida pelo destinatário.
Oliveira entrava pelo caminho do delírio.
Arrastava-se do caixão para o local onde a esposa se encontrava sentada, tentando nela encontrar um pouco de amparo.
Ela, todavia, que havia muito tempo mantinha um casamento de aparências, acostumada ao estilo fútil e mentiroso de viver, não carregava nenhum sentimento elevado em relação ao marido.
Ele nunca se fizera bem querer pela esposa e pelos inúmeros filhos e filhas.
Atendia aos seus anseios consumistas como forma de compensar-lhe a aceitação de suas aventuras e escapadas com amantes mais jovens, sempre conseguidas através de assessores directos e cúmplices de seus vícios sexuais, para orgias regadas a bebida cara.
Os filhos haviam sido relegados aos cuidados de criados e governantas, não possuindo maior laço de afecto com o progenitor, de quem se mantinham próximos somente para o aproveitamento das benesses do cargo político e das vantagens do poder.
Haviam crescido como delinquentezinhos burgueses acostumados a fazer tudo o que desejavam e esconderem-se atrás do pai poderoso que resolveria as suas encrencas.
O pai era apenas a caixa-forte, o fornecedor de dinheiro, o homem importante e nada mais.
Oliveira, pois, claudicava por entre políticos inescrupulosos que o apoiavam e que, agora, viam-se em dificuldades diante de negócios pendentes que ele deveria ter encaminhado, mas que estacionavam sem solução com a sua morte.
Os padres lastimavam a perda do grande aliado e pensavam, agora, como conseguir um outro importante respaldo para suas solicitações e interesses.
O coração de Oliveira estava estilhaçado pela surpresa, seu cérebro parecia explodir pela dor incessante e, segundo suas apressadas conclusões, somente o nada ou o desconhecido desesperador se abririam para ele.
Os olhos dos amigos espirituais, no entanto, não perdiam Leonor de vista, uma vez que lá estavam destacados por superiores espirituais a fim de auxiliar a pobre mulher nos momentos difíceis que se avizinhavam.

(*) Nome fictício. (Nota do Autor Espiritual)
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:43 am

2 - LEONOR

Eram interessantes as pessoas que se encontravam naquele arremedo de “homenagem” ao morto.
De um lado, criaturas
inescrupulosas e interesseiras compondo a grande maioria, aquelas que desejavam se fazer notadas, ao mesmo tempo em que a qualidade de suas conversas era marcada por palavras malévolas que dançavam com facilidade da boca para o ouvido, entre as rodinhas e as saletas da instituição legislativa.
Os representantes das religiões tradicionais acorriam igualmente, disputando entre si o ensejo de assumirem a liderança “espiritual” daquele certame de vaidades.
Os parentes, indiferentes e frios, se mantinham atentos à função teatral de demonstrar a exterior e protocolar tristeza que seria digna de se esperar dos componentes do clã Oliveira, sem que isso significasse qualquer pensamento confortador ao Espírito do defunto, indicativo de saudade ou sentimento de perda em relação a ele.
De outro lado, o povo curioso diante do ocorrido a um homem público.
Um ou outro cidadão que ao longo da vida havia recebido algum benefício do político importante, alguém que se valera de seus contactos influentes, que obtivera vantagem graças às atenções do falecido, trazia até o ambiente uma réstia de gratidão, algum sentimento que diferisse da curiosidade vulgar.
Alguns anciãos que apoiaram a ascensão política de Oliveira lastimavam com sinceridade a sua perda física, certamente por desconhecerem o tamanho dos seus compromissos morais no exercício de suas responsabilidades colectivas, idealizando-o na imagem de homem que viam representado nos seus discursos inflamados, imaginando-o dotado de virtudes especiais, longe de suporem a sua transformação no político venal e corrupto, indiferente e desalmado que boa parte das pessoas sabia que ele era, de facto.
O restante dos visitantes correspondia a esse universo de desequilíbrio próprio dos homens no mundo de hoje.
No entanto, sentada no banco dos convidados, Leonor era uma peça quase que totalmente ignorada pela maioria dos presentes.
Recolhida ao local mais afastado do ambiente, sem qualquer realce oficial, a antiga amante de Oliveira ali estava, entendendo e aceitando a sua condição de mulher sem títulos sociais e que deveria manter-se no anonimato para não constranger os representantes
do clube familiar do político finado.
A sua jornada de lágrimas começara muito tempo antes.
Quando Oliveira era jovem, pobre e sem qualificativos pessoais, Leonor, um pouco mais velha, conheceu-o e, da atracção imediata nasceu um tórrido romance, tão comum a qualquer jovem de todos os tempos.
Essa união informal redundou no nascimento do primeiro filho do casal, que logo foi seguido por uma linda menina.
No entanto, ambicioso e astuto, Oliveira sabia que sua vida não poderia manter-se naquele padrão de pobreza e desimportância.
Desejava maiores voos em conquistas mais ousadas.
Assim, logo que nasceu a filha, abandonou Leonor à própria sorte, alegando que precisava mudar de cidade em busca de outro tipo de trabalho.
Sem se incomodar com as lágrimas da companheira com quem convivera durante poucos anos e de quem recebera o carinho espontâneo da amiga e parceira na dificuldade, Oliveira demandou cidade maior da mesma região, na qual ele poderia dar asas aos seus objectivos de fazer carreira em qualquer área que lhe garantisse sucesso.
Leonor não poderia acompanhá-lo porque não possuía os requisitos ou atributos femininos à altura de suas exigências.
Ela seria uma óptima esposa de pobre. No entanto, jamais poderia se tornar esposa de rico, de um homem importante como ele, Oliveira, tanto ambicionava ser.
Os filhos do casal receberam o esquecimento deliberado do pai que, em realidade, desejava romper as amarras com aquilo que ele já considerava passado, um passado que acabara e com o qual não deveria manter qualquer vínculo.
Leonor criara o casal de filhos no ardor da dificuldade.
Oliveira prosperara devido ao seu talento pessoal e aos golpes favoráveis do destino, segundo pensava em suas ideias pouco espiritualizadas.
Aproximara-se de rico negociante exercendo as funções de motorista e guarda-costas, o que lhe propiciava o indispensável salário mensal, além da manutenção de uma aparência física favorável aos olhares femininos.
Não tardou para que seus impulsos conquistadores se dirigissem para a filha única do patrão.
A jovem Helena também simpatizara com o rapaz, e apesar da diferença de padrão social, um romance teve início entre ambos, ainda que longe dos olhares firmes e argutos dos pais da moça.
A competência, a seriedade, a rectidão aparente de Oliveira puderam, enfim, cativar a sensibilidade dos pais de Helena, facilitando a oficialização do namoro e a adopção do motorista como membro definitivo da família.
Todavia, o rapaz jamais mencionou o relacionamento anterior e a paternidade sua em relação aos dois filhos que gerara com Leonor.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:43 am

Helena ocupava o centro de seu mundo e de seus planos, porta aberta para o sucesso de seus empreendimentos de conquista.
Os pais da jovem estimulavam seus pendores de inteligência de forma que, com o apoio dos sogros, Oliveira deu seguimento à formação intelectual com o estudo nos diversos níveis, sempre com os melhores desempenhos e elogiosas vitórias, atraindo para si ainda mais a atenção de Helena e de seus pais.
O casamento não tardou, tendo sido realizado logo depois que Oliveira conquistara o diploma de bacharel em Direito, carreira muito cobiçada por todos os que desejavam enveredar pelos caminhos da política.
O sogro passara a ver, no antigo motorista, o continuador de sua tradição de riqueza e o garantidor da felicidade de sua única filha.
As lutas comerciais e os interesses da família, agora depositados também, em parte, sobre seus ombros mais jovens, levaram os dois varões a se embrenharem por caminhos de luta na garantia de melhores condições para seus negócios.
Travaram contacto com políticos da época a fim de garantirem maiores preços para as colheitas de suas fazendas, manipulando o mercado e exercendo pressões a fim de fazer subir o valor das mercadorias e, com isso, auferirem maiores lucros.
Empenhados nisso, surgiu a oportunidade de seu sogro ver-se erguido à condição de prefeito da cidade, colocando Oliveira como seu braço direito e iniciando seus primeiros contactos com os meandros difíceis do mundanismo político.
Leonor, por sua vez, ferida no afecto pelo abandono do pai de seus filhos, à custa de muito sacrifício, mantinha-se equilibrada sobre o ténue fio no qual procurava se manter entre a dignidade e o desespero.Sem se deixar inclinar pelas
sugestões da facilidade, na busca de dinheiro através da venda de prazeres, espremia-se entre o serviço doméstico do qual retirava pequeno salário e os problemas da educação do casal de filhos, que cresciam aos trancos e barrancos.
Leonor não tinha parentes próximos aos quais pudesse recorrer para ajudá-la na atenção indispensável com a prole.
Precisava contar com o auxílio de uma vizinha disponível que, por algum valor mísero que Leonor lhe oferecia, aceitara cuidar de seus filhos, o que fazia sempre com a má vontade daqueles nos quais o senso de amor ao próximo ainda não tocou o coração de forma verdadeira.
Assim, as crianças sempre eram maltratadas, apesar de entenderem os desafios maternos nos trabalhos exaustivos para a garantia do alimento diário e das roupinhas pobres.
O tempo passou.
Oliveira se tornou o chefe da família, com a morte do sogro, e Helena assumira a função de garantidora de sua integridade moral.
Com a modificação das situações no clã que adoptara como seu, Oliveira conquistara, a um só golpe, a riqueza herdada por sua esposa e a posição política como sucessor do sogro nos negócios e conchavos.
Helena se mantinha afastada de tais cenários já que se dedicara a cuidar da mãe enferma, que ainda vivia, e dos filhos que ia gerando da união com o esposo.
As rotinas da família, no entanto, não atraíam a atenção de Oliveira, que relegava tal responsabilidade à vigilância da mulher, descuidando-se das tarefas de pai e, por fim, do carinho de esposo.
Cada vez mais envolvido nas lutas políticas, vira-se igualmente embriagado pelas seduções que a importância de sua figura facilitava, em decorrência do comportamento lascivo e oferecido de outras mulheres.
E uma sucessão de amantes jovens, moças exuberantes e insinuantes passou a viciar os padrões de sentimento e as condutas sexuais de Oliveira, descobrindo emoções mais fortes do que aquelas que sentia ao contacto com Helena.
No entanto, jamais se permitiria deixar que tais aventuras se tornassem públicas, vindo a ferir a figura de bom marido e generoso pai, cultor dos padrões da família perfeita.
Suas infidelidades eram vividas sob a protecção de atentos ajudantes, alcoviteiros de plantão, que se prestavam a tais serviços para ganharem a confiança e a cumplicidade do importante homem de negócios que começava a enveredar pela carreira política.
A essa altura, a consciência de Oliveira se fez ouvir no sentido de buscar notícias de Leonor.
Entediado com o cortejo fácil de mulheres que se faziam pedaços de carne selvagem, submissas aos seus impulsos e servas de sua vontade, passadas mais de duas décadas de aventuras e sucesso financeiro, Oliveira sentiu saudades dos carinhos amigos de Leonor.
A solidão interior se torna maior quando o corpo, cansado de prazeres sem sentido, percebe que nenhuma das facilidades do sexo consegue alimentar as necessidades da alma.
Pensou nos filhos, de como já deveriam ter crescido...
Uma nostalgia entremeada de esperança e carência se apossou de sua emoção.
Através de um de seus ajudantes alcoviteiros, seus assessores para a depravação, Oliveira obteve notícias de sua antiga companheira.
Leonor não deveria conhecer muitos detalhes de sua vida privada.
Desejava marcar um encontro com a antiga companheira, depois de já ter decorrido tanto tempo de abandono.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:44 am

Com os esforços empenhados por seu assessor para assuntos sexuais, Oliveira conseguiu encontrar-se com Leonor que, carregando no coração o antigo sentimento, apesar das dores do abandono e das feridas não cicatrizadas, aceitou encontrar-se com ele, buscando conhecer seu destino.
Desse reencontro, Oliveira retomou a esperança em ser feliz.
Relembrando os carinhos de Leonor que, aos seus olhos, continuava atraente como no passado, apesar do tempo decorrido, Oliveira inventou a história de que vivia distante, em situação materialmente estável e que havia-se unido a uma pessoa, mas que o destino lhe garantira a posição de viúvo, com filhos a educar.
Isso consumia suas preocupações e recursos, obrigando-o a passar seus dias entre seus negócios e compromissos de viagem.
Leonor o escutava, impressionada com a modificação de suas maneiras.
Ela continuava a ser a simplória moça do ontem descomplicado que, agora, poderia voltar a se sentir querida por aquele homem.
No entanto, Oliveira precisava manter-se discreto e evasivo para não estragar aquele instante de enlevo para seus desejos de carinho.
Os filhos de Leonor não compareceram ao reencontro porque ela preferiu nada lhes revelar, já que ambos guardavam mágoa em relação ao pai, em virtude do abandono a que haviam sido relegados.
Desse reencontro reacenderam-se os carinhos e, sem saber que Oliveira era homem casado, Leonor voltou a ter esperanças de recuperar a sua atenção e seu interesse.
Para Oliveira, no entanto, aquilo era apenas um pouco de alimento fresco no meio de tanto lixo emocional do qual ele se via obrigado a se servir, agora que sua vida leviana o estava empurrando cada vez mais para o lodaçal da devassidão.
Com essa aproximação, Oliveira buscou compensar Leonor e limpar um pouco a própria consciência, enegrecida pela culpa do abandono, oferecendo ajuda financeira para as suas necessidades mais prementes.
Leonor, que era muito simplória, ainda assim soube ter dignidade para recusar a oferta pecuniária.
No entanto, lembrando-se da condição difícil dos próprios filhos, aventou a possibilidade de se conseguir estudo para ambos em outra cidade, o que permitiria que eles crescessem e, ao mesmo tempo, diminuiria as despesas da família.
Tocado em suas fibras íntimas pela nobre lembrança de Leonor e sabendo de seu dever paterno inafastável, Oliveira lhe prometeu conseguir trabalho e colocação em alguma escola para os filhos, sem que ele aparecesse como benfeitor.
Ambos não haviam
conseguido estudar adequadamente por lhes faltar condições financeiras para tanto.
Perdiam-se em sub-empregos, de onde retiravam algum sustento.
Não desejava que os filhos, que nunca o haviam conhecido, se vissem surpreendidos com uma ajuda financeira que poderia parecer uma tentativa de comprar-lhes o tardio perdão.
Oliveira ajudaria o casal de filhos, mas sem aparecer.
Inventaram a história de que Leonor havia sido beneficiada por uma bolsa de estudos com direito a trabalho para um dos filhos.
Começariam com o mais velho, o filho varão e, mais tarde, fariam o mesmo com a menina.
Por causa disso, Oliveira e Leonor passaram a se encontrar mais vezes, aceitando ela esse relacionamento esporádico com a justificativa de que o antigo companheiro era homem compromissado e que precisava ausentar-se muitas vezes.
Ao lado dela, passiva e conformada, estava um Oliveira que encontrara novamente um pouco de esperança e de luz afectiva, no mundo pardacento que vivia, ora ao lado de Helena, cada vez mais alheia aos carinhos de mulher pelo desfrute de uma vida de facilidades, ora ao lado de doidivanas sedutoras, interessadas no conteúdo de sua carteira.
No entanto, as sucessivas viagens de Oliveira à antiga cidade passaram a chamar a atenção de seus mais próximos colaboradores, tanto quanto dos que viviam na pequena comunidade que, despeitados como todos os miseráveis seres invejosos, notavam a presença do carro luxuoso à porta da humilde residência de Leonor e comentavam ter sido ela facilitada pela sorte, ao tornar-se a amante predilecta de importante figurão da cidade grande.
Leonor não fazia ideia dos pensamentos de que era objecto e seguia com sua vidinha normal, feliz por ver que seus filhos ganhavam novas oportunidades.
Cada novidade que lhe acontecia era motivo para que os seus poucos amigos mais lenha colocassem nos maldosos comentários que faziam a seu respeito.
Sem entender o que acontecia, Leonor começara a ser hostilizada pelos seus antigos vizinhos, os quais passaram a lhe dispensar o tratamento que usavam para as prostitutas baratas ou as mulheres mantidas por homens casados, como suas amantes.
Na cidade grande também corria a notícia de que o Dr. Oliveira estava envolvido por linda e irresistível mulher, que oferecia ao apetite masculino os mais saborosos manjares afectivos, fisgando-o e dele extraindo todos os favores.
As invejas de lado a lado produziam a sua teia de maldades e calúnias, único instrumento que os invejosos possuem para darem vazão aos seus recalques e frustrações.
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz Empty Re: Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:44 am

O velório continuava.
Observando as ocorrências no mundo invisível, Adelino e Jerónimo estavam incumbidos de acompanhar essas relações que envolviam tais personagens num drama de algumas décadas, agora que a desencarnação de Oliveira o reconduzira ao mundo da Verdade, ainda que os que chegam, em geral, não estejam lá muito dispostos a encarar a Verdade como deveriam, imaginando que, deste lado, as ilusões continuam a ter curso regular, como na Terra.
Ambos, como Espíritos devotados ao resgate de entidades desajustadas moral e emocionalmente quando se vêem reconduzidas ao mundo invisível, depois de uma vida de desmandos e abusos, acompanhavam aquele caso havia algum tempo, tratando de envolver os pupilos encarnados nos alertas necessários para a protecção quanto a quedas que se poderiam evitar, advertindo-os através da boa intuição a fim de que pudessem reparar certos delitos anteriormente praticados e, desse modo, retirarem-se da presente encarnação carregando melhores frutos para o futuro.
Com um comentário que não guardava nenhum tom de crítica, disse Adelino:
– Infelizmente, Jerónimo, apesar de nossos esforços, Oliveira está longe de ser considerado um cumpridor das mais singelas obrigações, no campo da responsabilidade afectiva.
Em resposta, Jerónimo afirmou, sereno:
– Longe de ser considerado um fiel discípulo do bem, Adelino, você sabe que todos eles estão crescendo, mesmo que tenham escolhido o adubo das lágrimas no terreno dos ferimentos, como já aconteceu connosco também, quando tínhamos menos experiência.
Nossa conduta, nesta pequena tarefa, não é a de obtermos resultados imediatos.
Todos somos jornadeiros do amanhã, usados por Deus e pelo carinho do Divino Mestre, como os seareiros que sabem que as sementes atiradas ao chão não nascem do dia para a noite.
Se para a sua germinação são necessárias semanas ou meses até que completem o ciclo que lhes é próprio na natureza nas rotinas humanas, do mesmo modo a eclosão das sementes divinas pede o trabalho árduo dos anos, das décadas e dos séculos.
No entanto, da mesma forma que uma semente não eclodiria a contento e no tempo adequado caso fosse abandonada pelo agricultor, sem adubo, sem protecção, sem água, nossa função, como agricultores de Deus, é a de garantir a tais sementes e solos as melhores condições, para que surjam no tempo certo de cada um, produzindo de acordo com a riqueza de seus genes celestiais, já que todos somos grãos do celeiro de Deus.
A palavra justa de Jerónimo, sem afectação ou pose de sapiência, denotava a sua condição de instrutor, equilibrado e sereno, sabendo ser amigo e professor ao mesmo tempo.
– Agora que a desencarnação de Oliveira se deu, temos o dever ampliado no atendimento à sua condição de desajustado do equilíbrio, além das atenções devidas ao estado de Leonor que, em conexão com seus compromissos do passado, começa a trilhar o testemunho do câncer, que cobrará dela o equilíbrio e exigirá determinação e fé nas lutas redentoras – falou Jerónimo, dando continuidade aos esclarecimentos do caso.
– Alguns encarnados costumam dizer que as dores menores parece atraírem dores maiores – comentou Adelino, admirado.
– Isso é só impressão de quem, como acontece com boa parte dos encarnados, só vê a vida pela óptica do mundo perecível.
Quando desejam comprar coisas sem terem recursos para tanto, os encarnados se desgastam em sacrifícios, em renúncias, em vigílias, em dois, três empregos, trabalhando finais de semana e feriados, tudo para aumentarem as reservas financeiras que lhes garantirão uma melhoria de posição material.
Nesse objectivo, todas as sobrecargas que se impõem, aumentando o peso de suas tarefas, de suas lutas, não são encaradas por eles como males, problemas ou castigos.
São a ante-sala da vitória, a cujo gozo poderão fazer jus tanto mais depressa quanto maior tenha sido o esforço e a renúncia que fizeram, espontaneamente, para alcançá-la.
Essa é a questão do ponto de vista pelo qual encaramos os problemas que surgem..
Quanto modificamos o ponto de observação das coisas, os problemas se modificam.
Veja este exemplo:
Alguém está atrasado para um compromisso importante e, no trânsito, um caminhão surge à sua frente impedindo que ele deslize pela velocidade alucinante e imprudente que está acostumado a implementar em seu veículo.
Naturalmente, o apressado condutor esbracejará contra o motorista que cortou o seu impulso audaz.
Talvez, nervoso, até desfira um xingamento contra o outro que, manobrando o pesado caminhão, criou o obstáculo para o avanço rápido.
No entanto, imaginemos que, logo mais adiante, na primeira curva do caminho, esse mesmo motorista imprudente e apressado seja defrontado com uma fiscalização policial que está parando os veículos em velocidade excessiva.
Graças à ajudazinha que o caminhão lhe deu, involuntária mesmo, ele conseguiu se livrar da fiscalização que o reteria por muito mais tempo e que lhe imporia pesada sanção por excesso de velocidade e por condução perigosa do veículo.
Aí é que entendemos a mudança do ponto de vista em relação às coisas que parecem nos contrariar os caprichos ou os momentos felizes.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:44 am

O motorista certamente pensará:
– Ufa... que sorte eu tive... se não fosse esse bendito caminhão na minha frente, eu teria sido pego pelos guardas e recebido uma multa das grandes...
Isso é que está acontecendo com Leonor.
Aos nossos olhos, ela é a pedra preciosa que está recebendo os cortes do buril que vai lapidar sua forma e conferir-lhe o brilho especial como criatura de Deus na Terra.
E desse embate, esperamos que ela possa assimilar todas as lições que a farão uma criatura ainda melhor, em uma condição muito mais favorável do que a de Oliveira, um irmão que se deixou alucinar pelas vantagens da vida e que, como iremos ver, estará colhendo amargas lições na sua chegada ao pórtico da Vida Espiritual.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:44 am

3 - OLIVEIRA E EULÁLIA

Jerónimo e Adelino estavam em tarefa de socorro e aprendizado com finalidade de amparo aos irmãos encarnados, tanto através da sustentação em suas lutas quanto por meio das lições que elucidam as dúvidas e se tornam instrumento de alerta para os companheiros de humanidade que ainda não precisaram enfrentá-las directamente na própria carne.
Dessa maneira, a observação dos dois problemas pessoais – o de Leonor e, agora, o de Oliveira – exigia de ambos a avaliação de condutas adequadas a cada caso, obrigando-os, inclusive, a procurar maiores detalhes do estado geral de Oliveira e sua condição de recém-chegado ao Mundo dos Espíritos.
Como já se falou antes, Oliveira surgia perante a avaliação do mundo invisível como um dementado, perdido de si mesmo, aparvalhado diante da morte que, de inopino, sem aviso ou preparo maiores, ceifou-lhe a vida quando, em seus planos, ainda haveria algumas décadas para que seus desmandos e abusos pudessem continuar a ser tecidos.
O local do velório, absolutamente inapropriado para tal prática, já que aquela casa legislativa não primava por qualquer elevação vibratória por parte dos humanos, piorava muito a situação do Espírito em desajuste.
Todavia, Oliveira estava de tal forma enredado nas tramas políticas inferiores, nas negociatas baixas, nos prejuízos colectivos causados por sua nefasta existência como um dos péssimos representantes do povo, que mesmo que o velório se desse na mais elevada das câmaras funerárias, tal circunstância em nada o auxiliaria no equilíbrio vibratório.
Acostumado às belezas exteriores, às roupas bem cortadas, trajes cerimoniosos, lugares de destaque, perfumes caros, Oliveira não entendia que força misteriosa tivera o poder de confundir-lhe os sentidos, vendo-se em corpos duplicados, aquele que parecia dormir circundado por flores e a veste vibratória que usava agora, perfeita cópia de sua roupagem de carne.
Efectivamente, perfeita cópia não seria a melhor expressão para sua forma.
Verdadeiramente, ao seu olhar tratava-se, ambas, da mesma pessoa, a que repousava no esquife e aquela que ele via em si próprio.
No entanto, a forma de seu Espírito se apresentava corroída pela incidência constante dos maus pensamentos, sentimentos e atitudes.
Algo semelhante a um ácido corrosivo que o houvesse deformado, revelando a vileza de sua alma.
Aos nossos olhares, o antigo político asselvajado nas negociatas inteligentes e astutas era visto com a aparência degenerada, ainda que seu contorno geral guardasse certa similitude com o corpo físico.
As posturas morais da alma durante a vida, suas condutas mentais, emocionais e materiais modelam a veste espiritual, espécie de roupa subtil de que o Espírito é revestido quando volta ao mundo invisível.
Daí, sua aparência na outra vida poder ser mais bela, nobre e exuberante do que a do corpo de carne ou o contrário, como acontecia com Oliveira, vítima de seus desajustes na Terra.
Seu corpo vibratório era a fantasmagórica cópia do modelo orgânico em decomposição.
Suas formas faciais, reproduzindo o modo astuto do lobo que lhe caracterizara a atitude na política humana, assemelhavam-no aos animais predadores da família dos lupinos, das hienas ou dos chacais, numa simbiose estranha que demonstrava as suas inclinações mentais mais directas e o centro de suas preocupações durante o estágio de vida na superfície do globo.
Astúcia, venalidade e planeamento meticuloso de golpes e mais golpes haviam produzido em sua mente a fixação inferior, determinando a modificação morfológica e fixando a aparência em função da concentração psicológica mais dominante em sua personalidade.
Oliveira começava a dar sinais de desespero quando tentava entender o ocorrido.
Procurara o refúgio dos antigos companheiros de partido, mas encontrou os comparsas de outrora citando-lhe o nome de forma irónica, pejorativa ou gozadora, recebendo o pesado impacto dos pensamentos e comentários, que lhe caíam sobre o crânio espiritual como tijoladas desnorteadoras.
Tentou refugiar-se junto à esposa Helena, sem sucesso.
Seus filhos igualmente não lhe ofereciam a menor demonstração de entendimento ou gratidão.
Em seus pensamentos, que eram sintonizados directamente pelos Espíritos amigos em face do poder de penetração que já possuíam, clamores angustiosos se sucediam.
Exigências eram gritadas a plenos pulmões para caírem no vazio ou para produzirem as gargalhadas irónicas, sem que ele entendesse de onde vinham.
Vendo-lhe o estado íntimo alterado, o organizador invisível daquele conclave deprimente dirigiu-se ao recém-desencarnado, dizendo-lhe:
– Calma, deputado... calma... logo o Grande Comandante vai chegar.
– Dá um sossegaleão nele... – gritava um ajudante mais ousado...
E a gargalhada prosseguia.
– Não podemos desrespeitá-lo, meus amigos – tornava o organizador.
O doutorzinho foi nosso braço direito por muito tempo aí no mundo e graças às suas actividades é que ele se tornou credor da grande honra de ser recebido pelo nosso Maioral em pessoa.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:45 am

– Uau! O Poderoso vai estar aqui hoje? – perguntaram-se os membros espirituais daquela orgia mal organizada.
– Não deve demorar.
Segundo me informaram, seu cortejo já estava se dirigindo a este local.
Enquanto Jerónimo se mantinha postado junto de Leonor, envolvendo-a em uma atmosfera de forças equilibrantes, buscando isolá-la de toda a balbúrdia ali reinante, Adelino seguia próximo, observando a cena.
– Eu já vi uma coisa dessas outrora, Adelino – exclamou o amigo devotado, comentando suas experiências anteriores para apaziguar os pensamentos do companheiro.
– Já havia tido notícias de tais cortejos, mas nunca tive a oportunidade de vê-lo pessoalmente – respondeu Adelino.
– É verdade que não se trata de procissões muito comuns nestas paragens.
No entanto, entidades de padrão inferior se sentem muito atraídas por esse tipo de exibição.
Pelo que pude avaliar em nossos estudos anteriores, o culto às cerimónias retumbantes e imponentes é típico do estado inferiorizado da alma, no exercício de suas arraigadas ligações egoísticas, no anseio de realce e de intimidação através da demonstração da própria importância.
Na dimensão espiritual exterior podia-se ouvir o aumento dos ruídos a indicarem a aproximação de um grande contingente de seres, trazendo os tambores e instrumentos que se pareciam com cornetas das bandas humanas, em melodia estridente, dissonante e irritante.
Qualquer um que tivesse acuidade visual para o mundo dos Espíritos podia observar a atmosfera circundante sem as dificuldades causadas por paredes ou obstáculos da dimensão material.
Assim, os dois enviados do Bem podiam divisar o contingente desajustado dos Espíritos que acompanhavam aquele que seria o astro principal da malsinada procissão.
Oliveira não conseguia entender o que o esperava.
Um laço de energia o mantinha preso ao corpo de carne que já dava mostras de acelerada desagregação.
Interrompida a circulação sanguínea, um dos sistemas responsáveis pela vitalidade e abastecimento de todo o cosmo orgânico, as células imediatamente começavam a entrar em colapso sucessivo, em uma verdadeira cadeia de eventos que, qual cascata ininterrupta, abria espaço para que os agentes microscópicos da vida, até então contidos pelos sistemas de defesa organizados, fossem liberados em verdadeira enxurrada avassaladora, vendo-se livres para o grande banquete na festa do apodrecimento que eles iriam encenar, transformando os tecidos e dando curso aos eventos naturais da transformação da matéria.
No entanto, não apenas as forças biológicas estavam em jogo.
As energias represadas pelo corpo, na forma do princípio vital acumulado, correspondiam a outra fonte de alimentos para almas esfaimadas que, debruçando-se sobre o cadáver, buscavam sugar as emanações tonificantes que os tecidos liberavam nos processos de desagregação.
Assim, enquanto Oliveira tentava manter-se dono de si mesmo, muitas vezes precisava disputar com entidades sugadoras um espaço na beirada do esquife funerário, gritando que aquele corpo devia ser respeitado, que o corpo era ele e que os outros não podiam se portar daquela forma já que ele, Oliveira, era autoridade importante, tinha amigos influentes e que, se necessário, falaria com o Presidente para colocar todos na cadeia.
Nada adiantava...
Com um solavanco, uma ou outra entidade mais animalizada do que o falecido o expulsava, atirando-o ao longe.
Os terríveis vampirizadores de fluido vital que devoravam as emanações energéticas como os seres carnívoros que disputam as carcaças em decomposição ali estavam, violentos e decididos a não arredarem pé.
Mesmo entre eles, a disputa produzia desajustes que beiravam o conflito, cada qual mostrando-se mais violento buscando a intimidação dos demais.
Apesar dessa bagunça, o organizador da “cerimónia”, com seu modo leviano, querendo demonstrar um certo controlo da situação e não aparentar o temor que também sentia em relação a tais Espíritos vampirizadores, dirigiu-se ao aflito falecido com certa intimidade, dizendo-lhe:
– Calma aí, chefia... quer dizer...
senhor deputado... logo o senhor já estará sendo recebido pelo nosso Mestre.
Vendo-se reconhecido na importância política de seu cargo por aquele desconhecido que, mesmo desrespeitosamente, a ele se dirigia chamando-o de “deputado”, Oliveira retrucou, imperativo:
– Até que enfim, um lacaio a me dar explicações, reconhecendo-me neste antro de devassidão.
– Aqui estou para servi-lo, senhor... – disse, ironicamente, Moreira.
– Saberei recompensar sua atenção, quem sabe eu o nomeie para assessor de meu gabinete pessoal...
– É, acho que esse emprego vai chegar um pouco tarde para nós dois...
mas mesmo assim, fico-lhe agradecido.
– Mas você pode me responder o que está se passando?
Eu enlouqueci ou acabei entrando em uma orgia dessas onde a droga corre solta e não percebi?
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:45 am

Vendo que Oliveira ainda não tinha entendido o que lhe acontecera, ou, o que era mais provável, se recusava a aceitar que tinha morrido, Moreira procurou ser claro, preparando-o para a nova etapa, à sua maneira.
– Ora, meu chapa... você virou presunto...
– Co... como é?
Meu chapa uma ova... você esqueceu quem sou eu? – replicou Oliveira, mais incomodado com a intimidade do que com a revelação de que já fazia parte dos mortos.
– É isso mesmo, meu.
Você virou presunto, bateu com as dez, e se antes as pessoas se dirigiam a você como “Sua Excelência o Deputado Oliveira”, saiba que, agora, você não passa do ilustre DEFUNTADO Oliveira...
– EEEEuuuuuuu? Defunto?
Ora, meu rapaz, você é que endoidou...
Não está falando comigo?
Como que você fala com alguém que já teria morrido?
– Se preferir outra palavra, temos muitas... bacalhau de porta de venda, bilhete vencido, manequim de funerária, alegria dos coveiros, melhor aluno do spa esquelético, anoréxico compulsório, festival dos bigatos...
– Cala a boca, seu atrevido... – esbracejou o deputado.
– Acabou o seu poder aqui, ó bacana.
Se manca, autoridade.
Você já não é mais chapa branca... é lápide branca.
Se está com dúvida e ainda não se tocou de que tudo ficou diferente, vem aqui comigo.
Moreira, então, arrastou Oliveira para a parte do hall de entrada dominado por um espelho.
– Diz para mim, excelentíssimo senhor anónimo, o que é que está vendo no espelho?
Assustado com a ausência de seu reflexo no espelho de cristal ali fixado como parte da decoração, Oliveira empalideceu ainda mais e, se Moreira não o segurasse com os braços, perderia o controle.
– Vamos lá, Excelentíssimo Defuntado... é a hora da verdade.
Toda esta festança é para você tanto da parte dos “caveiras vestidas” quanto da dos caveiras sem roupa.
Sua missão foi tão bem desempenhada, que a sua chegada está cercada de toda esta pompa, de tal forma que até a nós foi permitido participar de sua fama e aproveitar a festa para nossa diversão também. Que mal há nisso?
Você falou de orgias.
O que é que desejava no seu velório?
Não se lembra das muitas orgias que compartilhamos juntos?
Os motéis, as mansões, as mulheronas turbinadas, as alegrias da vida, meu amigo...
Nada melhor para esperá-lo por aqui, não acha?
A não ser que, depois de ter morrido na carne, também tenha morrido em “Vossa Excelência” o desejo por essas coisas...
Será que você perdeu o corpo e perdeu a vontade?
Sem esperar mais explicações de Moreira, ainda que cambaleante pelo turbilhão que lhe invadia a mente, Oliveira voltou para as proximidades de seu corpo que, a duras penas, tentava defender, já sentindo os efeitos da perda de energias vitalizantes.
No íntimo das entidades amigas que acompanhavam tudo aquilo à distância, tentando amparar o recém-chegado através das orações, a compaixão acompanhava aquela cena dantesca para os olhares do Espírito.
Oliveira era um irmão merecedor de alguma ajuda, apesar de ter sido um péssimo irmão para os outros semelhantes.
Jerónimo e Adelino se encontravam ali para atender Leonor, mas, por causa dela, também se viam na condição de enviados do Bem, a ajudarem onde a necessidade se apresentasse, guardadas as necessidades de cada um, o merecimento acumulado e os objectivos mais importantes a serem buscados.
E como a Sublime Misericórdia não descansa nunca, sempre procura amparar os filhos, por pior que eles tenham-se demonstrado nas experiências da vida.
Ao unir-se com entidades de tão inferior padrão vibratório, Oliveira era, agora, acolhido inicialmente esse mesmo tipo de sócio de suas aventuras materiais.
Entretanto, como o Amor está sempre pronto a vencer as distâncias e a penetrar nos piores antros, os dois benfeitores, que se achavam em oração silenciosa a certa distância das cenas ora descritas, começaram a observar o surgimento de uma massa de energias luminescentes, como se uma nuvem houvesse descido do alto e penetrado naquele antro.
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Acostumado a estes tipos de situação, como experimentado instrutor espiritual, Jerónimo se acercou daquele aglomerado fluídico para dar as boas-vindas à entidade que nele se fazia visível lentamente.
Depois de acolhê-la, respeitosamente, o instrutor acompanhou simpática senhora de nome Eulália, uma das progenitoras de Oliveira, desencarnada há alguns séculos e que lhe hipotecara todo o afecto maternal desde a longínqua Europa, nos alvores do Renascimento, quando ambos puderam conviver como mãe e filho.
Depois dos cumprimentos de praxe, puseram-se em conversação fraterna.
– É uma pena que meu filho tenha escolhido esse tipo de vida, a impor-lhe a desencarnação prematura como forma de evitar males piores, tanto para os outros quanto para ele mesmo.
Entendendo a afirmativa serena, ainda que mesclada da natural melancolia da mãe que reconhece a falência moral do próprio filho amado, Jerónimo acrescentou, fazendo as devidas apresentações e explicando a Adelino quem era a simpática e luminosa entidade:
– Eulália é devotada servidora de nossas instituições espirituais, nas quais granjeou méritos reconhecidos e se fez credora de todas as atenções de nossos superiores, porquanto é difícil encontrar aquele que não foi ajudado por suas abnegadas mãos ou por suas palavras generosas, que elevam a alma de qualquer um.
Eulália, sem afectação, denotando natural humildade, respondeu:
– Ora, querido Jerónimo, procuro ser a boa amiga de todos, sobretudo dos irmãos que me ajudaram diante de minhas necessidades.
Jerónimo mesmo é um a quem muito devo.
Suas palavras têm a doçura de sua alma.
Natural, portanto, todo o tipo de exageros.
Entendendo que o caso de Oliveira era doloroso para ela, o instrutor explicou:
– Eulália empenhou-se perante as autoridades espirituais superiores, juntamente com Oliveira, a fim de obterem a autorização indispensável para o renascimento do filho amado na presente existência que acaba de terminar, baseados na necessidade de correcção do passado remoto.
Em outras épocas, ambos aproveitaram-se do poder como instrumento de usurpação pessoal, carreando para seus Espíritos muitos débitos que, com o esforço hercúleo de muitas vidas, Eulália conseguiu saldar, entre suores e lágrimas, renúncias e tarefas missionárias.
Seu filho de então, Oliveira, escolheu a permanência nas mesmas estradas viciosas.
Sempre que se via livre da influência materna, voltava às mesmas tácticas, aos vícios repetidos, às maneiras perniciosas que o faziam prisioneiro de suas próprias criações extravagantes.
Com isso, assumiu importante função em uma organização trevosa, composta de Espíritos infelizes, alguns de cujos membros vocês estão vendo neste velório.
Passando a ser protegido pelo seu Maioral que, constantemente, o tem hipnotizado nas inúmeras voltas à vida física, usaram-no de forma directa, explorando suas fraquezas e facilitando as ocorrências que o possam encaminhar para as tentações nas quais fatalmente cederá novamente, por ser-lhe deficiente a vontade.
Não fora suficiente o amparo espiritual generoso que, por vezes sucessivas, empenhou-se em conseguir-lhe pais devotados, tutores sábios e generosos, professores inspiradores e amigos.
Tão logo se via afastado de tais berços luminosos, regressava ao tugúrio trevoso de si mesmo, ajustando-se às forças perniciosas com as quais se associara para o desfrute das emoções sem sentido, nas insanidades de todos os matizes.
Eulália aceitou regressar dos cumes luminosos aos quais já pôde se elevar para embrenhar-se no viscoso abismo em busca da alma desgarrada de seu afecto.
No entanto, não foi suficiente a Oliveira ter recebido a honra de ser-lhe filho novamente na actual reencarnação.
Terminada a sua jornada física na Terra, Eulália solicitou a oportunidade de continuar a influenciá-lo no Bem, o que
não foi difícil de se conseguir, graças aos seus atributos e méritos como Espírito esclarecido.
Com isso, como entidade generosa e maternal, tentou ajudá-lo a manter-se junto de Leonor nos períodos iniciais da vida familiar, já que quando a morte física transferiu-a de plano, Oliveira e Leonor estavam unidos, à espera do primeiro filho.
Sem poder se manter fisicamente próxima e sabendo das fragilidades de carácter de que era dotado, Eulália empenhou-se para que aceitasse corrigir-se através de apagada existência como operário que, honestamente, ganharia o pão de cada dia e poderia sentir a alegria de uma esposa carinhosa entre os filhos que lhe requisitariam o carinho.
A rotina de cada dia lhe permitiria redireccionar seus pensamentos, seus esforços no caminho da rectidão, martelando o carácter tíbio como se costuma fazer com o ferro em brasa para modelá-lo ou para dar-lhe melhor têmpera.
As dificuldades materiais seriam o calor necessário, as lutas constantes, a marreta que o fustigaria, e o carinho da família corresponderia à água fria e dadivosa que atenuaria os sacrifícios de cada hora.
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Esse planeamento fora aceito por Oliveira que, em Espírito, reconhecia suas deficiências de carácter, acatando os conselhos dos nossos mentores espirituais superiores, já que Eulália se manteria ao seu lado, mesmo depois da desencarnação, além de tudo fazer para favorecê-lo no enfrentamento dos obstáculos e dificuldades do caminho.
Todavia, voltar à Terra e entrar em contacto com os factores sedutores, este sim era o verdadeiro desafio.
Diante da retomada da velha roupagem física, os impulsos de grandeza, novamente estimulados pelos antigos sócios de orgias e viciações, fizeram o estrago nos planos superiores de evolução pelo Bem.
Envolvido pelas entidades escuras que com ele se haviam consorciado desde os antigos tempos medievais, Oliveira optou por outros caminhos, desprezando os exemplos de seus pais, o carinho da companheira, as necessidades de seus dois filhinhos e partiu para o desconhecido, de braços dados com as entidades trevosas, que tudo arranjaram para que o caminho fácil o levasse aos antigos certames do crime mal disfarçado pelas canetas de ouro, pela oratória imponente, pelos títulos que a cultura e a posição lhe confeririam ao longo dos anos.
Retornando à velha estrada de erros, Eulália procurou organizar-lhe os passos de forma que, ainda que como um membro proeminente da sociedade, representando os interesses da colectividade, Oliveira pudesse trilhar outros rumos, actuando diferentemente de outrora e, com isso, viesse a reparar os antigos desmandos, corrigindo as deformações morais que cultivara em outras épocas.
A mulher rica que escolheu não era a companhia adequada, e o sogro, comprometido com os valores do mundo, não corresponderia ao homem mais preparado para ajudá-lo a sair da encarnação com algum tipo de valor espiritual.
No entanto, Eulália continuou a manobrar suas forças no sentido de encaminhar os passos do filho querido.
Tentou influenciar no processo reencarnatório de seus sucessores, ajudando Helena a conceber e a receber em seu seio aqueles Espíritos que, desde a longínqua Itália dos Médicis, com ele haviam-se envolvido nas orgias e quedas morais, nos esforços de fazer com que Oliveira ajudasse seus antigos sócios a se renovarem.
No entanto, a aproximação de tais Espíritos parecia exercer sobre Oliveira uma repulsa instintiva, sentindo que eles representavam um peso a dificultar seus planos de fama e crescimento.
Então, usando como desculpa a responsabilidade paternal na manutenção da família, embrenhou-se ainda mais nos negócios, relegando os rebentos aos cuidados de Helena que, da mesma forma, bafejada pela riqueza do progenitor e pelas facilidades da vida, confiou-os à criação de babás ou pajens, bem pagas, mas pouco amorosas, não criando vínculos de amor verdadeiro, de gratidão e carinho que fossem capazes de atenuar as ligações deletérias do passado existentes entre eles.
Cresceram como estranhos ricos, amolecidos pelo conforto exagerado, bem remunerados por presentes e frivolidades, acostumados a se venderem aos seus pais em troca de favores e viagens.
Os filhos varões se perdiam em noitadas libertinas e vinham se desgastando no uso de tóxicos, no exacerbar das emoções, ao passo que a filha mais jovem era uma cópia perfeita das manequins de lojas chiques, maneira pela qual se acostumam algumas mulheres a se mostrarem superiores às amigas que as invejam.
Para atender-lhes aos caprichos incontáveis, Oliveira designara assessores políticos que se incumbiriam de fazer-lhes os desejos mais diversos, ao mesmo tempo em que mantinha um grupo de advogados a seu soldo para a solução dos desatinos juvenis, tidos como aventuras normais da idade, fossem elas solucionadas por abortos, por pagamentos de suborno a delegados ou a autoridades diversas ou, ainda, pela influenciação política para o abafamento dos escândalos.
Tudo estava seguindo pelos trilhos do desastre repetido, agora agravado pelas concessões avantajadas de que Oliveira fora objecto no mundo espiritual.
Enquanto escutava em silêncio, Eulália abanava a cabeça, como a confirmar as palavras de Jerónimo.
E para dar mais autenticidade às revelações, poupando os esforços verbais do instrutor, Eulália continuou, depois de breve pausa daquele:
– Sim, as coisas iam pelos caminhos do desastre.
Envolvido com as más companhias e com as forças titânicas da escuridão, meu filho se permitiu toda a sorte de conluios e negociatas, fosse para obter mais dinheiro para seus cada vez mais avolumados gastos e caprichos, fosse para conseguir apoio para sua carreira política, sempre dependente de financiamentos, favores e conchavos.
Enlameou-se ainda mais, acobertando delitos de todos os tipos, votando a favor de propostas notadamente prejudiciais ao povo sofrido, vendendo seu mandato pelo valor ínfimo de sua consciência.
Em todos os dias, no entanto, estava ao seu lado, buscando inspirá-lo a mudar de vida.
Muitas vezes, aproveitei-me de cerimónias religiosas às quais ele acorria sem nenhuma elevação, para fazê-lo pensar sobre a própria existência, inoculando-lhe ideias sobre a transitoriedade da vida, sobre a inadiável prestação de contas perante a Verdade e sobre a responsabilidade pessoal diante dos erros cometidos.
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz Empty Re: Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jan 10, 2015 11:45 am

Fazia-o imaginar, através de quadros mentais que projectava em seu pensamento, o que sentiria se eu o visse praticando todos aqueles crimes, lembranças estas que eram as únicas que o faziam se arrepiar intensamente.
No entanto, o cipoal das tentações já o havia enrolado em tantos prazeres e brilhos intensos que, para recusá-los se fazia necessária uma coragem ainda maior do que aquela que Oliveira teve para conquistá-los.
Como repelir deliberadamente aquela lama dourada que, por sua própria vontade ele próprio buscara com tanta avidez?
Como se livrar dos compromissos criminosos e dos cúmplices, depois que se brindou ao sucesso do crime sobre o cadáver das próprias vítimas?
E Oliveira se deixou arrastar novamente para o abismo de erros ainda piores do que os antigos, já que, hoje, a sua abrangência é ainda mais ampla do que naqueles tempos.
Assim, ainda que me tenha sido possível, pela misericórdia divina, acompanhar-lhe o regresso ao mundo espiritual, aqui estou apenas como aquela que sofre por amar e ora a Deus pelo filho amado, sem poder intervir directamente a seu benefício.
E, revelando algo surpreendente para todos, Jerónimo acrescentou:
– Sim, meus amigos, porquanto Eulália, observando os desmandos sucessivos do filho descabeçado, tanto quanto os rumos dolorosos que se avolumavam em seu roteiro de vida, tendo sido uma das importantes fiadoras do regresso de Oliveira ao corpo físico na última encarnação, não titubeou em movimentar suas forças e interpor suas luminosas solicitações em favor dele visando abreviar seus dias no corpo carnal para que as dores futuras pudessem ser menores para ele mesmo.
– Ela...?
Adelino ia perguntar, surpreendido, quando Jerónimo, entrevendo-lhe a dúvida, afirmou por antecipação:
– Sim, meu irmão, Eulália obteve dos nossos superiores a concessão autorizadora da ruptura dos laços físicos do corpo mal utilizado de Oliveira, a benefício dele mesmo, antecipando-lhe a morte física para o Bem de todos.
Tendo observado suas condutas desajustadas a produzirem o mal não apenas para seus semelhantes, mas, notadamente para ele, os governantes superiores, ao concederem tal medida extrema, levaram em consideração que, se a própria colectividade se fazia credora desse alívio, uma vez que já havia sofrido suficientemente em dores e necessidades pelo desatino de tê-lo conduzido ao cargo público que vinha sendo tão mal utilizado, ele também deveria ser poupado de maiores prejuízos pessoais, na estrada de desmandos que já lhe garantiria sofrimento reparador por vários séculos do porvir.
Assim, ordem superior foi externada para que os Espíritos responsáveis pelos processos de desencarnação se incumbissem de proceder a ruptura dos principais laços que o mantinham preso ao organismo físico, mas que, por questão pedagógica, lhe fosse garantida a experiência de recolher todos os efeitos imediatos de sua vida dissoluta e irresponsável acumulados sobre si mesmo, impedindo-se todo amparo directo pelo qual ele não se fizera credor.
Da mesma forma, tal decreto espiritual para o caso Oliveira determinou que se cuidasse de oferecer todo amparo aos irmãos que se agregaram aos passos do fracassado político na Terra e que acabaram prejudicados em seus caminhos pela acção nefasta daquele filho de Deus que não assumiu suas funções como prometera fazer.
Por isso, Leonor e seus dois filhos, tanto quanto Helena e seus herdeiros, deveriam ser amparados da forma mais adequada que a lei do Universo o permitisse, sem violentarmos suas escolhas nem impedirmos que as experiências amargas os ensinassem a trilhar outras estradas menos perigosas ou mentirosas do que aquelas que Oliveira tinha escolhido.
E olhando-nos com um brilho especial no olhar, rematou:
– É por isso que estamos aqui, irmãos.
Unidos a Eulália para tentarmos curar ou remediar onde o desatino dos homens abandonou e feriu.
Num gesto de carinho verdadeiro e estimulante, Eulália, com suas mãos, uniu-se aos dois irmãos, num momento de emoção colectiva, inspirados sob as leis de Deus e o Amor sublime de Jesus, dizendo:
– Que aprendamos a amar apesar de tudo, a esquecer o Mal e ver sempre o Bem, a nunca recusarmos o apoio a quem precise e, não importa quem seja ele, nosso amigo ou nosso adversário, vê-lo como Filho de Deus, antes de tudo, credor do mesmo Amor que o Pai dedica a todos nós.
Luzes faiscantes se projectavam de seu peito e penetravam todos naquele instante de emoção.
Parecia que, a partir dali, os três Espíritos estavam unidos como se fizessem parte de um único organismo.
E as circunstâncias mostrariam que isso seria mais do que uma mera impressão, apenas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:10 am

4 - OS MECANISMOS DA HIPNOSE

Não tardou muito para que o ambiente do velório fosse invadido pela horda de entidades inferiores que constituíam o cortejo do ser infeliz que a liderava, relembrando os antigos desfiles pagãos com os quais os romanos homenageavam seus deuses, depois das vitórias obtidas sobre os povos distantes.
Em nossa dimensão vibratória, as paredes não eram obstáculo para a passagem da caravana grotesca que vinha em busca de um de seus mais importantes membros, recentemente desencarnado no mundo dos homens importantes e insensatos.
Depois da entrada de todos os dançarinos e faunos despidos, agitando instrumentos musicais e tocando seus tambores primitivos em ritmo enervante, o carro principal interrompeu seu percurso bem diante da câmara ardente, na sala principal onde o corpo se encontrava.
Trazia em seu topo uma grande escultura em forma de trono e estava tão apinhado de entidades lascivas, viciosas e despidas, que fazia lembrar um carro alegórico tão próprio dos cortejos carnavalescos.
Sentado em tal cadeira ornamentada pelo mau gosto do estilo abrutalhado dos selvagens conquistadores, mesclando símbolos mágicos com crânios e ossos entrecruzados, a entidade infeliz que ali se mantinha no comando daquela procissão tenebrosa trazia a aparência típica dos Espíritos dementados, descritos na literatura terrena como a representação da figura infernal.
Olhos esfogueados denunciavam a sua astúcia, e os demais componentes da caravana serviam, claramente, para intimidar a qualquer um que, menos atento às leis universais, pudesse imaginar a existência real de um ser lendário, votado perpetuamente ao mal.
Acercando-se de Adelino, Jerónimo comentou, discretamente:
– Veja, meu irmão, as técnicas que tais Espíritos trevosos utilizam para intimidar as mentes mais desavisadas ou invigilantes.
– Sim, Jerónimo.
São imagens que podem impressionar às mentes mais desprevenidas, produzindo o terror e, com base na culpa acumulada na consciência, o processo hipnótico se torna mais fácil.
– Isso mesmo, meu amigo.
Já estive em outras circunstâncias parecidas com esta, atendendo a tarefas de auxílio e, invariavelmente, as entidades trevosas sempre recorrem a este tipo de imagem, por saberem que as almas que apresentam consciência culpada por crimes ocultos, acabam reconhecendo as próprias culpas em busca da tão esperada punição que as liberte do peso dos erros cometidos.
– Trazemos todos o pior tribunal em nós mesmos, não é, instrutor?
– Perfeitamente, meu irmão.
Nossa consciência não precisa de outros juízes mais honrados ou mais duros.
Somos capazes de, esquecendo os alvitres dessa voz interior, atirarmo-nos às piores acções.
No entanto, não conseguiremos fugir do fogo interior que, tanto no corpo carnal quanto fora dele, nos chamará à realidade de nós mesmos, traduzindo-se em elemento de evolução indispensável.
Para os que cultivam a consciência como quem recebe os convites amorosos de um jardim inspirador, a estrada será sempre menos difícil.
Todavia, para os que fogem de si mesmos, há sempre um longo e doloroso caminho para voltar à própria identidade, ocasião em que a misericórdia de Deus actua, em geral, para diminuir o efeito das auto condenações com as quais os homens alucinados pretendem se fustigar num processo de vingança contra si próprios.
Entendendo o rumo da conversa como uma troca de experiências a beneficiar o aprendizado sobre as questões da acção espiritual trevosa, Adelino indagou:
– Em todas as vezes que você presenciou cortejos parecidos, tais entidades perversas usavam das imagens como indução hipnótica?
– A rigor sim, meu amigo.
A porta visual é uma das mais marcantes para o processo do conhecimento, pelo conjunto de informações que possibilita.
A mente cria imagens nas chamadas formas-pensamento, e os processos imaginativos que a criatura desenvolve em seu dia-a-dia estão intrinsecamente ligados à visualização que seja capaz de produzir.
Assim, Adelino, o centro visual ocupa grande parte do cérebro físico, sendo dos mais complexos e intrincados no estudo e no funcionamento.
Conhecendo as necessidades de cada pessoa, no desejo de buscar informações visuais, de conhecer através das imagens, de identificar as coisas belas ou de conectar-se com o que é grotesco, as instituições humanas se empenham em veicular imagens estimulantes daquilo que, sabem elas, facilitarão a conquista de maiores clientes, de maiores interessados, de pessoas que se deixam arrastar pelas subtis sugestões visuais.
Não se trata somente de publicidade comercial.
É uma forma de modelar opiniões, conseguir impor ideias, gerar tendências, espalhar conceitos, vulgarizar conclusões.
As imagens são responsáveis por uma imensa ordem de conquistas positivas na evolução humana tanto quanto têm sido instrumento de destruição e de atraso para a agremiação terrena, na exacta medida em que os responsáveis pelo controle de todos estes elementos, deles se servem para enriquecer fomentando discórdias, para enfraquecer idealismos semeando desconfianças, para infundir dependências no carácter mais tíbio, através do cultivo de vícios e atitudes inferiores que temos observado ao longo do último século, desde o advento da televisão.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:10 am

Da mesma maneira que os encarnados compreendem o seu poder, os Espíritos também o conhecem.
Particularmente no caso de Oliveira, a referida entidade que se apresenta sob esse manto ilusório do deus das trevas sabe o efeito intimidador que essa imagem representa no subconsciente das criaturas, desde cedo amedrontadas pelos pais, pelos sacerdotes, pelos religiosos de várias denominações, com as ameaças do maligno.
Vamos ver o efeito que ele vai ter sobre nosso pobre Oliveira.
Calaram-se para melhor observar.
A entrada do cortejo grotesco não alterou a rotina calculada das acções dos encarnados.
No entanto, no plano espiritual estabeleceu-se um silêncio tumular.
Somente os gemidos das entidades apinhadas no carro alegórico, a se contorcerem em trejeitos erotizantes, eram os sons que se escutavam.
Oliveira estivera perambulando como um bêbado, entre o caixão, que era alvo dos Espíritos vampirizadores, e os amigos de partido, que eram seus companheiros no crime e na devassidão, nos quais não encontrava senão indiferença ou pensamentos de baixo teor a seu próprio respeito.
O velho político, despido de todas as pompas e poderes mundanos era, agora, um trapo moral, uma simples vítima de seu próprio destino.
Observara Leonor sentada à distância e, esfomeado de afecto, acercou-se dela como a suplicar uma carícia ao seu Espírito perdido.
No entanto, ainda que Leonor fosse a única que, em verdade, mantinha um sentimento de elevação a seu respeito, entidades amigas da sofrida mulher estabeleceram um halo vibratório protector a fim de que o antigo e indiferente amante não se aproximasse demasiadamente, para não impregná-la com seus fluidos deletérios, próprios dos Espíritos que se deixaram arrastar pelas futilidades e perversidades da vida.
Leonor se mantinha em silêncio, pensativa, encadeando as lembranças do passado e as preces de sua fé.
Eram estas as únicas que Oliveira recebia, como gotas de água no imenso incêndio da floresta de suas ilusões.
No entanto, com a chegada do cortejo espiritual, Oliveira voltou a ser colocado no centro das atenções dos invisíveis que o buscavam.
Solene gonzo soou aos ouvidos da turba, seguido de estridente toque de cornetas.
Então, Moreira, o organizador da cerimónia, gritou, imperativo:
– Que se aproxime o Deputado Oliveira.
Chamado de forma tão directa e sem querer entender o que se passava, já que ainda não tinha se dado conta do que o esperava, Oliveira assumiu os antigos ares de importância e seguiu na direcção do chamamento.
Moreira, o organizador do cortejo funerário que terminaria com a chegada do Maioral, dirigindo-se ao velho colaborador dos planos inferiores, exclamou:
– Por fim chegou o seu dia, Oliveira.
Longos anos de serviço prestados fazem você merecedor do reconhecimento que não deve mais tardar.
Ao escutar aquelas palavras
enaltecedoras de tudo quanto de errado fizera, um sorriso de satisfação bailou nos lábios do antigo político, ainda que julgasse estranho que tal saudação lhe fosse dirigida por um ser, assim, tão repulsivo.
No entanto, pelo menos alguém lhe correspondia ao anseio de reconhecimento ou se fazia mais amistoso, a reconhecer a sua importância e os grandes “esforços” realizados ao longo de várias décadas de tarefas políticas e administrativas.
– Finalmente alguém se digna
reconhecer-me nesta reunião de loucos, na qual todos reverenciam meu corpo adormecido.
– Já lhe disse que você está morto, Oliveira – falou Moreira, com uma gargalhada de sarcasmo.
Aquela informação, mais uma vez repetida, explicava tudo, ainda que, ao aceitá-la como verdadeira, uma outra grande onda de temores se cristalizasse em sua alma.
Oliveira empalideceu e, trémulo, perguntou:
– Então, se estou morto como diz, seria você o representante de Deus que me receberia no mundo dos mortos, como sempre me garantiram os sacerdotes de minha fé?
Afinal, sempre os atendi em seus reclamos, contando com as intercessões que poderiam fazer a meu benefício.
Ouvindo a palavra confusa e duvidosa de Oliveira, a entidade arrogante respondeu:
– Claro, meu amigo.
Estamos aqui atendendo a todas as solicitações dos nossos representantes no sacerdócio do mundo.
Eles também haverão de receber idêntica recepção, talvez até mais luxuosa do que a sua.
No entanto, tudo o que você pôde fazer por esses homens que se travestem de religiosos para se consumirem em luxo, poder, orgia e outras coisas, reverteu em seu benefício.
Tanto é assim, que o próprio Maioral se dignou vir até aqui para recebê-lo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:10 am

Falando dessa forma, Moreira, como o organizador da cerimónia, apontou seus braços para o alto do veículo que se encontrava às suas costas.
Oliveira, acompanhando o longo braço esquelético daquele Espírito repelente, endereçou o olhar confuso para o ponto indicado e, num instante, cruzou com a faiscante e perversa mirada do importante soberano ali postado.
No mesmo instante, a figura do demónio brotou ao redor do Espírito do político, obedecendo ao impulso de seu pensamento. Induzido pela visão de seus olhos de Espírito, a mente de Oliveira encontrou nos recônditos arquivos de sua alma as inúmeras referências a satanás, ao inferno e seus demónios cruéis.
Imenso choque vibratório tomou-lhe as fibras da alma e, imaginando-se credor das belezas do paraíso, nas promessas infantis e ilusórias que havia recebido de sacerdotes venais e interesseiros, Oliveira desejou fugir apavorado.
– Não... o diabo não... eu não fiz nada para merecer essa recepção... – gritava em desespero.
– Ora, Oliveira, que falta de gratidão é esta?
Pois nosso senhor vem até você, em pessoa, e é assim que o recebe?
Quantas vezes, sua figura de político não recorreu a ele?
Quantas negociatas suas não contaram com o apoio e protecção do Maioral para que acabasse recoberto do ouro do mundo?
Quantas vezes você defendeu nossos princípios e abraçou nossos projectos, influenciando pessoas, corrompendo interesses para que nossos planos acabassem vitoriosos?
Como pode dizer, agora, que não conhece, que não deseja ser recebido pelo nosso mais importante representante?
Oliveira estava chumbado ao solo, incapaz de se mover para qualquer lado.
Era o efeito da hipnose produzida pela aparência da entidade perversa repercutindo na alma culpada do político que, por mais que pretendesse se apresentar como um homem de bem, honrado e cumpridor de seus deveres morais, não passara de um falsário, de um estelionatário da pior espécie, de um corruptor da verdade.
Vendo que Oliveira tremia sem nada dizer, a entidade maligna que se fazia passar pelo próprio Lúcifer, adoptando as aparências que as humanas já puderam criar a seu respeito, dirigiu-se a ele, trovejante:
– Aqui estou, meu dilecto discípulo.
Agradecido pelos seus serviços, vim honrar sua fidelidade para levá-lo comigo ao lugar especial que corresponde aos seus méritos.
A voz tonitruante ecoava no recinto e imobilizaria qualquer Espírito que não estivesse fora da sua sintonia vibratória.
Isso porque as palavras eram acompanhadas de um magnetismo que penetrava o interior das entidades, reforçando suas tendências e amplificando o medo daquele que parecia uma força maior do que a de Deus.
Oliveira não tinha como fugir.
Mãos firmes o ergueram do chão e o colocaram no carro de perversões, no qual o político devasso encontrou as mesmas entidades lascivas que se uniam a ele nas orgias de que participava ou patrocinava.
Num misto de prazer e horror, tais Espíritos tinham corpos exuberantes e bem torneados, mas o rosto era o de velhas e desgastadas bruxas, emaranhando-se ao derredor de Oliveira, que delas tentava fugir em vão.
– Vem, meu queridinho... – dizia uma, puxando-o para o corpo exuberante.
– Ele é meu, primeiro... – reclamava outra, enlaçando-o com as coxas ao mesmo tempo em que os lábios, que mal ocultavam a boca desdentada e a baba viscosa procuravam os do recém-chegado, para as trocas de antigas sensações.
Oliveira se debatia, em desespero.
Sem saber a quem recorrer e se lembrando dos favores conseguidos para os clérigos de sua religião, gritou, quase louco:
– Bispo, bispo... um bispo, pelo amor de Deus, tire-me daqui... está havendo um engano terrível... socorro...
Não tardou para que uma entidade trajada à moda dos sacerdotes viesse até ele e, com ar jocoso, respondesse:
– Aqui estou, meu filho.
Estivemos juntos por longos anos aí na Terra... você não se lembra?
Eu sou Lourenço...
o padre de suas confissões nos primeiros anos de representante do povo... lembra-se?
Fazendo um esforço, no desespero de seus pensamentos, Oliveira respondeu:
– Sim... padre Lourenço... o das meninas?
– Sim, meu filho... você me contava seus podres e nós os dividíamos, depois, em momentos de prazer.
Lembra como foram bons aqueles encontros?
Mais perdido, ainda, Oliveira respondeu:
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:10 am

– Mas padre, estou nas mãos do Satanás por coisas ligadas a tais perversões... pedi ajuda a Deus e ele me mandou o senhor?
– Sim, meu filho...
Não foi com o seu apoio importante que consegui subir na hierarquia da Igreja também?
Estivemos juntos em tantas horas, que o nosso senhor me recolheu no seu carro para que eu pudesse servir, novamente, como confessor de suas fraquezas... com a vantagem de já podermos desfrutar dos nossos desejos aqui mesmo...
Gritando, desesperado, Oliveira se desequilibrava, dizendo:
– Mas padre, é o inferno... é inferno... é o demónio,... são os diabos...
Não é isso que eu pedi nem foi isso que os bispos me diziam que eu iria encontrar...
Não é para o inferno que eu quero ir...
Vendo a dor do antigo comparsa, Lourenço afagou-lhe os cabelos e respondeu, ironicamente:
– Agora, Oliveira, não reclame de seu destino... se o inferno não era o local que você desejava encontrar depois de morto, então não o deveria ter escolhido para viver enquanto vivo.
Ao som estridente dos gonzos e clarinadas metálicas, tambores e flautas, a caravana retomou sua jornada mergulhando solo adentro, na direcção dos ambientes trevosos nos quais entidades daquele tipo se misturavam na organização daquilo que chamavam de “Império dos Dragões”.
Oliveira se viu arrastado pelo padrão vibratório que adoptara durante sua vida e, no velório de seu corpo somente os vermes se faziam, agora, ainda mais vorazes na renovação da vida, transformando a podridão humana em alimento para a fome das vidas microscópicas.
Também na Casa Legislativa, chegara a hora de dar início ao processo funerário que levaria o corpo à sua última morada.
Não faltaram rezas oficiais, cânticos religiosos, corais e madrigais lamentosos, música triste, crepes e carros enlutados, ablução levada a cabo por sacerdotes, a espalharem água benta pelo corpo, pelo ataúde e, depois, no interior da própria cova, como se isso viesse a fazer alguma diferença para o Espírito do falecido deputado que, a estas alturas, se encontrava bem longe dali, junto daquele que o arrastara em seu cortejo, em obediência às leis de sintonia vibratória que actuam sobre todos os encarnados e desencarnados.
Aproveitando-se da confusão reinante no local, momentos antes da partida para as furnas inferiores, Eulália despediu-se rapidamente dos amigos espirituais, adensou-se na forma simples e pobre que a fazia semelhante a qualquer das entidades que compunham aquela funesta procissão e tomou o mesmo destino de Oliveira.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:10 am

5 - COMEÇANDO O TRABALHO

Com o deslocamento do cortejo espiritual que carregou a alma desajustada de Oliveira, acompanhado pelo Espírito da nobre Eulália, que se fizera passar por um dos integrantes que seguiriam a procissão sem maiores dificuldades, ajustando sua aparência e forma, luminosidade e maneiras às necessárias contingências específicas do momento, Jerónimo e Adelino preparavam-se para voltar aos
junto de Leonor.
Impressionado, entretanto, com a disposição da progenitora do falecido em embrenhar-se nos núcleos trevosos, Adelino ponderou:
– Mas não seria expor-se a muitos riscos actuar como a nossa irmã Eulália se dispôs a fazer?
Entendendo a perplexidade do companheiro, o instrutor Jerónimo esclareceu:
– Sabe, Adelino, a capacidade do Amor Verdadeiro surpreende a todos os que, como nós, ainda somos aprendizes nessa matéria.
Como você pôde constatar, sem ser uma das almas pervertidas a participar do festim, Eulália se apagou na beleza, nas vibrações de elevação já conquistadas, vestindo-se de simplicidade e, se você conseguiu perceber, até mesmo de uma certa deselegância na forma a fim de não causar tanto espanto entre os integrantes da alucinada turba.
Isso é uma necessidade e uma imposição das circunstâncias, se deseja estar com eles, seguindo o ser amado até o seu destino.
Por enquanto, todos estão tão alienados, que não notarão a sua participação no cortejo sinistro.
Mais tarde, chegando ao destino, entretanto, é que os riscos se tornam maiores, uma vez que nos territórios umbralinos para onde se dirigem nossos amigos, existem papéis específicos para cada um e grupos de entidades que se relacionam com maior intimidade.
Aí, então, é que o Amor ganha contornos ainda mais importantes como escudo de defesa e de auxílio aos que ali estagiam.
Por enquanto, você se admira de sua coragem para seguir o filho de outrora, mas, até aqui, é apenas atrelar-se ao cortejo dos loucos.
Mais tarde, no entanto, será estar no hospício e viver por lá por algum tempo.
Só quem consegue amar como Eulália já é capaz, amparada pelos exemplos do Divino Amigo, esquecendo-se de si própria, rasgando os preconceitos e se dispondo a compreender de forma ilimitada as necessidades alheias, recebe a autorização das autoridades superiores para mergulhar nesses antros sombrios e regressar vitoriosa, apesar dos volumosos desafios e riscos de fracassar.
E o que é mais grave, é ter que estar no meio dos alucinados sem comungar de suas práticas e sem se entregar aos seus desatinos.
Disfarçar-se para ajudar a todos sem denunciar-se com discursos ou actos inoportunos ou suspeitos é uma arte superior.
Às vezes, Adelino, uma expressão facial de susto ou de repulsa é suficiente para demonstrar a verdadeira intenção do missionário nas trevas, dificultando-lhe a estada nessa região e abortando a tarefa por um descuido do trabalhador.
Ouvindo as orientações, Adelino respondeu:
– Mas isso quer dizer que Eulália terá de fazer as maldades que eles fazem para que não levante suspeitas a respeito de sua verdadeira intenção?
– Não seria lícito, Adelino, imaginar que o Bem fizesse o Mal para enganar os maldosos.
Saber o limite da acção e discernir o que fazer nos momentos cruciais é o que distingue estes trabalhadores especiais de todos os outros, servos do Bem ainda incapacitados de mergulhar nas profundezas onde impera a ignorância e a perversidade.
No entanto, em vez de acumpliciar-se com tais práticas a fim de granjear simpatias para sua causa, o servo do Bem procura outros caminhos, sondando os corações descontentes, alegando desconhecimento das técnicas obsessivas ou usando artifícios que venham a transformar o momento difícil a benefício de todos.
Em qualquer tempo, todavia, vendo-se defrontada por circunstância adversa e intransponível, Eulália poderá recorrer à oração e retomar seus potenciais irradiantes, acendendo verdadeira estrela no ambiente dominado pelas trevas.
Isso a protegerá da acção colectiva, mas, a partir daí, ela se denunciará como representante do Bem, não tendo mais como passar desapercebida ou ser aceita pela turba desavisada.
O trabalhador em missão de reerguimento ou socorro que mergulha nas trevas deverá saber que estará dependendo do Criador e de si mesmo para superar qualquer evento imprevisto.
E se preza a tarefa que solicitou, deverá estar atento para não revelar-se antes do tempo, a fim de não atrapalhar o sucesso da empresa socorrista.
O tempo, todavia, pedia atitude em favor da assistida em foco.
Com o velório encerrado e os diversos veículos rumando em fila até o campo santo, a antiga amante de Oliveira viu-se relegada ao esquecimento, não lhe restando outra opção que não a de tomar o rumo de casa.
Havia muito tempo passara a viver em modesta residência alugada em cidade próxima.
Sem qualquer prestígio e quase como uma intrusa naquele ambiente de falsas afectividades, sua alma sentia a opressão vibratória dos conflitos emocionais que envolveram o Espírito do falecido companheiro, além de receber as suas emanações fluídicas mais desajustadas em virtude de ser, o seu afecto sincero e doce, o único oásis disponível ao falecido para saciar sua sede de esperanças.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:11 am

Apesar de protegida pelo escudo de energias que impedia a aproximação directa de Oliveira, Leonor não deixara de receber os reflexos negativos de toda aquela cerimónia hipócrita e dos funestos agentes espirituais que ali actuaram.
Uma dor de cabeça se impusera desde as primeiras horas de sua estada na improvisada câmara funerária.
Alguns dos presentes, conhecedores da sua íntima ligação pessoal com falecido, enviavam-lhe dardos mentais de contrariedade, de julgamento mesquinho e condenação cruel, sem conhecerem o drama que os envolvia.
Quase ninguém fazia ideia dos longos anos de solidão, da frustração do abandono, do amargor na criação dos filhos sem o amparo daquele homem que, agora, era pranteado como o virtuoso representante do povo.
Nos pensamentos vulgares daqueles que condenam nos outros as torpezas que reflectem as suas próprias fraquezas morais, Leonor era vista como a aproveitadora, como uma ave agourenta que retornava do passado para ver se haviam sobrado restos da carcaça a fim de devorá-la, retirando algum quinhão, aproveitando-se daquele momento de despedida.
Raros dos assistentes do funeral poderiam imaginar que a sua presença significava, apenas, a solidariedade final ao homem que ela amara um dia e que, com todos os defeitos de carácter e fraquezas morais, representara, no ontem distante, o ideal de companheiro que um dia a fizera feliz e a quem se entregara no sonho de alcançar, igualmente, a felicidade.
Somente ao sair do ambiente por uma porta lateral, sem que ninguém se dignasse dirigir-lhe a palavra, é que Leonor pôde sentir uma melhoria geral em seu estado ao contacto com o ar fresco da via pública, apesar da persistente dor de cabeça.
Ao mesmo tempo, os dois amigos invisíveis a seguiam, buscando oferecer-lhe amparo fraterno, sabedores de que sua jornada física estava às vésperas da aspereza moral, do testemunho espiritual.
Como se disse, ambos cumpriam uma missão de amparo em favor da pobre mulher, em decorrência de seus méritos pessoais, conquistados graças aos heróicos exemplos de coragem e fé em Deus, sobretudo aqueles vividos no silêncio de sua pobreza responsável, de sua solidão resignada, dos sacrifícios de mulher e mãe abandonada pelo homem frágil, sonhador e ambicioso.
Ali se encontravam para garantir-lhe os dias vindouros, dentro das melhores intuições e forças, além de buscarem amparar-lhe todos os caminhos, inclusive acerca das necessidades materiais da vida.
Dirigira-se a pobre mulher, desalentada e sozinha, ao local onde o ónibus que a conduziria até sua casa já estava estacionado, aguardando o horário da saída e, tomando assento, deixou-se levar pelas meditações enquanto, logo a seguir, começava o veículo a rodar, em direcção ao seu destino.
Foi quando Jerónimo e Adelino se acercaram de simpático Espírito que se mantinha próximo dela na luta para sustentar-lhe as forças depois da saída do velório.
Como todos os encarnados, Leonor também contava com a companhia do Espírito generoso que a ela se ligara na condição de Protector invisível para a jornada evolutiva e que sempre lhe favorecera com todos os recursos que estavam disponíveis.
Isso porque cada vida humana é um plano celeste, e sobre todos os encarnados paira a preocupação Augusta e Majestosa de Deus, para que cada alma esteja municiada com todos os recursos que a permitam passar pelas horas desafiadoras e vencer as próprias limitações.
Assim, o Protector espiritual destacado para velar pela reencarnação de Leonor e que atendia pelo nome de Cristiano conhecia profundamente a personalidade e o carácter de sua protegida e, a fim de desempenhar plenamente as tarefas protectoras que lhe haviam sido designadas há muitas décadas, solicitara os esforços necessários ao atendimento de suas necessidades, principalmente na questão da saúde física, já que a insidiosa enfermidade, contraída nos idos do pretérito, estava prestes a dar seus primeiros sinais exteriores.
Foi a partir das requisições espirituais lançadas pelo Protector de Leonor tempos antes, que foram assinaladas as tarefas de cooperação de Jerónimo e Adelino em favor dela, o que permitiria a oportunidade de aprendizado geral.
Jerónimo possuía a responsabilidade de comando sobre os procedimentos necessários à cooperação com Cristiano, notadamente pela sua larga experiência em atendimentos como aquele.
Mantinha-se em contacto directo com o Dr. Bezerra de Menezes, a quem se ligava desde longa data pelos laços do respeito e da admiração e que funcionava como apoio fluídico e inspiração para a tarefa.
Além disso, Jerónimo possuía os conhecimentos aprofundados não apenas pelo estudo das leis espirituais, mas, principalmente, pela vasta folha de serviços nas regiões inferiores, exercitando a medicina da alma.
Já Adelino era o companheiro de jornada e se encontrava exercitando suas faculdades espirituais ao contacto directo com as lutas na experiência dos encarnados, ampliando seus conhecimentos médicos, buscando começar a praticar os elevados conceitos da medicina da alma sobre a tão desequilibrada estrutura mental dos homens, aprofundando conhecimentos sobre os mecanismos da dor-instrução, da dor-auxílio, elementos ainda tão mal compreendidos pelo ser encarnado.
Ao mesmo tempo, Adelino era detentor do conhecimento técnico da medicina do corpo em busca das lições que lhe granjeariam qualificação mais ampla para o entendimento da medicina espiritual.
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz Empty Re: Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:11 am

Assim, acercaram-se de Cristiano, apresentando-se como a resposta às suas solicitações de apoio.
Gentil e espontâneo, encontraram no novo amigo a simpatia que lhe caracterizava a personalidade.
– Agradeço a atenção de vocês ao caso de nossa irmã – disse ele.
Como devem estar informados, o processo cancerígeno já se encontra instalado fisicamente há algum tempo, ainda que a enfermidade já se achasse registada nas matrizes perispirituais de nossa amiga para os necessários reajustes no tempo certo.
Como responsável pelo grupo, Jerónimo se incumbiu de tecer os primeiros comentários acerca do caso.
– Sim, Cristiano, é sempre uma grande satisfação quando podemos ser úteis a algum irmão ou irmã que sofre.
No entanto, ouso afirmar que a sua solicitação se torna sem sentido, diante do imenso amor e do grau de generosidade de sua alma que, na condição de Protector designado anteriormente para a reencarnação de Leonor, tem demonstrado os dotes de verdadeiro sacerdote do Bem em favor da tutelada, como nós mesmos pudemos constatar quando estudávamos o seu caso específico.
Sem enveredar pelas trilhas da lisonja ou da falsa modéstia, Cristiano respondeu, cortesmente:
– Agradeço as palavras de reconhecimento, que considero verdadeiras apenas na parte do imenso apreço que possuo por Leonor.
No restante, não podemos nos esquecer que todos fazemos parte da imensa família dos necessitados e quando podemos contar com mais apoios na luta, como forma de garantir aos nossos tutelados maiores esperanças e forças, por que deveríamos dispensar semelhantes fontes de bênçãos?
Além do mais, trata-se de tarefa complexa cujos contornos, talvez, ainda não tenham divisado por completo, mas que, à medida que os dias se sucederem, poderão se revelar intrincados e delicados na abordagem e no tratamento.
Infelizmente, os encarnados só enxergam o clássico “palmo de nariz”, deixando de lado todas as implicações de suas escolhas ou condutas.
Daí ser tão importante o concurso de almas amigas que, além de tudo, nos enriquecerão os momentos com a companhia serena e tornarão menos áspero o caminho de orientar, de amparar, de auxiliar aqueles encarnados que, em geral, desprezam nossos conselhos, repudiam nossas sugestões, riem de nossos alvitres para, logo mais, chorarem pelas consequências de seus actos insensatos.
É, Jerónimo, sem me lastimar desta função que, em realidade, exerço por amor legítimo, poucos imaginam como é áspera a jornada do Espírito Protector.
Como você vê, aqueles que nos colocamos nesta empreitada, estamos longe de sermos anjos como, poeticamente, costumam nos chamar.
No entanto, depois de algum tempo nesta actividade, posso dizer que entendo o motivo pelo qual a tradição religiosa atribui a tais entidades essa qualificação angelical.
Sorrimos diante da modesta referência e, aproveitando esse instante, Jerónimo fez-se mais específico, falando da determinação do próprio Bezerra de Menezes para o acompanhamento do caso Leonor, além de apresentar Adelino como o médico amigo que o acompanhava com funções de auxiliar no tratamento de sua protegida como para desenvolvimento de sua experiência médica directa com os integrantes do mundo dos encarnados.
– Quanto mais recorro aos recursos do Cristo, mais me admiro de sua misericórdia e bondade.
Solicitei o auxílio de um outro irmão e a Soberana Compreensão atende, em resposta, com dois trabalhadores do Bem para a ampliação do ensinamento em todos os sentidos.
Isso só aumenta a minha gratidão para com o Senhor e para com vocês que não são, para mim, apenas companheiros, mas, realmente, instrutores a me ajudarem com os conhecimentos específicos de medicina que me fogem e com a possibilidade de transformar em bênçãos alentadoras as lágrimas de uma cancerosa, que começa a sua “via crucis” sem imaginar como estará sendo objecto dos cuidados dos Espíritos amigos, que se devotarão ao seu caso específico na condição de representantes da Compaixão de Deus.
Concordando com Cristiano, Adelino complementou:
– E muitos pensam que foram abandonados pelo Pai quando identificam as primeiras manifestações cancerígenas em seu organismo...
– Quase ninguém imagina que, muito antes de eclodir a enfermidade, as preocupações de Deus já estão procurando entregar-lhe o amparo indispensável para que a aspereza da prova ou da expiação possa encontrar o analgésico do acompanhamento dos Espíritos amigos – completou Jerónimo.
O ónibus chegara ao destino e Leonor, sem imaginar a presença invisível, descera em direcção à sua modesta vivenda, passando antes na farmácia para a aquisição de um comprimido para combater a cefaleia.
– Aqui começaremos nossa acção – afirmou Jerónimo, com a simplicidade daquele que educa sem impor.
Observando o ambiente da farmácia, identificou em sua parede lateral um cartaz que orientava a mulher na realização dos exames rotineiros para a constatação de tumorações na glândula mamária.
Tratava-se de uma campanha de educação que alguns institutos governamentais ou privados promoviam para que, através do ensinamento, as pessoas pudessem estar atentas para si mesmas, observando as modificações do organismo e ajudando os médicos na detecção precoce de inúmeros distúrbios.
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz Empty Re: Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:11 am

Poucas pessoas, queridos leitores, se dispõem a observá-los nos diversos locais onde estão expostos ou nos anúncios que os veiculam como um noticiário importante e que pode ser a diferença entre o tratamento eficaz e a doença insidiosa e fatal.
Identificamos que o desinteresse da maioria impede que as informações ali contidas possam ser assimiladas pelos verdadeiros interessados.
E se você se pergunta o que Deus está fazendo no sentido de amparar as pessoas nas diversas enfermidades tão cruéis que se alastram, observe quantas coisas existem para chamar a atenção dos seres humanos em tal sentido.
Não basta, apenas, favorecer a descoberta de medicações ou de terapias importantes a serem implementadas no cosmo orgânico através de drogas ou de cirurgias.
Deus está mais atento do que pensamos.
Através de seus emissários fiéis, está inspirando pessoas para que ajudem seus semelhantes no diagnóstico precoce, informando a ignorância para que esta não seja uma aliada da enfermidade.
Folhetos, cartazes, propagandas de todos os tipos, alertas, matérias na imprensa, entrevistas, cursos, tudo está sendo produzido para ampliar o conhecimento dos fatos, diminuindo os riscos.
Mas...
Como dá trabalho a leitura de algum informativo, tanto quanto não gostamos de estudar as matérias dos diversos cursos de formação que existem na Terra, deixamos passar as inúmeras oportunidades pelas quais o Amor de Deus nos visita constantemente.
Você já pensou que, longe de nós, alguém está preocupado com os detalhes que poderão nos ser úteis na superação de inúmeros problemas.
Um pequeno papel, um folheto de alerta, um cartaz ilustrado que ensine a observar melhor o funcionamento de nosso organismo, as reacções de nossos corpos... tudo isso está sendo objecto das preocupações de alguém que, prestando tal serviço, actua como destacado elemento na grande engrenagem da vida para diminuir as dores e aflições dos semelhantes.
No entanto, preocupados em adquirir o cortador de unhas, a cápsula para a dor de cabeça momentânea, o champô para os cabelos ou a tinta para mudar-lhes a coloração, os seres humanos desprezam esses chamamentos silenciosos que poderiam evitar-lhes muitos e amargos sofrimentos.
Leonor buscara a farmácia para a aquisição de analgésico comum.
Adelino, aproveitando-se da situação, entendendo a indicação de Jerónimo quanto ao início do atendimento socorrista, acercou-se da senhora e, colocando seus lábios próximo do ouvido dela, sussurrou-lhe, imperativa e docemente:
– Olhe para o lado e leia o cartaz...
A primeira frase não produziu maior efeito na senhora.
– Vamos, Leonor... olhe para a parede e leia o cartaz.
Novo jacto luminoso penetrou-lhe o cérebro, como se as palavras de Adelino não fossem apenas impulsos mentais, mas, em realidade, verdadeira fonte de luz que dilacerava as barreiras escuras que se achavam acumuladas no interior do cérebro físico da irmã e que, inclusive, produziam-lhe as dores de que se via vitimada até aquele momento.
Ao lado dela, afixado na parede à sua esquerda, o referido informativo trazia uma figura feminina com o seio à mostra, ensinando como se deveria proceder para o auto-exame de mama, na busca de algum tipo de nódulo.
– Veja, Leonor, olhe que cartaz interessante bem ao seu lado – insistiu o médico espiritual.
Enquanto Adelino se esforçava para ajudar a senhora, o balconista se acercou para o atendimento, sendo informado de que necessitava de um remédio para o combate à dor de cabeça.
E como tivesse de esperar o retorno do rapaz, seus olhos iniciaram o tão esperado passeio pelas paredes do estabelecimento até que se fixaram no tão importante informativo sobre o câncer de mama.
Aquele busto desnudo e os diversos quadros explicativos atraíram-lhe a curiosidade, mas viciada pela malícia do mundo, imaginou tratar-se de uma propaganda pornográfica, coisa imprópria para ser colocada na parede de uma farmácia.
Sem desejar ler o conteúdo do cartaz, Leonor esperou a volta do funcionário e cobrou-lhe explicações assim que ele retornou ao balcão:
– Ora, Luíz... onde já se viu colocar um cartaz de filme imoral aqui dentro da farmácia... era só o que faltava... não basta toda a pouca vergonha que a gente tem de ver por aí, mesmo na televisão, e, agora, até aqui, onde a gente procura um pouco de esperança, tem de ver essas coisas imorais...
Percebendo que ela se referia ao anúncio na parede, Luíz deu uma risadinha e perguntou:
– A senhora está falando do cartaz, não é?
– Da aspirina é que não é, né, Luíz... é claro que é dessa indecência que o dono da farmácia deixou que pendurassem aqui dentro.
– Outras pessoas também reclamaram, dona Leonor, mas é porque não leram o cartaz... não se trata de filme pornográfico não... é um cartaz que explica para as mulheres sobre uma doença que é das mais graves no corpo feminino e que se for percebida logo, pode ser combatida com bastante sucesso.
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz Empty Re: Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:11 am

Envergonhada pela revelação e pela educada explicação do rapaz, Leonor contestou, interessada:
– Ah! É isso?...
Mas que doença é essa, meu filho?
Eu sou mulher e preciso saber mais sobre essas coisas... é alguma praga que está se espalhando por aí, que nem a gripe?
Tem a ver com o pernilongo?
Sorrindo diante da ingenuidade da cliente, Luíz respondeu:
– Não, dona Leonor... é o câncer no seio.
Muitas mulheres vão descobrir que ele está instalado em si mesma depois de muito tempo, quando ele já se espalhou para muitos outros órgãos.
– Nossa, eu tinha uma amiga que morreu disso, alguns anos atrás.
– É, muitas mulheres acabam sofrendo e morrendo por não saberem nada sobre os métodos de prevenção ou de identificação precoces da doença.
E como a senhora pode ver no cartaz, quanto mais passa o tempo, mais a mulher deve estar atenta para os sintomas, de forma a se proteger nos estágios iniciais da doença.
E enquanto o rapaz ia falando, Leonor parecia absorver-lhe os ensinamentos.
Sabendo que as pessoas preferem mais escutar do que ler, porque é mais fácil receber os ensinamentos sem que se tenha o trabalho de ir buscá-los, Adelino se aproximou de Luíz e passou a infundir-lhe o estímulo para que se ampliasse em explicações, aproveitando o momento de fraco movimento na farmácia.
Desejando ser útil como era de seu feitio, o rapaz, influenciado pela generosa solicitude do Espírito amigo que o inspirava, abordou várias questões ligadas aos riscos, às práticas nocivas e às formas de tratamento.
Natural que Leonor se visse despertada na curiosidade.
Enquanto o rapaz falava, sob os auspícios de Adelino, os outros dois amigos invisíveis, Cristiano e Jerónimo, a envolviam em fluidos luminosos, reabastecendo-a com forças mais puras e, aplicando energias na área afectada pela dor de cabeça, favorecendo a assimilação das informações e a semeadura dos ensinamentos que o balconista do estabelecimento estava lhe passando.
Graças à transfusão de energias, a cabeça de Leonor foi aliviada por completo, ficando livre do incómodo, o que facilitaria a absorção das notícias e ensinamentos que Luíz lhe transmitia, com riqueza de detalhes.
– Nossa, Luíz, nunca ninguém me falou nada disso.
Se não fosse você me dizer estas coisas, eu nem ia saber que o caso era grave. Será que as pessoas não estão exagerando um pouco nesse negócio?
Tem tanta gente que prefere criar noticiário de desespero, falando que vai faltar água potável para que as pessoas corram ao supermercado para comprarem todo o stoque de garrafas de água que lá está e, por fim, a escassez prometida não aparece...
– Sabe, dona Leonor, como trabalhador nesta farmácia, estou sempre em contacto com muita gente doente e, assim, posso lhe dizer que os casos de câncer em mulheres são muito numerosos.
Não é fantasia de governo ou de empresa farmacêutica para vender remédio ou para fazer propaganda.
Olhando para o rapaz, pensativa, Leonor exclamou:
– Puxa vida, e eu que estava pensando que isso era filme pornográfico, Luíz... desculpe a ignorância, meu filho. Isso não é filme pornográfico, Luíz.
Isso é filme de terror mesmo – disse ela, dando uma risadinha amarela.
O rapaz sorriu em resposta, colocando o comprimido na sacolinha e encaminhando a cliente para o caixa.
– O que é isso? – perguntou Leonor.
– Ora, dona Leonor – respondeu, pacientemente, o rapaz, acostumado a clientes com memória fraca – é o seu remédio... para dor de cabeça... lembra?
– Dor de cabeça? Ah... é verdade...– exclamou ao recordar-se de que havia entrado ali para adquirir o analgésico.
Mas sabe de uma coisa, Luíz, a sua conversa foi tão agradável, que eu nem havia-me dado conta de que a dor tinha passado, como passou, quase que por milagre.
– Puxa, que bom, dona Leonor.
É sempre importante que a gente não tome remédio sem precisar, não é?
– É isso mesmo... pena que não posso levar esse cartaz para casa, porque eu ia gostar de ler com mais calma.
– Ora, não seja por isso...
A empresa que fez o cartaz, também produziu vários folhetos explicativos sobre o câncer de mama, e a senhora pode levar um para estudar melhor as informações.
– Nossa, que maravilha meu filho.
E quanto custa?
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Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz Empty Re: Série Lúcius - Esculpindo o próprio destino / André Luiz Ruiz

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 11, 2015 11:12 am

– Não custa nada, dona Leonor.
O mais importante é que a senhora entenda bem como fazer a protecção contra tais ocorrências.
– Posso levar dois, então?
Vou dar um para minha filha...
– Claro, eles estão aí é para serem distribuídos.
– Obrigada, Luíz... que Deus o abençoe pelos ensinamentos que me deu hoje...
– De nada, dona Leonor, estamos sempre aqui para atendê-la no que for necessário.
Despediram-se e, assim, a primeira tarefa dos amigos invisíveis estava cumprida.
Leonor levara consigo as informações necessárias para dar início ao tratamento pessoal da enfermidade que já se encontrava em desenvolvimento no seu íntimo, mas que, somente com a avaliação mais meticulosa, poderia ser identificada a contento, dentro dos recursos da modernidade, na prevenção e tratamento das doenças.
Os amigos de sua alma e a acção directa que realizaram sobre ela souberam aproveitar aquele pequenino pedaço de papel que algum desconhecido tinha-se preocupado em produzir com a finalidade de ajudar seu semelhante.
Leonor tomou o rumo de casa, colocando os folhetos dentro da bolsa para que pudesse lê-los mais tarde.
Enquanto caminhava, intrigava-se com o misterioso desaparecimento da dor de cabeça, durante a conversa na farmácia.
– Coisas de Deus ou do capeta?... – perguntava para si mesma, nas explicações toscas que dava para certos eventos não compreendidos racionalmente, por lhe faltarem noções espirituais para o entendimento das acções do mundo invisível.
E lá se foram todos para a sua casinha, a ampará-la desde o início de suas lutas.
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