LUZ ESPÍRITA
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Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ

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Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ - Página 5 Empty Re: Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ

Mensagem  Ave sem Ninho Sex maio 16, 2014 9:05 am

A figura de Zacarias, desassombrada e humilde, contrastava com a de Pilatos, arrogante e confundido.

– E qual é a base da pregação de vocês?
Filia-se a algum novo deus, fere os ditames da lei que os fariseus defendem?

– Nosso senhor Jesus – que, talvez, um dia vossa autoridade possa vir a conhecer pessoalmente para entender-lhe melhor os ensinos – nos afirma que ele não veio à Terra para infringir a lei, mas para dar-lhe cumprimento.

Quando provocado por fariseus, que desejavam conhecer-lhe a postura diante do dever de pagar tributo a Roma – que, aliás, os próprios fariseus abominam em sua usura sem fim – Jesus pediu uma moeda ao que perguntava e lhe indagou:
De quem é esta figura estampada na moeda?
E a resposta apontou para César.
Então, Jesus lhe respondeu:
Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus, o que produziu um desgosto muito grande nos fariseus que ali estavam e que desejavam obter dele a pregação subversiva para acusá-lo de infractor dos deveres fixados pelo governo imperial.

A mensagem da Boa Nova se estende ao mundo interior de cada pessoa, buscando respeitar nas criaturas as suas escolhas, mas tentando mostrar-lhes que a infelicidade é fruto do egoísmo e que se mais criaturas fossem generosas umas com as outras, menos tragédias existiriam sobre a Terra.

Por isso, nada há na prédica que Jesus tem realizado, que possa considerar-se perigoso à ordem pública, que Roma sabe manter como seus métodos o aconselham.
Ao referir-se ao Reino de Deus, fala claramente que não é um reino que venha a competir com os reinos dos homens sobre a Terra, mas que se trata de um reino a nascer no coração das pessoas, no qual elas serão mais dóceis, menos orgulhosas, mais puras e pacíficas.

Quando defrontado por qualquer ofensa, ensina-nos o perdão sem ressentimento, de tal maneira que é o mais poderoso meio de se produzir a boa convivência entre os povos ocupados e os dirigentes estrangeiros que os dominam e dirigem.

Os fariseus, ao contrário, estão sempre por aí, pendurados nos poderosos, mas tramando e conspirando contra eles.
Não nos é possível, então, vislumbrar, nos princípios que Jesus nos ensina, qualquer perigo para o poder constituído.
Ao contrário, Jesus fala aos caídos para que se levantem com coragem, não contra o Império, mas para que se ergam perante si próprios e carreguem suas cruzes sem esmorecimento, pois Deus sustentará a todos em suas lutas.

Se seu poder amoroso é capaz de curar, a todos ensina, todavia, como não caírem enfermos, dizendo-lhes que devem seguir suas vidas, mas não devem pecar novamente, pois isso produz mais enfermidades.

Enfim, meu senhor, fala ao coração e ao entendimento de cada pessoa, para que cada pessoa mude por si mesmo e melhore seu coração, onde, afinal, se há-de instalar o reino de Deus.
Em resumo, essas são as lições que temos aprendido.

Altamente impressionado com os conceitos sumamente elevados, ouvidos da boca de um quase andarilho, o governador recebia, ali, as primeiras noções do reino de Deus pregado por Jesus.

Envolvido pela atmosfera amorosa que os espíritos produziam à sua volta, Pilatos sentiu uma vibração que jamais havia sentido, desde os velhos tempos de Roma, o que lhe causou agradável impressão.

Sem desejar quebrar tal ambiente e, com a finalidade de encerrar a entrevista que já lhe havia dado suficientes elementos de compreensão, diante das tolas e infundadas acusações dos fariseus, Pilatos atenuou o tom da voz, abrandando-lhe a altivez e indagou:
– E quanto custa tudo isso aos que seguem tal profeta?

Acostumado a negociar com a fé dos fariseus e suas práticas religiosas sempre permeadas por doações exigidas, cobranças baseadas nas escrituras, preços para orações e cerimónias, Pilatos imaginava que ali também deveria haver algum tipo de valor a ser pago.

– O Reino de Deus é de graça, meu senhor.
Nenhum interesse nos move e não desejamos nem aceitamos qualquer amparo ou pedimos qualquer dinheiro para realizar o que realizamos.
Jesus caminha sem levar bolsa, sem ter duas túnicas, sem pedir qualquer contribuição.
Cura sem cobrar, esclarece sem dar preço, salva sem exigir nada de ninguém.

Aceita o que lhe dão de comer e dorme onde lhe oferecem um leito amigo.
Não possui uma pedra para deitar a cabeça.
Este é o núcleo da mensagem de Amor.
Fazer pelos outros sem nenhum interesse para si mesmo.
Essa é a pureza que o Reino de Deus exige dentro dos corações humanos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex maio 16, 2014 9:05 am

Tocado em seu ponto fraco, Pilatos sentiu-se confundido com as referências, eis que a sua consciência o acusava de coisas indignas e de um apego extremo às riquezas.

Assim, imaginou que a beleza daqueles princípios se tratasse apenas de mais uma das tão decantadas filosofias de que a Grécia era senhora em produzir todos os dias e acabou pensando, de maneira prática, como os romanos de todos os tempos, dizendo para si mesmo que, apesar de belo, aquilo não era para ele.

Somos todos assim quando as mudanças surgem diante de nós.

Deixamos o raciocínio perturbar-se com as conveniências de nossos desejos e vícios para que não tenhamos que abdicar de nossas vaidades e caprichos.

E mesmo reconhecendo a superioridade dos ensinamentos evangélicos, muitos seres procuram evitar escutá-los a fim de não terem que agir em consonância com os seus princípios.

Por isso, Pilatos se encantara com a profundidade filosófica dos conceitos, mas não aceitaria, jamais, vestir-se de maneira simples como Zacarias e aceitar o jugo suave e o fardo leve.

Estava acostumado ao fardo pesado de homem do mundo e ao jugo sufocante das algemas que o prendiam às coisas terrenas, ao poder ilusório, às riquezas voláteis e perigosas, às seduções da carne.

Naquele momento, Pilatos se sentira diminuído diante daqueles homens humildes, pois lhes admirava o tamanho da fé que ele não compreendia.
Todavia, seu raciocínio de governador romano importante o fez voltar à tradição de seus ancestrais e dizer para si mesmo que aquela era a sua crença, a que houvera aprendido dos seus pais e que não lhe cabia ficar se deixando seduzir por princípios estrangeiros.

Afinal, era romano e não judeu.
Estes raciocínios são muito comuns em muitos dos seres humanos que, diante de princípios elevados que pedem modificação de comportamentos e pensamentos, preferem apegar-se a antigas crenças conformistas e mornas, que lhes permitem continuar do mesmo jeito sempre, desde que se submetam às exigências da ritualística ou da contribuição financeira.

No fundo, é um estelionato recíproco, onde ambos se enganam para que possam seguir sendo sempre do mesmo modo, com o discurso de que desejam ser diferentes.

Igrejas cobiçam o dinheiro e o poder, pregando o desprendimento e a humildade.
Fiéis desejam a absolvição para entrarem no céu, vivendo de maneira extremamente mundana e presos à terra.

Por isso, entregam parte de suas riquezas e comparecem a cultos para que, ainda que não se comportem de acordo com aquilo que escutam, recebam a absolvição e pensem que têm o céu garantido.

Não era diferente com Pilatos, naquele momento.
Isso lhe pesaria também na consciência.
Todavia, a semente estava lançada no seu coração.

Depois de um rápido exame de todos os elementos e envolvido pela aura de serenidade que lhe havia produzido aquele colóquio, o governador pontificou:
– Não vejo perigo algum em suas prédicas.
Aliás, elas são de tal modo belas, que eu próprio me sinto tocado por muitos de seus conceitos, ainda que não me possa furtar ao peso de meus ancestrais, na fé nos deuses de meu povo.

Por isso, não irei detê-los aqui, por mais tempo.
Agradeço os esclarecimentos que me foram dados e ofereço-lhes a hospedagem para a noite que se aproxima, bem como algumas provisões para a sua viagem de regresso, se é verdade o que me foi informado, ou seja, que estão de partida para outras regiões.

Meditarei em tais conceitos e procurarei avaliá-los dentro de mim mesmo.
Pena que os deveres oficiais de um governador não lhe permitem fazer o que deseja, mas, antes, o escravizam a obrigações de Estado...

Ouvindo-lhe as palavras favoráveis, Zacarias rematou:
– O homem é sempre ajudado por Deus para romper, um dia, as correntes que o prendem, meu senhor, de maneira que chegará o momento em que sentireis a possibilidade de ser livre para sempre ou manter-vos escravizado, como dizeis, e eu acredito que assim o seja.

Nós confirmamos perante vossa autoridade a nossa partida de Nazaré, a fim de que não venha a ocorrer mais algum tumulto que nos aponte como responsáveis e, se não vos causar qualquer prejuízo e desde que venha como uma oferenda de vosso generoso coração, nós aceitaremos algumas frutas secas e alguns pães para que o caminho possa ser trilhado sem tantas dificuldades, agradecendo-vos a oferta da estadia, que não podemos aceitar, pois pretendemos seguir caminho o mais rápido possível.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex maio 16, 2014 9:06 am

Sorrindo-lhes de modo franco e dando por encerrada a reunião, Pilatos ordenou que os seus empregados providenciassem as necessárias provisões aos quatro homens, despedindo-se deles e encaminhando-se para seus aposentos íntimos.

Lá chegando, procurou manter-se em ligação com as emoções daquela hora, tão diferentes de tudo o que havia visto até ali, em sua vida pessoal, cheia de experiências.

Envolvido pelo ambiente, lembrou-se do imperador Tibério, com seus achaques e dores, e imaginou logo lhe relatar as ocorrências daquele dia ao mesmo tempo em que o colocaria a par, através de um relatório, das possibilidades curativas daquele Jesus que ele desconhecia e que, somente por boatos, havia tido notícias até então.

Ao mesmo tempo, pensava na vantagem que conseguiria para si mesmo se conseguisse levar até o imperador a solução para seus problemas e enfermidades crónicas.

Quanto não lhe poderia render a gratidão de Tibério.
Era o velho homem prático, tentando tirar proveito das vantagens que os novos conceitos lhe produziam.
Tomou a pena e redigiu pessoalmente longo relatório falando sobre esse Jesus que Tibério já conhecia, sem imaginar que Públio Lentulus tinha como missão secreta fornecer ao imperador os informes que ele desejava também.

Enquanto isso, os quatro homens deixaram as dependências de descanso de Pilatos como aqueles que saem da arena das feras sem nenhum arranhão.
Mais do que depressa, partiram para longe da cidade, aproveitando a claridade da Lua naquela noite, para que nenhuma recaída do governador ou pressão dos fariseus viesse a aprisioná-los novamente.

Caminhavam com uma profunda alegria, como se o dever mais elevado que lhes fora outorgado pelas forças do bem tivesse sido cumprido dentro dos objectivos superiores.
Uma sensação de felicidade infantil fazia com que os quatro homens saíssem cantando hosanas pelo caminho, abraçados e eufóricos, como sendo os primeiros seres vivos que haviam levado a mensagem da Boa Nova ao coração do poderoso Império romano, pessoalmente.

Caminharam por longas horas até que o cansaço aconselhou que parassem para dormir, o que fizeram depois de terem comido algo das provisões que o governador lhes havia concedido.

Naquela noite, os quatro, de joelhos, agradeciam a Deus e a Jesus por tudo o que haviam recebido para que pudessem dar testemunho da verdade nos caminhos por onde passaram.

E a alegria se misturava com aquela que era sentida pela equipe invisível de espíritos luminosos que lhes havia acompanhado a trajectória, amparando-lhes as fraquezas, aclarando-lhes o raciocínio, ajudando-os nos argumentos, protegendo-os das armadilhas, fazendo-os defrontar-se com os desafios pessoais na superação de seus próprios equívocos, enfim, cumprindo tudo aquilo que Jesus havia dito que ocorreria quando os havia enviado como ovelhas ao covil dos lobos.

Que isso nos sirva sempre de estímulo para as nossas lutas.

Por piores que possam parecer ou mais impossíveis se nos afigurem as realizações, lembremo-nos de que Deus dirige tudo e sabe abrir as portas para aqueles que Nele confiam e a Ele entregam os frutos de toda a sementeira.

Aos arrogantes, as frustrações do fracasso, pois o que faziam, faziam-no por si mesmos e para a exaltação de sua vaidade.
Aos humildes, a alegria do dever cumprido, pois estavam a serviço do mais generoso de todos os senhores, Dele recebendo a gratidão da coragem e da fidelidade demonstrada na execução da obra.

Por isso, o próprio Jesus não se cansava de afirmar ser apenas um embaixador de Deus e que maior era Aquele que o havia enviado do que ele próprio, simples filho que cumpre a vontade do Pai Eterno.

Aprendamos com isso a fazer a parte que nos toca, sem imaginarmos ser muito difícil ou impossível atingir objectivos mais elevados.
Coloquemos os tijolos na construção seguindo as instruções dos arquitectos, sem nos preocuparmos em saber qual será a altura da obra.

Quando ela tocar as nuvens, admiremo-nos e alegremo-nos por termos sido aqueles que ajudaram a edificá-la.

Certa feita, perguntaram a três pedreiros de uma construção o que eles estavam fazendo:
O primeiro respondeu:
Eu corto pedras para ganhar o pão.

O segundo disse:
Eu estou erguendo estas paredes, pois é meu trabalho.

Mas o terceiro, orgulhoso e sorrindo, respondeu:
Eu estou construindo uma catedral.

Os três eram pedreiros e estavam fazendo a mesma coisa, no mesmo lugar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex maio 16, 2014 9:06 am

24 - Jesus e Lívia

Enquanto os quatro homens seguiam seu caminho de regresso a Cafarnaum, onde buscariam a figura doce do Messias amoroso, pelo caminho iam pregando a Boa Nova nos vilarejos existentes, retendo-se aqui ou ali, de maneira a que também nesses pequenos aglomerados humanos se fizesse presente a mensagem do Cristo.

Enquanto passava o tempo em companhia de Zacarias e Josué, Saul e seu irmão Cléofas iam aprendendo e se aprofundando nas lições que, aos seus espíritos, nunca perdiam a beleza e o encantamento.

Ao mesmo tempo, puderam presenciar muitas outras curas, o que acabava produzindo um tal impacto no seio daquele povo sofrido, que a estadia de todos na localidade não podia alargar-se muito, em face de todas as dificuldades que passariam a enfrentar, diante do desejo e da necessidade das pessoas, além da natural curiosidade que tal realização levantava nos corações imaturos.

Aqui ou ali surgia algum fariseu mais arraigado à lei mosaica que se manifestava em oposição aos ideais pregados pelos mensageiros do evangelho.

No entanto, confrontado com a turba esfomeada de esperança, a maioria se ocultava a fim de não se expor perante a insatisfação do povo, que atribuía sua dor e sua desdita, em grande parte, às injustiças e abusos cometidos pelos judeus que, ligados às questões religiosas, dirigiam o povo tanto nas pequenas localidades quanto nas grandes.

O governo imperial impunha a ordem e cobrava tributo.
Todavia, Roma mantivera na Palestina a realeza local, sendo certo que os tetrarcas tinham o poder relativo sobre as questões de sua jurisdição, notadamente no carácter religioso dos costumes, no que Roma não se imiscuía, ao menos directamente.

Todavia, o pobre e sempre esquecido povo era o que sempre sofria, fosse o peso dos tributos cobrados pelos estrangeiros, fosse a indiferença com que suas necessidades eram atendidas pelos seus próprios representantes.

E das diversas facções que compunham a estrutura social, a dos fariseus e a dos saduceus eram as mais bem aquinhoadas, em face do controle das coisas religiosas, já que os primeiros eram os que dominavam as sinagogas e os segundos cuidavam do Templo em Jerusalém.

Por isso desenvolveram a casuística, para se manterem sempre na vantagem e no domínio das questões colectivas, impondo seus pontos de vista e cobrando sempre pelos seus palpites, como se estivessem, apenas, seguindo os escritos sagrados.

E o povo miserável, apesar de crédulo, já estava cheio de suas negociatas.
Assim, as palavras dos emissários de Jesus caíam em um terreno fértil e totalmente preparado pela dor para a sementeira tornar-se viçosa lavoura.

De cada localidade por onde passavam, sempre alguém se dispunha a segui-los a fim de conhecer Jesus pessoalmente.
Não que todos desejassem tornar-se seus discípulos, mas queriam, por toda a lei, ver com seus olhos aquele em nome de quem os forasteiros atendiam aos sofredores;
com um simples toque ou uma simples palavra, curavam ou expulsavam o demónio – como as pessoas ignorantes interpretavam os processos de desobsessão, com o afastamento de espíritos sofredores que actuavam sobre encarnados.

De vilarejo em vilarejo, um pequeno séquito ia se formando ao redor dos dois homens, que se surpreendiam com o efeito de suas palavras e acções.
E como ia crescendo a necessidade de esclarecimento, Saul e Cléofas iam começando a falar do reino de Deus, dentro daquilo que tinham aprendido de Zacarias e Josué por muito ouvirem suas prédicas, quando estes estavam ocupados em atender outras necessidades.

Assim, os dois novéis trabalhadores do bem se iniciaram no mister de serem pontes luminosas que levassem Jesus aos que viviam na escuridão da ignorância.
Enquanto isso ocorria com os quatro trabalhadores, em Cafarnaum, a situação dos Lentulus, como já foi descrito, havia-se agravado com o desaparecimento do filho mais novo do casal, o pequeno Marcus.

Dessa ocorrência misteriosa, se valeu Sulpício Tarquinius para tentar envenenar o espírito do senador Públio contra a esposa, atendendo aos alvitres de sua cobiçada Fúlvia, informando-o de que, havia não muito tempo, um caso muito semelhante ocorrera na Judeia, motivado, como se descobriu depois, por envolvimento amoroso ilícito entre o governador que antecedera Pilatos e a esposa romana de um patrício que se preparava para regressar a Roma.

Como não conseguira impedir que os mesmos se ausentassem, tratou o importante administrador de sequestrar-lhes o filho a fim de impedir o regresso da família à capital, levando a acreditar na cumplicidade da mulher amada.

Naturalmente, sem citar directamente o caso actual, as palavras do lictor caíam como uma luva na situação em que se encontrava o senador, num paralelismo imediato, o que produziu em Públio uma reacção igualmente turbulenta, já que sua personalidade altiva e firme se recusava a imaginar que sua esposa estivesse envolvida em tal delito.

No entanto, volviam-lhe à mente as palavras incriminatórias de Fúlvia, nas insinuações da prevaricação de Lívia em relação a Pilatos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex maio 16, 2014 9:06 am

Ao mesmo tempo, a mente confundida e atordoada do senador ligava pontos e condutas como se estivesse encontrando motivos para reconhecer um fundo de verdade ou a possibilidade de tais insinuações maldosas e viperinas possuírem algum fundamento.

No entanto, nenhuma conclusão que tivesse sobre o carácter da esposa iria desnudar ali perante o subalterno.
Depois de controlar-se herculeamente, Públio se manifestou agradecido ao enviado do governador, mas dispensou-lhe o serviço pessoal, alegando que não poderia mais confiar nele em face dos conceitos que houvera expendido em relação às virtudes de sua esposa.

Não desejava prejudicar a honra pessoal de Sulpício e, por isso, esclareceria ao governador os motivos políticos necessários a tal cometimento, notadamente aquele que o impedia de voltar a Roma brevemente, como pretendia fazer, o que o levava a dispensar o lictor de seu serviço pessoal por não lhe desejar monopolizar os deveres nem embaraçar as funções em outras áreas de tarefa a serviço do governador.

Sulpício se viu amargamente surpreendido por tal decisão, que recebeu como uma demonstração de desafecto ante seu zelo pessoal para com a reputação do senador a quem estava servindo.

Irritado, mas contido, deixou o serviço de Públio e rumou para Jerusalém onde se radicavam as suas obrigações primeiras e onde estavam, também, os interesses imediatos de seu coração, na figura da atraente e volúvel mulher desejada, o pivô de muitas das intrigas, Fúlvia.

Tão logo se viu a sós, Públio redigiu a mensagem ao governador informando do desaparecimento inexplicável do filho, da modificação brusca dos planos de regressar prontamente a Roma, da necessidade de dispensar os serviços de Sulpício sem revelar, efectivamente, o verdadeiro motivo de tal dispensa para que não lhe produzisse qualquer prejuízo à sua carreira pública, como lictor e homem de confiança de Pilatos.

Enviou um emissário directamente ao governador que sabia estar, naqueles dias, estacionado em Nazaré, colocando-o a par da situação.

Uma vez notificado de que tais fatos estavam ocorrendo com o mais alto e directo representante do Império na província e, felicitado com tal possibilidade ser usada como escusa para aproximar-se da família Lentulus, imediatamente Pilatos adoptou todas as medidas necessárias à substituição do lictor dispensado junto à família patrícia e deliberou ele mesmo, em pessoa, comparecer perante o senador em Cafarnaum, a fim de inteirar-se completamente dos fatos e demonstrar o seu interesse pessoal na solução do problema doloroso.

Ao mesmo tempo em que daria mostras de sua mais ampla disposição em auxiliar na solução do desaparecimento do filho de tão importante autoridade romana em sua jurisdição, poderia avaliar como estaria a disposição do senador quanto à sua administração e, se tivesse sorte, igualmente, poderia vislumbrar a figura da mulher desejada que, naturalmente, lá também estaria, aflita e desditosa com a perda do pequeno filho.

Atendendo às prerrogativas de Públio, em face das altas funções que lhe foram atribuídas por Tibério, podendo contar, inclusive, com o comando autónomo de uma unidade militar a qual o senador dispensara cordialmente quando de sua estada em Jerusalém para submeter-se, confiantemente, à protecção do governador, Pilatos enviou uma guarnição de soldados para a cidade a fim de dar início a uma busca minuciosa e detalhada, interrogar pessoas, colectar indícios, estabelecer procedimentos apuratórios e punir se fosse necessário.

Tal conduta produziu em Públio uma reacção favorável por demonstrar-lhe consideração e apreço pela sua dor pessoal, o que era algo confortante ao romano, isolado na longínqua Palestina daqueles tempos.

Uma vez notificada da próxima chegada do governador, Lívia se deu conta de que aquela seria uma outra situação difícil para ser enfrentada pessoalmente, notadamente depois da cena do jardim na qual Pilatos se deixara levar pelo seu arrebatamento.

E se era verdade que sua ajuda naquele momento seria muito útil, como o fio de esperança que se ligava à necessidade de reencontrar o filho desaparecido, também representava desafio à sua capacidade de recusar-lhe qualquer demonstração de apreço que viesse a ser interpretada de outra maneira.

Assim, tão logo ficou sabendo da próxima chegada do governador, procurou o marido e lhe confidenciou:
– Públio, não acho desprezível o cuidado do governador para com a nossa causa e espero que sua iniciativa e suas diligências possam ser decisivas para que consigamos encontrar nosso filho.

No entanto, não me sinto disposta a estar diante desse homem que não me agrada e que exigirá de mim uma postura de anfitriã que minha debilidade, diante da perda de Marcus, não me permitirá demonstrar.

Assim, gostaria que você o recebesse e escusasse minha ausência com o argumento, de resto verdadeiro e justo, de meu abatimento ante os factos acontecidos.
Não desejo ter que me conduzir em minha casa como se estivesse encenando uma peça social no teatro da vida das conveniências e protocolos oficiais.

Surpreso com aquele comportamento inusitado de Lívia, Públio ainda tentou testá-la, argumentando:
– Mas você não acha que a conduta da esposa de um senador deve estar acima de nossos achaques pessoais, por mais dolorosos que possam ser?
– Sim, meu querido, compreendo o seu zelo, mas não desejo que meu estado pessoal de mãe desfigurada venha a ser objecto de admiração de um homem que não priva de nossa intimidade nem de minha fraterna simpatia.

Assim, espero me dispense dos deveres legais e protocolares que sempre desempenhei a contento até hoje, a fim de que a dor do coração de mãe possa prevalecer sobre os argumentos da conveniência exterior.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:16 am

Reconhecendo o peso de sua ponderação, Públio assentiu secamente que se ausentasse da entrevista com Pilatos, não sem sentir uma nesga de alegria interior por identificar nessa conduta firme da esposa um indício que desmentiria as insinuações torpes de todos quantos desejavam destruir-lhe a felicidade conjugal.

Assim, quando da chegada do governador, foi ele recebido com cordialidade apenas por Públio, que apresentou as escusas pela ausência da esposa, recolhida à dor da mãe despojada de seu tesouro afectivo mais sagrado, o que, no íntimo, frustrou uma das expectativas de Pilatos, que gostaria de aproveitar aquele momento para diminuir a ansiedade pelo reencontro com Lívia.

A estada do governador na região, no entanto, foi breve e apenas para marcar perante Públio a sua solidariedade e a adopção de todas as medidas de busca necessárias à solução do caso.

A conduta do procurador da Judeia lhe serviu como uma carga nova de forças, perante a dificuldade que representava para um romano procurar uma criança pequena em um local desconhecido e distante dos recursos da metrópole.

O comportamento de Lívia lhe havia tranquilizado um pouco os sentimentos e as suspeitas, já que dera mostras firmes de não se manifestar disposta a se entrevistar com o governador, nem mesmo para exercer os deveres que lhe eram esperados pela condição de esposa de senador.

Todavia, se por um lado esses pensamentos lhe atenuavam as preocupações, a fragilidade de suas emoções sempre deixava entrever a dúvida como uma nuvem negra no horizonte de seu afecto.

E se ela estivesse agindo assim justamente para não levantar suspeitas?
Se não desejasse encontrar o governador apenas para não se trair em algum olhar menos formal e mais íntimo?
Afinal, ele não podia deixar de perceber que o próprio governador se ocupara de informá-los de sua estadia em Nazaré, não muito longe dali.

Será que isso não indicava alguma senha secreta entre dois corações que se buscavam?
Do mesmo modo, o desaparecimento do filho coincidira com a presença do governador na região dos factos e, logo a seguir, a sua chegada a Cafarnaum para a mencionada visita.

Tudo isso fazia com que o pensamento daquele homem do mundo, que escolhera o jugo sufocante e o fardo pesado, se visse embaralhado entre o desejo de acreditar no amor da esposa e o peso de insinuações e algumas evidências que poderiam ser interpretadas de muitas maneiras mas que, na visão do homem imaturo, serviriam apenas para atestar a infidelidade.

E longe de procurar a esposa para uma conversação sincera e esclarecedora, Públio se recolhia em seu mutismo, pois imaginava que, se levasse até ela alguma indagação directa sobre sua conduta, desencadearia reacções que poderiam ser verdadeiras ou mentirosas.

Se ela estivesse sendo falsa a ponto de trair-lhe a confiança, facilmente poderia usar de tal falsidade para negar os fatos e se sentir ultrajada pela desconfiança do marido.

E, afinal, ele não teria provas de sua conduta culpável para defrontá-la.
Se ela não tivesse sido infiel, sua revelação demonstraria o grau de sua insegurança afectiva, o que redundaria em uma demonstração de fraqueza que seu orgulho jamais daria a quem quer que fosse, sem falar que a esposa poderia, com justiça, considerar-se igualmente ultrajada em sua honra e passar a tratá-lo com o desprezo que ele, certamente, mereceria.

Assim, o senador não se deixava qualquer saída para solucionar o impasse através da verdade, revelando à mulher os factos e correndo o risco de se ver desnudado em sua íntima insegurança.

Por não pretender abdicar de seu status de personalidade segura diante dos desafios do Estado e de suas funções públicas, Públio se via vítima de sua altivez no âmbito pessoal de seu afecto, ainda imaturo para as coisas do coração, conquanto fiel e sincero em todos os momentos.

Por isso, preferiu fugir ao contacto mais estreito com a esposa em quem não podia acreditar cegamente e da qual não desejava duvidar sem motivo grave e verdadeiro.
Esse afastamento produziu um esfriamento no afecto do casal, que Lívia não via com bons olhos, mas aceitava, acreditando tratar-se de preocupações decorrentes do desaparecimento do filho.

Não havia outro motivo que ela soubesse que lhe pudesse modificar tanto o modo de ser dentro de casa.

O distanciamento e a frieza só poderiam ter essa causa.
Não imaginava ela que sua inocência estava sendo fustigada pela maldade alheia e pela coincidência de factos que, analisados por uma mente maliciosa ou por uma mente invigilante, facilmente poderiam levar à conclusão de sua infidelidade.

Vendo o estado de sua senhora, que com o passar dos dias se ia entristecendo ainda mais, agora não só por causa da falta de Marcus como também por causa do afastamento do marido, a serva Ana se acercou dela e lhe falou sobre as belezas da pregação de Jesus aos aflitos.

Sim, Jesus, o profeta que lhe havia curado a filha Flávia e que continuava pelas redondezas, realizando os prodígios que só a sua bondade era capaz de efectivar.
A lembrança de Ana foi como se um sereno suave lhe humedecesse a face seca que nem mesmo as lágrimas conseguiam molhar.

– Sim, senhora, Jesus estará aqui próximo, no lago, para as pregações no próximo sábado.
Se for do seu desejo, poderemos nos hospedar na casinha pobre de meus parentes pescadores em Cafarnaum, de onde iremos para escutar-lhe as palavras.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:16 am

– Ana, a sua lembrança me enche de alegria, já que eu mesma desejava procurar o profeta para agradecer-lhe a cura de Flávia antes que voltássemos a Roma e, por isso, agora que a dor regressa a nosso íntimo, poderia buscá-lo como fonte de consolação e esperança, não para que intercedesse com seu poder pelo nosso filho desaparecido, mas para que nos desse o alimento de que você tanto comenta e que conforta os corações combalidos.
Esteja certa de que eu irei com você.

– Mas, senhora, e o seu esposo?
Permitirá ele que nos ausentemos?
– Bem, minha querida Ana, procurarei falar com Públio pedindo sua autorização.
Mas ainda que ele não me receba, não me abaterei diante de sua posição distante.
Irei mesmo sem o seu consentimento.

Colocarei vestes simples, como as que são usadas pelas pessoas desta região e irei com você até a casa de seus parentes para que, dali, possamos encontrar a figura do profeta, ouvindo-lhe as exortações como alimento para o coração aflito.
Meu isolamento destes tempos pede conforto espiritual que, penso, só me será possível encontrar nesse Messias que todos veneram e que é tão bondoso para com os que sofrem.

E assim foi feito.
Públio escusara-se em conceder uma entrevista pessoal à esposa que lhe sondava o espírito para conseguir falar-lhe sobre seu desejo.
Sua postura taciturna e irritada sempre não lhe inspirava a coragem para submeter-lhe a súplica que, sabia ela, seria denegada naquelas horas de azedume do marido.

Assim, comunicou ao servo de confiança que administrava a casa a sua saída na companhia de Ana a fim de que o marido fosse, posteriormente, avisado de sua ausência e, naquele sábado previsto, dirigiu-se até a cidade onde, além de conhecer a simplicidade dos parentes da serva querida, iria receber as bênçãos do Mestre dos Mestres, o que lhe seria inesquecível momento de deslumbramento espiritual.

Junto do patriarca da família de Ana, o velho Simeão, que viera da Samaria para ver Jesus, Lívia se mantinha mesclada às mulheres do povo, sem nenhum atavio que lhe revelasse a condição de esposa do senador romano.

O acolhimento do povo simples e dos parentes da escrava tinham encantado o coração doce e faminto de Lívia, que se deixou enlevar pelo carinho espontâneo daquela gente humilde, que se sentia subidamente honrada em recebê-la na sua modesta vivenda, de onde partiram para o encontro com o Mestre, no lago, ao findar do dia.

Ali raiaria uma nova aurora para o espírito de todos, inclusive para o de Lívia que, embevecida com os conceitos da Boa Nova e com o magnetismo superior, desatava de seu espírito inúmeras amarras que a mantinham cativa nos convencionalismos mentirosos de todos os tempos.

Ali estava diante da verdade mais profunda e pura que encontrara em toda a sua vida.
Ao final da pregação, ajudado pelos discípulos, Jesus dividiu poucos pães para o povo que o escutara e a parte que coube a Lívia lhe produziu uma transformação que jamais imaginara, um dia, poder sentir dentro de si.

Era apenas pão pobre, mas trazia uma tal carga magnética que mais parecia manjar celeste que penetrava por todos os escaninhos do corpo e da alma, infundindo uma paz serena e confiante, capaz de suportar todas as misérias do mundo sem desistir de lutar e sem se entregar ao desespero.

Depois de ter pregado e alimentado a multidão de velhos, mães pobres e crianças esquálidas, o Mestre deteve-se a conversar com algumas mulheres que o procuravam, no que foram imitadas por Simeão e Lívia, ao seu lado.

O colóquio que tiveram, chegada a sua vez de se encontrarem, marcou todo o caminho daquela romana que se assumia na condição de alma rutilante no caminho do sacrifício.
Ao falar-lhe, Jesus fez menção às dores ocultas que feriam seu coração e marcou para o futuro o momento em que aceitaria, igualmente, a negação de si própria em face do novo reino que nascia em seu espírito naquele momento.

As emoções eram indescritíveis para todos.
Mesmo para Simeão, que escutara do Mestre as palavras de exortação para a luta até o momento do sacrifício, o contacto com Jesus infundia uma energia poderosa e sem paralelo na Terra.

A hora de voltar, todavia, havia soado e Lívia, acompanhada de Ana, regressou ao lar, já passada a hora costumeira de se recolherem.
Seus espíritos vinham pelo caminho como que flutuando de emoção, como se tivessem bebido de um elixir misterioso e inigualável, que modificava o mais profundo dos sentimentos, abrandando as dores, dando coragem ao espírito e serenidade diante de todos os problemas da vida.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:17 am

Afinal, isso seria muito bom diante da tempestade que aguardava por Lívia dentro de casa.
Tão logo deram entrada na residência senhorial, Públio aguardava a mulher entre irritado e desconfiado.
E em sua violência descontrolada, dirigiu-se à esposa com irritação e agressividade verbal nunca vistas por Lívia em sua boca.

Tal reacção se tornara ainda mais forte em face da constatação de que a mulher houvera se ausentado usando vestes que ocultavam a sua condição de patrícia, como se desejasse se livrar de testemunhas indesejáveis.

Sem perder o estado de alma que lhe visitava o coração, Lívia esperou que o marido lhe permitisse falar e explicou-lhe tudo, desde a dificuldade de lhe solicitar a permissão para sair naquele dia, até o encontro com Jesus e o motivo de seu disfarce, justamente para proteger o marido de quaisquer comentários incorrectos e indignos de sua posição.

Nada, no entanto, seria capaz de atenuar o espírito vulcânico que tomava conta de seu marido naquela hora, a lastimar a maldita ideia de ter realizado aquela viagem, que estava se tornando uma tragédia em sua vida.

Lívia lhe ouvia as reprimendas e, sabendo como era a personalidade do esposo, calara-se, até que o marido a deixou a sós, indo em direcção ao seu escritório, não sem antes demonstrar a sua irritação com a clássica, rude e estrondosa batida de porta.

Ali ficara a mulher, entre aflita por seu marido e enlevada em face de tudo o que recebera naquela noite.

A lembrança de Jesus lhe dominava o horizonte íntimo, e uma sensação de alívio lhe percorreu o corpo todo, como se estivesse vendo o Mestre enlaçando-a e lhe falando ao coração aflito para que tivesse confiança, pois nunca lhe faltaria a sua misericórdia, fosse para aquela hora de amargura doméstica, fosse para os momentos mais duros de sua jornada que ainda estavam por vir.

E asserenada, Lívia deixou que lágrimas molhassem o rosto, agora confiante em Deus e em Jesus para sempre.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:17 am

25 - Jesus ouvindo e falando aos setenta

Depois da visita a Cafarnaum, frustrado por não ter encontrado Lívia, como desejava, Pilatos regressou a Nazaré, de onde seguiria para Jerusalém novamente, daí a alguns dias.

Todavia, na sua condição de homem de Estado, as ameaças políticas que se materializavam com a presença de Públio em seu território, agora por mais tempo do que aquele que havia previsto, passaram a incomodá-lo sobremaneira.

Especialmente diante da perspectiva de que, em busca do filho perdido, o senador se veria forçado a palmilhar a região e isso poderia expor de maneira mais perigosa os métodos administrativos corrompidos pela longa duração de seu governo.

O regresso a Jerusalém, dias depois, foi imerso num véu de preocupações e receios os quais Pilatos tentava afastar com as lembranças dos bons ofícios que havia despendido a favor da busca do pequeno desaparecido, o que deveria, por certo, levantar a seu benefício a boa consideração do pai desesperado.

No entanto, a ansiedade e a consciência pesada pelos inúmeros desmandos administrativos tinham o seu peso nas preocupações do governador.
Não havia esquecido a paixão que Lívia lhe inspirava e a distância que se lhe interpunha entre seu coração e o objecto de sua cobiça.

No entanto, não podia agir como se estivesse desejando uma das mulheres comuns daquela região, eis que se tratava da esposa de seu potencial e perigoso adversário.
Já havia-se comportado de maneira arrojada, mesmo para um homem de seu posto com relação à esposa de outro importante romano na província.
Não desejaria abusar da sorte e correr o risco de pôr tudo a perder com atitudes arrebatadoras que o comprometessem perante os olhos argutos de seus observadores.

Assim, tratou de se envolver nos negócios de Estado, divertindo-se com as conquistas que não representassem riscos maiores.

Entre elas, estava Fúlvia que, na sua leviandade, não via a hora de recuperar as vantagens na preferência do governador, seu cunhado.

Essa mulher era o protótipo da víbora em forma feminina, eis que se deixara levar pelos conceitos de sua época, que colocavam a beleza como o pedestal poderoso, graças ao qual tudo se conseguiria, desculpando-se das ilicitudes com a alegação de que os homens são movidos por desejos e que tais fragilidades não são de responsabilidade de quem detém a coisa que todos cobiçam.

Era um raciocínio comum naquela época tanto quanto o é hoje, na simplificação dos conceitos e no esquecimento dos princípios morais que deveriam auxiliar as pessoas a vencerem suas fraquezas.

Tanto Pilatos quanto Fúlvia representavam com exactidão o perfil que boa parte da humanidade tem cultuado até os dias actuais.

De um lado, administrador que se corrompe para obter vantagens pessoais e se manter no comando valendo-se de uma rede de apaniguados amigos do poder que, igualmente, se corrompem para dele retirarem as vantagens particulares, acobertando-se reciprocamente, protegendo-se até o fim, com a consciência de que se uma das engrenagens dessa máquina sórdida se romper, todo o mecanismo está arruinado e corre riscos.

De outro, a pessoa que se corrompe para conseguir a posição de realce diante das demais, usando dos recursos estéticos de que dispõe para convertê-los em armas de tentação, sem se preocupar com os resultados de suas investidas, desde que deles consiga retirar vantagens pessoais para usá-las no momento adequado.

Comercializando com as emoções frágeis que as fraquezas humanas permitem se instalem no interior dos indivíduos, as criaturas que se comportam com tal primitivismo são perigosas fontes de discórdia social, deixando atrás de si um rastro de lágrimas, frustrações afectivas e compromissos cármicos para muitas encarnações futuras.

Assim, leitor querido, não há posição de vantagem social ou pessoal que não tenha o seu custo na responsabilidade espiritual com que deve ser exercida.

Se lhe cabe comandar alguma coisa, de uma casa a um país, não se esqueça de que você está sendo convocado a erguer os demais com exemplos de correcção e de abnegação virtuosa e que, em caso de defraudar tal mandato divino do qual você é, apenas, o modesto executor, inúmeras aflições visitarão o seu caminho e o abismo de remorsos e dores se abrirá para que nele você mergulhe.

Visões de mães desesperadas carregando filhos esquálidos surgirão diante de seus olhos que, em vão, tentarão se fechar para fugir de horripilante panorama.

Vozes lamentosas de doentes sem leito hospitalar, gritando de dor nas ruas onde morreram à míngua de atendimento por causa do sangramento dos recursos públicos para os bolsos particulares, na forma de comissões, de propinas, de juros, de “consultorias”, serão o espólio atormentado daqueles que se beneficiaram dos recursos furtados ao povo e que fizeram falta aos que sofriam.

A vantagem material que representaram em alguns momentos de gozo passageiro nada significará diante da dor moral que o indivíduo terá de enfrentar por longo período, no futuro.

Não se trata, contudo, de punição divina arbitrária e injusta. Trata-se da colheita dos frutos amargos de uma sementeira viciosa, que sempre dá ao lavrador a lição necessária a fim de que aprenda como não valeu a pena agir em desrespeito aos irmãos de humanidade.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:18 am

Todo o tipo de exploração de fraqueza humana produz, no caminho daquele que se beneficia com ela, a estrada esburacada, lodacenta e escura que o ensinará a refazer o seu estilo de viver.

Explorar o vício, a fraqueza sexual, a fragilidade da ignorância, a falta de cultura e de consciência na escolha, a miséria material ou moral, a fé ou a crendice amedrontando-a com vaticínios infernais, a carência afectiva, enfim, qualquer postura de inferioridade de alguém significa traição do dever de amparar o mais fraco, ajudar o caído, elevar o necessitado de ajuda, o que representará doloroso resgate no futuro, já que ninguém foge da verdade diante das Leis do Universo.

Da mesma maneira que é culpável por tais excessos, o administrador que vilipendia a moeda dos cofres públicos para seus fins pessoais ou de seu grupo de apoio na manutenção de sua tradição política;
da mesma forma que infringem os cânones divinos aqueles que se transformam em indústria de sedução física, atirando encantamentos ou exibindo corpos e formas aos olhares cúpidos e imaturos para o autodomínio;
infringem ainda mais profundamente tais padrões do Universo os que se valem das pregações da Verdade do Reino de Deus para convertê-las em indústria arrecadatória de dinheiro, aproveitando-se das necessidades pessoais e transformando os momentos de elevação espiritual em espectáculos que exibem vulgarmente a tragédia pessoal, transformando-a em propaganda do negócio.

O inferno dos pagãos reservava a esses comerciantes da verdade divina o pior dentre todos os sofrimentos.
E, se é verdade que na visão do mundo espiritual não se pode mais falar em inferno, no sentido físico da expressão, com seres votados eternamente ao mal a fustigarem os maldosos, prevalece para os comerciantes da fé a dura responsabilidade de sofrer as consequências de seus actos, seja do púlpito, do altar, do parlatório ou do palco.

Depois de terem ameaçado a credulidade ingénua com o fogo do inferno para melhor embolsarem vultosas quantias ou de terem pedido provas de amor a Deus através do montante de cheques e de valores, constrangendo os ouvintes a se desfazerem de coisas mediante a promessa de reembolso futuro com outras coisas, os profetas mundanos, traficantes de mercadorias que enriquecem suas vidas à custa de tal comportamento absolutamente divorciado dos Evangelhos, serão profundamente surpreendidos pelo que os espera na vida espiritual.

Cortejos de crentes enganados por seus argumentos estarão diante deles, requerendo o cumprimento de suas promessas ou a devolução de seu dinheiro, eis que o negócio não se concretizou na forma prometida.

Habitantes da escuridão se levantarão para perseguir os falsos profetas que fizeram a sua jornada através dos interesses pessoais, das negociatas escusas, transformando templos em balcão de transacções espúrias.

Essa traição ao postulado de Amor ao Próximo com desprendimento representará para o seu agente uma das mais cruéis sentenças, eis que outros tipos de maus exemplos, como os governantes corruptos ou os viciosos e fracos estavam, muitas vezes, apartados das mensagens edificantes da Boa Nova.

No entanto, aos sacerdotes de todos os credos que se valeram dela para obtenção dos bens da Terra, nenhuma justificativa se levantará para defendê-los no momento do acerto de contas.

Por isso, para todos nós, vale a pena pensarmos, de vez em quando, que chegará a hora de abandonarmos tudo sobre a Terra e partirmos para o reino da Verdade, onde nada fica escondido e onde o mais remoto e secreto sentimento acaba aflorado à vista de todos.

E, se uma secreta angústia o visita ao contacto de tal pensamento nesta página e neste momento, pense em refazer as coisas enquanto é possível.
Ajuste o decote de sua roupa, modifique a importância de seus músculos, rectifique os objectivos de seus investimentos, atenue a importância de sua aparência, corrija os equívocos de sua administração, devolva o que não lhe pertence, repare os prejuízos enquanto é tempo.

Abdique de ser pedra de tropeço na fé e na vida de seus semelhantes, pois, se não o fizer, não restará compensação suficiente em suas lembranças terrenas para lhe atenuar as aflições espirituais que o aguardam.

A Boa Nova vem resgatar do mal da ignorância as criaturas que podem trilhar o caminho da verdade, desde que tenham a coragem de tomar a iniciativa correta, aproveitando a vida para dela extraírem ensinamentos e crescimento para seus espíritos.

Por isso, Fúlvia e Pilatos representavam a velha ordem das conveniências frívolas e egoísticas que até os dias de hoje insistem em se enraizar nos corações.

Regressando a Jerusalém, como já explicamos, Pilatos voltou ao encontro de seu mundo de misérias douradas, colocando-se novamente sob a influência dessa mulher de baixos instintos, espírito leviano e irreverente, ao mesmo tempo em que se reencontrou com Sulpício, o seu homem de confiança que lhe servia de ajudante iníquo, que sabia de suas tramóias e trapaças e que se valia da sombra do poder para também se beneficiar à sua maneira.

Todos eles seguiam atrelados ao jugo do mundo, acreditando que esse era o mais importante de todos os caminhos.
Por essa época, findava o ano de 32 e o inverno já cobrava o seu tributo, diminuindo as actividades gerais e aconselhando o recolhimento aos seguros abrigos para que a sobrevivência estivesse garantida em face das fragilidades sociais ali vigentes.

Enquanto isso, ao norte, o Reino de Deus seguia produzindo a sua sementeira, com os discípulos que haviam sido espalhados para a difusão da Boa Nova retornando ao tugúrio do Senhor, levando consigo a rede repleta de feitos e de almas para ser apresentada diante do Divino Amigo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:18 am

Naturalmente que durante a missão conferida aos setenta, Jesus não interrompera a sua actividade, junto aos doze mais próximos seguidores, aproveitando-se das condições de pescadores para que se valesse do barco a fim de mais estender suas sementes.

Isso também era conveniente ao Mestre em face do avolumado número de desesperados e curiosos que o buscavam em uma localidade.
Se com os seu enviados ocorria tal fenómeno, ou seja, a multidão, depois dos primeiros feitos e das primeiras prédicas, se multiplicava geometricamente, tornando quase impossível a manutenção deles nos sítios específicos por longos dias, a figura majestática de Jesus, com maior razão, infundia mais veneração e interesse.

Assim, a existência da barca de Simão e do vasto lago de Genesaré permitia ao Mestre deixar um lado e dirigir-se ao outro sem que a multidão pudesse acompanhá-lo.

Ao chegar no outro lado, lá estava uma comunidade virgem e pronta para ser trabalhada, sem os problemas decorrentes do avolumado número de pessoas a exigir-lhe favores ou interromper-lhe a revelação do novo Reino.

Os deslocamentos por terra, sempre mais demorados e difíceis, desestimulavam os simpatizantes a viajarem ao redor do lago, até porque Jesus não revelava aos que ficaram para onde estava se dirigindo.

Acompanhado por seus discípulos, homens experientes na navegação e na pesca, Jesus deliberava passar de um lado a outro do vasto aglomerado aquoso, sendo certo que, em inúmeras ocasiões, pregou a Boa Nova do interior da embarcação ao povo das margens.

A grande maioria dos enviados do Cristo para a pregação da mensagem de Deus aos sofredores teve tal sucesso que, ao regressarem, junto deles pequenina comitiva os acompanhava, como ocorrera com Zacarias e Josué, que trouxeram Cléofas e Saul para junto da comunidade apostólica.

Assim, ao final de tal período, ainda no ano de 32, já havia uma pequena multidão de seguidores e adoradores do Cristo que, mesclados entre homens e mulheres, representavam o cortejo dos novos semeadores que vinham buscar as sementes no armazém das bênçãos.

Ali estavam muitos dos que foram curados, dos que tiveram espíritos obsessores afastados, o que lhes propiciou recuperar o equilíbrio emocional e mental, dos que diziam ter encontrado a verdade nas exortações morais, cheias de esperanças e belezas.

E com isso, ainda que Jesus tivesse também caminhado com os seus doze amigos por muitas localidades fazendo a tarefa que o Pai lhe houvera confiado, a julgar pelo volume das necessidades e pelas angústias populares, em breve se tornaria extremamente difícil que Jesus exercesse o seu ministério, fosse pelo aglomerado de curiosos e devotos, fosse pelos zelos ciumentos que os fariseus e os demais membros das castas dominantes vinham sentindo diante de tal popularidade.

À medida que crescia o movimento da Boa Nova, crescia o número dos seus antagonizadores, todos eles de caso pensado e intenção medida para impedirem o avanço da Verdade que os derrubaria de seus postos miseráveis.

Por isso, com a chegada dos setenta, trazendo muitos outros consigo, Jesus se vira rodeado de uma grande comitiva a qual deveria alimentar e municiar com as sementes do armazém divino enquanto tivesse tempo suficiente para fazê-lo, preparando-os para as novas lutas que surgiriam em breve no caminho de todos.

A reunião dos emissários, à medida que iam chegando, produzia imenso júbilo na família apostólica, que se ufanava por saber quantos paralíticos haviam abandonado seus cajados, quantos cegos haviam recuperado a vista, quantos “demónios” – na verdade, espíritos ignorantes que influenciam as criaturas – haviam desistido de tal perseguição e se afastado, liberando os perseguidos.

Era uma reunião de soldados vitoriosos no Bem, exultantes pelo regresso diante da grande seara que pôde ser semeada.

E muitos traziam as provas vivas dos feitos da Boa Nova na pessoa dos que os acompanhavam espontaneamente até a presença de Jesus, que os recebeu com amoroso acento de gratidão e alegria.

Assim, com a chegada de Zacarias e Josué não foi diferente.
Tão logo puderam avistar-se com Jesus, foi com justo interesse que o divino amigo ouviu-lhes a narrativa dos feitos, sobretudo porque vinham da cidade onde se radicava a família carnal do Mestre.

– Assim, meu senhor – dizia Josué, com entusiasmo – ao falarmos do Reino de Deus e do teu nome, as pessoas se curavam, os corações se abriam e muitos, emocionados, abraçavam os ensinamentos.

E ajudando-os na descrição viva, Zacarias rematava:
– Tudo o que nos prometeste, efectivamente aconteceu e, se não fosse tão estrondoso o sucesso da verdade, nós não nos veríamos forçados a ficar tão pouco tempo em cada lugar.
Uma vez que as pessoas se inteiravam dos prodígios que a Tua mensagem produzia, como formigas saindo de buracos, a multidão se achegava de tal maneira que, no segundo ou terceiro dia já não havia mais condições mínimas de se levar a palavra com a paz necessária.

Emissários dos governantes locais, espias dos fariseus, sacerdotes inescrupulosos já tramavam a nossa derrocada, através de perseguições ocultas com as quais pensavam conseguir nos destruir.

No entanto, sempre contávamos com a ajuda de alguém, mesmo fariseu simpatizante, que nos livrava das armadilhas dos lobos.

Ouvindo-o com um brilho especial no olhar, Jesus sorria em silêncio.
Seu semblante como que demonstrava estar a par de todas aquelas coisas, mas que partilhava das alegrias e da alvorada da Boa Nova no coração dos seus amigos, empolgados com o sucesso inicial.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:18 am

E como quem desejasse que todos ao redor fossem informados sobre a amplitude da sementeira, Jesus perguntou, dando mostras de sua capacidade de tudo conhecer:
– E, Zacarias, mesmo perante o governador foi pregada a mensagem do Reino?

Surpreendido pela indagação que demonstrava ter Jesus a ciência de que haviam estado diante do mais alto representante do Império terreno naquela região, Zacarias, emocionado, revelou para espanto de todos:
– Senhor, tua sabedoria bem identifica os detalhes que nossa cegueira quase deixa passar, ante a alegria de rever-Te.
Sim, Mestre, pensávamos que iríamos ser presos ou que algo mais grave nos fosse acontecer.

No entanto, estivemos diante de Pilatos e pudemos falar das belezas do Reino que tem sido pregado por toda a Galileia.
Pilatos ouviu com atenção e demonstrou interesse nos conceitos elevados, de tal maneira que lamentou não poder renunciar aos compromissos de seu cargo nem aos deuses de seus pais para abraçar tão formosa doutrina estrangeira, o que seria, para ele, um risco e um desprestígio.

Ainda assim, ouviu-nos respeitoso e nos libertou, ofereceu-nos hospedagem e forneceu-nos alimento para a viagem, impedindo que os fariseus miseráveis conseguissem nos prejudicar conforme era o desejo imediato deles.

Ouvindo a afirmativa daquela hora, os demais seguidores do mestre exprimiram a sua euforia entre palmas e expressões que louvavam a bondade de Deus e a superioridade de Jesus entre os mais poderosos humanos.

E pressentindo a necessidade de aproveitar a oportunidade para ensinar a todos que os frutos de qualquer sementeira pertencem ao dono das sementes, Jesus os adverte:
– “Eis que vos dei o poder para pisar serpentes, escorpiões e todo o poder do inimigo.
Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos estão sujeitos, mas alegrai-vos de que os vossos nomes estejam escritos nos céus”.

Com tais palavras, os seus seguidores entenderam que não era de euforia de vitória que se deviam orgulhar e ufanar.
Afinal, tudo isso representava a exaltação da personalidade mesquinha sempre em constante competição umas com as outras, o que produzia conflitos sem fim entre as pessoas.

O desejo de supremacia sempre produziu mais guerras do que qualquer ambição material, já que ele está arraigado no íntimo de cada pessoa, a produzir conflitos de grande ou pequena monta em todos os lugares, nas diversas guerras particulares que as pessoas travam entre si por questões de opinião, de prevalência de pontos de vista, de imposição de autoridade.

Assim, cumpria combater a ideia da superioridade mesquinha de homens sobre homens, para tão só enaltecer a grandeza de Deus, que os havia convocado para a tarefa por neles confiar e depositar o crédito que os havia mantido vigilantes e protegidos na jornada difícil que encetaram.

Era a visão superior que falava da alegria por terem sido eleitos e levado a bom termo a obra de Deus.
Não mais a arrogância humana que se colocava por cima dos que não pensavam como eles, dando mostras de poder para curar, expulsar demónios ou coisas do tipo.

A interpretação do Cristo trazia-os para a visão mais ampla de que a guerra não seria travada com os semelhantes, mas, ao contrário, dependeria de cada um julgar-se preparado para tirar de dentro de si mesmo esses laivos de personalismo que até os dias atuais ainda contaminam as mentes e os corações nas constantes disputas por superioridade em todos os sectores da vida.

Jesus falava com clareza que a felicidade das pessoas não está na sua capacidade de superar os demais, convencendo-os com poderes argumentativos ou com efeitos sobrenaturais.

Estava em se considerarem felizes porque Deus lhes havia confiado alguma coisa, escrevendo-lhes o nome nos céus, como maneira de lhes dizer que a recompensa não estará nunca no reino transitório onde as alegrias são fugazes e as vitórias tão precárias.

Ter o nome escrito no céu é a maior alegria e é a maior premiação que alguém pode ter por estar a serviço do Bem.
Nenhuma outra lhe é suficiente e nenhuma outra lhe basta.

Quando os verdadeiros cristãos não estiverem mais à cata de postos de direcção, nem de colocações que lhes realcem ao personalismo, nem de reconhecimento que lhes exalte o nome com respeito e acatamento nos meios de comunicação;
quando os simpatizantes de todas as religiões cristãs em geral, e do espiritismo-cristão, em particular, deixarem de ser cultores do intelectualismo que faz crescer a musculatura da vaidade cultural em detrimento da essência da Boa Nova e assumirem o trabalho anónimo e desprendido que lhes garanta apenas a inserção de seus nomes nos livros celestes como bons e devotados trabalhadores, aí então terão compreendido a mensagem do Evangelho e poderão ser colocados em tarefas mais importantes do que a de dirigentes de casas de caridade formal, de administradores de cestas de alimentos e de espalhadores de bens, mais preocupados com números e quantidades do que com a qualidade de afecto com que fazem as coisas.

Enquanto isso não é compreendido por muitos dos que tentam se alistar nas linhas do conhecimento espiritual buscando nelas o alimento para a própria vaidade, vai a Boa Nova claudicando na mão de criaturas que dizem ter boa vontade, mas que a exercitam apenas em proveito de si mesmas e de suas ambições pessoais de mando e de supremacia no burgo ou no feudo onde se acham inseridos e que pensam comandar ou dirigir.

Espíritas, escutai Jesus dizendo aos seus seguidores:
“Alegrai-vos por terdes os seus nomes escritos nos céus”.

E, modestamente, parafraseando-lhe o conselho, acrescentamos:
Alegrai-vos de que somente Deus, nos céus, conheça as vossas virtudes no anonimato de vossos exemplos e renúncias pessoais nas lutas da vida na Terra.

No céu estará a única recompensa que vale a pena.
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26 - O Pedido de Jesus

Iniciado o ano de 33, estava se tornando cada vez mais concorrida a participação na vida pública de Jesus, uma vez que a chegada de muitos homens e mulheres que abdicavam de suas misérias pessoais para se juntarem ao séquito que buscava o consolo, e o aprendizado ampliara significativamente o número dos seus seguidores próximos.

A multidão continuava a ser a que o buscava para receber as migalhas da verdade, através de coisas ou vantagens, geralmente na melhora física ou no reequilíbrio do espírito.
Sempre ávida por algum lance espectaculoso, a grande chusma de curiosos misturava-se aos necessitados e isso fazia crescer o volume dos que se comprimiam para ver e ouvir Jesus.

Dessa maneira, muitas vezes o Mestre deixava uma região demandando outros lugares mais afastados, para onde ele sabia que a maioria não poderia segui-lo, ao mesmo tempo em que poderia levar a mais pessoas a sua palavra de fé e esperança no Reino Divino.

Em sua tarefa, aceitava a companhia dos doze que o seguiam quase sempre todos juntos e a de muitos dos setenta e a de mais alguns que se haviam agregado ao colégio apostolar.

Tinham eles, ainda, a função de seguir adiante para avisarem da chegada do Messias e prepararem pousada ao Senhor a fim de que as bases para a tarefa estivessem arranjadas quando da chegada dos mesmos àquela comunidade.

Estando, assim, em uma dessas visitas à região um pouco mais afastada do lago, certa noite, em que os seus seguidores já se haviam recolhido depois de um longo dia de caminhadas e constante vigilância para protegerem o Mestre dos caprichos da turba que dele se acercava, Zacarias estava acordado, pensativo, sentado ao relento e fitando no firmamento o faiscar das estrelas, como a imaginar o que seria do futuro.

Naquela noite, nas conversas colectivas, Jesus havia alertado a todos, mais uma vez, para a notícia de sua partida da Terra.
Falara com uma emoção diferente, referindo-se às atrocidades de que seria vítima e que deveria dar testemunho de tudo aquilo que estava ensinando aos homens para que pudessem acreditar que tudo era verdade.

Os discípulos, naturalmente, rechaçavam tais referências, sempre afirmando que isso não ocorreria e que eles o defenderiam, ao que observavam que Jesus se calava e sorria um sorriso triste como a lhes dizer que os fatos provariam o contrário.

No entanto, no coração de Zacarias, os dizeres de Jesus produziam um aperto e uma angústia que, naquela noite, lhe haviam tirado o sono.

Como será que todos ficariam se tudo aquilo que o Mestre estava afirmando ocorresse mesmo?
Se o Reino de Deus se visse privado de seu principal propagador, vencido pelos adversários da verdade tão pouco tempo depois de ter iniciado a sua implantação entre os homens, como poderia ele prevalecer sobre a maldade?
Se a treva tinha tanto poder, como as pessoas poderiam acreditar no poder do Bem que se via destruído tão precocemente?

Ele próprio não se sentia capacitado para fazer algo tão grandioso como o Cristo o realizava e sabia que nenhum dos seus seguidores, sozinhos ou agrupados, teria tal condição, o que impossibilitaria todo o progresso da mensagem, condenada ao desaparecimento sem o alicerce sobre o qual se levantava.

Todas estas cogitações incomodavam o sentimento de Zacarias, que não tivera a coragem de falar delas directamente a Jesus.
Desde que voltara de Nazaré, o Mestre se dirigira várias vezes a ele para conversar e ensinar, mas Zacarias, em momento algum, tomou isso como uma intimidade que ele pudesse explorar para invadir a atmosfera do Senhor e incomodá-lo com suas indagações ou questionamentos, coisa que os doze tinham facilidade em fazer, pela maior proximidade que guardavam com Jesus.

No entanto, naquela noite se sentira muito tocado pelos vaticínios amargurosos que o Mestre mencionara e não conseguira deixar de pensar nisso tudo.

Isso porque ele sabia, por experiência própria, que Jesus nunca mentia ou falava sem motivo.
Tudo o que dissera, se convertia em facto e em verdade plena na vida dos que o cercavam ou o escutavam.

Muitas advertências, ele as dava de forma indirecta ou velada, de tal maneira que o ouvinte podia não compreender, no exacto momento, o alcance de suas palavras, mas tão logo as experiências chegavam no caminho da pessoa, imediatamente ela se lembrava daquilo que Jesus havia falado, alertando-a sobre os riscos e aconselhando condutas diferentes, dentro do padrão do Reino de Deus que ele viera inaugurar.

E a solidão do ambiente, o silêncio e o isolamento garantiam a Zacarias o necessário conforto para que pudesse pensar sem ter que dividir suas preocupações e emoções com ninguém.

Sentindo-se livre desse modo, Zacarias se deixou levar pela emoção e as lágrimas vieram-lhe aos olhos, lembrando-se de tudo o que havia enfrentado em sua vida antes e depois daquele encontro tão importante em Jerusalém, anos já transcorridos.

Encontrar Jesus foi o maior horizonte para seu espírito.
Lembrou-se de como era antes, como homem do mundo.

Seus sofrimentos, suas misérias, sua frustração afectiva com o abandono, a solidão e a revolta contra a esposa e o traidor que a seduzira, o modo como se comportava com os seus fregueses, sempre em busca de dinheiro ou de ganho, lembrou-se de Absalão.
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Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ - Página 5 Empty Re: Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:19 am

Depois, voltou sua mente para o que ele era hoje, um pobre homem, sem nada mais do que outrora ele julgava importante em face do mundo.
Agora era apenas um seguidor de Jesus, mas a felicidade que possuía agora não se podia comparar com aquela que pensava que tinha antes.

Perdera todas as coisas materiais para conquistar a serenidade e a paz íntima.
Quando possuía os bens transitórios, vivia atarantado em aumentá-los ou em não perdê-los, desconfiado e inquieto.
Recordou-se de Judite e do encontro na porta da casa velha que lhe servia de moradia e que era compartilhada por irmãs que decaíram do respeito a si próprias.

O encontro no qual tudo se revelara, na presença do sedutor de outrora que se havia transformando em irmão de caminhada por força do verdadeiro amor que, naquela hora, pedira dele, Zacarias, o testemunho da verdade.

Jesus falara naquela noite que, se todas as coisas amargas não lhe acontecessem, o Reino de Deus não seria digno de fé no coração das pessoas.

Ele deveria padecer para ensinar a verdade.
Zacarias havia sentido que isso era a mais pura realidade.
Sentira isso na carne, tendo que enfrentar as pessoas que o feriram e ver-lhes a condição frágil de seres humanos inquietos, ao mesmo tempo em que teve que dar testemunho pessoal de tudo aquilo que suas palavras pregavam.

Não bastara ser o veículo da cura física ao leproso abandonado, Cléofas.
Era necessário descobrir nele o insensato homem que lhe causara a dor moral do abandono e ser capaz de continuar a amá-lo, não mais em nome de Jesus, mas em nome próprio.

Quando lhe impusera as mãos na tapera onde vivia, fizera-o em nome de Deus e do Cristo.
Mas quando descobriu de quem ele, efectivamente, se tratava, precisara adoptar a postura que as palavras do Cristo tanto repetiam, e perdoar-lhe em seu nome pessoal.

Ter conseguido fazer isso lhe deu uma tal fortaleza moral que o fazia sentir-se imbatível.
Passara pela sua prova pessoal a qual, graças à sabedoria do que havia compreendido, pudera levar a bom termo, resgatando as duas almas equivocadas – Cléofas e Judite – para o trabalho da reconstrução de suas vidas através do serviço no Reino da Verdade.

– Que Reino estranho era esse?
Não era feito de príncipes ou reis de tradição nobre.
Começou com um carpinteiro, que escolheu pescadores e homens do povo, praticamente analfabetos todos, e depois aceitou como súbditos os miseráveis, esfarrapados, aleijados, doentes, leprosos, feridentos, prostitutas, publicanos, tudo aquilo que um reino humano desperdiçaria por considerar escória.

A coroa eram as estrelas, o manto imperial, a beleza do céu.
O ceptro eram os braços e mãos que atendiam os caídos e o trono era o altar do coração, oculto no peito, mas que vibrava no olhar e nas palavras.

E os ajudantes do rei eram os miseráveis que se regeneravam, não à custa de cadeias e castigos, mas, justamente, quando venciam as cadeias do ódio e do erro e deixavam de se castigar com o remorso e a culpa, transformando-os em pedido de perdão vivo através do trabalho em favor dos outros e, ao mesmo tempo, perdoando sempre os que houvessem errado.

Estranho reino esse, feito de fracos e vencidos no conceito do mundo, mas onde Deus encontrava os adeptos fiéis e trabalhadores valorosos para as obras do seu Reino – pensava Zacarias.

Todos estes pensamentos fervilhavam em seus neurónios de tal modo que Zacarias não percebeu que alguém se aproximava.
Era Jesus que, sozinho, viera ao seu encontro naquela noite estrelada e fresca.

– Teus pensamentos, meu filho, nunca devem vislumbrar as coisas pelo véu da escuridão.

Assustado com a intromissão em seus devaneios, Zacarias levantou-se rapidamente, como que a demonstrar seu respeito pelo Mestre venerado.

– Senta-te, meu amigo.
Vamos conversar um pouco sobre o futuro.

Dizendo isso, Zacarias voltou a sentar-se onde estava e Jesus fez o mesmo, pondo-se, acomodado, ao seu lado.

– Se observares bem, Zacarias, somente envolvidas pela escuridão é que brilham as estrelas.
Eu venho, em nome de meu Pai, acender as estrelas que estão no coração de meus amigos, não para que se apaguem ao sabor da primeira brisa.
Faço-o para que, como as que estão no céu desta noite, brilhem e encantem a escuridão, servindo de inspiração aos pensamentos de amor, de roteiro aos que precisam seguir os seus caminhos a fim de que não se percam.

Quando a tempestade ataca as paisagens, parece que elas se afugentam.
No entanto, acima das nuvens elas velam, pacientes, esperando a tormenta caprichosa passar a fim de que voltem a se mostrar com o seu brilho fiel e perseverante.
Sem as dificuldades que nos cercam, nenhum de nós poderia tornar-se uma delas, pois o destino da estrela é brilhar por causa da escuridão.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:19 am

Sem a treva da noite elas não se divisam.
Desse modo, filho, é preciso que a treva envolva a estrela que Meu Pai enviou ao mundo para que os que se prendem à escuridão possam ver-lhe a luz faiscante na hora da maior noite.

Nessa ocasião, desejarão tornar-se uma estrela também.
Afinal, de escuridão todos são professores nesta vida.
Falta-lhes, no entanto, o desejo de se iluminarem e somente esse contraste forte poderá lhes mostrar que a noite pode cobrir com o seu manto todas as coisas, mas é incapaz de aplacar a menor das estrelinhas do céu, que continua brilhando vencedora sobre a treva mais compacta.

Não te amofines, Zacarias, por tudo aquilo que está para acontecer, pois tudo isto já foi preparado por Meu Pai há muitos e muitos séculos.
Agora chegou a hora da libertação dos erros.
Será árduo o trabalho, mas doce a vitória.

Ouvindo-lhe a palavra inspirada com a qual Jesus pretendia ensiná-lo a ser diferente na análise das coisas, Zacarias se sentiu encorajado a comentar:
– Mas por que é necessário o sofrimento de um ser tão puro para que os homens acordem para a verdade, Senhor?
– A natureza não salta pelas etapas que lhe cumpre obedecer.
Sempre que desejamos melhorar as coisas, impõe-se que nos aproximemos do erro e suportemos a sua companhia, sem a qual nunca o corrigiremos.

Há pessoas que pensam que belos discursos podem alterar as almas.
Põem-se a falar de belas ideias com belas palavras como se pregassem do alto de uma colina aos miseráveis do vale.

Estes o escutam, mas não o seguem.
Estão cansados e feridos demais para subir a montanha.
Além disso, esse pregador é um desconhecido a quem não admiram nem respeitam.

Como pode um médico tratar de doenças se nunca viu um doente?
Por mais que tenha conhecimentos teóricos, nunca terá credibilidade nem acertará os diagnósticos, a não ser quando se aproximar do enfermo malcheiroso e examinar-lhe as feridas.
Assim, Zacarias, quando pretendemos ser instrumentos do Bem, precisamos nos valer das armas do Bem e descer ao vale da maldade.

Os maldosos estão armados com as armas que julgam ser as que mais lhes garantem a protecção.
Até que acreditem no forasteiro, que vêem como um invasor de sua tranquilidade miserável, tentarão proteger-se, atacando-o com suas armas.
Se o pregador do bem não for tão bom como pensa, afastar-se-á do desafio, desistindo de ajudá-los.

E se o pregador não se valer do escudo da bondade que está pregando e, colocando-o de lado, defender-se com as mesmas armas agressivas dos que o açoitam, igualmente deixará de merecer o crédito em tudo aquilo que está falando, pois seus ouvintes identificarão nele um igual, sem nenhuma coisa diferente a mostrar-lhes.

Assim, os que descem ao vale, mais do que de palavras, devem estar revestidos de fortaleza moral, perseverança, paciência, confiança em Deus e absoluta renúncia e abnegação para aceitar os golpes e agir por padrões que os enfermos da ignorância desconhecem.

Só assim darão provas de que está portando um poder novo e maior do que aquele que os demais pensam ser o único que existe.

Ensinar sem viver é oferecer rosas às areias do deserto.
Suportar as agressões com uma outra maneira de ser, ensinará aos que vivem nas trevas que a luz é mais poderosa do que qualquer outra coisa.

Sabendo brilhar em vez de se tornar opaca, quanto mais treva a envolver, mais luz se destacará para confundir os trevosos e ensinar-lhes um novo caminho que eles não conhecem, ainda.

E, mesmo que com cicatrizes profundas e ferimentos dolorosos, a tarefa daquele que aceita descer ao vale com a perseverança de educar pelo exemplo irá ser recompensada pela grande quantidade de criaturas que deixarão as trevas e aceitarão o reino da luminosidade, acompanhando o devotado servidor que aceitou ser machucado para que os outros despertassem.

E se o pregador se retirasse ante as primeiras pedradas?
Não seria digno da tarefa para a qual foi enviado.
Assim é com tudo na vida, Zacarias.
Quem faz o bem e não sofre por isso, está longe de ser bom realmente.

Quem sofre fazendo o bem e persevera, sem desistir, sem se abater, sem desanimar e sem ter raiva dos que o agridem ou que não o compreendem ou ajudam, este sim, é digno de ser reconhecido como a estrela que brilha, o emissário de Meu Pai, o agente do Amor.

Os que se pensam bons, mas não possuem cicatrizes da luta, são ainda os pregadores do alto da montanha.
Falta descer ao vale das misérias humanas e sofrer com a sua companhia para ajudar a melhorá-las e para aperfeiçoarem, com o próprio testemunho, a bondade que pensam, inocentemente, já estar desenvolvida dentro de si próprios.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:19 am

Tudo isso aconteceu convosco quando estivestes em Nazaré.

– Sim, meu senhor.
Tudo isso ocorreu comigo pessoalmente e reconheço a exactidão de teus ensinamentos.
– Por isso, Zacarias, guarda a coragem de seguir como és, pelos caminhos luminosos e verdadeiros, aceitando a companhia dos maus e perseverando com teus exemplos para domá-los com o teu carinho.
E, se me permites estender as tuas tarefas, tenho algo pessoal a pedir-te.

Tocado em seu mais íntimo sentimento, Zacarias empertigou-se e asseverou ser o escravo por opção, que acata os pedidos de seu senhor como ordens, ainda que venham envolvidos no veludo da delicadeza de uma solicitação.

– Daqui a não muito tempo, a noite fechada irá envolver a estrela que Meu Pai enviou para brilhar nos caminhos dos homens.
E sobre alguns deles vai pairar a responsabilidade de minha condenação injusta, atendendo às pressões que a ignorância fará para atingir os seus objectivos.

No entanto, o Reino de Deus é para todos, principalmente para os que se perdem nos erros de governo e nas responsabilidades na condição de criaturas.
Assim, como foste o primeiro a te aproximares do governador na noite em que fez brilhar o primeiro raio de luz aos seus olhos imaturos, quero pedir-te que, seja como for e o que acontecer comigo por culpa da fraqueza desse nosso irmão em crescimento, não o abandones.

Quando eu não estiver mais fisicamente entre vós, estarei buscando as ovelhas perdidas que meu Pai me confiou e gostaria que fosses o instrumento do pastor, procurando resgatar essas criaturas que se perderam nos desmandos e no descumprimento do dever.

No primeiro momento, parecerão vitoriosos.
No entanto, não tardará para que o peso da culpa lhes fustigue a alma e para que a perda de todos os privilégios os reduza à miserável condição de desditosos semelhantes, pouco diferentes dos leprosos que nos procuram a ajuda, pelos séculos do futuro.

Dentre todos estes, peço a tua ajuda para que este, em particular, seja acompanhado pelo teu carinho, para onde for, onde estiver, a fim de que, no momento adequado, voltes a falar-lhe do Reino de Deus que não o esqueceu nem excluiu.

Lembra-te, no entanto, de esperar a melhor hora.
Segue-o de longe e estejas a postos, pois na ocasião adequada te será revelado como agir em favor de sua recuperação.
Eu estarei contigo como sempre estive.
Posso contar com teu auxílio?

Algo confundido e, ao mesmo tempo, desejando esclarecer as coisas que estava imaginando sem entender bem, Zacarias perguntou reticente:
– Senhor, te referiste ao governador Pilatos?
– Não, Zacarias, estou me referindo ao nosso IRMÃO Pilatos, que é, apenas, o que sobrará dele depois de tudo o que vai ocorrer.
Ele precisará muito de ti e, pela impressão que já produziste em sua alma, será mais fácil que te receba na hora amargurosa que o espera e que será o momento áureo de sua transformação.

Nada do que ele fizer ou deixar de fazer deverá interferir no teu amor por esse nosso amigo.
Tua tarefa consistirá em consolá-lo a fim de que ele esteja semeado de boas sementes.
A eternidade se incumbirá de fazê-las germinarem.

Não esperes por resultados imediatos.
Mesmo que ele te repudie, que não te escute, que não deseje tua companhia, persiste sempre.
Estejas próximo, solícito e sorridente.
Dia chegará em que o poderoso governador não terá ninguém mais ao seu lado a não ser a ti mesmo.

Desejando corresponder ao pedido de Jesus com o mais nobre de sua alma, Zacarias respondeu, sincero:
– Senhor, Teu pedido é a minha vontade.
Se Teu coração vê em mim qualidades que eu não consigo, por mim mesmo, encontrar, eu as colocarei integralmente a serviço dessa tarefa, na qual verei a Tua solicitude e o Teu amor antes de qualquer coisa.

Atenderei esse irmão com todas as forças do meu ser e seguirei seus passos por onde for necessário a fim de sustentá-lo com a esperança do Reino de Deus e de Teu coração afectuoso.

Feliz por aquele colóquio tão significativo naquela hora de entendimento que se estenderia pelos séculos vindouros, Jesus colocou sua mão sobre a fronte de Zacarias e elevou o olhar ao firmamento, como a pedir que as estrelas do céu passassem a emprestar o seu brilho àquele companheiro, que aceitara ir ao sacrifício para levar a esperança ao adversário da verdade.

No interior de Zacarias, parece que uma das estrelas do céu, naquela noite, veio habitar, iluminando-lhe para sempre o coração.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:20 am

Depois de algum tempo, Jesus ergueu Zacarias e o conduziu ao local do repouso, a fim de que, no silêncio do sono, pudesse o seu novo emissário encontrar o descanso necessário e a preparação para as tarefas que lhe consumiriam boa parte dos dias do futuro naquela existência e, nas vindouras, todas as preocupações em manter-se fiel ao mandato que lhe fora outorgado por Jesus.

Esta fora a única vez que o Messias lhe houvera falado assim, na solidão do entendimento e, igualmente, seria a última entrevista pessoal com a sua sabedoria.

A partir de então, conversariam apenas com os olhares, eis que uma misteriosa capacidade de sentir Jesus no seu interior lhe fora conferida por aquele gesto de bênção durante o qual o Mestre invocara a protecção a Zacarias naquela noite.

Não se falariam mais por palavras, mas em todos os momentos que Jesus lhe mirava com os olhos lúcidos, Zacarias sabia o que o Mestre estava desejando dele.
Josué continuava seu amigo chegado, o mesmo acontecendo com Saul e Cléofas que, aproximados de Jesus, ganhavam vida nova, e tantos exemplos de abnegação e renúncia ofereceram que, por seus próprios méritos, conquistaram o respeito e a gratidão dos mais antigos servidores e discípulos do Mestre.

Estavam sempre juntos e sempre que possível se ajudavam e aumentavam o número dos simpatizantes e amigos no grupo dos seguidores pelo muito que serviam aos sofridos.

Alguns discípulos mais próximos do Cristo se demonstravam sempre rudes na defesa da integridade e do sossego do Senhor.
Todavia, os quatro amigos providenciavam sempre uma maneira de acolher os que se lhes acercavam, consolando-os, conversando e escutando as suas misérias, mesmo quando Jesus estava ausente, percorrendo outras paragens.

Muitas vezes, Josué falava das verdades que aprendera de Jesus ao povo que se reunia esperando a chegada do Senhor, para as pregações diárias.
No entanto, à medida que o tempo passava, mais e mais o Mestre se ia entristecendo, como se um véu de amarguras lhe toldasse o olhar.

Estava mais calado e pensativo nas longas noites em que passava em orações solitárias, único horário em que tinha tranquilidade para conversar com o Pai sem ser importunado pelas pessoas e pelos seus próprios seguidores.

Seus avisos se multiplicavam e os discípulos não os gostavam de escutar, pois estavam se entusiasmando com o sucesso e a publicidade de todo aquele movimento.
Alguns, inclusive, passaram a imaginar que ele seria, efectivamente, o libertador do povo como um revolucionário armado a subverter a ordem estabelecida.

Judas era destes que imaginavam estar a serviço de uma revolução mais militar do que moral e, assim, tramava nos bastidores uma ampliação do movimento, fazendo contactos com outros descontentes do povo, espalhando clandestinamente a notícia de que o dia da liberdade havia chegado.

Aproximava-se a comemoração da páscoa judaica, e o desejo de Jesus em passar essa data na capital do povo, para onde acorriam todos os que podiam viajar, fazendo ferver as suas ruas, era um dos mais fortes indícios de que, no fundo, Jesus estava indo para lá a fim de dar o início à revolução.

Pensavam os partidários de tal ideia, viciados pelos equívocos morais, que Jesus houvera começado o apostolado da maneira como o fez a fim de arrumar mais e mais adeptos no seio do povo, espalhando benefícios e curas para que mais e mais criaturas pudessem conhecer o seu poder e se aliar à causa.

Por isso, raciocinava Judas, que melhor momento do que a páscoa para começar o movimento?
Ali em Jerusalém estariam milhares de pessoas que tinham sido atendidas por ele, curadas por suas mãos, que lhe haviam ouvido as palavras e se encantado com a promessa de um novo reino.

Lá seria o melhor local para que o movimento tivesse início e, assim, valendo-se de seus amigos mais chegados, espalhou a notícia, sorrateiramente, para que ninguém soubesse a sua origem, de que naquele período seria iniciada a modificação das coisas.

Que se preparassem com recursos armados para eventual luta contra o invasor romano.
No momento adequado, a ordem seria dada e todos deveriam estar preparados para enfrentar o inimigo romano em muito menor número e encastelado nas muralhas da cidade.

Não seria difícil derrubar o invasor e, sobre ele, vencido, estabelecer uma nova ordem onde a tradição de Abraão ocupasse o seu devido lugar, conforme Javé houvera prometido um dia, nos remotos evos descritos pela tradição religiosa.

Assim estavam as coisas preparadas, no clima da revolução não proclamada, mas insinuada, quando a páscoa do ano 33 chegou.
Por motivos de segurança pública, Pilatos houvera regressado a Jerusalém para ali estar nesse período turbulento das festas religiosas, tão propícias ao desejo de liberdade do povo judeu.

Afinal, era na páscoa que se comemorava a conquista da liberdade quando o povo estava cativo no Egipto distante.
Mais e mais soldados foram trazidos para a cidade e, ainda assim, eram muito poucos diante do contingente da massa humana que para lá acorria nessa semana de orações, oferendas, sacrifícios e intrigas religiosas e políticas.

Convencido de que ali seria um local muito favorável para encontrar notícias do filho desaparecido, Públio e sua família deixaram Cafarnaum e regressaram à capital, agora para uma confortável moradia que Públio havia comprado para ali permanecer longe da influência nociva dos seus parentes, entre os quais da perversa Fúlvia, que se preparava para seguir com seus planos de levar a infelicidade àquela que pensava ser a sua concorrente nas preferências de Pilatos.

Deste modo, tudo estava preparado para os decisivos actos que a tragédia humana conhece como a maior de suas quedas, o mais tenebroso gesto de violência e de trevas, mas de onde os homens ofereceram o negro ambiente para que a Luz da Verdade se imortalizasse em seu brilho rutilante no horizonte das criaturas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:20 am

27 - A Páscoa e a Prisão

Aquela seria uma semana decisiva na vida de todos os integrantes desta história e, de resto, no destino de toda a humanidade.

A chegada do Mestre a Jerusalém fora precedida por uma longa jornada na qual inumeráveis seguidores o acompanharam até a capital religiosa e política da nação, passando por povoados e vilarejos onde eram recebidos pela alegria dos moradores, já conhecedores da fama e da bondade do Cristo.

Adensando-se a caravana dos que lhe faziam companhia, a passagem do Mestre por Betânia, pequeno povoado nas cercanias de Jerusalém, fora algo extremamente impactante, notadamente porque ali, na companhia dos amigos tão queridos, Marta e Maria, que pranteavam a morte de Lázaro, para surpresa de todos, Jesus contrariaria a evidência afirmando que Lázaro não havia morrido, mas que estava dormindo.

Dito isso, dirigiu-se até a porta do túmulo de onde, atendendo ao seu chamamento doce e firme, o próprio Lázaro – que todos acreditavam ter morrido já há alguns dias e cujo corpo físico já apresentava sinais de necrose – levantou-se, enfaixado e atontado, aparecendo à porta para espanto de todos.

Tal feito fora, na verdade, a concretização material de um poder que muitos tinham escutado ser real, mas que ainda lhes parecia fruto do entusiasmo popular, sempre a aumentar as coisas à medida que as notícias se vão espalhando.

No entanto, ali não havia dúvidas sobre essa capacidade.
Os discípulos directos se maravilharam com a maneira de Jesus demonstrar o seu poder, diante do povo que o seguia, e Judas, crendo que isso fazia parte da estratégia do Senhor, fez, mais do que depressa, correr a notícia de que o libertador, o verdadeiro Rei dos Judeus estava chegando, aproveitando-se da alcunha que o povo miserável e sofrido usava para se referir à figura imponente e humilde do Cristo.

Distando poucos quilómetros de Jerusalém, facilmente se propagou a notícia do milagre ocorrido em Betânia e, desse modo, a afirmativa de que o motim libertador se aproximava inflou de esperanças a alma rebelde de muitos dos judeus que, sedentos de liberdade, mais se deixaram inflamar pela perspectiva da revolta prestes a iniciar-se.

Do mesmo modo, a fama de Jesus causava preocupações na alma dos sacerdotes e fariseus, que temiam a sua doutrina porque ela lhes impunha uma modificação radical na maneira de viver e de retirar vantagens pessoais do exercício do sacerdócio e no controle das sinagogas, coisas nas quais o interesse pessoal dos judeus influentes se mesclava com as coisas sagradas, o que sempre fora odioso e continua a ser até os dias atuais, quando muitos religiosos se valem do profissionalismo da fé como fonte de renda pessoal e de ganhos financeiros.

Assim, Jesus já não podia caminhar livre e despreocupadamente no meio dos judeus porque muitos já tramavam contra a sua vida e buscavam um meio de prendê-lo naqueles dias que se aproximavam e que correspondiam à páscoa do povo.

A entrada do Messias em Jerusalém fora coroada de êxitos retumbantes, uma vez que, cercado por seus discípulos e por um grande grupo de seguidores, foram acolhidos por outra multidão eufórica e exultante com a perspectiva de estar ali presenciando a chegada do libertador da raça do domínio estrangeiro.

As pessoas buscavam improvisar-lhe um tapete para homenageá-lo, atirando ao solo folhas verdes arrancadas das árvores, procurando mesclá-las com pétalas de flores silvestres, colocando também seus próprios mantos e vestes no caminho por onde passaria a comitiva.

Este movimento não passou despercebido dos importantes representantes judeus que, mais do que depressa, foram informados da calorosa recepção que aquele profeta do povo estava recebendo à entrada da cidade.

Todavia, ao contrário do que o poviléu estava lhe demonstrando na euforia de sua recepção, como a apoiá-lo em caso de revolta armada ou rebelião declarada contra os poderes constituídos, Jesus entra em Jerusalém demonstrando exactamente outro tipo de disposição.

Tanto que, em vez de entrar andando como sempre o fizera pelos caminhos ou, ainda, valendo-se de um fogoso cavalo como todos os guerreiros heróicos, protagonizando a figura do libertador, o Mestre se vale de um burrico emprestado para, montado nele, ingressar na poderosa cidade.

Assim, o festim triunfal que o povo lhe preparava era confrontado pela mensagem silenciosa de Jesus, que o repelia com o comportamento humilde e desajeitado que era representado pela sua montaria singela e digna de provocar risos na alma dos menos empolgados.

No entanto, os exaltados não quiseram entender a mensagem da humildade e do desapego às convenções e expectativas do mundo judeu que Jesus estava demonstrando com aquele comportamento.

Depois das festas do dia, dirigiu-se cercado pelo povo até o Templo onde, após ali permanecer alguns minutos caminhando por entre a multidão, retirou-se para dormir em casa de Maria, Marta e Lázaro, na cidade de Betânia.

A notícia de sua chegada espalhou-se por Jerusalém, eis que nela se congregavam muitos judeus de todas as cidades e vilarejos que Jesus houvera percorrido em seus três anos de tarefas missionárias e que já o conheciam pessoalmente ou tinham tido contacto com sua doutrina e seus feitos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:20 am

A ansiedade e a expectativa aumentaram com a sua chegada à cidade naqueles dias tão especiais para todos.
Em casa de Públio, igualmente, chegou a notícia alvissareira através da serva de Lívia, a fiel e simples Ana, que colocara a sua senhora a par da novidade e dela recebera a autorização para ir ouvir-lhe a mensagem naqueles dias, permanecendo junto ao velho tio Simeão, que viera de sua vivenda na Samaria até Jerusalém, acompanhando a comitiva apostólica.

O ambiente interno de sua casa não sofrera alterações importantes, sentindo Lívia o distanciamento imposto, inexplicavelmente, pelo esposo e guardando para si as apreensões que a sabedoria feminina aprendeu a administrar e suportar com o estoicismo que a transformara no esteio de qualquer família.

Pilatos estava envolvido pelas questões administrativas e pelos perigos que, nessa época, brotavam de todos os lados, notadamente porque era o representante estrangeiro de maior prestígio.

Se algum movimento de libertação ou revolta se iniciasse ali em Jerusalém, tal ocasião reunia todos os elementos propícios para que o sucesso lhe estivesse garantido, em face do imenso volume de peregrinos reunidos para as festas religiosas de sua tradição, o que punha em risco a capacidade de defesa até mesmo da cidadela fortificada na qual se sediava a supremacia militar romana na região.

As medidas de defesa e contenção de ânimos dos próprios judeus, sempre divididos em facções e grupos hostis entre si mesmos, tomavam grande parte do tempo e da energia dos soldados.

Inúmeras patrulhas percorriam as ruas principais e os becos em Jerusalém nesse período, procurando, de modo ostensivo, intimidar os mais exaltados e aconselhá-los a uma conduta pacífica que tivesse na exortação religiosa o seu cunho principal.

Colocando a soldadesca na rua, restava-lhe um grupo reduzido de militares de prontidão para ser usado em caso de tumulto generalizado.
Todavia, Pilatos tinha noção clara de que, mesmo possuindo armamentos mais potentes do que o que era acessível ao povo judeu, o volume de combatentes dos dois lados dava nítida e larga vantagem aos judeus que, se o desejassem, poderiam facilmente iniciar uma conspiração que acabariam por vencer em face de possuírem concentrados ali mais homens do que a guarnição militar que ele comandava.

Nos primeiros anos de sua governança, solicitara reforços da província vizinha – a Síria – pois temia que o povo se valesse de sua inexperiência no governo da Judeia para tentar destruir-lhe a reputação e golpeá-lo no início de sua trajectória administrativa.

Depois, no entanto, quando as pessoas passaram a conhecer o seu carácter rude e a sua maneira impetuosa de se conduzir, a sua capacidade de aterrorizar pela violência e os seus modos licenciosos e permissivos, os líderes judeus passaram a relacionar-se com ele de outra maneira, não mais produzindo no espírito do governador o temor inicial que o aconselhara a solicitar reforços de fora.

Tanto que, nesta páscoa, a sétima de seu governo, não havia solicitado qualquer colaboração especial para a manutenção da ordem local.
Até mesmo porque, a medida poderia ser interpretada pelos seus superiores romanos como uma demonstração de fraqueza pessoal e incapacidade de manter-se com o contingente que lhe era oferecido e tido como suficiente para aquela província.

Desse modo, Jerusalém estava patrulhada pelos soldados de que dispunha o governador, mantendo pequena reserva, como já se disse, para situações mais graves.
Seu palácio administrativo estava sempre na mira dos potenciais revoltosos e, assim, ali se encontravam vários soldados de prontidão e preparados para reprimir os mais violentos e agressivos.

A presença de Jesus, aliada ao boato que Judas houvera feito circular de que se tratava do momento da liberdade do povo, a esperança de muitos sofredores, a euforia com os feitos do Mestre, o grito de revolta preso na garganta de muitos dos judeus que não suportavam a convivência com os romanos em sua terra, tudo isso se combinava para que os desdobramentos dos factos se precipitassem.

Nos dias que se seguiram, Jesus apresentava-se na cidade sempre cercado pelos seus seguidores e demonstrava toda a sua indignação com as condutas venais dos sacerdotes.
Virara mesas de dinheiro que se haviam erguido no recinto do Templo de Jerusalém nas quais os peregrinos tinham que trocar as suas moedas regionais pelas que tinham curso regular para a compra de animais e objectos sagrados que, logo a seguir, seriam oferecidos em holocausto de sua fé, no altar dos sacrifícios.

Ao mesmo tempo, os próprios sacerdotes que eram, teórica e eticamente, impedidos de comercializar pela sua condição especial, mantinham, junto dos cambistas, pessoas que faziam as vezes de seus testas de ferro, vendendo os animais que lhes pertenciam e arrecadando dinheiro para eles, ao preço de pequena comissão, maneira de burlar a proibição de serem, os sacerdotes, exploradores da fé dos seus irmãos de raça.

Eles não vendiam pessoalmente – como proibia a lei, aliás, muito correta nesse sentido, já que não permitia que aquele que desejou seguir o caminho do sacerdócio se movimentasse nos dois caminhos ao mesmo tempo: o que levava a Deus e o que chafurdava nas negociatas dos homens.

Então, para burlarem tais restrições, valiam-se de secretos representantes que, vendendo animais dos quais pareciam donos, mas, na verdade, estavam comercializando o património pessoal dos príncipes do Templo, que desejavam ganhar mais e mais vendendo os animais que criavam para o povo levá-los ao sacrifício, como a tradição mandava.

Essa conduta vergonhosa era conhecida pela maioria das pessoas, que mais não faziam do que comentar entre si o absurdo e a hipocrisia daqueles sacerdotes os quais, ao invés de darem o exemplo, costumavam censurar o povo por suas pequenas quedas morais nos sermões que faziam nas sinagogas.
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Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ - Página 5 Empty Re: Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb maio 17, 2014 9:20 am

A conduta de Jesus, desse modo, foi uma demonstração muito clara de seu desejo de limpar da vilania dos homens a Casa do Pai, como se referiu ao mencionar o local sagrado da fé dos seus irmãos judeus.

Quando tal notícia correu pela cidade, os que já estavam pensando na revolta mais se animaram com a ideia, imaginando que não tardaria o momento em que alguma palavra ou ordem directa desencadearia o motim tão aguardado.

Jesus estava dando mostras de sua independência sobre os poderes humanos, não temendo as consequências e se valendo de sua autoridade moral e da liderança sobre muitos dos que o seguiram para mostrar que a verdade não pode ser suplantada pelo erro para sempre.

Isso atingia as feridas morais mais bem disfarçadas que os fariseus e saduceus procuravam ocultar com seus mantos sumptuosos, suas posturas ritualísticas vazias e seus comentários sobre a lei, cheios de casuísmos e mentiras.

E a receptividade do povo às verdades que Jesus procurava ensinar-lhes, ora com a palavra doce, ora com as curas estupendas, ora com a conduta firme contra os mercadores da fé ia directamente na fonte das preocupações dos líderes religiosos judeus que, sem terem como lhe negar as acusações verdadeiras de que eram objecto, passaram a desejar, ardentemente, livrar-se da fonte das verdades amargas que contra eles eram desferidas, matando-a.

Todavia, apesar da conduta firme de Jesus, os dias iam se passando sem que o Mestre tivesse qualquer comportamento no sentido de deflagrar o movimento como se estava pensando que o faria, naquela oportunidade.

E o tempo era um factor precioso nessa luta já que, passada a comemoração daquela semana, todos os peregrinos regressariam às suas cidades e Jerusalém se esvaziaria.
A pequena vantagem que eles tinham – que era a vantagem numérica – deixaria de existir e, por isso, cada dia que passava era um dia que se perdia e que, com o encerramento das festividades, encerraria também o sonho de liberdade e poder que grande parte dos judeus sonhava em obter, entre eles o próprio Judas.

Sabendo disso, Judas era o que mais se sentia comprometido com os rebeldes que ele alimentara com as expectativas do movimento, acostumado que estava às práticas do comércio nas trocas, nas estratégias, na influência sobre o desejo das pessoas, uma vez tratar-se, ele próprio, de comerciante antes de ser convocado para integrar a caravana apostólica.

Sua reputação estava em jogo, ao mesmo tempo em que o movimento que ele abastecera de esperanças, agora, se voltava contra ele, cobrando-lhe o momento em que seria desferido o golpe inicial contra os invasores.

Alguns dos próprios fariseus estavam dispostos a aguardar os acontecimentos porque desejavam tirar proveito desse clima de antagonismos e, quem sabe, o movimento que Jesus liderava pudesse fazer-lhes o favor que eles mesmos não haviam tido a coragem de realizar, lutando abertamente contra os romanos poderosos.

Assim, dentre os próprios líderes religiosos judeus, surgiam correntes conflituantes, uma, que pedia o imediato aprisionamento daquele homem perigoso para suas tradições e outra, que desejava dar mais tempo a esse grupo rebelde que poderia estar abrindo o espaço para a liberdade política que eles tanto desejavam.

Depois de iniciado o movimento libertador, como os boatos diziam à boca pequena, vencendo a dureza dos romanos com o vigor dos judeus jovens, os sacerdotes e fariseus se levantariam igualmente e, assumindo a liderança do movimento, agora sem os perigos da exposição prematura, afastariam Jesus e o matariam para não perderem o espaço político desejado.

Essas duas correntes internas dividiam os judeus importantes, que ficavam na discussão sobre qual a melhor estratégia a seguir.
Levado pelas pressões dos correligionários revoltosos, que viam o tempo passar perigosamente para a sua causa, os inúmeros líderes judeus que acreditaram nas promessas de Judas colocaram-no em uma encruzilhada decisiva.

Era Jesus quem deveria liderar o movimento e, ao mesmo tempo, ele não o fazia nem dava mostras de que o faria, efectivamente.
Limitava-se a pregar o Reino de Deus, a curar e a andar com os discípulos pela cidade e arredores, pregando o amor e a caridade.
Judas afirmava que isso era apenas uma estratégia sábia para conseguir mais simpatizantes para a causa.

No entanto, Judas mentia e suas palavras não expressavam senão a sua ideia pessoal de poder e liberdade, impedido que estava, pela sua ignorância, de vislumbrar outro Reino que não fosse o da matéria, e outro Poder que não fosse o das armas.

Por isso, agoniava-se o discípulo vendo a inércia de Jesus, ao mesmo tempo em que se apercebia da disposição para a luta existente em muitos, que queriam fazer daquela páscoa a data da liberdade do povo, como ocorrera no Egipto longínquo.

Precisava tomar alguma iniciativa, antes que fosse tarde demais e antes que algum outro exaltado assumisse a liderança do movimento, o que tiraria de Jesus o privilégio e dos seus seguidores as vantagens de estarem ao seu lado, podendo compartilhar o poder advindo da conquista, depois da vitória sobre os romanos.

Já se haviam passado mais de quatro dias desde que Jesus chegara a Jerusalém naquele domingo triunfal e nada tinha acontecido.
Se Jesus não tomava a iniciativa, talvez o fosse porque não estava percebendo o tamanho da aceitação popular – imaginava Judas, na sua ingenuidade ignorante.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom maio 18, 2014 9:40 am

Ao mesmo tempo, sabendo que os fariseus e saduceus não eram pessoas bem aceitas pelos judeus mais simples, em face de sua hipocrisia e de suas maneiras arrogantes, Judas concebeu o plano de dar início à rebelião por sua própria conta, pois imaginava que, assim o fazendo, as circunstâncias produziriam o resto naturalmente.

Sabendo que os fariseus mais exaltados tramavam contra Jesus, Judas acerta com eles revelar onde se encontrava, para ser preso.
Imaginava que, com a notícia da sua prisão por parte dos fariseus e sacerdotes judeus, isso levantaria a ira da plebe contra eles também, o que faria com que a revolta se iniciasse para pedir a libertação de Jesus, como o herói do povo humilde.

Daí, conseguida a libertação, facilmente se teria congregado à volta do Senhor a expectativa unânime que lhe mostraria possuir a liderança absoluta e, se lhe estava faltando até então, não lhe faltaria a partir daí a vontade de liderar o movimento contra os invasores e libertar o povo.

Apenas uma palavra sua bastaria para que isso se desse.
Seu plano parecia perfeito, graças ao qual as ânsias libertárias se veriam colocadas em risco com a prisão do Mestre pelos próprios judeus, o que ocasionaria uma reacção dos adeptos secretos do movimento, forçando-os a sair publicamente, a pedir pela libertação de seu líder e, unidos à sua causa, demonstrariam a Jesus a sua importância.

Além disso, tais factos não levantariam suspeitas junto aos romanos, que achariam que se estava tratando, apenas, de mais uma das tricas dos próprios judeus, nas suas divergências internas tão comuns na raça rebelde, que se caracterizava pela polémica e pelas disputas.

Assim, os romanos não teriam motivos para se alarmar diante de tais ocorrências que, logo mais, haveriam de voltar-se contra eles mesmos, afastando-os do poder sobre a terra prometida.

Nas conversações com os fariseus e sacerdotes da corrente que propugnava pela prisão de Jesus, obteve a garantia verbal de que não pretendiam tirar-lhe a vida, mas, apenas, detê-lo, para que não produzisse mais estragos à reputação dos religiosos durante a páscoa.

Tão logo esta terminasse, colocá-lo-iam em liberdade, depois de avaliarem no mais alto tribunal da raça as alegações contidas em sua pregação.
Essa garantia lhe pareceu suficientemente sincera para que não temesse em entregar Jesus aos fariseus maldosos e matreiros, nem aos sacerdotes astutos e mesquinhos.

E como que desejando parecer que estavam procurando dar mostras de sua verdadeira boa vontade, ao mesmo tempo em que demonstravam gratidão a Judas por esse auxílio importante, entregaram o famoso saco de moedas – pequena fortuna que demonstrava a confiança recíproca naquele trato.

Ao mesmo tempo, o espírito cúpido de Judas, acostumado a trocas e negócios, lobrigou uma boa quantia que poderia ser usada no financiamento da própria revolta, caso as coisas assim o exigissem.

Para lhe dar a sensação de que tal montante estava sendo entregue como garantia da palavra empenhada, os sacerdotes e Judas haviam acertado que tais valores ser-lhes-iam devolvidos depois que tudo ocorresse conforme tinham combinado.

Isso deixou Judas ainda mais confiante do sucesso de sua estratégia.
Facilitaria a prisão injusta de Jesus pelos fariseus e sacerdotes odiados pelo povo simples e isso desencadearia todo o restante, segundo suas ideias.

Assim, combinaram a senha, e o momento seria definido pelo próprio apóstolo, que iria dar as informações necessárias à localização do Messias para a sua prisão.

Feito isso, Judas regressou à companhia do Senhor, exultante e preparado para as coisas que iriam advir.
Conversou em sigilo com Pedro, que não ignorava de todo as expectativas populares para aqueles dias, mas com seu temperamento de pescador, ainda que rude em muitos momentos, desencorajava Judas de se meter nesses assuntos.

A sua palavra não revelava a negociata que havia feito com os inimigos, mas, sim, a emergência da situação, trazendo a Pedro a advertência de que não deveria andar desarmado, pois a qualquer momento, os inimigos poderiam prender Jesus ou, a qualquer momento, a revolta explodiria.

Judas queria criar a ideia de que Jesus fora arrebatado injustamente, depois de ter sido defendido pelos seus e de, ainda assim, os judeus mesquinhos e covardes terem-no levado preso sem justificativa ou acusação.

Pedro, sem entender o íntimo desejo de Judas, mas reconhecendo que o clima em Jerusalém era propício para alguma emboscada ou algum gesto de agressão contra Jesus, aceitou levar consigo, naquele dia, um artefacto de defesa com o qual pretendia defender o Mestre contra os agressores.

Chegado o momento, depois da emocionante ceia final na qual Jesus se despede de seus seguidores mais íntimos e deixa para a posteridade o exemplo do verdadeiro Amor e da verdadeira Amizade, já no Monte das Oliveiras, para onde se dirigira com seus discípulos mais próximos, a figura de Judas se aproxima conduzindo um grupo de homens mandados pelos fariseus e sacerdotes, que já se haviam organizado para que as coisas tivessem outro destino que não aquele que Judas tinha imaginado.

Identificado pelo seguidor no meio dos seus amigos de aflição, notabilizou-se na tradição apostólica a cena do beijo da traição com o qual Judas apontaria aquele que deveria ser preso.

Em realidade, no coração de Judas, apesar de sua condição inferiorizada e cega, sua conduta não era a do traidor, mas sim daquele que dá condições para que o movimento libertador se iniciasse.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom maio 18, 2014 9:40 am

Para si mesmo era um quase herói ainda não compreendido, mas que, em breve, seria como tal reconhecido pela sua coragem.
Além disso, houvera conseguido dos sacerdotes, com quem se entendera, todas as garantias necessárias à protecção de Jesus que, mais tarde, seria devolvido à liberdade, sem danos para a sua integridade física.

Estava imaginando dirigir um jogo no qual já possuía todas as cartas marcadas pela sua inteligência astuciosa e aquele seria o gesto inicial de toda a grande epopeia do povo, heróico e lutador, conforme a tradição lhe enaltecia tais virtudes de carácter.

Faltava o estopim inicial, esse que Judas estava acendendo e que acabaria com a escravidão imposta pelo invasor romano.
Jesus é preso e, na tentativa de proteger-lhe de tal agressão, Pedro, lembrando-se das advertências ouvidas do próprio Judas, tenta defender o Mestre agredindo o servo dos sacerdotes, de nome Malco, cortando-lhe a orelha com a espada.

No gesto de benevolência e fraternidade que caracterizavam a sua doutrina, Jesus repreende Pedro e toca a orelha do agressor, curando-a, na advertência que deixa para todos nós que o que nos ferirá para sempre serão os nossos gestos de agressão aos outros.

Receberemos sempre de acordo com o que dermos.
Seremos julgados na medida com que julgamos.
Se ferimos pela espada, pela espada seremos feridos.

Amarrado como um reles bandido, Jesus é conduzido à casa do Sumo-sacerdote onde se mantém vigiado por servidores do Templo até o amanhecer, sendo ironizado e agredido pelos que o deveriam guardar, mas que, na sua arrogância e falsa superioridade, se valiam da fragilidade daquele homem inocente para zombarem de sua aparente condição de inferioridade.

Enquanto isso, Judas se põe a espalhar a notícia da prisão do Cristo no Monte das Oliveiras, acreditando que essa novidade poderia impor-se por si mesma, dando início ao levante popular.

Ao mesmo tempo, uma outra notícia, com a qual ele próprio não contava, feriu os ouvidos dos populares, ou seja, a de que o próprio discípulo havia entregado o Mestre aos inimigos.

Vendo-se surpreendido pelas interpretações equivocadas de seu gesto, Judas se viu forçado a revelar parte de seu plano, indicando que a prisão seria o sinal adequado para que a rebelião pudesse começar.

Todavia, a sua conduta dera mostras de que ele não era digno de confiança e sua palavra poderia não ser verdadeira.
Afinal, havia entregado o líder do movimento, aquele que Judas mesmo dizia ser o mais importante membro e que deveria ser defendido ferreamente e seguido cegamente.

Como é que o próprio discípulo agia dessa maneira infiel?
E Judas, vendo as coisas se complicarem para seu lado, revelou os detalhes da conversação com os sacerdotes, na qual haviam confessado o desejo de mantê-lo afastado do povo apenas para se preservarem até o final da páscoa, mas que o devolveriam.

E os seus interlocutores, igualmente astutos e maliciosos ao extremo, fizeram ver a Judas que isso era um absurdo, que os sacerdotes eram raposas velhacas e que, quando punham suas mãos sobre a presa, nada mais a retirava dali.

Judas dizia que não seria assim, pois eles lhe haviam dado garantias de que cumpririam a palavra empenhada.

– Que garantias convincentes poderiam ter oferecido, Judas, para que você se sentisse assim confiante? – perguntaram-lhe os líderes mais próximos, em conversação secreta e exaltada.
– Ora, eis aqui a bolsa de moedas que me deram em penhor da palavra – revelou o apóstolo ingénuo, tentando se fazer acreditar e mostrar a realidade de suas palavras.

– Dinheiro? – gritaram os mais exaltados.
Dinheiro em troca do nosso líder?
Você traiu o movimento por uma bolsa de dinheiro?

As coisas estavam tomando um rumo que saía do controle de Judas e, agora, a revelação das moedas que, a princípio lhe haviam sido dadas como garantia da palavra dos sacerdotes e que deveriam ser devolvidas ao final do período pascal, se transformaram em um vil motivo para entregar o Mestre, tornando Judas ainda mais odioso e indigno de qualquer crédito.

Esse comportamento arrefeceu os ânimos mais eloquentes e a notícia da bolsa de moedas ganhou o conhecimento dos demais, não por se apresentar como garantia, mas por ser apenas o preço pago por Judas, na interpretação simplista das pessoas que sabem ver o mal e a malícia em todos os gestos e comportamentos.

A história de Judas não convencia a ninguém e, amedrontados de que sua astúcia os estivesse conduzindo a um poço sem saída, acautelaram-se de qualquer demonstração de indignação.

Os outros discípulos estavam aterrados com o que sucedera.
Nenhum deles se dispunha a agir de acordo com os ditames que haviam aprendido com o Mestre.
Choravam as mulheres, revoltavam-se contra Judas alguns, oravam a Deus outros, seguiam à distância as ocorrências no palácio dos sacerdotes, para onde Jesus fora levado naquela noite.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom maio 18, 2014 9:40 am

Notadamente Pedro seguia de longe as ocorrências, colocando-se nas proximidades da casa do Sumo Sacerdote a fim de obter notícias sobre o seu processo e sua prisão.
Por efeito dessa proximidade, surge-lhe o amargoso momento em que ele se vê identificado como seguidor do preso e, amedrontado, nega conhecê-lo, por várias vezes, até que, anunciando a chegada da alvorada, seus ouvidos escutam o galo cantar e seus pensamentos se recordam da advertência de Jesus, dizendo-lhe, na véspera, que antes que o galo cantasse, ele próprio, Pedro, O negaria por três vezes.

Chorou o apóstolo de vergonha e isso o abateu sobremaneira.
No entanto, tão logo a notícia da prisão correu as casas, no dia seguinte, o povo simples, que se encantara com as suas palavras e actos, saiu à rua à cata de informações.

Não sabiam qual o delito e, por isso, ninguém imaginava que alguma coisa séria havia ocorrido.
Do mesmo modo, a notícia se espalhara sobre o gesto de Judas, além de traidor do seu amigo, vendedor do mesmo ao preço de moedas de prata, com as quais pagaria suas dívidas pessoais, segundo a calúnia que, agora, se espalhava por si mesma.

Já era a maledicência criando histórias para tornar mais pérfida a verdade e encantar com a mesquinhez o imaginário trágico das mentes necessitadas de emoções tanto quanto o estômago de alimentos.

Nos albores da manhã, o coração dos aflitos e anónimos seguidores de Jesus passou a se movimentar a fim de advogar a sua libertação junto às autoridades.
Enquanto Jesus era conduzido ao Sinédrio para o interrogatório sumário, que já tinha como finalidade dar legalidade a uma condenação previamente acertada, os humildes e gratos indivíduos visitavam pessoas influentes para solicitar-lhes a simpatia para a causa da Boa Nova.

E com Públio isso não foi diferente.
Tanto através de Ana, que procurou Lívia, aflita e angustiada, para falar da prisão de Jesus, quanto através de inúmeras visitas que buscavam Públio, como autoridade romana que poderia influir no seu destino, a morada confortável dos Lentulus foi sacudida por inúmeras visitas.

Todas eram recebidas pelo senador em seu gabinete de trabalho e ora eram compostas por pessoas simples que advogavam a protecção do Mestre ante as hordas virulentas dos fariseus e saduceus, ora compostas por judeus influentes que vinham pedir a sua ajuda para manter afastado do povo aquele perigoso e blasfemo judeu, levantando-se inclusive como ameaça ao próprio poderio romano na região.

Tendo sido condenado pelos de sua raça, que desejavam validar com uma aparência de julgamento aquela condenação prévia que já tinham acertado, não desejavam, contudo, atrair para si a ira dos mais humildes, que depositavam no profeta todas as suas esperanças.

Assim, deliberaram envolver os romanos na delicada situação, para que o peso de sua condenação à morte fosse imputado ao invasor, ninguém melhor para arcar com a culpa de tal tragédia, apontado como adversário estrangeiro, o que livraria os sacerdotes de qualquer responsabilidade perante os seguidores judeus.

Desejando criar tal circunstância que os inocentaria da culpa da morte injusta, os fariseus enviaram Jesus a Pilatos.
Este, sem ter qualquer coisa contra o condenado, não via nenhum motivo para deliberar no assunto.

Entretanto, sempre claudicante nas questões cruciais, Pilatos se via pressionado nos bastidores pela influência nefasta dos sacerdotes mais íntimos de sua casa, que o abasteciam com recursos escusos, que sabiam ter influências através das falhas de seu carácter, que se deixara prender nas garras dos lobos astutos.

Não desejava ser injusto, mas não se via livre para adoptar uma conduta moral que, nele, nunca tivera o peso necessário para justificar seus actos com exclusividade.
Além do mais, estava sob a investigação silenciosa de Públio que, ali em Jerusalém, seria dos primeiros a conhecer as suas decisões e reportá-las à sede do Império.

Desse modo, guardando o prisioneiro na cela de seu palácio pessoal, o governador solicita a presença de romanos e patrícios de sua estrita confiança, entre os quais, envia especial e reverente convocação ao senador Públio, para comparecer imediatamente à sua presença.

Tendo sido convocado ao palácio de Pilatos, Públio, apesar de não se sentir à vontade na companhia daquele administrador iníquo e homem de baixos padrões de conduta, conforme ele próprio, Públio, já tinha constatado em alguns casos que vinha apurando, além das suspeitas que haviam sido lançadas sobre sua conduta moral acerca da própria esposa Lívia, colocou as questões importantes daquela hora delicada e urgente – como mencionava a comunicação do governador – acima de suas cismas e desconfianças pessoais, imbuindo-se do mais elevado espírito público para assumir suas funções legais conforme o determinava as suas atribuições oficiais.

Lívia não conseguiu falar a sós com o marido, solicitando que intercedesse por Jesus, conforme lhe solicitara Ana e a sua própria consciência.
Públio saíra e se deslocara ao palácio onde Pilatos o aguardava com ansiedade, na tentativa de se livrar do dever solitário de decidir e, ao mesmo tempo, demonstrar ao senador que dominava a situação, procurando fazer justiça segundo os conceitos romanos das cortes de magistrados que vigiam no Império.

Públio saiu, carregado pelos seus escravos, em direcção à entrevista difícil daquela hora e Lívia quedou-se aturdida, sem saber como agir, ante a ausência do marido.

Ana se havia ausentado para acompanhar os factos mais de perto e a esposa do senador recorreu à oração para que as coisas se acertassem sem qualquer prejuízo para aquele que lhe houvera salvado a filha leprosa e modificado o destino e a vida.
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Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ - Página 5 Empty Re: Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ

Mensagem  Ave sem Ninho Dom maio 18, 2014 9:40 am

28 - O Julgamento e a Aparição

No palácio de Pilatos, a situação pedia cuidados.

Ao chegar ao local, Públio se viu surpreendido pela quantidade de pessoas, populares de todos os tipos, que se aglomeravam à porta e à frente pedindo providências punitivas para Jesus.

Admirado pelo modo volúvel das massas, o senador adentrou no salão onde se reuniam os romanos mais influentes e o círculo íntimo do governador, tendo sido recebido com deferência e consideração.

Naturalmente, por sua condição de enviado de Tibério e representante do Senado Romano na província, sua participação naquele processo de julgamento seria decisiva para a solução do impasse criado pelos sacerdotes.

A visão de Pilatos era a de um romano em terras estrangeiras, buscando sempre não interferir nos assuntos próprios do povo dirigido por ele.
No entanto, foram os judeus, astutos e matreiros, aqueles que lhe haviam suscitado esse espinhoso caso, levando-lhe o condenado até sua apreciação e, com isso, fazendo recair sobre a autoridade romana a avaliação sobre a culpabilidade daquele homem.

Além disso, frágil para as questões de fundo e de consistência religiosas, o governador estava acostumado a se limitar às contendas políticas e a mediar os interesses em conflito entre os próprios judeus, amolecido em seu tirocínio por um longo período em que se mesclaram seus interesses pessoais com os dos mais influentes representantes da raça dominada, impedindo-lhe uma conduta absolutamente livre de tendências ou de firme determinação.

Estava acostumado a medir quem é que iria sair prejudicado com suas escolhas e, não em face do direito e da justiça, mas em face dos que poderiam produzir menos danos à sua condição e interesse, voltava o peso de suas sentenças contra aqueles que menos riscos lhe representavam, acolhendo sempre as causas dos mais poderosos e mantendo, desse modo, suas boas relações com aqueles que procurariam sustentá-lo, também, na sua condição sossegada e vantajosa.

Nesse dia, entretanto, havia conflitos de muitos interesses em jogo.
De um lado, sua condição de romano lhe dizia que havia que obedecer a um processo, por meio de uma acusação e apuração legítimas.
Por outro, os judeus não lhe apresentaram nenhum argumento para que, à luz do direito romano e mesmo dos princípios universais se pudesse avaliar a culpabilidade de alguém.

No entanto, sacerdotes e fariseus, cúmplices de seus delitos e aliados de suas conquistas, se lhe dirigiam para solicitar a condenação do criminoso, sem maior rigor ou demora, eis que ele representava ameaça às posições de todos, fazendo ver ao governador, de maneira subtil e pouco respeitosa, que se sentiam autorizados a pedir-lho em face dos inúmeros negócios mantidos por ambas as partes, sempre aliadas na conquista de seus interesses.

Era a referência ao comprometimento moral do procurador da Judeia com os que, agora, vinham solicitar-lhe a contrapartida nesse jogo mesquinho, onde os interesses de grupos ou de pessoas se colocam sempre acima da verdade e da justiça.

Ao lado desse quadro que não se poderia revelar com nitidez aos olhos dos demais, surgia a figura de Jesus, cuja vida recta já lhe chegara ao conhecimento e cuja doutrina, ainda que de forma reduzida, lhe houvera sido explicada em Nazaré pelo grupo de discípulos que lhe falara há não muito tempo.

Naquela ocasião, recordara-se, os princípios de amor, caridade, verdade e fraternidade humana haviam-no impressionado sobremaneira e, se não fosse a sua condição pessoal e os seus compromissos com as posturas e interesses, se sentiria tentado a se aprofundar naquele caminho que parecia generoso e belo.

Notara a alegria interior daqueles homens simples, quase miseráveis, que o haviam esclarecido sobre algumas dúvidas que atormentavam os fariseus de Nazaré, naturalmente feridos em seus interesses pessoais.

Não vislumbrava, desse modo, qualquer culpa ou responsabilidade subversiva na doutrina daquele nazareno humilde.
Tivera o cuidado de ir conhecer pessoalmente o réu, na verdade, a vítima das intrigas humanas e se espantara com o seu estado de miséria física, apesar de muito se impressionar com a nobreza de sua postura e a serenidade triste de seu olhar.

Com a presença do senador em Jerusalém, surgia um outro factor complicador no cenário de Pilatos.
Afinal, como autoridade mais poderosa do que ele próprio, Públio deveria ser consultado para poder opinar e, ao mesmo tempo, avaliar a conduta do governador naquele caso rumoroso, o que daria a medida de seu modo de agir na direcção dos negócios da província.

Não podia, deste modo, demonstrar qualquer fragilidade pessoal ou qualquer cumplicidade para com os fariseus ou judeus influentes, eis que isso denunciaria a sua incapacidade e autonomia administrativa, condenando-o à vista do governo imperial e produziria a sua derrocada política.

Por isso, via-se cercado de factores adversos que iam desde o interesse mesquinho dos seus aliados na ilicitude, passando por seu conceito pessoal sobre a inocência do réu, pela avaliação do senador que lá estava como o olhar de Tibério sobre ele, terminando com a pressão popular às portas de seu palácio para que desse fim àquele julgamento, com a condenação sumária de Jesus.
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Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ - Página 5 Empty Re: Série Lúcius - O Amor Jamais Te Esquece / ANDRÉ LUIZ RUIZ

Mensagem  Ave sem Ninho Dom maio 18, 2014 9:41 am

Além de tudo isso, naquela noite, a sua esposa, a nobre Cláudia, havia tido um sonho profético, no qual vozes poderosas diziam-lhe para que o marido não se envolvesse naquele caso, julgando o inocente e, antes que tudo tivesse acontecido, levou ao conhecimento do marido o aviso recebido a fim de prepará-lo para as ocorrências que, de facto, mais tarde vieram a suceder.

Vendo-lhe a vontade de não se misturar no assunto, com a qual concordava também, ocorreu a Públio remeter Jesus ao julgamento de Herodes Antipas.

Naquele período de festas religiosas, o rei Herodes estava em seu palácio de Jerusalém.
Para a compreensão do leitor, este Herodes era filho do outro Herodes, conhecido como o Grande, o mesmo que reinava na Judeia quando Jesus nasceu e que, segundo conta a tradição, mandou matar todos os primogénitos até dois anos como forma de exterminar o anunciado rei que nascia naquela região de Belém.

Com a morte de Herodes, o Grande, seus vastos domínios foram divididos pelos seus filhos, cabendo a cada um deles a quarta parte do reino principal, daí a denominação de tetrarquia e a qualificação de Herodes Antipas como o tetrarca da Galileia e da Pereia, partes do reino que lhe couberam quando da divisão, com a morte do pai.

Assim, sendo o rei a quem Jesus deveria se submeter em face de ter nascido na região da Galileia, caberia ao rei avaliar o seu súbdito, o que seria muito oportuno, uma vez que retiraria dos ombros romanos o problema e a espinhosa questão da condenação.

Agradecido por esse alvitre, que foi acolhido por todos os que estavam nesse improvisado congresso romano, foi o réu levado à presença de Herodes, que o recebeu de maneira mesquinha e irónica.

Não havendo crime do qual era acusado, os fariseus e sacerdotes lançaram-lhe a culpa por se considerar Rei dos Judeus, o que viria a ser uma acusação que colocaria Jesus contra Herodes e Pilatos, já que ambos eram as máximas autoridades legais na província.

Diante desse rei mundano e volúvel, o mesmo que houvera criado condições para a morte de seu meio-irmão, Herodes Filipe, mandando-o para a guerra a fim de tomar-lhe a mulher, Herodíades; esse soberano que, seduzido pela dança voluptuosa de Salomé, a filha de sua mulher, mandou degolar João Baptista, que se encontrava preso por ter censurado a conduta do rei em se casando com a própria cunhada depois da misteriosa morte do marido;
enfim, a esse homem de baixo padrão moral, que a circunstância da vida houvera levado à condição de rei de outros homens, Jesus foi apresentado sob a acusação de se considerar Rei dos Judeus.

Diante desse homem indigno, calou-se Jesus, como única forma de manifestar a sua indignação.
Seu estado miserável era a antítese de qualquer postura soberana indicadora de nobreza terrena.

Seu silêncio veemente, ante as perguntas do próprio rei, criaram o alvoroço entre os sacerdotes que acompanhavam a cena, produzindo ainda mais indignação a sua postura humilde, mas firme.

Assim, ridicularizando a sua pessoa e a alegação de que seria Rei dos Judeus, Herodes mandou vestir-lhe um manto branco luxuoso, que era sinal de nobreza à época, colocando em suas mãos uma cana pobre como ceptro e fazendo cingir-lhe a cabeça com a famosa coroa que todo o soberano deveria ostentar, só que feita de espinhos pontudos e venenosos, que foi introduzida ao redor de sua cabeça, rasgando-lhe a pele e deixando escorrer o sangue pelo seu rosto e cabelos.

Depois de tê-lo humilhado, remeteu-o a Pilatos por sugestão dos próprios sacerdotes que acompanhavam a cena e desejavam, a qualquer custo, envolver o poder romano na condenação daquele que, como os judeus não podiam negar, tinha muita popularidade.

Pilatos recebeu, com surpresa, o prisioneiro, agora mais debilitado do que antes.
À porta, a massa humana, alimentada pelos fariseus e sacerdotes interessados na morte do Justo e que, através de seus representantes, ocultos no meio do povo, insuflavam a malta, inclusive com a distribuição de moedas a fim de obter mais público para a gritaria, pressionava o governador, desejando o sangue daquele homem humilde.

– Malditos sejam estes judeus miseráveis – esbravejou Pilatos, novamente submetido à necessidade de decidir a delicada questão.
Não vejo delito algum neste homem que só tem feito ajudar esta gente, amparando os que choram, curando doenças, dando esperanças.
Até aonde vai a maldade humana...

Vendo-lhe o espírito alterado pela contingência daquela hora, Públio e os demais se calaram a fim de não atrapalhar a sua deliberação.

– Senador, solicitei-lhe a presença a fim de que, tendo estado mais tempo nas cercanias da Galileia, talvez tenha tido algum contacto com este pobre homem ou saiba de alguma coisa que nos permita deliberar dentro dos padrões de Justiça que nosso Império busca impor aos povos bárbaros que dominamos – falou o governador tentando acalmar-se da onda de cólera que o avassalava.

Convocado a manifestar-se, Públio se adiantou e, ocultando os motivos pessoais que o levaram a encontrar-se com Jesus, quando se sentira quase que forçado a prostrar-se diante Dele, tal o poder magnético que o dominara, relatou com sinceridade as impressões que colheu naqueles dias.

– Sim, governador, estive na região e conheci o profeta pessoalmente, podendo afirmar que jamais ouvi de seus lábios ou escutei da boca de alguém tivesse ele pregado a subversão aos costumes, a rebeldia contra Roma ou alguma conduta que vilipendiasse nossos valores mais elevados.
Ao contrário, sempre pautou sua vida pela correcção, pelo amor aos miseráveis, pela compaixão pelos sofridos, curando a muitos sem nada pedir e sem nada esperar de ninguém.
É de uma pobreza que impressiona e possui uma sabedoria que nós mesmos, romanos de estirpe, não conseguimos apreciar com rapidez.
Da mesma maneira, não vejo culpa nesse homem.
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