LUZ ESPÍRITA
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Página 5 de 6 Anterior  1, 2, 3, 4, 5, 6  Seguinte

Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sex Nov 07, 2014 11:39 am

-Ricardo, Ricardo! - gritou desesperado.
-Acalme-se, papai! Acalme-se, pelo amor de Deus!
Abraçou-me, beijou-me, acariciava meu rosto sem tréguas.

Segurei fortemente suas mãos e disse-lhe, enérgico, como nunca o fizera:
-Meu pai, estou vivo em espírito, morre somente o corpo, somos eternos.
Estou bem, como vê, perfeito, sadio, nem sequer tenho cicatrizes.

Mas estou aborrecido e preocupado, porque está pensando em se matar.
Nada consertará com esse seu gesto, nem melhorará sua situação.
Piorará, sim, e muito, e não poderá ficar comigo.

-Ricardo, meu filho, sofro tanto, por que foi salvar-me?
-Porque o amo!
-Não mereço, sou um assassino!

-E quer continuar sendo, matando mais um corpo, o seu?
Papai, papaizinho, se me ama, se me quer, não pense mais em suicídio, por Deus, peço-lhe.
Nunca me negou nada, atenda-me, por favor, viva, ore, perdoe-se, faça isso por mim.

Se morri para salvar o senhor, quero-o vivo na carne até que Deus o chame.
Prometa-me!
-Se ficar comigo...
Fique comigo, filho, fique...

Vovó colocou-o no corpo adormecido e ele acordou, falando:
-Ricardo, por favor fique comigo, por caridade!

Lembrou-se papai parcialmente do nosso encontro como um sonho e, pela primeira vez, sentiu um certo alívio e falou alto:
-Meu Deus, sonhei com meu Ricardo, pareceu-me tão real!
Foi como se ele estivesse aqui, disse que está preocupado comigo, que me ama apesar de todos os meus erros e que quer que eu viva;
morreu para me deixar vivo!

Pensei que fosse chorar, mas, para minha alegria, gritou:
-Margareth, Pretinha, venham, podem limpar o quarto, quero tomar banho!

A porta se abriu. Mamãe, Pretinha e uma outra em pregada entraram e mamãe perguntou, timidamente:
-Manuel, quer cortar o cabelo e fazer a barba?
Quer ir um pouco ao quintal?
-Sim - respondeu.

Mamãe deu-lhe o braço.
Saíram para o quintal, andando devagar por entre as árvores.

Logo chegou Márcio, que a outra empregada fora chamar, e ele ficou observando papai e mamãe de longe, temendo que o sogro atentasse de algum modo contra sua vida física.
Papai estava tranquilo, quieto, não respondia as indagações de mamãe.
Depois de ter caminhado um pouco se sentou numa cadeira.

Fiquei com eles, animando-os com carinho;
chegou o barbeiro, cortou-lhe o cabelo, barbeou-o.
Foi tomar banho.
Márcio acompanhou-o, papai pareceu ignorar sua presença, lavou-se, colocou as roupas que lhe ofereceram, foi para a cozinha e alimentou-se.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sex Nov 07, 2014 11:39 am

Depois, foi para seu quarto, agora limpo, e disse:
-Podem fechar a porta, estou bem e vou dormir.
-Que legal, vovó! - exclamei.
- Acho que estamos conseguindo ajudá-lo!
-De início está óptimo.

Como pensávamos, Manuel atendeu-o.
Devemos fortalecê-lo mais e nos certificar de que não pensa mais em suicídio.

-Chama por mim, quer a mim, queria que prometesse que ficaria com ele, estranho, não é, vovó?
-Nem tanto! Estranho é pensar que é o desencarnado que está obsediando, porém muitas vezes é o encarnado quem segura o desencarnado perto de si.
-Entendi bem, se não tivesse sido socorrido ao desencarnar, estaria em perturbação vivendo entre eles, talvez nem quisesse ir embora, e, se quisesse ir, eles me segurariam.

Papai adormeceu, seu corpo refazia as energias.
Vovó e eu saímos, sentamo-nos na área em frente da casa.
-Ricardo, está agora a par de tudo o que acontece no seu antigo lar.
-Quero ajudá-los, vovó, porém não quero ficar muito tempo aqui.
Tudo me parece estranho;
disse bem, aqui é meu antigo lar.

-Ricardo, você estava consciente de que deveria partir, mudou-se sem problemas ao ter o corpo morto, adaptou-se facilmente no plano espiritual.
Orgulho-me de sua coragem!
-Nunca pensei que iriam sofrer tanto com a minha desencarnação.
Aborreço-me, vendo-lhes a falta de fé, porque tudo isso, consolar-se, conformar-se, não é tão difícil.

-O tempo ajudará, ser religioso em tempo de sofrimento é confortador. Infelizmente não são religiosos a ponto de confiar no Pai Amoroso.
Vamos ficar aqui por uns dias e ajudar a todos, em especial a seu pai.

Vovó e eu tudo fizemos nos dias em que lá permanecemos para instruí-los, para que se conformassem, lembrando da prece sincera para o alívio.
O desespero foi sendo substituído pela calma e todos me pareceram melhores.
Papai não falou nem pensou mais em se matar, passou a se alimentar regularmente.

Achando que havíamos obtido êxito, retornamos à colónia e senti-me feliz entre os colegas do Educandário.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sex Nov 07, 2014 11:39 am

NOVAS RESPONSABILIDADES

Três dias depois comecei a sentir uma forte inquietação; incomodava-me muito, sentia-os a me chamar.
Parecia tê-los dentro de mim e o desespero de papai amargurava-me muito.
Fiquei distraído, não conseguia prestar atenção às aulas e, quando em desespero, papai chamava-me.

Não conseguia me concentrar nem para orar e tinha de receber ajuda dos mestres do Educandário.
Estava diferente, não conseguia conversar alegremente com os amigos, estava mesmo calado e triste.
Tinha esperanças de que essa fase passasse logo, que fosse por pouco tempo.

Fazia vinte e oito dias que regressara do lar terreno e vovó veio visitar-me, acompanhada de um senhor.

-Ricardo, este é Lourenço, um dos orientadores do Educandário.
Cumprimentamo-nos e vovó foi directo ao assunto que a preocupava.
-Ricardo, sabemos que está a sentir muito os sofrimentos de seus familiares.
Que está triste e tem estudado pouco.
Entretanto, graças a Deus, Manuel não pensa mais em suicídio, mas devemos ajudá-lo ainda, Ricardo.

-Desculpe-me, vovó, se a preocupo. Estou me esforçando, mas está difícil.
Antes, sem saber o que ocorria, era mais fácil isolar-me, não receber estas vibrações; agora tenho deixado me abater pelas preocupações.
-Não precisa se desculpar.
O que ocorre com você é comum aqui, por isso mesmo Lourenço e eu temos uma proposta a fazer.

-Ricardo - disse Lourenço -, estou a par de todos os acontecimentos de sua vida.
Sei que seu ideal é estudar aqui, conhecer o mundo espiritual e ser útil com conhecimento.
Mas a Terra é uma escola e, trabalhando entre encarnados, aprende-se muito.

Seus familiares necessitam do seu auxílio e você pode fazê-lo.
Certamente não poderá ficar somente no seu antigo lar, mas ajudará aos seus, como também poderá trabalhar num centro espírita.

-Centro espírita?
-Sim, Ricardo, na sua cidade há bons locais onde se pratica a caridade e equipes de obreiros do bem trabalham em ajuda a encarnados e desencarnados.
Escolhi um destes locais, um centro espírita, onde o mentor espiritual é um grande amigo e o receberá, se quiser, como a um filho querido.
Será auxiliar dele, terá de dedicar algumas horas por dia ao trabalho de equipe e as outras restantes estará no seu lar consolando aos seus.

Suspirei tristemente;
Lourenço enumerara bem meus objectivos, meus sonhos.
Sentia, entretanto, que, se os meus não se consolassem, não iria realizá-los, não conseguiria.
Vovó animou-me.

-A escolha é sua, Ricardo, só fará o que quiser.
Se quiser trabalhar entre encarnados, não precisará determinar tempo, ficará o tanto que julgar necessário.
Poderá experimentar, dedicará horas ao trabalho e o restante passará no seu ex-lar.

Poderá ajudar a todos e, como comprovante, eles melhorarão com sua presença.
Pretinha se animará, Valquíria poderá ter você para acalmá-la, sua mãe vendo todos melhorarem ficará calma também, e seu pai, com você ao seu lado, melhorará.
Depois, Ricardo, será uma experiência maravilhosa trabalhar num centro espírita;
aprenderá muito, tenho certeza de que gostará.

-Ricardo - completou Lourenço -, não é a todos que podemos fazer esse convite, você sabe que são inúmeros os jovens aqui com o mesmo problema seu, que sofrem o desespero dos seus familiares.
Analisamos e achamos que você poderá realizar esta ajuda, você é responsável, fortaleceu-se muito nas suas últimas reencarnações, retornou ao plano espiritual sem erros, sem revolta e com muito amor.
É obediente, quer melhorar e deseja ajudar o próximo.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sex Nov 07, 2014 11:39 am

Também levamos em conta os factos que envolveram e envolvem a vida de vocês.
Não precisa resolver agora, tem o tempo que quiser para pensar.
-Vovó, acha que todos lá em casa ficarão sofrendo por muito tempo?

-Não sei, Ricardo, antes de contar a você o que se passava com eles, Manuela e eu tudo fizemos para ajudá-los.
Nestes dias, tenho estado muito lá e não consigo ajudá-los, nada parece confortá-los.
O que sentem, para eles não existe nada pior;
sinto por você, meu neto.

Silenciamos.

À minha mente veio a imagem de Valquíria, minha irmã deficiente que tinha crises nas quais se machucava muito.
Com a minha presença se acalmaria.
Mamãe Margareth, que se amargurava, definhando-se.

Conseguindo fortalecê-la, ajudaria o esposo e a filha.
Pretinha, minha querida amiga, mãe de coração que me amara muito como Raul e Ricardo, merecia que eu a confortasse e animasse.
E meu pai, meu ex-adversário, que sofria o remorso de ter sido um assassino e se desesperava com a perda do filho que aprendera a amar.

Se consegui que me amasse, devia agora ajudá-lo na sua colheita;
não queria que, por não suportar o sofrimento, ele o agravasse, provocando a própria morte física.
Se me era oferecida a oportunidade de ajudá-lo, aceitaria com gratidão.

-Lourenço, vovó, agradeço o carinho de vocês e a preocupação para com os meus.
Não será sacrifício ajudar os que amo e, no centro espírita, os que aprenderei a amar.
Adiarei a realização dos meus sonhos, terei tempo para realizá-los.
Não necessito de tempo para pensar, quero ajudá-los e estou pronto para ir.

-Sendo assim - disse vovó -, iremos à tardinha.
Vá agora e se despeça dos seus amigos, eles poderão visitá-la e você poderá vir aqui sempre que quiser.

Assim fiz. Despedi-me de meus mestres e colegas, procurei o professor Eugénio e dele ouvi carinhosos incentivos.

-Gostará muito, com certeza, desse trabalho-estudo, aprenderá muito com os encarnados.
Acompanhado de Lourenço e vovó, à tardinha estávamos no meu antigo lar terreno.

Aproximei-me de mamãe, que, triste e abatida, chorava num canto da sala;
ela tentava orar:
"Ricardo, meu filho, por Deus, venha ajudar-nos, já nem sei mais o que faço, sentimos tanto sua falta.
Por que tudo isso teve de acontecer, por que você morreu?
Por que não morreu Valquíria?

Entenderíamos, ela só sofre, retardada como é.
Você não, meu filho, era lindo, forte, inteligente, todos nos orgulhávamos de você.
Venha nos ajudar, filho, Carlos quer internar seu pai no hospício, sabe, ele está bem atrapalhado, Ave Maria..."

Conscientizado de que viera ajudar e não atrapalhar, fortaleci-me também na prece, abracei-a docemente e disse:
-Acalme-se, mamãe, tranquilize-se, tenha fé, ore com sinceridade.
Deus é justo, sabe o que faz e por que faz.
Lourenço e vovó aplicaram-lhe um passe, mamãe acalmou-se e pôde orar mais tranquila.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sex Nov 07, 2014 11:40 am

Após, fomos ver todos:
Taís, Telma, as crianças;
elas estavam bem e tudo faziam para ajudar meus pais.

Vi Valquíria toda machucada, deveria ter tido crises constantes, e ela novamente percebeu a minha presença, estendeu os braços em minha direcção e gritou: -Ri-Ri!
Abracei-a e ela sentiu meu abraço e carinho.
Assim ficamos por algum tempo.

-Não vou deixá-la mais, Valquíria, estarei sempre ao seu lado.
Valquíria sorria, feliz, e repetia: -Ri-Ri!

Deixando-a alegre e tranquila, fomos até o papai.
O quarto estava como da primeira vez em que o visitei, sujo, cheirando mal.
Papai estava mais magro, barbudo e descabelado, estava de pé num dos cantos do quarto e batia a cabeça na parede; não me contive e gritei:

-Papai!
Ele voltou-se instantaneamente e vi que o rosto e a cabeça estavam machucados.
-Ricardo, Ricardo, venha para mim, fique comigo, filho, fique!
Abracei-o, transmitindo todo o meu amor, e ele de alguma forma, sentiu minha presença.

Sentou-se na cama, falando sem parar sobre fatos acontecidos com Raul, com Ricardo, com ele, até que adormeceu com os passes de Lourenço e vovó.

-Manuel dormirá por um bom tempo - disse vovó.
-Não podemos tirá-lo do corpo como da outra vez, vovó?
-Não, Ricardo, Manuel está muito fraco, acalmou-se só com sua presença e o ajudaremos dessa forma.
Deixemos que ele agora descanse e vamos conhecer o local onde você trabalhará.

-Vovó, não sei ajudar.
-Tendo vontade, aprenderá logo.
Depois, Ricardo, não seria possível você ficar só em seu ex-lar, há muitos que sofrem e necessitam de auxílio.

Terá como instrutores amigos nossos.
Isaías, um bondoso orientador do plano espiritual, e António, orientador encarnado do centro espírita.
Ficarei com você por uns dias até se ambientar, fará outros amigos.

O centro espírita era perto do meu lar terreno.
O local, fisicamente falando, era somente um cómodo, ao lado da casa do orientador António.
Era simples, limpo, tinha somente o indispensável, uma mesa com oito cadeiras à sua volta.

Em cima dela, uma toalha branca, uma jarra de flores e um volume de O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Completando a decoração, mais cadeiras e bancos, que supus serem para a assistência.
Entrei constrangido e cinco desencarnados muito simpáticos vieram cumprimentar-nos.

Após a apresentação, vovó explicou-me:
-Estão em serviço, guardam o ambiente.
Depois chegou Isaías e abraçou-me alegremente.

Disse, dirigindo-se a Lourenço:
-Meu afilhado, que prazer revê-lo!
Então, este é Ricardo, que trabalhará connosco?
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:31 am

Conversaram animados e felizes por um bom tempo, até que vovó interferiu:
-Isaías, permita-me que fique com meu neto por uns dias.
Tenho licença do meu trabalho e gostaria de estar com Ricardo, pois se sente encabulado por julgar que não sabe fazer nada.
Isaías sorriu e olhou-me docemente.

-Claro, Margarida, fique connosco o tempo que quiser, para nós será somente prazeroso.
Quanto a aprender, Ricardo, quando você foi à escola pela primeira vez, também não sabia nada, entretanto aprendeu.
Todos nós aqui teremos prazer em ensiná-lo.

Apresente-se ao trabalho amanhã às oito horas.
Não se acanhe de nos contar suas preocupações; espero que tenha uma proveitosa estada connosco - falou, abraçando-me.

Despedimo-nos, Lourenço acompanhou-nos até a rua e despediu-se também.

-Até logo, Ricardo, verá que este centro espírita é uma escola para encarnados e desencarnados, onde se aprende trabalhando, e será muito bom você poder ajudar aos seus.

Caminhamos, vovó e eu, rumo ao meu ex-lar.
Era noite, poucas pessoas encarnadas transitavam pela rua.
Admirei-me, entretanto, dos muitos desencarnados que por ali passavam, uns aflitos, desesperados e doentes, outros tranquilos, como se passeassem.

Vovó esclareceu-me:
-Ricardo, existimos sempre, ou como encarnados ou como desencarnados, e semelhantes se afinam, se atraem.
Temos livre-arbítrio para escolher a forma de viver, ou no bem ou no mal, e temos também a consequência da vida que escolhemos.

No plano físico da Terra, onde encarnados vivem, há muitos desencarnados vivendo também.
Há os que vagam em sofrimento, os que por ignorância tudo fazem para prejudicar seus semelhantes e há os que trabalham ajudando aos que sofrem e recuperando os que se julgam maus.
-Acho, vovó, que irei aprender muito!

-Vai, sim, fará um grande aprendizado que não estava incluído nos seus sonhos; entretanto, um dia teria de fazê-lo para complementar o seu conhecimento.
Os acontecimentos o farão concluí-lo antes, porém confio em você, tenho a certeza de que, das duas tarefas que lhe competem, realizará ambas a contento.

Chegamos em casa, vovó e eu fomos a cada um dos meus familiares dando-lhes conforto e alegria.
Às oito horas em ponto, apresentamo-nos no centro espírita; Isaías, o mentor, cumprimentou-nos, sorridente.

-Ricardo, connosco deverá trabalhar todos os dias, em média quarenta e oito horas por semana.
Terá seu trabalho pela manhã, mudando de horário a cada quinzena, e fará um trabalho de rodízio, para aprender tudo o que fazemos.
Normalmente, tudo por aqui é tranquilo, tendo mais labores nos dias de trabalho de desobsessão, que são realizados nas segundas e sextas-feiras, e nas terças-feiras, quando fazemos o estudo evangélico.
Começará ficando de guarda com outros companheiros nossos.

Isaías chamou-os e apresentou-nos.
Gostei deles logo em seguida ficamos a guardar o centro espírita.
Vovó ficou comigo, isso me dava muita segurança.

Pensei que seria maçante ficar ali oito horas e vigiar sem saber o porquê, mas logo vi que não era bem como pensara.

Um desencarnado bêbado veio incomodar-nos:
-Ei, vocês aí! Dêem-me uma pinga!
Não querem dar? Onde está a caridade de vocês?
Não dão a quem pede?

Espantei-me, já vira encarnado bêbado, mas desencarnado, não.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:31 am

Mário, um dos companheiros, disse, enérgico:
-Juvenal, sabe muito bem que aqui não temos bebida alcoólica.
Temos e lhe oferecemos um tratamento para que deixe o vício e mude de vida.
-Não quero mudar de vida e não vim aqui pedir conselhos.

-Então siga em frente, que Deus o acompanhe!
Juvenal tentou entrar e com atrevimento de bêbado queria que bebêssemos com ele.
Mário teve de usar autoridade, e Juvenal resolveu ir embora.
Achando tudo muito estranho, indaguei com o olhar sem ter coragem de perguntar verbalmente.

Mário, demonstrando ter compreendido minha curiosidade, esclareceu-me:
-Ricardo, indague-nos sempre o que quiser, será um prazer elucidar.
Ninguém está livre de seus vícios só porque o corpo morreu.
Juvenal sabe que desencarnou, sabe que aqui trabalhamos com a caridade.

Sóbrio, evita passar aqui perto, teme-nos;
quando embriagado, costuma passar por aqui e fazer estas cenas que presenciou.

Não quer mudar a forma de viver, não quer ser livre de seu vício.
Vampiriza encarnados e tenta induzi-los a embriagar-se.
Fica perto de outros viciados encarnados e, quando estes bebem, suga-lhes os fluidos e embriaga-se também.

-Só se embriaga? - indaguei, admirado.
-Embriagar-se já seria muito;
porém, como quase todos os viciados, prejudica a si mesmo e a outros.

Quer sempre beber e induzir invigilantes encarnados a fazê-lo;
como também faz pequenos favores a espíritos maldosos, em troca da bebida.
Cada vez mais vai ficando escravo de seu vício.

-Não podemos prendê-lo, ajudá-lo?
-Ajudá-lo como, se ele não quer receber nossa ajuda?!
Respeitamos seu livre-arbítrio, esperamos que se canse desta forma de viver e queira mudar.

-E se um encarnado que ele vampiriza aqui vier em busca de socorro, que farão?
-Se o encarnado quiser, realmente, não ter companhias como Juvenal, é só não se afinar com ele.
E, se aqui vier buscar socorro, um de nós o acompanhará e não deixará que Juvenal ou outros iguais o perturbem.

Logo em seguida, vi aproximar-se, como se fosse uma nuvem de poeira, um grupo arruaceiro.
Mário foi até um pequeno aparelho, que estava conectado do plano espiritual ao centro espírita, e vi admirado uma luz azulada cercar todo o local.

-É o nosso campo magnético, ele impedirá de recebermos ataque de irmãos inferiores.
O grupo era demasiado estranho para mim.
Estavam vestidos de maneira exótica, predominando a cor preta.

Eram doze, todos feios, sujos, tipos que, quando encarnados, diria serem mal-encarados.
Todos eles estavam armados, uns com pedaços de pau, outros com correntes, chicotes, e riam, gargalhando.

Os primeiros que chegaram bateram com a cabeça no círculo magnético e foram jogados alguns metros para trás.
Pararam e ficaram observando-nos.
Meus companheiros estavam tranquilos, e também procurei ficar.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:32 am

O que me pareceu chefe deles dirigiu-se a nós:
-Então, tem notícias de Catarina?
Ela voltará para nós?

-Catarina está bem e não deve voltar ao convívio de vocês.
Se alguns de vocês quiserem mudar a forma de viver, venham até nós, que os ajudaremos.

Riram.

-Ora, ora, aqui temos sempre o que queremos, para que mudar nossa forma de vida?
Mudar para ficar como vocês, trabalhando de guardas?

-Somos felizes, temos paz, usufruímos tranquilidade, somos amigos e irmãos.
E vocês o que têm?
Fingiam que eram felizes, rindo, gargalhando, fazendo barulho, tudo fazendo para demonstrar externamente a alegria que não sentiam.
Mesmo na minha pouca experiência senti que eles viviam um conflito e longe estavam de conhecer a paz.

Novamente, Mário elucidou-me:
-Não fechamos a nossa porta aos irmãos inferiores, estes são os muitos doentes que necessitam de socorro e aos poucos temo-los orientado.
É uma pequena falange, conhecida nossa, e se os deixássemos entrar teríamos de prendê-los, porque só querem bagunçar.

No momento certo entrarão e receberão por meio de uma incorporação a doutrinação de que precisam e eles sabem que, se quiserem ajuda, a terão.
Catarina, uma ex-componente do grupo, foi por nós orientada e está em um posto de socorro recebendo ajuda e orientação.
O campo magnético foi novamente desligado.

-Socorro! Socorro! Por favor!
Era o pedido de um senhor de pele escura, desencarnado, que se esforçava para caminhar até o portão.
Mário fez um sinal para que eu o ajudasse, corri até ele e o carregamos para dentro do centro espírita.
Vi maravilhado que, como no plano espiritual, havia no local um pequeno laboratório, um pronto-socorro.

O senhor foi colocado num leito.
Mário, pacientemente, deu-lhe água, ele falava sem parar.
Percebi que ele não sabia que desencarnara, julgava-se no corpo físico.
Mário adormeceu-o e o acomodamos no leito;
notei que havia mais duas pessoas adormecidas.

-Ricardo, são irmãos que não sabem que desencarnaram e não adiantaria nada lhes contar, porque iam achar que estamos loucos ou algo parecido.
Aqui, ficarão adormecidos até o próximo trabalho, em que, por meio de uma incorporação, poderão notar a diferença que existe entre eles e o encarnado;
receberão a orientação e o socorro para seus males.
E, ao acordarem, nem perceberão que estiveram dormindo.
Voltamos ao nosso posto.

Três mocinhas encarnadas, ao passar pelo centro espírita, exclamaram com medo:
-Cruzes! Credo!
E uma delas fez o sinal-da-cruz.
Uma outra exclamou:
-Se tiver um espírito comigo, que fique aí!
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:32 am

Para minha surpresa, um desencarnado que a acompanhava exclamou:
-Eu não fico!
Se quiser se livrar de mim, belezoca, venha você trazer-me.
E lhe deu um tremendo soco na cabeça;
ela sentiu, levou a mão ao local e disse às outras:
-Ai, que pontada na cabeça!

Novamente esperei as elucidações de Mário, que, sorrindo, me disse:
-A mocinha só se livrará do acompanhante desagradável da forma que ele mesmo disse, se ela vier e pedir ajuda.
E não pense você que todas as pontadas que encarnados sentem sejam provocadas por desencarnados.
Vimos uma das possibilidades.

O tempo passou e nem percebi.
Não era nem um pouco maçante como pensara no início;
o trabalho era movimentado e apresentava casos interessantes.

Cheguei ao final de meu trabalho diário e com vovó fui para casa.

-Ricardo - disse-me vovó -, esteve muito bem, logo estará participando mais e saberá, em qualquer situação, o que fazer.
Meu lar terreno estava envolvido pela névoa de tristeza e preocupação.
Procuramos fortalecê-los e convidá-los à prece.
A única que percebia minha presença era Valquíria.

Papai acalmava-se quando eu estava ao seu lado; alimentava-se e após alguns dias tomou banho, barbeou-se, deixou que limpassem o quarto e não bateu mais com a cabeça na parede.
Carlos ainda queria levá-lo para se tratar num sanatório, mas mamãe, vendo-o melhor, foi contra.

Ao mudar de horário de trabalho, continuando como vigia, conheci António, o orientador encarnado do centro espírita.
Jovem, bem apresentável, veio com a esposa fazer a limpeza física do local.
Gostei dele, transmitia simpatia e bondade, era tranquilo e estava sempre a sorrir.

Chegou a hora de vovó voltar ao seu trabalho, despediu-se de mim.
Por instantes me senti triste e temi ficar sem saber o que fazer.

Ela incentivou-me:
-Ricardo, prometo-lhe que virei vê-lo sempre.
Passarei todas as minhas horas livres com você e não se acanhe em pedir ajuda a Isaías e a Mário, que já são tão seus amigos.

Vovó Margarida sempre estava a ajudar-me com tanto amor.
Abraçamo-nos e dei-lhe um beijo com toda a minha gratidão.
Com amor e carinho concentrei-me nas minhas novas responsabilidades, fortalecendo-me, orando com fervor, estudando os Evangelhos e confiando na amizade dos nossos companheiros.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:32 am

APRENDENDO A SERVIR

O rodízio do horário de trabalho fora muito bom para mim, primeiro na ajuda aos meus.

Perto de trocar de horário, papai começava a sentir minha ausência, ficando emburrado e triste.
Também como aprendizado no centro espírita, cada período tinha um tipo diferente de socorro.
No período nocturno tinha mais trabalho e, nos dias de sessões, o trabalho de vigia mudava por completo.

O campo magnético era completamente desligado e todos os desencarnados entravam livremente.
Vários grupos de socorristas voltavam das excursões com muitos necessitados.
O movimento era imenso e tinha sempre muito o que fazer.
Mário, para minha alegria, mudara comigo de rodízio, só conseguia elucidar de madrugada.

No primeiro dia de sessão em que fiquei de guarda, minutos antes do início, espantei-me com os muitos desencarnados que vinham acompanhando os encarnados.
Eles se apresentavam de diversas formas, uns adoentados e tristes, outros autoritários e orgulhosos e muitos brincalhões; estranhei quando vi um montado nas costas de um senhor encarnado e este queixava-se de dores lombares.

A maioria dos desencarnados não sabia de seu estado.
Acompanhavam os encarnados certos de que ainda possuíam o corpo carnal.
Vinham conversando, reclamando de seus males, participando da conversa de seus acompanhantes.

Muitos espíritos que se julgavam maus, perturbados e perturbadores, eram recebidos educadamente e, se na entrada demonstravam que ali estavam para enfrentar-nos, eram presos por forças magnéticas e conduzidos ao interior do prédio para assistir à sessão.

Querendo aprender, prestava muita atenção em tudo, assim mesmo acabei por fazer acções precipitadas, até mesmo engraçadas.

Como em um dia em que Mário me pediu:
-Corra, Ricardo, pegue-o!

Dois desencarnados seguiam ao lado de uma senhora e um deles, ao ver que estava sendo conduzido ao centro espírita, correu em sentido contrário.
Obedecendo à ordem que me foi dada, corri atrás, alcançando-o.
Rápido segurei-o, ele se debatia querendo escapulir e me assustei.

-Que faço, Mário?
Peguei-o, e agora?
Mário calmamente veio até nós, olhou-o simplesmente, ele aquietou-se e foi conduzido ao interior do centro espírita.

-Urra! - suspirei.
Que aperto passei!
-Você poderia tê-lo apanhado, usando sua força magnética, mental; aqui, não usamos disputar, lutar corporalmente.
Veja, é assim que se faz.

Mário elucidou-me a usar a vontade, a usar nossa força interna.

Mas fiquei curioso para saber o que ocorria lá dentro, nas sessões mediúnicas, e Mário disse-me:
-Não se apresse, Ricardo, para conhecer tudo.
Chegará o tempo em que você trabalhará nas sessões.

No final das sessões, encantava-me com o aerobus que partia levando os desencarnados socorridos e orientados que vira entrar para os postos de socorro ou para a colónia, à qual o centro espírita era filiado.
Também iam embora os encarnados, sempre tranquilos, acompanhados de seus guias espirituais;
iam conversando amigavelmente, trocando ideias sobre o trabalho da noite.

Percebi logo a dedicação do senhor António, que, com paciência e bondade, ouvia as queixas desses irmãos e elucidava sobre tudo o que indagavam.
Notei também a frequência de quase todos eles e vim a saber que se tratava dos médiuns, os trabalhadores encarnados.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:32 am

-Você, Ricardo, é um bom vigia.
Foi o primeiro elogio que ouvi do orientador Isaías, que me deixou contente e incentivou-me a melhorar.
O meu ex-lar melhorara muito, minhas irmãs Taís e Telma eram dedicadas e boas, como também o eram seus esposos.

Márcio administrava os negócios de papai com precisão e honestidade, meus sobrinhos cresciam sadios e fortes e para mim -"tio coruja" - eram lindos.
Pretinha cuidava da casa e de todos com a mesma dedicação, o que me comovia.

Mamãe Margareth melhorara muito:
com meu incentivo passou a dedicar-se mais à Valquíria e ao papai.
Era outra pessoa, como comentavam, não saía mais de casa, não se arrumava como fazia antes e, atendendo a meus pedidos, orava mais e passou a ir com mais frequência à igreja.

Valquíria definhava, estava magra e mais feia fisicamente.
Carlos temia que não aguentasse passar a puberdade e morresse.
Mas, para mim, ela melhorava, acalmara-se e, com mamãe mais ao seu lado, se sentia contente.

Percebia minha presença e suas crises escassearam.
Sempre estava a lhe pedir paciência e que se acalmasse, ela sentia-me espiritualmente e atendia.

Papai melhorava aos poucos, insistia muito com ele para que orasse;
ele relutava, não se sentia digno e, quando começou a orar, sentiu-se muito melhor, passou a ter momentos de paz e começou a pedir perdão a Deus, à mamãe Manuela, a Raul e ao Louco.

Pensava sempre sobre o que o levara a achar que Manuela o traía ou que iria traí-lo.
Sabia, no entanto, que ela fora fiel e que era honesta e boa.

E na razão de não ter conseguido amar Raul.
Era seu filho e naquela época queria que ele fosse filho do tarado.
Ao pensar em Raul, chorava sentido, amava agora o filho que antes odiava e que assassinara, e o remorso doía-lhe profundamente.
Já não ficava preso no quarto, porém saía muito pouco de lá.

Um dia, acompanhando papai e mamãe que andavam pelo quintal, ouvi-os:
-Margareth, sinto que melhoro, porém carrego comigo uma dor tão grande que nunca mais serei como antes.
A perda do nosso Ricardo é irreparável, porém é o remorso que me corrói.

Mamãe estremeceu e papai, após uma pausa, continuou:
-Estou calmo, lúcido e gostaria de que pelo menos você acreditasse em mim, fui eu que matei Manuela e Raul e deixei que um pobre louco pagasse pelo meu crime.
-Manuel, não diga isso, pelo amor de Deus, como pode?

-Como gostaria que tudo isso fosse mentira, mas não é.
Matei minha esposa para me casar com você.
Não a amava, não sei por que achava sempre que ela ia me trair e não suportava vê-la fiel e honesta.

Queria me casar, ter você, bonita e alegre.
Raul era um garoto assustado pela minha maldade, não o amava, não o queria como filho, livrei-me deles, ou pensei que me livraria.
Agora, o remorso me destrói.

Mamãe chorou, papai abraçou-a.
-Você também, Margareth, sofre muito.
Como tenho sido egoísta, só percebo minha dor.
-Manuel, prometa que não irá contar essa história a mais ninguém.
Pensarão que está louco e o internarão num sanatório.
Não quero me separar de você, esqueça esse crime.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:33 am

O Louco já morreu;
Manuela, Raul e nosso Ricardo não voltarão mais.
Não se martirize assim, esqueça isso.
Valquíria e eu necessitamos tanto de você!

-Valquíria...
-Sabe, Manuel, tenho cuidado mais dela, é tão frágil!
Carlos acha que ela morrerá logo.
-Nunca liguei para ela nem para Raul.

Calaram-se e, para minha alegria, entraram e foram até Valquíria.
Papai pegou-a no colo, conversou com ela.
Minha irmãzinha estranhou, não quis receber os afagos dele.
Papai entendeu que errara com ela, porém podia reparar o seu erro, e, com paciência, passou a agradá-la.

Valquíria começou a aceitar seus afagos e a se sentir feliz com a atenção que recebia dos pais;
deixou definitivamente de ter suas crises.

Eu recebia muitas visitas, eram amigos do Educandário, dos ex-mestres, como também do professor Eugénio e de mamãe Manuela;
era gratificante escutá-los, receber notícias do Educandário.
Raramente ia à colónia, dedicava-me com todo o carinho ao meu trabalho e estava realmente aprendendo a servir, emocionava-me até as lágrimas com meus pequenos êxitos.

João Felipe viera também visitar-nos.
Abraçou papai em espírito, fora do corpo físico, e respondeu ao seu pedido de perdão.

-Perdoo sim, Manuel.
O que sofri foi por minha colheita, tenha paz, meu irmão.

Papai, naquela noite, dormiu tranquilo.
Vovó Margarida sempre que podia visitava-nos, estava sempre nos ajudando.

Um dia comentei com ela:
-Vovó, sei que Valquíria e mamãe Margareth já estiveram juntas em outra existência, e encabulo-me às vezes com Pretinha, tão boa, tão dedicada, terá ela motivos para servir assim?
Conhece o passado delas, vovó?

-Sim, Ricardo, conheço e vou contar a você.
Pretinha na outra existência certamente tinha outro nome, este detalhe não importa.
Pretinha foi muito bonita, caprichosa, fugiu de seu lar mocinha, deixando seus pais desesperados, a sofrer, para ter uma vida mundana de festas e muitos parceiros.

Teve uma filha, Margareth, que manteve consigo, pagando a uma mulher para que tomasse conta dela.
Ensinou a filha desde menina a ser vaidosa, a ter ambição e, adolescente ainda, a iniciou na forma de vida que levava.
Nesse período, Margareth deu à luz uma menina, Valquíria, linda, de uma beleza exótica.
Com oito anos, Margareth a colocou num convento para que tivesse outra educação, desejando que esta casasse bem, de preferência com um homem rico.

Quando a filha saiu do convento, Margareth conseguiu casá-la com um homem mais velho e rico.
Valquíria apaixonou-se pelo marido e viviam felizes.
A avó e a mãe a visitavam com frequência, porém Margareth apaixonou-se pelo genro, sentiu uma paixão forte, tudo fez para conquistá-lo e tornaram-se amantes.

Valquíria acabou descobrindo o romance dos dois, ficou desesperada e prometeu que se vingaria.
O esposo arrependeu-se, jurou parar de fazer todos sofrerem.
Valquíria fora educada entre religiosas, conhecia e seguia uma religião.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:33 am

Planeou e, conscientemente, para vingar a traição, suicidou-se, jogando-se do alto de uma torre, desencarnando na hora, antes de completar dezanove anos.
Conseguiu fazer com que todos sofressem, o esposo sentiu muito sua morte, a mãe desesperou-se em sofrimento e ela também sofre até hoje seu ato de vingança.
Margareth, arrependida, culpava a mãe por tê-la ensinado a ser devassa, e as duas, tristes, amarguradas, viveram ainda por muitos anos.

Pretinha foi a que sentiu mais, teve lar e não deu valor a ele, teve uma filha e a fez infeliz.
Reencarnadas, a bondade de Deus reuniu-as novamente.

Pretinha, órfã de mãe, meninota, o pai colocou-a em lar alheio para que trabalhasse.
Serve Margareth, ajuda Valquíria, dedica-se agora a elas sem ser parente carnal.
Agora é mãe e avó, amorosamente.

-Vovó, Pretinha trabalhou para mamãe e, antes, para a senhora?
-Sim, dedicada e trabalhadeira, fez por merecer ter boas patroas e amigas.
Se não tivesse ocorrido o desencarne de Manuela, Pretinha iria por instinto do amor achar Margareth e servi-la, ajudá-la.
As duas, em espírito, sabiam que Valquíria viria diferente e, sentindo-se culpadas, queriam estar com ela e ajudá-la.

-Puxa, vovó, vendo Valquíria agora, gostaria de poder gritar a todos os que pensam em suicídio para não fazê-lo.
Destruir o corpo traz sempre sofrimentos maiores.
-O importante, Ricardo, é que as três estejam vencendo suas más tendências, aprendam a amar e a se respeitar.
E Pretinha aprende muito nesta existência, serve, ajuda a antigos parentes carnais e ama muito.

-De facto, Pretinha ama, ajudou tanta o Taís, a Telma e a mim.
Também recebe amor, já notou como ela é amada?
Taís e Telma a têm como uma segunda mãe, seus filhos a chamam de "Tia Pretinha".
É tratada como se fosse da família, e eu também a amo muito.
Era verdade, Pretinha amava e amor sincero é uma força poderosa, dá-se e se recebe.

Amava Pretinha, e pensei:
"Somos no presente o que construímos no passado e seremos no futuro o que fizermos no presente".
Construir, realizar o bem, era muito importante, comecei a planear como faria para ajudá-los a pensar neste assunto.

Meu trabalho no centro espírita era gratificante, qualquer pequena ajuda que fazia a outrem era eu o primeiro a receber;
sentia-me tão bem e alegre que logo os amigos estavam me chamando de "Ricardo Alegria".
De vigia, passei a integrar as equipes de socorro, primeiramente ajudando os que vagavam na crosta.

Atendíamos a pedidos de socorro emitidos da cidade e vê-la agora era bem interessante; conhecia a cidade muito bem na sua forma física, e conhecer seu lado espiritual foi de grande aprendizado.

Via muitas tristezas e sofrimentos, mas isso não me abalava;
visitávamos muito o hospital e o número de desencarnados doentes era às vezes maior que o de encarnados.
Gostei de consolar e animar os doentes e muitos deles se alegravam e resignavam-se com nossa presença.

Quando não queriam receber nosso conforto, orávamos por eles e por minha vez tinha-lhes pena;
é tão ruim negar-se a se conformar!
Visitávamos muito também o cemitério, confortando os encarnados que lá iam e procurando ajudar os desencarnados que, inconsoláveis, se prendiam a seus restos mortais sem querer abandonar o corpo.

Andávamos pelas ruas, procurando ajudar aos necessitados, orientando, aconselhando desencarnados e instruindo para o bem os encarnados.

Sabíamos que estávamos oferecendo ajuda e não obrigando ninguém a aceitar.
Entendia agora que o Pai não deixa nenhum de seus filhos sem socorro.
Num grande aprendizado, para que amemos a todos como irmãos, deixou-nos a lição: que nos ajudemos uns aos outros.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:33 am

Interessei-me muito pelo trabalho que as equipes do centro espírita faziam no umbral. Íamos em excursão socorrista às partes mais próximas da crosta, onde ajudávamos sempre espíritos escravizados das falanges do mal e socorríamos também os que sofriam de remorso e os que clamavam por clemência.

Estávamos sempre preparados contra os ataques dos irmãos inferiores que não queriam invasões nos seus domínios.
Nas minhas primeiras excursões temi, depois aprendi a confiar e entendi que aquele que sabe faz com confiança.
Voltávamos ao centro espírita, carregando irmãos deformados, em farrapos, em grandes sofrimentos, para o socorro necessário.

Sabia que já havia sido como eles, recebera socorro e agora tinha a graça de socorrer. Sabia também que aquele sofrimento lhes era necessário como aprendizado, eram os invigilantes em que a morte física destruíra a ilusão construída sobre a areia.

-Agora, Ricardo - disse Isaías - trabalhará directamente com o encarnado, ajudará os protectores de médiuns no seu trabalho.
Um médium activo trabalha muito.

Primeiramente, acompanhei Nélson, que protegia dona Ana, e ele logo me informou:
-Ricardo, dona Ana e eu somos amigos e companheiros, não estou aqui para fazer a tarefa dela, e sim para ajudá-la e incentivá-la a fazê-la bem feita.
A dona Ana era uma pessoa boa e agradável.
A tarefa era fácil porque ela era uma espírita fervorosa, lia e meditava sobre os Evangelhos todos os dias, orava com fé e tinha uma forma de vida honesta e simples.

O trabalho que nos cabia fazer era socorrer os desencarnados que ela bondosamente pedia a Nélson para levar ao centro espírita e encaminhá-los.
Toda vez que ajudava aos outros, ela os via;
dona Ana estava sempre ajudando, e eram várias as pessoas que lhe pediam auxílio.

Foi um período no qual aprendi que com fé e honestidade se constrói muito e que a alegria do encarnado ao fazer o bem é incomparável.
Depois fui ficar com Anacleta, que protegia dona Nívea, uma médium iniciante que longe estava de ter sido por amor a aceitação da tarefa mediúnica.

Fora a dor que a trouxera para o centro espírita e para os trabalhos práticos.
Indisciplinada, nunca achava tempo para estudar a Doutrina Espírita e vivia reclamando;
tinha um vício bem desagradável:
comentar a vida do próximo e contar piadas de baixa moral.

Com grande bondade, Anacleta tudo fazia para orientá-la.
Quase todos os dias, reunia-se com as amigas para sua conversa habitual.
Anacleta e eu nos afastávamos, não dava para ficar perto e ouvir tantas coisas desagradáveis.

Entretanto, outros desencarnados, que se afinam com esse tipo de conversa, reuniam-se a elas e gargalhavam, trocando fluidos negativos.

Dona Nívea recebia esses fluidos, clamava pelo anjo da guarda, seu guia-protector, e reclamava a todo instante:
"Estou mal, vou reclamar ao senhor António, tenho ido às sessões e aí está, é o que recebo, estou pesada, com fluidos ruins;
vou tomar passes" .

Dei graças a Deus por mudar de trabalho.
Não é agradável ser protector daquele que acha que merece receber alguma coisa em troca da sua mediunidade, e pensa estar fazendo favores a outrem e não a si mesmo.

Fui acompanhar o senhor António.
Ele, além de Isaías, tinha sempre consigo dois a três trabalhadores, e estar com eles foi muito gratificante.
O senhor António trabalhava muito materialmente para seu sustento e dos seus e todos os dias, à tardinha ou à noite, dava passes em várias pessoas e visitava doentes.

A nós cabia o socorro dos desencarnados que acompanhavam os encarnados que vinham até ele em busca de auxílio.
Também estávamos sempre atentos para o ataque de desencarnados mal-intencionados;
muitas vezes tínhamos que prender alguns e deixá-los no centro espírita para que, na próxima sessão, fossem orientados.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:33 am

Nesse período excursionei com Isaías pela parte mais trevosa dos umbrais.
No começo fiquei chocado com as condições em que viviam tantos irmãos, lugar muito triste com fluidos pesados, tantos sofrem lá e outros se vangloriam de lá estar e de ter no umbral sua morada.
Fizemos socorros fantásticos e impressionava-me o modo com que Isaías tratava nossos irmãos trevosos na sua ignorância, mudando muitos deles e encaminhando-os para o bem.

-Ricardo, cada um faz por merecer estar num lugar, afinamo-nos a grupos semelhantes.

Ouvi essa explicação de Isaías, quando vi que muitos desencarnados que socorríamos não queriam ir para os postos de socorro nem para as escolas do plano espiritual.
Queriam, sim, ficar livres de seus males e dores, sem mudar a forma de viver.
Curados de seus males, recebiam orientação, eram levados para o posto de socorro do qual o centro espírita fazia parte, para logo mais voltar quase sempre para seus lares ou lugares afins.

Tempos depois, pediam novamente socorro;
seus males, quase sempre, tinham voltado.

Isaías continuou a elucidar-me:
-Ricardo, nas nossas escolas e nos postos de socorro há muita disciplina.
Para que nosso trabalho dê resultado não podemos fugir da regra:
"Ordem para progredir".

Lá não são permitidos vícios, não há bebida alcoólica, fumo, não podemos permitir fofocas e palavreado baixo.
Há horário para tudo, e esses lugares de socorro e aprendizado são simples e sem luxo.
Muitos não gostam disso, não se adaptam lá, querem somente a cura dos males externos; mesmo no perispírito, há a parte externa.

Não curado o interno, não havendo modificações íntimas, com fluidos pesados da crosta, logo estão novamente com seus males.
E sofrem até que realmente desejem mudar, sendo a dor maior que o orgulho, até que aceitem nosso lugar de socorro como bênção e com respeito.
Muitos, entretanto, não conseguem ficar num posto de socorro pela saudade que sentem dos seus.

Desejam tão intensamente estar com eles que acabam vindo e depois não sabem voltar.
Completara quatro anos que trabalhava no centro espírita, meus familiares melhoraram muito.
Papai, para nossa felicidade, pensava em assumir os negócios.

-Ricardo -disse vovó - se você quiser pode voltar ao Educandário, não creio que Manuel possa recair.
Pensei por momentos e respondi:
-Vou ficar, vovó.
Se posso escolher, quero continuar aqui, quero encaminhar para uma compreensão maior os meus familiares e dedicar mais horas de trabalho a esse grupo tão amigo.
Ainda não participei das sessões e desejo muito fazê-lo!

-Orgulho-me de você, meu neto, acho que fez a melhor escolha.

Abraçamo-nos contentes.
Sentia-me realmente muito feliz, estava aproveitando a oportunidade que me fora oferecida, aprendia a servir.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:34 am

NO CONFORTO DO ESPIRITISMO

Depois de algum tempo em que passei a dedicar mais horas de trabalho ao centro espírita, papai ficou doente.

Sofrera um derrame cerebral e fora constatado que era portador da doença de Chagas.
O derrame deixou-lhe sequelas, ficara com o lado esquerdo do corpo com dificuldade de movimento, como também com problemas para falar.

Tratado com carinho e fisioterapia, meses depois estava caminhando com dificuldades, amparado numa bengala;
desistira de voltar ao trabalho, não saiu mais de casa e recebia poucas visitas.
Dores, o sacrifício dos exercícios, as medicações, nada disso fazia papai reclamar.

Estava contente com tudo, em casa ninguém reclamava, e um dia ouvi papai comentar com mamãe:
-Margareth, a sociedade não quis prender-me, não me deixaram pagar por meu crime na prisão.
Às vezes me pergunto se não estou preso.
Não saio mais de casa, fico quase o tempo todo no quarto e com minha doença quase não ando e falo tão enrolado!

-Manuel, não fale assim, sofremos sem reclamar, talvez este sofrimento seja fruto do nosso erro;
não toque mais neste assunto, por favor, você prometeu.
Tenho medo de que suas filhas ouçam, elas pensam com certeza que foi uma alucinação momentânea que teve.

Se papai não falava, pensava muito, todos os dias orava e pedia perdão.
Chegou a minha vez de servir nas sessões práticas no centro espírita.

Vibrei de contentamento.
A primeira vez em que participei foi para o estudo evangélico e doutrinário.
Não havia muitos encarnados.

Por mais que o senhor António convidasse e orientasse para a necessidade de todos aprenderem, principalmente os médiuns, para servirem com mais precisão e com sabedoria, eram poucos os que frequentavam as reuniões de estudo.

Muitos desencarnados tinham a permissão de ficar para aprender.
Isaías e outros colaboradores procuravam instruir e orientar o estudo da noite.
Iniciava-se com uma prece, feita a cada dia por uma pessoa, o senhor António abria O Evangelho Segundo o Espiritismo e lia um texto;
após, comentava-o e as pessoas presentes podiam dar Sua opinião, ou mesmo falar sobre o texto lido.

Os desencarnados somente escutavam e, se quisessem esclarecer alguma dúvida, esperavam o término da reunião, e Isaías elucidava-os com prazer.
Após, O Livro dos Espíritos foi aberto no lugar marcado, estava sendo estudado desde o início;
gostei muito da forma como estudavam, uma pergunta ou mais era lida e discutiam o assunto até que todos entendessem.

Era muito interessante, trocavam ideias, comentavam fatos ocorridos com eles, também liam nas reuniões artigos sobre a Doutrina Espírita, páginas de revistas e jornais espíritas.

No horário marcado, terminavam com a Prece de Cáritas e agradeciam a oportunidade de aprendizado.
Os encarnados iam embora conversando.
Nós ficávamos por mais tempo desfrutando da companhia de Isaías.
Agora éramos nós que conversávamos trocando ideias, comentando factos, tirando dúvidas com as elucidações de Isaías.

O trabalho de desobsessão começava para nós, desencarnados, horas antes, tudo bem organizado;
várias equipes participavam, para que aprendêssemos com precisão, era feito também o rodízio.

Uma equipe tomava conta dos desencarnados sofredores, outra, dos irmãos ignorantes do bem;
uma equipe auxiliava os encarnados, os médiuns, outra visitava os lares dos presentes, como também os pedidos que o centro espírita recebia, quase sempre de socorro, solicitações de ajuda, anotados no caderno que ficava sobre a mesa.
Também tínhamos a equipe de médicos e nós, leigos em medicina, participávamos como ajudantes de enfermeiros.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:34 am

Sempre havia muito trabalho.
Os espíritos adormecidos eram despertados e reunidos aos que chegavam para ouvir a leitura do Evangelho e as preces.
Todos os desencarnados tinham que ficar quietos, respeitando o ambiente.
Os insubordinados, para não tumultuar os trabalhos, eram presos por forças magnéticas e esperavam, numa fila, sua incorporação.

Os médiuns chegavam e sentavam-se à mesa.
O responsável pelas incorporações começava a organizar a fila dos que recebiam orientação pela incorporação, e por qual dos médiuns.
Quando um médium não ia, fazia muita falta, às vezes não era possível despertar todos os que esperavam adormecidos e muitos tinham que aguardar pela oportunidade na próxima vez.

E muitos iam sofrer por mais alguns dias ou semanas.
Com todos acomodados e em silêncio tinha início a sessão com uma prece feita por um dos que se sentavam ao redor da mesa.
O senhor António lia um texto do Evangelho e fazia breve comentário.

A luz branca apagava-se e era ligada uma outra bem suave.
Com todos participando da prece, o ambiente ficava confortador, levando muitos desencarnados a chorar emocionados.

Muitos, como previa Isaías, nem necessitavam de uma incorporação, compreendiam e aceitavam nossa ajuda.
Os protectores dos médiuns ficavam ao lado deles, ajudando na incorporação.
Os desencarnados aproximavam-se dos médiuns, que recebiam suas ideias e começavam a falar.

É um fenómeno maravilhoso.
Ao se aproximar o desencarnado do médium, este percebe a grande diferença que há nos seus corpos, logo que o doutrinador compara sua situação.
Ele fala quase sempre de sua situação, de suas mágoas e de suas dores; podendo falar e ser escutado por encarnados, recebe de um doutrinador orientação e, consequentemente, sua melhora.

Afastado do médium, espera em outra fila.
Os desencarnados perturbados, maus, ficam quase sempre inquietos, desejando incorporar logo, não tendo paciência para esperar, ou não querendo conversar com ninguém, ainda mais com encarnados.

Eles têm a consciência intranquila e não gostam de dar contas de seus actos.
Com sabedoria, o senhor António, ajudado por Isaías, conversava com eles, procurando fazer com que entendessem a necessidade de melhorar e mudar a forma de viver.

Orávamos com fé para que esses irmãos tomassem consciência de seus erros e voltassem ao bem.
Perto do horário de encerramento, os socorridos eram levados para um aerobus e conduzidos ao local devido;
Isaías sempre orientava seus colaboradores.
Nem todos os centros espíritas trabalham dessa maneira.

São diversas as maneiras de realizar a tarefa e, se os componentes de um grupo estão com boa vontade e determinação de fazer o bem, ele é realizado.
Contudo, os que estudam, aprendem, sabendo, realizam-no com mais segurança.
Procurava fazer as tarefas que me cabiam com segurança e da melhor forma.

Entretanto, sempre que possível, prestava atenção às incorporações.
Gostava muito. Cada desencarnado tinha uma história interessante.
A morte do corpo, a desencarnação, não é igual para todos, não segue regra geral, e a maioria das pessoas sofre por mudar a forma de viver e por não aceitar esta mudança.

Comovia-me por ver tantas pessoas passarem anos e anos iludidas, sem sequer perceber que tinham desencarnado.
Muitas delas acreditavam que a morte seria diferente, e não pelo processo simples por que passaram.
Outros julgavam-se credores por terem feito muitas orações, algumas caridades e participado de cultos externos.

Honraram com os lábios e não com o coração.
Muitas e muitas vezes, chorei junto deles, apiedando-me com seus sofrimentos.

Vendo tantos imprudentes, Isaías, por intermédio do senhor António, repetia sempre, tanto para os desencarnados como para os encarnados que ali aprendiam:
-Aproveitemos a oportunidade que o Pai Maior nos está oferecendo para melhorarmos interiormente, trocando nossos vícios por virtudes, aprendendo para compreender as verdades eternas.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:34 am

E a nós, encarnados, o que é mais importante é voltarmos ao plano espiritual com boas obras, com nossos talentos multiplicados;
e desde já tudo devemos fazer para que nos afinemos com o bem para merecermos ficar em bons lugares.

E suas orientações vinham ao encontro de nossas necessidades.
Nós, desencarnados, meditávamos em profundo silêncio e muitas vezes escutei no término da sessão encarnados trocando ideias:
-Não quero desencarnar e ficar no umbral.
Meu Deus, como é triste!

-Viva de maneira que mereça ser socorrida, Marisa!
-Como é ruim desencarnar e ficar iludido, julgando que o corpo não morreu!

Compreendi que o principal objectivo das reuniões era educar, instruir, doutrinar, sanar o espírito.
Após os socorridos terem se retirado, um dos presentes orava a Prece de Cáritas.
Os orienta dores desencarnados espargiam fluidos salutares sobre todos os encarnados que oravam e estes recebiam energias puras, forças para o espírito e o corpo.

Com a saída dos encarnados nosso trabalho não terminava.
Organizávamos tudo, deixando o centro espírita, . no plano espiritual, limpo e organizado.
Equipes nossas também acompanhavam os socorridos para o posto de socorro.

Fui lá muitas vezes, era grande e muito bonito.
Acomodávamos os doentes nas enfermarias, quase sempre eles indagavam sobre suas dúvidas e conversávamos por horas, motivando-os, explicando onde estavam, o que de facto se passara com eles.
Quase todos se sentiam felizes por estarem curados e faziam promessas de melhorar e se adaptar à nova forma de viver.

Pena, pensava, que a maioria logo esquecia esse propósito.
Gostava muito de participar dos trabalhos da equipe médica como ajudante de enfermagem, ajudando a encarnados e a desencarnados; ficava sempre atento às explicações que os médicos nos davam:
-As doenças têm diversas origens: as carmáticas, que às vezes só podemos suavizar para animar os doentes;
as que conseguimos curar são as doenças que criamos pelos vícios, pela alimentação errada e exagerada, e tantas outras doenças comuns, como gripe, sarampo etc., que são simples consequências de vivermos nos fluidos da Terra.

Fluir a água era de muita responsabilidade.
Doutor Jamil, nosso companheiro desencarnado, organizava a medicação, cuidadosamente a colocava nos frascos particulares e fluía com energia a água que todos tomariam.

No centro espírita não havia trabalhos sociais.
Senhor António sempre dizia que a caridade material ficava a cargo de cada um;
e ele dava o exemplo, socorria a todos os que lhe pediam e estava distribuindo sempre mantimentos pelos subúrbios da cidade.

Pessoalmente conhecia e participava de todos os trabalhos e, se podia escolher, ajudava nas incorporações.
Nessa ajuda, aprendi muito, entendi que é muito mais fácil desencarnar conhecendo o fenómeno da morte física e ter a compreensão de como vai ser a vida após a morte do corpo carnal.

Todas as religiões são boas;
pessoas religiosas são ligadas ao Pai;
ser bom é ter um tesouro de felicidade no plano espiritual, afinar-se com a vida simples e pura e amar os locais de socorro.

Mas o Espiritismo ensinava a amar com compreensão e entender com raciocínio lógico os ensinamentos de Jesus.
Os encarnados espíritas ganhavam muito aprendendo o que muitos de nós fazíamos agora, desencarnados.
Pensava como seria bom se os meus familiares conhecessem e entendessem o Espiritismo.

Sabendo que o senhor António visitava tantos doentes, pedi a Isaías:
-Isaías, o senhor António poderia visitar meus pais, o Espiritismo fará tanto bem a eles!
-Podemos pedir-lhe.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:34 am

O senhor António recebeu sem entusiasmo meu pedido.
"Como iria a um lar -pensou - sem ser convidado?
Como seria recebido, se apenas os conhecia?"

Não desanimei, insisti;
dois dias depois, ao sair para suas visitas, acompanhei-o, instruído por Isaías;
passou em frente à casa de meus pais, por minutos ficou indeciso, aproximei-me dele e pedi:
-Senhor António, por favor, vá, eles necessitam de orientação, de ajuda, vá, por favor.

Senhor António bateu palmas no portão e em instantes foi atendido por Pretinha.

Meu amigo falou um tanto encabulado:
-Vim visitar o senhor Manuel.
-Entre, senhor, estamos na sala neste momento, o senhor Manuel ficará contente.
Recebe tão poucas visitas, acha-se esquecido pelos antigos amigos.

O senhor António entrou, papai cumprimentou-o e reconheceu-o como um antigo freguês do armazém.
Era, contudo, pouco o conhecimento para uma visita, e meus pais ficaram curiosos.
O senhor António, agradável, simpático, encaminhou a conversação para assuntos alegres e os minutos passaram rapidamente.

Querendo que conversassem sobre a Doutrina Espírita, intuí Pretinha a indagar:
-Senhor António, o senhor é espírita?
-Sim, senhora, sou espírita.

-O que é o Espiritismo, senhor António? - indagou mamãe.
-Uma religião codificada por Allan Kardec, que nos dá a compreensão da vida nas suas diversas formas de vivê-la, seja no corpo físico, seja no Além, tendo o corpo morto.
A resposta simples veio directamente a eles e todos silenciaram e pensaram em mim.

Mamãe indagou, novamente curiosa:
-Acha o senhor que nosso Ricardo vive de outro modo? Ele está vivo?
-Sim, vivo em espírito, e Ricardo muito os ama.

Muitas perguntas fizeram ao senhor António, que pacientemente respondia, e a visita prolongou-se.

-Já é tarde - disse meu amigo - devo ir-me!
-Por favor, não vá, há tanto tempo que não tínhamos uma conversa tão agradável! - disse mamãe.
-Senhor António - disse papai no seu jeito confuso, às vezes sendo ajudado por mamãe ou Pretinha - sua religião deve dar muitas esperanças a seus seguidores.
Se o senhor puder, volte, interessei-me profundamente, gostaria de conhecer e entender seus ensinamentos.

-É com prazer que volto e, se quiser, trago alguns livros nos quais encontrarão esses ensinos.
-Poderia comprá-los para nós?
Gostaria de ter alguns - disse mamãe, entusiasmada.
Que maravilhoso é poder saber como está vivendo Ricardo, como é a continuação da vida no Além.
-Sim, posso comprá-los, tenho alguns exemplares para serem vendidos, que adquiri na Feira do Livro do ano passado.

Mamãe pediu licença, saiu da sala e voltou com uma quantia de dinheiro que entregou ao senhor António.

-Compre-os para nós, por favor, senhor António.
Aqui está o dinheiro, traga-nos o que achar melhor, assim desfrutaremos novamente de sua companhia, quando vier trazê-los.

Quando o senhor António se retirou, conversaram animados sobre o assunto ouvido e, como esperava, gostaram muito do orientador do centro espírita.
Agradeci ao senhor António.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Nov 08, 2014 10:35 am

Ele sorriu para mim, sentiu meus fluidos e disse baixinho:
-Foi você, hem, Ricardo, que me fez vir visitá-los.
Valeu, meu amigo, foi uma visita de proveito.

O senhor António foi logo separar os livros para levar à mamãe, e exclamou ao contar o dinheiro:
-Ora veja, a senhora Margareth pensa que os livros espíritas são caros como os comuns.
Comprará muitos livros!

Dois dias depois, o senhor António levou os livros, explicou o que encontrariam em cada um deles e conversaram por muito tempo sobre Espiritismo.

Comovi-me quando papai pediu-lhe:
-Senhor António, seria possível dar-me um passe?

O senhor António bondosamente aplicou-lhes um passe de energia e todos se sentiram bem.
O dirigente espírita passou a ser um amigo sempre bem-vindo àquela casa.
Começaram a ler os livros, trocar ideias, falar de textos e, como o senhor António sugerira, todos os dias, à tardinha, reuniam-se, e mamãe lia um texto de O Evangelho Segundo o Espiritismo e oravam juntos.

O clima de minha casa mudou, a tristeza já não deixava fluidos cinzentos, começaram a pensar na caridade e, o mais importante, a praticá-la.
Valquíria acomodara-se bem, agora ficava muito com meus pais, escutava quieta a leitura, as preces, gostando de sentar ao lado de papai.

Papai sofreu seu segundo derrame cerebral, que lhe deixou sequelas mais graves.
Falava poucas coisas e só se locomovia com ajuda.
Agora, passava quase o tempo todo deitado ou sentado; passou a meditar nos ensinos que adquirira.
Valquíria fazia-lhe agora companhia constante, ficavam sentados pertinho, silenciosos, porém comungando carinho e resignação.

Os quatro se reuniam por mais tempo e, para não cansar papai, era mamãe ou Pretinha quem lia alto os livros;
por vezes, paravam para comentar o texto.
E, como Carlos previra, Valquíria não estava bem fisicamente, seu organismo fraco logo expulsaria sua alma.
Foi durante uma dessas reuniões, em que mamãe lia, que Valquíria simplesmente se desligou.

Seu corpinho estremeceu e deixou de respirar.
Seu enterro foi simples e papai não pôde ir, sentiu muito sua ausência.
Mas desta vez, com a compreensão espírita, evitaram chorar e esforçaram-se por se conformar.
Mamãe arrependeu-se muito por ter, anos antes, desejado que ela morresse e comentou isso com o senhor António, logo que ele os visitou.

-O que importa, dona Margareth, são seus sentimentos agora, não deve pensar mais nisso.
Deu-lhe tanto carinho nestes últimos anos e tomaram-se amigas, amaram-se.
Valquíria teve o tempo que lhe foi necessário para reajustar-se;
a morte de seu corpo foi uma libertação.
Onde está agora, terá a cura de seus males.
Pensemos nela, feliz e em paz, e oremos para que ela se adapte lá.

O senhor António tinha razão.
Valquíria foi desligada carinhosamente por socorristas, levada para um local de socorro ao qual estava filiada como ex-suícida e lá continuou a ser orientada.
Foi com grande alegria que recebi permissão para visitá-la.

-Valquíria!
-Ricardo! Meu Ri!
Abraçamo-nos ternamente, Valquíria estava sadia, falava perfeitamente, seu aspecto modificara-se, estava tranquila.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Nov 09, 2014 10:14 am

Ela explicou-me: .
-Tive permissão para modificar meu aspecto, poderia até ter a aparência que tive em outra existência, porém não quero ser bonita como fui antes nem tão feia como fui nesta;
mas, ao ficar sadia, obtive esta aparência e vou ficar assim.
Ricardo, meu irmão, alegro-me tanto em vê-lo e conversar com você!

Valquíria tinha uma voz agradável e doce, estava feliz por conversar, andar com segurança, correr.

-Valquíria, eu que me alegro vendo-a assim.
-Você amou-me, ajudou-me, sou-lhe grata.
-Quero amar e ajudar sempre.
Valquíria, por que você não tenta amar a todos também?

-Vou aprender, Ricardo, os ensinos que ouvi sobre a Doutrina Espírita ajudaram-me tanto!
O meu cérebro físico podia não entender, mas espiritualmente sim, recordo-os com carinho, vou estudá-los e firmar-me no bem.
É tão bom amar a todos e não ter mágoa de ninguém!

-O amor, minha irmã, é o remédio para todos os males, força pura que nos aproxima do Pai.
Que Deus a proteja, Valquíria.

E, sempre que me era permitido, ia visitá-la, conversávamos muito e contente acompanhei Valquíria, que com determinação começou a estudar, trabalhar e logo, dentro da instituição, passou a fazer parte de uma equipe de ajuda aos suicidas socorridos.

Minha casa terrena modificara-se, sem Valquíria.
Diminuíram os trabalhos, ficou vazia e silenciosa sem seus gritos e choros.
Mamãe e Pretinha, seguindo os conselhos do senhor António, doaram os pertences todos de Valquíria, e até mesmo alguns meus que estavam guardados, para uma escola que orientava crianças excepcionais.

Com a permissão de papai, passaram as duas a ir às reuniões de estudos.
Passaram também a confeccionar roupinhas e distribuí-las nos lugares pobres da cidade.
Defrontaram com muitos sofrimentos, comentavam com papai.
Vendo que muitos sofriam mais que eles, entenderam que é ajudando que se é ajudado, é confortando que se é confortado.

Papai, por ficar muito tempo deitado e sentado, começou a ficar com o corpo ferido.
Às vezes chorava de dor, porém não reclamava, orava muito, pedia perdão e, o mais importante, perdoara a si mesmo.
O senhor António convidou mamãe e Pretinha para assistirem aos trabalhos práticos de incorporações, elas foram.

Isaías disse-me, ao vê-las entrar no salão:
-Ricardo, prepare-se.
No término dos trabalhos, antes da Prece de Cáritas e da oração final, incorporará e falará aos seus familiares presentes por meio do aparelho mediúnico de dona Ana.

Emocionado, pensei no que falaria e aguardei ansioso minha vez.

Quando acabou a doutrinação dos socorristas da noite, o senhor António, instruído por Isaías, viu-me ao lado de dona Ana e disse:
-A dona Ana receberá mais uma vez, é um amigo que dará uma comunicação à sua mãe presente.

Estava maravilhado;
era a primeira vez que desfrutava a graça desse intercâmbio.
Falei e, como um disco gravado, a dona Ana repetiu alto para os encarnados escutarem.
Emocionei-me, segurei as lágrimas.

Não querendo abusar, procurei ser breve e disse:
-Mamãe, Pretinha, peço-lhes a bênção.
Estou muito bem, vivo feliz, estou agradecido pela oportunidade de falar a vocês, como também por vocês terem aceitado a graça do consolo que o Espiritismo dá a todos nós.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Nov 09, 2014 10:15 am

Peço-lhes paciência e firmeza na caminhada a que foram chamadas a seguir.
Trago notícias de Valquíria, minha irmãzinha está linda, sadia e muito feliz.
Transmita ao papai meu pedido de bênção e digam também que o amo muito.
Eu amo demais todos vocês!

Afastei-me.
Não só mamãe e Pretinha choravam como muitos dos presentes e até eu.
Isaías abraçou-me.

-Isaías, sou grato a todos.
-Ricardo, a mediunidade é maravilhosa quando se serve ao bem, agradeçamos ao Pai.
Acompanhei-as, estavam as duas contentes, agradecidas, e ao chegarem foram contar ao papai.

-Meu Ricardo vive, é feliz – exclamou ele - graças a Deus!
Choraram de emoção, de saudade e as lágrimas de resignação os aliviaram; tranquilos, oravam em agradecimento.
Passei a dedicar mais horas de trabalho ao centro espírita.

As restantes, ficava com os meus para animá-los.
Agora, minha tarefa em casa estava fácil.

Se via papai sofrer fisicamente, por outro lado ele se fortalecia espiritualmente e isso era o mais importante.
Sabia que iria desencarnar e seu sofrimento estava curando seu espírito.

E trabalho num centro espírita não falta; o aprendizado era diário e o tempo passou.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Nov 09, 2014 10:17 am

ALELUIA

Papai não estava bem, tanto que Isaías permitiu que passasse mais tempo com ele.

Ia completar naquela manhã quinze anos que eu desencarnara.
Como sempre, fizeram a higiene diária em papai e ele pacientemente suportara as dores que sentia ao serem medicados seus ferimentos causados pela imobilização.
Tinha feridas pelo corpo, principalmente nas costas, nádegas e pernas, que exalavam odores desagradáveis.

Sentia muitas dores e cansaço.
Lembraram-se os três da data, comentaram os tristes factos ocorridos há quinze anos.
Éramos felizes e este dia marcou a todos, levando-os a conhecer a dor, o sofrimento.

Deixaram papai no leito, ele começou a recordar os acontecimentos daquele dia com clareza.
Depois passou a recordar acontecimentos, sem ordem, de sua vida.
Seu corpo enfraquecia, respirava com dificuldade, logo ia ter seu terceiro derrame cerebral.

Mamãe e Pretinha, ao vê-lo, preocuparam-se e pediram que buscassem o médico.

Logo o facultativo chegou e examinou-o:
-Senhor Manuel não está bem, dona Margareth.

Mandaram chamar Taís e Telma e eu chamei Isaías.

-Ricardo - disse-me Isaías carinhosamente -, seu pai desencarna.
Os socorristas logo estarão aqui para desligá-lo do corpo, o senhor Manuel será levado para um posto de socorro.
Seu pai muito errou, muito sofreu, aprendeu a amar e, o mais importante, aproveitou seu sofrimento para aprender e modificar-se, suportou o sofrimento físico, como medicamento para seu espírito.

A família em prece acompanhou sua agonia, estavam silenciosos.
Isaías adormeceu o espírito de papai, que parou de sofrer;
os socorristas o desligaram e o retiraram do corpo, e este morreu.

Acompanhei tudo calmamente, orando com fé, vibrando com carinho, para que eles tivessem força, diante de mais esse sofrimento.
Sabendo que papai ia ficar dormindo algum tempo, permaneci ali para consolar mamãe.

Quando o médico deu a notícia, mamãe chorou baixinho, tentou orar, rogava por meu auxílio, pedia-me para encaminhar papai.

Taís e Telma tudo fizeram para consolar mamãe.
Foram ao enterro juntas, sentiam sem revolta a desencarnação de papai.
Continuaram a ir a casa, agora de mamãe, e tudo faziam para agradá-la e confortá-la.

Após a missa de sétimo dia que Taís mandou celebrar, foram todos da família ao cemitério.
No mesmo túmulo estavam os restos mortais de papai, de Valquíria e os meus, como Ricardo.

-Margareth -disse Taís -, Márcio e eu queremos que você e Pretinha venham morar connosco.
-Também é este o nosso desejo - disse Telma.
Mamãe chorou comovida, agradecida, e abraçou as enteadas.

-Obrigada, minhas filhas, Pretinha e eu queremos ficar no nosso canto, não queremos mudar, lá é o nosso lugar, mas quero pedir a vocês para que nos enterrem aqui, junto deles, quando nosso corpo morrer.
Queremos ficar os cinco juntos.
Todos foram embora, só ficaram mamãe e Pretinha, orando.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Nov 09, 2014 10:17 am

-Pretinha, como Taís e Telma são boas!
-Dona Margareth, a senhora também sempre foi boa para elas.
-É, Pretinha, recebo uma pequena parte de minha colheita, a parte boa.
Já pensou se tivesse sido má com elas, agora sozinha, com quem contaria?
Tive dois filhos, tenho-os, porém partiram mais cedo, só me restam elas.

-Não está sozinha, tem a mim;
eu, sim, não tenho ninguém.
-Queixamo-nos à toa, temos muito e teremos mais se fizermos por merecer.
Se eu tenho você, você tem a mim.
Que tal pensarmos que somos duas irmãs?
Para começar, não me chame mais de dona!

-Será que me acostumo?

As duas voltaram de braços dados e com muitos planos.
Iam ser membros activos dos trabalhos assistenciais e frequentar todas as sessões do centro espírita.
Eram, de agora em diante, espíritas assumidas.

À noite, reuniram-se para tratar dos negócios, mamãe disse:
-Márcio, quero que cuide do testamento, você e Carlos.
Quero somente ficar com esta casa e já passei em usufruto das meninas.

Quero, também, passar a casa que temos na esquina em nome de Pretinha;
se eu morrer primeiro, quero que ela fique pelo menos com uma casa boa e que o aluguel a sustente, juntamente com a aposentadoria que logo irá receber.
Com a aposentadoria que receberei de Manuel, eu e Pretinha viveremos bem.

-Dona Margareth, tem certeza de que é isso mesmo que quer?
A metade de tudo o que o senhor Manuel tinha é da senhora.
-É assim que quero, Márcio, tudo o que era de Manuel deve ser de Taís e Telma.

-Farei como quiser, porém temo que a aposentadoria não possa sustentá-las no futuro.
Passarei as casas de aluguel que o senhor Manuel tinha no seu nome em usufruto de Taís e Telma.
Terá assim mais uma renda e nós teremos a certeza de que estarão bem, financeiramente.

E reafirmamos:
nossos lares estarão à disposição de vocês duas, venham ter connosco quando quiserem.
Podem ter a certeza de poderem contar connosco sempre, a família continua.
A senhora, dona Margareth, foi sempre como mãe para Taís e Telma, avó de nossos filhos, nós a amamos e nossa amizade deve continuar.

Ao receber o recado de que papai acordara, quase um Mês depois, fui visitá-lo.
Estava num posto de socorro perto da crosta, um lugar de amor, pequeno, simples e bonito.

Abraçamo-nos comovidos, choramos e ele exclamou:
-Desencarnei mesmo!
-Papai, está num posto de socorro recuperando-se, logo poderá levantar-se, deve esforçar-se para sarar.
São, pode ser útil; doente, terá de receber ajuda.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Nov 09, 2014 10:17 am

-Esforçar-me-ei, meu filho, tantos anos doente, alegro-me em sarar, já não sinto mais dores.
-Papai, é um hóspede desta casa de caridade, aqui fica quem quiser.
Querendo poderá voltar ao lar, basta desejar ardentemente, mas não deve fazer isso, não deve desejar voltar lá, agora é um desencarnado e deve desejar somente viver como tal em espírito, sem o corpo carnal.

-Entendo, filho;
vou sentir saudade das pessoas, mas não de estar encarnado.
Ainda sinto o odor desagradável das minhas feridas.
Sinto-me tão bem aqui, nada farei sem ordem ou permissão, quero ser e vou ser obediente.
Sou grato a Deus e a todos os que me socorreram.

Voltei tranquilo. Em casa, Pretinha e mamãe estavam bem.
Colocando seus planos em prática, faziam, animadamente, suas tarefas.
Agora, poderia voltar aos meus estudos, poderia concluí-los nas esferas superiores, e levaria uma grande bagagem de conhecimentos, adquiridos nesses anos que passei em trabalho e aprendizagem entre amigos no centro espírita.

Comuniquei minha decisão a Isaías.
-Ricardo, fico contente por ter tido você connosco nesses anos, e fico mais contente ainda por saber que você está querendo estudar, progredir.

Isaías reuniu todos os trabalhadores e, após a reunião da noite, despedi-me de todos eles, abraçando um por um.
Éramos amigos e amigos sabem se despedir, era um "até logo!" com votos de felicidade. Parti.

Após quinze anos, o tempo passara, envelhecemos quando reencarnados, porém eu estava como minutos antes do acidente.
Não me modificara, os encarnados que me amavam pensavam em mim assim, fora bom papai ver-me assim, com fisionomia de adolescente, mas com o amadurecimento de um adulto.
Passara, agora, pelo tempo.

Fui primeiramente ver papai e encontrei vovó Margarida e mamãe Manuela visitando-o.

Papai segurava a mão de mamãe Manuela:
-Manuela, seu perdão me faz tanto bem, obrigado.
-Manuel, há tanto tempo que lhe perdoei.
Esqueçamos os factos tristes.
Alegremo-nos com o presente e esperançosos devemos estar quanto ao futuro.
-Papai! Mamãe! - exclamei.

Abraçamo-nos.
Mamãe Manuela levantou-se e foi ficar perto de vovó que estava em pé do outro lado da cama.
Sentei-me onde ela estava, numa cadeira ao lado da cabeceira de seu leito, e segurei sua mão.

-Como está, papai?
-Bem, filho, Manuela veio visitar-me e perdoou-me!
Papai apertou-me a mão, fechou os olhos e, emocionado, continuou a falar:
-Só falta ver meu Raul, queria tanto vê-lo, pedir, implorar seu perdão, meu filhinho Raul, amo-o tanto agora!

Quis ser Raul, concentrei-me e modifiquei minha imagem.
Adquiri as feições que tinha antes, meu perispírito mudou-se na aparência que tinha como Raul.
Ave sem Ninho
Ave sem Ninho

Mensagens : 122645
Data de inscrição : 07/11/2010
Idade : 68
Localização : Porto - Portugal

Ir para o topo Ir para baixo

RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho - Página 5 Empty Re: RECONCILIAÇÃO - António Carlos / Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho

Mensagem  Conteúdo patrocinado


Conteúdo patrocinado


Ir para o topo Ir para baixo

Página 5 de 6 Anterior  1, 2, 3, 4, 5, 6  Seguinte

Ir para o topo

- Tópicos semelhantes

 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos