LUZ ESPÍRITA
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Série André Luiz - OS MENSAGEIROS

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Série André Luiz - OS MENSAGEIROS - Página 3 Empty Re: Série André Luiz - OS MENSAGEIROS

Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 28, 2011 10:31 pm

XVII - O romance de Alfredo

Depois de alguns minutos, utilizados por nós no serviço da higiene reconfortadora, Alfredo convidou-nos à mesa, onde Ismália, com extrema fidalguia, mandou servir frutos diversos.

Os senhores do castelo não podiam ser mais gentis.
Servidores iam e vinham, com grande júbilo a lhes transparecer do rosto.
A palestra de Alfredo e as observações de Ismália estavam cheias de notas interessantes e educativas.

— E qual a sua impressão dos serviços em geral? — perguntou Aniceto, atencioso, dirigindo-se ao dono da casa.

— Excelente, quanto às oportunidades de realização que nos oferecem — respondeu Alfredo em tom significativo — entretanto, não tenho o mesmo parecer quanto à situação em curso.

As zonas a que servimos estão repletas de novidades dolorosas.

O presente período humano é de conflitos devastadores e as vibrações contraditórias que nos atingem são de molde a enfraquecer qualquer ânimo menos decidido.

Desencarnados e encarnados empenham-se em batalhas destruidoras.
É uma lástima.
Multiplica-se o número de necessitados que recorrem ao Posto? — continuou indagando nosso orientador.

— Enormemente. Nossa produção de alimentos e remédios tem sido integralmente absorvida pelos famintos e doentes.

Tenho quinhentos cooperadores, mas nos sentimos presentemente incapazes de atender a todas as obrigações.

As massas de sofredores são incontáveis.
Noutro tempo, nossa paisagem se mantinha sem sombras, durante muitas semanas, mas agora...
Nesse instante, Ismália pediu licença para dirigir-se ao interior.

E como Alfredo fixasse os olhos nos meus, aventurei-me a considerar:
— Ainda bem que tendes uma abnegada companheira ao vosso lado.

Ele e Aniceto sorriram, quase a um só tempo, falando-nos o administrador;
— Ah! meus amigos, por enquanto, não tenho essa felicidade em carácter definitivo.

Minha esposa e eu temos o divino compromisso da união eterna, mas ainda não lhe mereço a presença contínua.

Ela é a bondade celeste, e eu, a realidade humana.
Depois de pequena pausa, prosseguiu com gentileza:
— Aniceto conhece a história.
Vocês, porém, a ignoram. Sentir-me-ei, portanto, contente, em relatar algumas lembranças, com benefício duplo.

Aliviarei o coração, uma vez mais, contando minhas faltas, e vocês dois, que talvez tenham em breve novos serviços na Terra, aproveitarão, por certo, alguma coisa das minhas experiências.

Ismália e eu guardávamos um escrínio de felicidade no mundo; no entanto, os salteadores perversos espreitavam-nos a ventura.

Minha responsabilidade era enorme no campo dos negócios materiais, e, longe de compreender as obrigações sublimes de esposo e pai, não procurava atender aos deveres justos para com o lar e os dois filhinhos que Deus me enviam ao círculo doméstico.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:38 pm

Ismália, porém, era a providência de nossa casa.
Esqueci-me, contudo, de que a virtude, a qualquer tempo, será atormentada pelo vício e minha nobre companheira foi vítima da maldade de um amigo desleal, com quem tinha eu inúmeros interesses em comum, no campo monetário.

Minha esposa sofreu, em silêncio, a perseguição dele por alguns anos consecutivos.

E quando meu desventurado sócio verificou a inutilidade da atitude criminosa, em franco desespero buscou envenenar-me o espírito desprevenido.

Começou por advertir-me, quanto ao procedimento dela.
Atordoou-me, envolvendo-a em acusações descabidas.
Subornou criados domésticos e colocou espiões que seguissem minha querida Ismália, nas tarefas de esposa e mãe.

Esse homem exercia profunda influência sobre mim, e, atendendo aos laços que nos uniam, minha companheira jamais se sentiu com bastante coragem para denunciá-lo.

Enquanto dava ouvidos à calúnia, fora de meu círculo doméstico, tomara-me intolerável dentro dele.
Não sabia contemplar minha esposa com a despreocupação e a confiança absoluta de outra época.

Via o mal nos seus mínimos gestos e queria descobrir segundas intenções nas suas frases mais inocentes.
Cheguei a acusá-la, veladamente.
Ismália chorou e calou-se.

Por fim, nosso infeliz perseguidor subornou um homem de baixa condição que permaneceu, certa noite, ao lado de nossos aposentos particulares como vulgar ladrão, às ocultas, sendo eu convocado à prova máxima.

Penetrei no quarto em extremo desespero e acusei em voz alta ao ver a companheira profundamente tranquila.

Ismália levantou-se, receosa da minha saúde mental, mas não lhe atendi os rogos, procurando, como louco, o conspurcador da minha honra...

Abri violentamente grande armário antigo, vasculhando o quarto.

Nesse instante, o vulto de um homem esgueirou-se na sombra, do aposento próximo, e, antes que eu pudesse agarrá-lo no meu ódio infrene, saltou a janela, alcançando o pomar de nossa casa.

Corri, desesperado, detonando balas a esmo, mas, nada consegui.

Regressei ao quarto e, para cúmulo da calúnia odiosa, o desconhecido deixara, atrás de si, um chapéu novo, rigorosamente moderno, para que se acentuassem meus sentimentos terríveis.

Olhos congestos, vomitando insultos, quis eliminar Ismália, banhada em lágrimas a meus pés; no entanto, alguma coisa, que nunca pude compreender na Terra, paralisou-me o braço quase homicida.

Vociferando blasfémias, surdo aos rogos dela, afastei-me do lar, tomado de horror.

No dia imediato, fiz valer meu direito exclusivo sobre os filhos e providenciei para que Ismália, convertida em estátua de dor, fosse restituída à fazenda paterna.

Contratei uma governanta para os meninos e, logo após, tomei um paquete para a Europa, onde me demorei mais de três anos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:38 pm

Nunca me propus a verificações sérias, e, embora tivesse o espírito incessantemente atormentado, omitindo os sentimentos mais íntimos, jamais procurando notícias da companheira caluniada.

Certo dia, recebi uma carta lacónica na costa francesa.
Um parente dava-me informações da esposa.

Após dois anos angustiosos, entre a saudade e o abandono, Ismália fora colhida pela tuberculose, falecendo em terrível martírio moral.

Deliberei, então, a volta.
Fixei-me novamente no Rio, eduquei os filhinhos e conservei a dolorosa viuvez no desencanto do coração.

Os anos rolaram uns sobre os outros, quando fui chamado à cabeceira do ex-sócio agonizante.
O infeliz, em face da morte, confessou o crime odioso, pedindo um perdão que, infelizmente, não pude conceder.

Transformei-me, desde então, num louco irremediável.
Cansado, envelhecido, procurei a propriedade rural dos sogros, tentando reparar, de alguma sorte, a injustiça, mas a morte não me deu ensejo e voltei para a esfera dos desencarnados, em tristes condições espirituais.

Nesse instante, fez uma pausa, para continuar comovido:
— Não preciso dizer que recebi de Ismália todo o amparo de que necessitava. Todavia, infelizmente para mim, estávamos separados.

Não mereci a bênção da união sublime.
Ismália segue-me de perto, mas tem residência num plano superior, que devo esforçar-me por alcançar.

Desde muito, dediquei-me aos serviços do nosso Posto de Socorro, consagrei-me aos ignorantes e sofredores, e minha santa Ismália vem até aqui, mensalmente, incentivar-me o bom ânimo e amparar-me nas lutas.

— Mas não poderia ela transferir-se definitivamente para aqui? — indagou Vicente, tão impressionado quanto eu, com o romance comovedor.

Alfredo sorriu e falou:
— Sei que Ismália tem trabalhado para isso, que seu ideal de união eterna é idêntico ao meu, atendendo à circunstância de estar o superior sempre em posição de dar ao inferior;
mas não ignoro que foi advertida por nossos maiores, sobre as minhas actuais necessidades de esforço e solidão.

Preciso conhecer o preço da felicidade, para não menosprezar, de novo, as bênçãos de Deus.
Minha esposa deseja descer para encontrar-se definitivamente comigo;
entretanto, é necessário que eu aprenda a subir e, por este motivo, ainda não recebemos a devida permissão para o definitivo consórcio espiritual.

Observando-nos a emoção, concluiu:
Estou resgatando crimes de precipitação.
Pela impulsividade delituosa, perdi minha paz, meu lar e minha devotada companheira.

Conforme ouviram, não matei nem roubei a ninguém, mas envenenei-me a mim próprio.

A calúnia é um monstro invisível, que ataca o homem através dos ouvidos invigilantes e dos olhos desprevenidos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:39 pm

XVIII - Informações e esclarecimentos

A volta de Ismália ao círculo da conversação impediu o prosseguimento do assunto.

Aproveitando, talvez, a oportunidade, Aniceto perguntou ao administrador:
— Que me diz da continuação de nossa viagem?
Estimamos alcançar, ainda hoje, as esferas da Crosta.

Dirigiu-nos Alfredo significativo olhar e falou:
Não me sinto com o direito de alterar-lhes o plano de serviço, mas seria conveniente pernoitarem aqui.

Nossos aparelhos assinalam aproximação de grande tempestade magnética, ainda para hoje.
Sangrentas batalhas estão sendo travadas na superfície do globo.

Os que não se encontram nas linhas de fogo, permanecem nas linhas da palavra e do pensamento.
Quem não luta nas acções bélicas, está no combate das ideias, comentando a situação.

Reduzido número de homens e mulheres continuam cultivando a espiritualidade superior.

É natural, portanto, que se intensifiquem, ao longo da Crosta, espessas nuvens de resíduos mentais dos encarnados invigilantes, multiplicando as tormentas destruidoras.

Aniceto escutava com atenção.
— Não me preocupo com sua pessoa — continuou Alfredo, dirigindo-se de maneira particular ao nosso instrutor —, mas estes dois amigos, penso, seriam desagradavelmente surpreendidos.

— Tem razão — concordou Aniceto.
E, esboçando significativa expressão fisionómica, prosseguiu:
— Avalio o sacrifício dos nossos companheiros espirituais, nos trabalhos de preservação da saúde humana.

— São grandes servidores — disse o senhor do castelo. — De quando em quando, observo-lhes, pessoalmente, os núcleos de actividade santa.

A Humanidade parece preferir a condição de eterna criança.
Faz e desfaz os patrimónios da civilização, como se brincasse com bonecas.

Nossos irmãos suportam pesados fardos de serviço para que as tormentas magnéticas, invisíveis ao olhar humano, não disseminem vibrações mortíferas, a se traduzirem pela dilatação de penúrias da guerra e por epidemias sem conta.

As colónias espirituais da Europa, mormente as de nosso nível, estão sofrendo amargamente para atenderem as necessidades gerais.

Já começamos a receber grandes massas de desencarnados, em consequência dos bombardeios.

“Nosso Lar”, pela missão que lhe cabe, ainda não pode imaginar todo o esforço que o conflito mundial vem exigindo da nossa colaboração nas esferas mais baixas.

Os Postos de Socorro de várias colónias, ligadas a nós, estão superlotados de europeus desencarnados violentamente.

Fomos notificados de que as súplicas da Europa dilaceram o coração angélico dos mais altos cooperadores de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Aos terríveis bombardeios na Inglaterra, na Holanda, Bélgica e França, sucedem-se outros de não menor extensão.

Depois de reiteradas assembleias dos nossos mentores espirituais, resolveu-se providenciar a remoção de, pelo menos, cinquenta por cento dos desencarnados na guerra em curso, para os nossos núcleos americanos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:39 pm

Temos aqui o nosso campo de concentração com mais de quatrocentos.
— Mas não há dificuldade no socorro a essa gente? — Indagou Aniceto em tom grave. — E a questão da linguagem?

— Os serviços de socorro, apesar de intensos na Europa, têm sido muito bem organizados, explicou Alfredo —;
para cada grupo de cinquenta infelizes, as colónias, do Velho Mundo fornecem um enfermeiro-instrutor, com quem nos possamos entender, de modo directo.

Desse modo, o problema não pesa tanto, porque nossa parte de colaboração consta de fornecimento de pessoal de serviço e de material de assistência.

— Não seria, porém, mais justo — indagou Vicente — que os desencarnados dessa espécie fossem mantidos nas próprias regiões do conflito?

Alfredo sorriu e explicou:
— Nossos instrutores mais elevados são de parecer que essas aglomerações seriam fatais à colectividade dos Espíritos encarnados.

Determinariam focos pestilenciais de origem transcendente, com resultados imprevisíveis.

Inúmeros de nossos irmãos que perdera o corpo nas zonas assoladas não conseguem subtrair-se ao campo da angústia; mas, quantos ofereçam possibilidades de transferência para cá, dentro das nossas cotas de alojamento, são retirados dali, sem perda de tempo, para que seus pensamentos atormentados não pesem em demasia nas fontes vitais das regiões sacrificadas.

Nesse ínterim, Aniceto interveio, esclarecendo:
— Embalde voltarão os países do mundo aos massacres recíprocos.
O erro de uma nação influirá em todas, como o gemido de um homem perturbaria o contentamento de milhões.

A neutralidade é um mito, o insulamento uma ficção do orgulho político.
A Humanidade terrestre é uma família de Deus, como bilhões de outras famílias planetárias no Universo Infinito.

Em vão a guerra desfechará desencarnações em massa.
Esses mesmos mortos pesarão na economia espiritual da Terra.
Enquanto houver discórdia entre nós, pagaremos doloroso preço em suor e lágrimas.

A guerra fascina a mentalidade de todos os povos, inclusive de grande número de núcleos das esferas invisíveis.

Quem não empunha as armas destrói dons, dificilmente se afastará do verbo destruidor, no campo da palavra ou da ideia.

Mas, todos nós pagaremos tributo.
É da lei divina, que nos estendamos e nos amemos uns aos outros.

Todos sofreremos os resultados do esquecimento da lei, mas cada um será responsabilizado, de perto, pela cota de discórdia que haja trazido à família mundial.

Alfredo, que parecia ponderar seriamente os conceitos ouvidos, observou:
— É justo.

Aniceto voltou a considerar, após silêncio mais longo:
— Estive pessoalmente, a semana passada, em “Alvorada Nova”, que fica em zonas mais altas, e vim a saber que avançados núcleos de espiritualidade superior, dos planetas vizinhos, desde as primeiras declarações desta guerra, determinaram providências de máxima vigilância, nas fronteiras vibratórias mantidas connosco.

Ensinam-nos os vizinhos beneméritos que devemos suportar, nos próprios ombros, toda a produção de mal que levarmos a efeito. Somos, finalmente, a casa grande, obrigada a lavar a roupa suja nas próprias dependências.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:39 pm

Sorrimos todos, com essa comparação.
Ismália, que permanecia em silêncio, não obstante a funda impressão que se lhe estampara no rosto, considerou com delicadeza:
— Infelizmente, na feição colectiva, somos ainda aquela Jerusalém escravizada ao erro.

Todos os dias somos curados por Jesus e todos os dias conduzimo-lo ao madeiro.
Nossas obras estão reduzidas quase a simples recapitulações que fracassam sempre.

Não saímos do estágio da experiência.

E, dolorosamente para nós, estamos sempre a ensaiar, no mundo, a política com os Césares, a justiça com os Pilatos, a fé religiosa com os Fariseus, o sacerdócio com os rabinos do Sinédrio, a crença com os Jairos que acreditam e duvidam ao mesmo tempo, os negócios com os Anases e Caifases.

Neste passo, não podemos prever a extensão dos acontecimentos cruciais.

Encantado com as definições ouvidas, aventurei-me a dizer:
— Como é angustiosa, porém, a destruição pela guerra!

— Nestes tempos, contudo — observou Alfredo, bondosamente — a prece é união à luz mais intensa no coração dos homens.
Bem se diz que a estrela brilha mais fortemente nas noites sem luz.

Imaginem que, para iniciar providências de recepção aos desencarnados em desespero, já fui, mais de uma vez, aos serviços de assistência na Europa.

Há dias, em missão dessa natureza, fomos, eu e alguns companheiros, aos céus de Bristol.
A nobre cidade inglesa estava sendo sobrevoada por alguns aviões pesados de bombardeio.

As perspectivas de destruição eram assustadoras.
No seio da noite, porém, destacava-se, à nossa visão espiritual, um farol de intensa luz.

Seus raios faiscavam no firmamento, enquanto as bombas eram arremessadas ao solo.
A chefia da expedição recomendou nossa descida no ponto luminoso.

Com surpresa, verifiquei que estávamos numa igreja, cujo recinto devia ser quase sombrio para o olhar humano, mas altamente luminoso para nossos olhos.
Notei, então, que alguns cristãos corajosos reuniam-se ali e cantavam hinos.

O Ministro do Culto lera a passagem dos Actos, em que Paulo e Silas cantavam à meia-noite, na prisão, e as vozes cristalinas elevavam-se ao Céu, em notas de fervorosa confiança.

Enquanto rebentavam estilhaços lá fora, os discípulos do Evangelho cantavam, unidos, em celestial vibração de fé viva.

Nosso chefe mandou que nos conservássemos de pé, diante daquelas almas heróicas, que recordavam os primeiros cristãos perseguidos, em sinal de respeito e reconhecimento.

Ele também acompanhou os hinos e depois nos disse que os políticos construiriam os abrigos anti-aéreos, mas que os cristãos edificariam na Terra os abrigos anti-trevosos.

Às vezes — concluiu o senhor do castelo, em tom significativo — é preciso sofrer para compreender as bênçãos divinas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:40 pm

XIX – O sopro

Depois de interessantes considerações relativamente à situação dos círculos carnais, Aniceto voltou a examinar nossas necessidades de serviço.

Muito amável, Alfredo ponderou;
— Em virtude da tormenta iminente, poderiam demorar connosco algumas horas, seguindo amanhã, ao alvorecer.

E, com profunda surpresa, ouvi-o afirmar:
— Poderão utilizar meu carro, até à zona em que se torne possível.
Fornecerei condutor adestrado e ganham muito tempo com a medida.

Não podia caber em meu espanto.

Embora conhecendo as operações dos Samaritanos em “Nosso Lar”, que empregavam grandes veículos de tracção animal, em trabalhos de salvamento nas regiões inferiores e considerando as dificuldades de vulto que defrontáramos na caminhada longa, rumo ao Posto de Socorro, não supunha possível semelhante condução naquele instituto de auxílio.

Soube, mais tarde, que os sistemas de transporte, nas zonas mais próximas da Crosta, são muito mais numerosos do que se poderia imaginar, em bases transcendentes do electromagnetismo.

Nosso orientador, que parecia meditar gravemente a situação, observou preocupado:
— Entretanto, temos serviços urgentes nos círculos carnais.
Vicente e André precisam iniciar aprendizado activo.

Alfredo sorriu, bondoso, asseverando:
— Quanto a isso, não necessitaremos de maiores cuidados.
Há sempre que fazeres em toda a parte.

Onde houver espírito de cooperação da criatura, existe igualmente o serviço de Deus.
Nossos amigos poderiam colaborar connosco, ainda hoje, nas actividades de assistência.

Acompanhar-nos-iam, por exemplo, nos trabalhos da prece, nos quais há sempre muita coisa a fazer e muita lição a aprender.

— Excelente sugestão! — exclamou nosso instrutor.
— A oração individual, ou colectiva, é sempre vasto reservatório de ensinos edificantes.

— Aliás — falou Ismália, afectuosa — não devemos demorar.
Estamos quase na hora.

Nesse momento, como se fora chamado, de súbito, à lembrança de grave compromisso de trabalho, falou o administrador, dirigindo-se à companheira:
— É preciso prevenir Olívia e Madalena das providências que se fazem imperiosas para a noite.

Necessitaremos a colaboração de mais alguns técnicos do sopro.
Temos alguns irmãos em estado grave, tomados de impressões físicas mais fortes.

— Técnicos do sopro? — indaguei, assombrado, antes que Ismália pudesse fazer qualquer observação referente aos serviços.

— Sim, meu amigo — respondeu Alfredo, atenciosamente —, o sopro curador, mesmo na Terra, é sublime privilégio do homem.

No entanto, quando encarnados, demoramo-nos muitíssimo a tomar posse dos grandes tesouros que nos pertencem.

Comumente, vivemos por lá, perdendo tempo com a fantasia, acreditando em futilidades ou alimentando desconfianças.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:40 pm

Quem pudesse compreender, entre as formas terrestres, toda a extensão deste assunto, poderia criar no mundo os mais eficientes processos soproterápicos.

— Mas, semelhante património está à disposição de qualquer Espírito encarnado? — perguntou Vicente, compartilhando minha surpresa.

Nosso interlocutor pensou alguns instantes e respondeu, atencioso:
— Como o passe pode ser movimentado pelo maior número de pessoas, com benefícios apreciáveis, também o sopro curativo poderia ser utilizado pela maioria das criaturas, com vantagens prodigiosas.

Entretanto, precisamos acrescentar que, em qualquer tempo e situação, o esforço individual é imprescindível.

Toda realização nobre requer apoio sério, o bem divino, para manifestar-se em acção, exige a boa vontade humana.

Nossos técnicos do assunto não se formaram de pronto.
Exercitaram-se longamente, adquiriram experiências a preço alto.
Em tudo há uma ciência de começar.

São servidores respeitáveis pelas realizações que atingiram, ganham remunerações de vulto e gozam enorme acatamento, mas, para isso, precisam conservar a pureza da boca e a santidade das intenções.

Compreendendo o interesse que suas palavras despertavam, continuou o administrador, depois de pequena pausa:
— Nos círculos carnais, para que o sopro se afirme suficientemente, é imprescindível que o homem tenha o estômago sadio, a boca habituada a falar o bem, com abstenção do mal, e a mente recta, interessada em auxiliar.

Obedecendo a esses requisitos, teremos o sopro calmante e revigorador, estimulante e curativo.
Através dele, poder-se-á transmitir, também na Crosta, a saúde, o conforto e a vida.

E, como Vicente e eu não pudéssemos ocultar a perplexidade, Alfredo considerou:
— Isto não é novo. Jesus, além de tocar naqueles a quem curava, concedia-lhes, por vezes, o sopro divino.

O sopro da vida percorre a Criação inteira.
Toda página sagrada, comentando o princípio da existência, refere-se a isso.

Nunca pensaram no vento, como sopro criador da Natureza?
Quanto a mim, desde o ingresso em Campo da Paz, quando fui ali recolhido em péssimas condições espirituais, tenho aprendido maravilhosas lições nesse particular.

Tanto assim que, chefiando este Posto, tenho incentivado, com as possibilidades ao meu alcance, a formação de novos cooperadores nesse sentido, oferecendo compensações aos que se decidam iniciar a tarefa de especialização, nem sempre fácil para todos.

Há esse tempo, Ismália recebia algumas colaboradoras de importância, que se preparavam para a tarefa.
Impressionado com o que ouvira, acompanhei de perto as providências que se organizavam.

Encontrando-me, porém, mais a sós com Aniceto, transmiti-lhe minha enorme surpresa, respondendo-me ele em tom confidencial:
— Esquecem-se vocês de que a própria Bíblia, aludindo aos primórdios do homem, narra que o Criador assoprou na forma criada, comunicando-lhe o fôlego da vida.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:40 pm

Referindo-nos aos nossos irmãos encarnados, faz-se preciso reconhecer, André, que, mesmo partindo de homens imperfeitos, mas de boa vontade, todo sopro com intenção de aliviar ou curar tem relevante significação entre as criaturas, porque todos nós somos herdeiros directos do Divino Poder.

Aliás, é necessário observar também que não estamos diante de uma exclusividade.
Você, por certo, passou muito ligeiramente pelo nosso Ministério do Auxílio.

Temos, ali, grande instituto especializado nesse sentido, onde nobres colegas se votam a essa modalidade de cooperação.

No plano carnal, toda boca, santamente intencionada, pode prestar apreciáveis auxílios, notando-se, porém, que as bocas generosas e puras poderão distribuir auxílios ditos, transmitindo fluidos vitais de saúde e reconforto.

Esperava que Aniceto prosseguisse, mostrando-me as qualidades magnéticas do sopro, mas Alfredo acercara-se de nós, operoso e solícito, exclamando:
— Estamos no momento destinado aos trabalhos de assistência e oração.

— Segui-lo-emos com prazer — respondeu nosso instrutor, sorrindo.

Era necessário interromper a lição, atendendo a deveres diferentes.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:40 pm

XX - Defesas contra o mal

Descemos as escadarias e, em frente dos muros altos, pude observar a extensão das defesas do soberbo edifício.

Aquela construção grandiosa era muito mais importante que a de qualquer castelo antigo, transformado em fortaleza.

Novamente no exterior, podia detalhar a visão panorâmica com mais exactidão.
Reconhecia, agora, que entráramos por um baluarte avançado, identificando a imponência da construção majestosa.

Apresentavam-se-me as linhas gerais com nitidez.
Impressionavam-me, sobretudo, as fortificações.

Via a torre de mensagem, consagrada, por certo, ao serviço de resistência;
o baluarte agudo, elevando-se acima dos fossos que deixavam transbordar a água corrente;
a torre de vigia, esbelta e alterosa.


Observei o caminho da ronda, a cisterna, as seteiras e, em seguida, as paliçadas e barbacãs, reflectindo na complexidade de todo aquele aparelhamento defensivo.

E as armas?
Identificava-lhes a presença na maquinaria instalada ao longo dos muros, copiando os pequenos canhões conhecidos na Terra.

Entretanto, vi com emoção, no cume da torre de vigia, a enorme bandeira de paz, muito alva, tremulando ao vento como largo penacho de neve...

O administrador percebeu a estranheza que se apossara de Vicente e de mim.
— Já sei a impressão que a nossa defesa lhes causa — disse Alfredo, detendo-se para explicar.

Fixando-nos com o olhar muito lúcido, continuou:
— Naturalmente, não imaginavam necessárias tantas fortificações.

Conforme vêem, nossa bandeira é de concórdia e harmonia;
no entanto, é imprescindível considerar que estamos em serviço que precisaremos defender, em qualquer circunstância.

Enquanto não imperar a lei universal do amor, é indispensável persevere o reinado da justiça.

Nosso Posto está colocado, aqui, igualmente, como “ovelha em meio de lobos”, e, embora não nos caiba efectuar o extermínio das feras, necessitamos defender a obra do bem contra os assaltos indébitos.

As organizações dos nossos irmãos consagrados ao mal são vastíssimas.
Não admitam a hipótese de serem, todos eles, ignorantes ou inconscientes.

A maioria se constitui de perversos e criminosos.
São entidades verdadeiramente diabólicas.
Não tenham disso qualquer dúvida.

— Deus meu! — exclamou Vicente, admirado mas por que se organizam deliberadamente para o mal?
Não sabem, porventura, que todos os patrimónios universais pertencem à Majestade Divina?
Não reconhecem o Soberano Poder?
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 29, 2011 10:41 pm

— Ah! meu amigo — falou Alfredo em tom grave —, fiz as mesmas perguntas quando aqui cheguei pela primeira vez.

As respostas que tive foram incisivas e concludentes.
Poderíamos, Vicente, formular na Crosta as mesmas interrogações.

Os criminosos que fazem as vítimas da guerra, os exploradores da economia popular, os avarentos misérrimos, os sedentos de injustificado predomínio e os vaidosos cheios de fatuidade sabem, tão bem quanto os nossos adversários daqui, que tudo pertence a Deus, que o homem é simples usufrutuário dos divinos bens.

Não ignoram que os antepassados foram chamados à verdade e à contas pela morte, e que eles seguirão os mesmos caminhos;
entretanto, atormentam-se na Crosta como verdadeiros loucos, amontoando possibilidades para a ruína e abusando das oportunidades mais santas.

Aqui se verifica a mesma coisa. Querem dominar antes de se dominarem, exigem antes de dar e entram em perene conflito com o espírito divino da lei.

Estabelecido o duelo entre a fantasia deles e a verdade do Pai, resistem às corrigendas do Senhor e transformam-se, esses desventurados, em verdadeiros génios da sombra, até que, um dia, se decidam a novos rumos.

Intrigado com as profundas observações, perguntei:
— Mas, como explicar as bases de semelhante atitude?
Na Terra, compreendemos certos enganos, mas aqui...

O generoso interlocutor não me deixou terminar e prosseguiu:
— Na Crosta, nossos irmãos menos felizes lutam pela dominação económica, pelas paixões desordenadas, pela hegemonia de falsos princípios.

Nestas zonas imediatas à mente terrestre, temos tudo isso em identidade de condições.

Entre as entidades perversas e ignorantes, há cooperativas para o mal, sistemas económicos de natureza feudalista, baixa exploração de certas forças da Natureza, vaidades tirânicas, difusão de mentiras, escravização dos que se enfraquecem pela invigilância, doloroso cativeiro dos Espíritos falidos e imprevidentes, paixões talvez mais desordenadas que as da Terra, inquietações sentimentais, terríveis desequilíbrios da mente, angustiosos desvios do sentimento.

Em todo o lugar, meu amigo, as quedas espirituais, perante o Senhor, são sempre as mesmas, embora variem de intensidade e coloração.

— Mas... e as armas? — perguntei — acaso são utilizadas?
— Como não? — disse Alfredo, pressuroso — não temos balas de aço, mas temos projécteis eléctricos.
Naturalmente, a ninguém atacaremos.

Nossa tarefa é de socorro e não de extermínio.
— No entanto — aduzi, sob forte impressão —, qual o efeito desses projécteis?

— Assustam terrivelmente — respondeu ele, sorrindo — e, sobretudo, demonstram as possibilidades de uma defesa que ultrapassa a ofensiva.

— Mas apenas assustam? — tornei a interrogar.
Alfredo sorriu mais significativamente e acrescentou:
— Poderiam causar a impressão de morte.
— Que diz! — exclamei com insofreável espanto.

O administrador meditou alguns instantes, e, ponderando, talvez, a gravidade dos esclarecimentos, obtemperou:
— Meu amigo! meu amigo! se já não estamos na carne, busquemos desencarnar também os nossos pensamentos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:28 pm

As criaturas que se agarram, aqui, às impressões físicas, estão sempre criando densidade para os seus veículos de manifestação, da mesma forma que os Espíritos dedicados à região superior estão sempre purificando e elevando esses mesmos veículos.

Nossos projécteis, portanto, expulsam os inimigos do bem através de vibrações do medo, mas poderiam causar a ilusão da morte, actuando sobre o corpo denso dos nossos semelhantes menos adiantados no caminho da vida.

A morte física, na Terra, não é igualmente pura impressão e ninguém desaparece.
O fenómeno é apenas de invisibilidade ou, por vezes, de ausência.
Quanto à responsabilidade dos que matam, isto é outra coisa.

E além desta observação, que é da alçada da Justiça Divina, temos a considerar, igualmente que, nesta esfera, o corpo denso modificado pode ressurgir todos os dias, pela matéria mental destinada à produção dele, enquanto que, para obter o corpo físico, almas há que trabalham, por vezes, durante séculos...

Vicente e eu caláramos, estupefactos.
Alfredo sorriu serenamente e perguntou, bem-humorado:
— Vocês conhecem a lenda hindu da serpente e do santo?

Ante a nossa expressão negativa, o administrador continuou:
— Contam as tradições populares da Índia que existia uma serpente venenosa em certo campo.
Ninguém se aventurava a passar por lá, receando-lhe o assalto.

Mas um santo homem, a serviço de Deus, buscou a região, mais confiado no Senhor que em si mesmo.
A serpente o atacou, desrespeitosa.

Ele dominou-a, porém, com o olhar sereno, e falou:
— Minha irmã, é da lei que não fará mal a ninguém.
A víbora recolheu-se, envergonhada.

Continuou o sábio o seu caminho e a serpente modificou-se completamente.
Procurou os lugares habitados pelo homem, como desejosa de reparar os antigos crimes.
Mostrou-se integralmente pacífica, mas, desde então, começaram a abusar dela.

Quando lhe identificaram a submissão absoluta, homens, mulheres e crianças davam-lhe pedradas.

A infeliz recolheu-se à toca, desalentada. Vivia aflita, medrosa, desanimada.
Eis, porém, que o santo voltou pelo mesmo caminho e deliberou visitá-la.
Espantou-se, observando tamanha ruína.

A serpente contou-lhe, então, a história amargurada.
Desejava ser boa, afável e carinhosa, mas as criaturas perseguiam-na e apedrejavam-na.

O sábio pensou, pensou e respondeu após ouvi-la:
— Mas, minha irmã, houve engano de tua parte.

Aconselhei-te a não morderes ninguém, a não praticares o assassínio e a perseguição, mas não te disse que evitasses de assustar os maus.

Não ataques as criaturas de Deus, nossas irmãs no mesmo caminho da vida, mas defende a tua cooperação na obra do Senhor.

Não mordas, nem firas, mas é preciso manter o perverso à distância, mostrando-lhe os teus dentes e emitindo os teus silvos.

Nesse momento, Aniceto sorriu de maneira expressiva.

O administrador fez longa pausa e concluiu:
Creio que a fábula dispensa comentário.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:29 pm

XXI - Espíritos dementados

Inúmeros servidores acompanhavam-nos ao serviço.

Movimentavam carregadores sem conta.
Conduziam grandes botijas d’água, caldeirões de sopa, vasos de substância medicamentosa, em galeotas diversas.

Mais alguns passos e notei que centenas de entidades se reuniam em vastos albergues, olhos vagueantes e rostos sombrios, parecendo uma assembleia de loucos em manicómio de amplas proporções.

Alfredo aconselhou umas tantas providências de serviço à maioria dos técnicos do sopro curativo, os quais se desviaram de nós, rumo às edificações situadas em zona diferente.

Gentilmente nos explicava que os benfeitores de “Campo da Paz” localizavam, ali, grande número de Espíritos enfermos, mais desequilibrados que propriamente perversos.

Os doentes que tínhamos sob os olhos permaneciam em melhores condições.

Já se locomoviam e muitos deles já conversavam, apesar do desequilíbrio que lhes assinalava as palavras e pensamentos.

Esclarecia-nos sobre as múltiplas obrigações do trabalho de rotina, quando algumas entidades se acercaram, respeitosas.

— Senhor Alfredo — disse um velho de barbas muito alvas —, estou aguardando o resultado da minha petição.

Em que ficamos, quanto às minhas terras e os escravos?
Paguei bom preço ao Carmo Garcia.
Sabe o senhor que venho sendo perseguido durante muitos anos, e não posso perder mais tempo.

Quando volto para casa?
Creio esteja o senhor ciente da necessidade de eu voltar ao seio dos meus.
Esperam-me a mulher e os filhos.

Como excelente médico da alma, Alfredo prestou a maior atenção e respondeu, como se estivesse tratando com pessoa de bom senso:
Sim, Malaquias, você reclama com razão, mas sua saúde não permite o regresso apressado ao lar.

Você sabe que sua esposa, Dona Sinhá, pediu fosse você aqui tratado convenientemente.
Creio que ela deve estar muito tranquila a seu respeito.
Suas ideias, porém, meu amigo, não estão ainda bem coordenadas.

Temos alguma coisa mais a fazer.
Porque preocupar-se tanto, assim, com as terras e os escravos?
Primeiramente a saúde, Malaquias; não esqueça a saúde!

O velho sorriu, como o doente apoiado na firmeza e no optimismo do médico.

— Reconheço que as suas observações são justas, mas meus filhos não se movem sem mim, são preguiçosos e necessitam da minha presença.

Mas, doutrinando subtilmente o pobre velhinho, o administrador objectou:
— Entretanto, donde vieram os filhos para os seus braços paternos?
Não vieram das mãos de Deus?
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:30 pm

— Sim, sim... — afirmava o ancião, trémulo e satisfeito.
— Pois é isso, Malaquias, chegam instantes na vida, em que precisamos devolver a Deus o que a Ele pertence.

Além do mais, seus filhos são também responsáveis, e, se forem ociosos, responderão pelos males que criarem em torno de si mesmos.

Por agora, é indispensável que você se refaça, aclare as ideias e sossegue o coração.

O velho sorriu, confortado, mas, antes que pudesse falar de novo, um cavalheiro, denotando nobre aprumo, adiantou-se, exclamando:
— E a solução do meu processo, senhor Alfredo?
Sinto-me prejudicado pelos parentes de má fé.

Minha parte na herança dos avós é cobiçada pelos primos. Segundo já lhe fiz ver, meu quinhão é superior aos demais.

Soube, todavia, que o Visconde de Cairu interpôs toda a sua influência contra mim.
Ninguém ignora tratar-se de um grande velhaco.

Que não poderá ele fazer com as artimanhas políticas?
Está mal Informado a meu respeito.
O senhor enviou meu pedido ao Imperador?

Já expedi a mensagem — esclareceu Alfredo com carinho fraternal — o Imperador certamente levará em conta a solicitação.

— Entretanto, a demora é muito grande!... — falou o cavalheiro, impaciente, como se estivesse diante de insubordinado vulgar.

— Mas, meu caro Aristarco — respondeu o administrador, muito calmo —, acredito que você está sendo experimentado para conhecer a grandeza da herança divina.

Que valem os patrimónios terrestres, ante os patrimónios imperecíveis?
Não pense no que tem perdido; medite nos bens sublimes que poderá alcançar, diante da Vida Eterna.

Esqueça os primos ambiciosos e o Visconde que não o compreendeu.
Terão eles de deixar quanto possuem, no campo transitório, a fim de prestarem contas à Divindade.

Nunca pensou nisto?
Aristarco pareceu perder, por momentos, a inquietação, sorriu francamente e respondeu:
— É verdade! Os tratantes morrerão...

Uma senhora, mostrando-se aflita, pôs-se à nossa frente e interpelou, altiva:
— Senhor Alfredo, peço-lhe não me retenha aqui.
Meu marido é nosso próprio adversário.

Prometeu perseguir as filhas, tão logo me ausentasse de casa.
Aqui permanecendo, estou certa de que ele nos dissipará os bens, desmoralizar-nos-á o nome.
Por favor, autorize o meu regresso.

O coração me diz que as filhinhas estão desesperadas.
Convenço-me, cada vez mais, de que a minha moléstia teve origem neste estado de coisas...

— Já sei, minha irmã — respondeu o nosso amigo com a mesma solicitude —; no entanto, que adiantaria regressar, tão fortemente atormentada?
Não será melhor curar-se, tranquilizar o espírito para ajudar as filhinhas com eficiência?
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:30 pm

— Mas, nem sequer sei onde estou — reclamou a pobre senhora, torcendo as mãos —, creio me tenham trazido ao fim do mundo, para tratamento de uma simples perda de sentidos!

— Todavia, ninguém a maltrata — disse o interlocutor, bondosamente — e seu caso não é tão simples como parece. Tenha calma.

Os laços consanguíneos são edificantes, mas, acima deles, vibra a família universal.
Há criaturas suportando fardos muito mais pesados que o seu.

Aprenda, quanto esteja em suas possibilidades, a desfazer-se de aquisições passageiras, para ganhar os eternos bens.

A infeliz não sorriu como os outros.
Fechando-se em sombria catadura, afastou-se pesadamente, olhos fulgurantes de cólera, como se a mente estivesse cravada muito longe, incapaz de qualquer compreensão.

Adiantaram-se outros enfermos, mas o administrador falou em voz alta:
— Não posso atender a todos no momento. Depois de amanhã, serão recebidos para explicações.

E, voltando para nós, esclareceu a sorrir:
No círculo carnal, seriam todos absolutamente normais; no entanto, aqui, são verdadeiros loucos.

São desencarnados que, por muito tempo, se agarraram aos problemas inferiores.

Reclamam providências, sem falar no ensejo de iluminação que menosprezaram, acusam os outros, sem relacionarem os próprios erros.

Procurei ouvi-los para lhes dar uma ideia do nosso trabalho, no sector dos que se desequilibram mentalmente por excesso de centralização em propósitos inferiores.

Não é crime interessar-se alguém pelas actividades rurais, pela recepção de uma herança, pelo bem-estar da família;
mas, no fundo, o velhinho que reclama terras e escravos nunca pensou senão em tirania no campo;
o cavalheiro, que aguarda a herança, deseja lesar os primos;
e a senhora, que se revelou tão interessada pelo ambiente doméstico, desencantou quando pretendia envenenar o marido, às ocultas.


Conheço os processos um a um.
Acordaram de longo sono, na inconsciência, e julgam-se ainda encarnados, supondo igualmente que podem dissimular as pretensões criminosas.

Eu estava assombrado. Expressando minha profunda admiração, perguntei:
— Esses doentes demoram-se aqui? Como alcançaram o Posto?

Gentil, como sempre, Alfredo respondeu:
— Foram recolhidos em pior estado. Já estiveram em pesado sono durante muito tempo e vão readquirindo a memória, gradativamente, até que possam ser encaminhados aos Institutos Magnéticos de “Campo da Paz”, a fim de receberem maiores auxílios e necessários esclarecimentos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:30 pm

XXII - Os que dormem

Seguimos através de longas filas de arvoredo acolhedor, rumo às vastas edificações que obedeciam a linhas arquitectónicas singulares.

Sem que eu pudesse explicar o fenómeno, as luzes diminuíam progressivamente. Que teria acontecido?

Vicente e eu nos entreolhamos, assustados.
Alfredo, Aniceto e os demais, todavia, caminhavam sem surpresa.
A serenidade deles tranquilizava-me o íntimo, embora o espanto insofreável.

Mais alguns passos, atingimos os pavilhões diferentes, que se estendiam em área superior a três quilómetros, pelos meus cálculos.

Lá dentro, contudo, as sombras se fizeram mais densas.

Conseguia distinguir, vagamente, os quadros interiores, observando que se tratava, a meu ver, de espaçosas enfermarias com teto sólido, mas semi-abertas ao longo das paredes altas, dando livre passagem ao ar.

Dezenas de operários, devotados e operosos, seguiam-nos em absoluto silêncio.
Alfredo era o único a falar, notando-se, contudo, que se fizera extremamente discreto nas palavras.

Tudo isso me dava a impressão de haver penetrado um cemitério escuro, onde os visitantes fossem obrigados a guardar todo o respeito aos mortos.

Com estranheza, notei que um dos servidores entregara ao chefe do Posto pequenina máquina, que Alfredo nos deu a conhecer gentilmente, explicando:
— Este é o nosso aparelho de sinalização luminosa.

Estamos no centro dos pavilhões a que se recolhem irmãos ainda adormecidos.
Temos aqui, presentemente, quase dois mil.
Os numerosos cooperadores dirigiam-se em ardente para a zona de serviços que lhes competiam.

Depois de pequena pausa, falou o administrador com firmeza:
— Iniciemos o trabalho de assistência.

Ao primeiro sinal luminoso de Alfredo, acenderam-se numerosas lâmpadas eléctricas e, então, dominando, a custo, a primeira impressão de horror, vi extensas filas de leitos ao rés-do-chão, ocupados todos por pessoas mergulhadas em profundo sono.

Muitos tinham o semblante horrendo.
Eram muito poucos os que traziam as pálpebras cerradas, parecendo tranquilos.

Em quase todos, estampavam-se-lhes nos olhos, aparentemente vitrificados, o extremo pavor e o doloroso desespero da morte.

Cadavérica palidez cobria-lhes a face.
Recordando a literatura antiga, pensei nos velhos túmulos egípcios.
Tínhamos, diante de nós, centenas de múmias perfeitas.

Raríssimos pareciam dormir um sono natural.

Aproximando-se de nós outros, Alfredo falou a Aniceto, em particular:
— Infelizmente, não podemos atender a todos.
— Porquê? — indagou nosso orientador, comovido.

— Estamos aguardando pessoal adestrado.
Tenho aqui a colaboração de oitenta auxiliares para este género de serviço; entretanto, não pode cada qual atender a mais de cinco doentes de uma só vez.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:31 pm

À vista disso, dos nossos mil novecentos e oitenta abrigados, separei os quatrocentos mais susceptíveis de próximo despertar, a fim de submetê-los ao tratamento intensivo.

— E os demais?
— Recebem alimento e medicação mais densos uma vez por dia.
Aniceto calou-se, pensativo.

Profundamente tocado pelo que via, inclinei-me instintivamente para o abrigado mais próximo, tentando examinar-lhe o estado fisiológico.

Identifiquei o calor orgânico, a pulsação regular e os movimentos respiratórios, embora verificasse a extrema rigidez dos membros, como que mergulhados em imobilidade cataléptica.

Indescritível impressão apoderou-se de mim.

Levantei-me assustado, dirigi-me a Aniceto com a máxima discrição, e interroguei:
— Explicai-me, por Deus! que vemos aqui?
Estamos, acaso, na moradia da morte, depois da morte?

O instrutor sorriu, complacente, e explicou em voz quase imperceptível:
— Sim, André, este sono é, verdadeiramente, avançada imagem da morte.
Aqui permanecem, com a bênção do abrigo, alguns milhões dos nossos irmãos que ainda dormem.

São as criaturas que nunca se entregaram ao bem activo e renovador, em torno de si, e mormente os que acreditaram convictamente na morte, como sendo o nada, o fim de tudo, o sono eterno.

A crença na vida superior é actividade incessante das almas.
A ferrugem ataca a enxada ociosa. O entorpecimento invade o Espírito vazio de ideal criador.

Os que, nos círculos canais, homens e mulheres, crêem na vida eterna, ainda que não sejam fundamentalmente cristãos, estão desenvolvendo faculdades de movimentação espiritual e podem penetrar as esferas extra terrenas em estado animador, pelo menos quanto a locomoção e juízo mais ou menos exacto.

No entanto, as criaturas que perseveram em negação deliberada e absoluta, não obstante, por vezes, filiadas a cultos externos de actividade religiosa, que nada vêem além da carne nem de sejam qualquer conhecimento espiritual, são verdadeiramente infelizes.

Muitos penetram nossas regiões de serviço, como embriões de vida, na colmeia da Natureza sempre divina.

Um amigo nosso costuma designá-los por fetos da espiritualidade; entretanto, a meu ver, seriam felizes se estivessem nessa condição inicial.

Temos a certeza, porém, de que muitos se negaram ao contacto da fé, absolutamente por indiferença criminosa aos desígnios do Eterno Pai.

Dormem, porque estão magnetizados pelas próprias concepções negativistas;
permanecem paralíticos, porque preferiram a rigidez ao entendimento;
mas dia virá em que deverão levantar-se e pagar os débitos contraídos.

Eis porque os considero sofredores.
Primeiramente, demoram no sono em que acreditaram, mais tarde acordam;
porém, a maioria não pode fugir à enfermidade e à perturbação, como acontece aos irmãos dementados, que vimos ainda há pouco.

Grande o meu assombro.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:31 pm

Como Vicente se aproximasse, também, para ouvi-lo, falou Aniceto, esclarecendo a nós ambos:
— A fé sincera é ginástica do Espírito. Quem não a exercitar de algum modo, na Terra, preferindo deliberadamente a negação injustificável, encontrar-se-á mais tarde sem movimento.

Semelhantes criaturas necessitam de sono, de profundo repouso, até que despertem para o exame das responsabilidades que a vida traduz.

Observando que o nosso orientador se esquivava a comentários longos, para que pudéssemos seguir, de mais perto, os trabalhos de assistência, calei as muitas indagações que me escaldavam a mente.

Com excepção de algumas senhoras que permaneciam junto de Ismália, todos os servidores se mantinham em posição de vigilância, ao pé dos grupos mumificados.

A luz artificial iluminava os leitos, que se perdiam de vista, mas observei que nenhum dos albergados reagia à intensa claridade que se fizera.

Continuavam rígidos, cadavéricos, prostrados.
Notei, então, que Alfredo começou a mover o aparelho de sinalização, para emitir as ordens de serviço.

Cada sinal determinava operação diferente.
Vi os servidores do Posto distribuírem pequenas porções de alimento líquido e medicação bucal, em profundo silêncio.

Em seguida, forneceram reduzidas quantidades de água efluviada aos infelizes, com excepção, porém, de muitos que pareciam preparados a receber, tão-somente, caldo e remédio.

Dois terços dos quatrocentos abrigados em tratamento receberam passes magnéticos.
Alguns poucos receberam aplicações do sopro curador.

Todos os movimentos do trabalho eram transmitidos pela sinalização luminosa, partida das mãos do administrador, que parecia interessado na manutenção do máximo silêncio.

Impressionado com o que via, perguntei ao orientador, em voz baixa, a razão de alguns enfermos não terem sido beneficiados com a água e com o socorro de forças novas, através do passe e do sopro vivificante.

Aniceto, todo bondade, inclinou-se aos meus ouvidos, com a ternura de um pai ansioso por tranquilizar o filhinho inquieto, e falou:
— Cada um na vida, meu caro André, tem a necessidade que lhe é peculiar.

Aqui, compreendemos com amplitude esse imperativo da Natureza.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:31 pm

XXIII - Pesadelos

Enquanto Alfredo continuava dirigindo os serviços, nosso instrutor, com a permissão dele, conduziu-nos aos leitos distantes, onde se asilavam os enfermos desatendidos quanto ao auxílio magnético.

— Precisamos acentuar experiências e aproveitar oportunidades — afirmou Aniceto, sorridente.

Acompanhamo-lo, curiosos, identificando as expressões isoladas, dolorosas ou terríveis, daquelas máscaras mortuárias.

Quando nos encontrávamos a regular distância da zona central, o instrutor esclareceu, em tom grave:
Desejaria conhecer a extensão dos benefícios colhidos por vocês no Gabinete de Auxílio Magnético às Percepções.

Para ajudar eficientemente aos nossos amigos encarnados, é necessário saibamos ver com clareza e precisão.

Indicando os doentes imóveis, acrescentou:
— Todos os que dormem nestes pavilhões permanecem dentro do mau sono.

— Mas teremos, porventura, nas zonas espirituais, os que estejam em bom sono? — interrogou Vicente, de modo brusco.

Sem dúvida — respondeu Aniceto, solícito — temos na esfera de nossas actividades os que repousam períodos curtos, quais trabalhadores rectos que esperam o repouso nocturno a tranquilidade dos que sabem trabalhar e descansar, de consciência aliviada.

Fez uma pausa, como quem estudava o melhor meio de sintetizar, por não perder tempo, e acentuou:
— Mas esses não precisam estacionar, como filhos da sombra, nas construções de emergência de um Posto de Socorro.

Em seguida, retomou o fio da lição e continuou:
— Quem dorme em desequilíbrio, entrega-se a pesadelos.

Todos estes irmãos desventurados que nos cercam, aparentemente mortos, são presas de horríveis visões íntimas.

Vejamos o aproveitamento de vocês.
Procedamos a observações rápidas.

Antigamente, o inquérito anatómico, o exame das vísceras, a perquirição científica nas células, também aparentemente mortas;
agora, a auscultação profunda da alma, a sondagem dos sentimentos a visão do plano mental.

E, com expressão decidida, concluiu, resoluto:
— Mãos a obra!

Designando-me um corpo envelhecido de mulher, recomendou:
— Você, André, examine detidamente essa irmã.
Abstenha-se de todas as considerações do plano exterior.

Observe-a com todas as possibilidades e percepções ao seu alcance.
Sinceramente interessado em atender, não reparei nas ordens que o nosso instrutor transmitia a Vicente.

Procurei esquecer os quadros externos, focalizando aquela máscara feminina com todos os meus recursos mentais.

À medida que me despreocupava dos interesses diferentes, observava a sombra cinzento-escura que se lhe ia condensando em torno da fronte.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:31 pm

A visão parecia auxiliar-me o poder de concentração.
Reconhecendo que o fenómeno se acentuava, não mais lembrei qualquer objecto ou situação exterior.

Estupefacto, comecei a divisar formas movimentadas no âmbito da pequena tela sombria.

Surgiu uma casa modesta de cidade humilde.
Tive a impressão de transpor-lhe a porta.
Lá dentro, um quadro horrível e angustioso.

Uma senhora de idade madura, demonstrando crueldade impassível no rosto, lutava com um homem embriagado.

— “Ana! Ana! pelo amor de Deus! não me mates!” — dizia ele, súplice, incapaz de defender-se.

— “Nunca! Nunca te perdoarei !“ — exclamava a mulher, acrescentando em tom lúgubre — “Morrerás esta noite”. — Vi o infeliz cair, exausto.

— “Envenenaste-me com bebida mortal” — reclamava ele, lacrimoso — “perdoa-me se te causei algum mal!

Sou pai! Ana! preciso viver para meus filhos! Não me mates, por piedade!”

Ela ouviu com frieza e respondeu duram ente:
— “Morrerás mesmo assim. Tenho a infelicidade de amar-te, a ti que pertences a outra mulher!
Não quiseste seguir-me e preciso vingar-me!”

Rebolcando-se no assoalho, tornava o Infeliz:
— “Deus sabe que estou arrependido do meu criminoso passado!

Quero viver para o bem, Ana!
Perdoa-me por amor do Eterno Pai!
Quem sabe poderei auxiliar-te como irmão!

Ajuda-me para que te possa ajudar!
Não me mates! Não me mates!”

A mulher, porém, como se tivesse a maldade agravada, ao ouvir a expressão da virtude, tomou de um pesado martelo e exclamou:
— “Deus não existe! Deus não existe! Morrerás, infame!”

E, de súbito, crivou-lhe o crânio de marteladas surdas.
O homem expirou sem um grito.
Logo após, vi a criminosa conduzindo o cadáver em carrinho de mão, através de um trilho ermo.

Acompanhava-lhe os movimentos com interesse.
A noite estava muito escura, mas observei a parar junto à via-férrea.

Sondou os arredores, certificou-se do isolamento em que se encontrava e depôs a estranha carga sobre os trilhos.

Vi-a dispondo o cadáver para que a cabeça fosse decepada à passagem do comboio, retirando-se apressadamente, reconduzindo o pequeno carrinho vazio.

Não esperei a máquina de ferro.
Segui a mulher que me pareceu inquieta e pensativa.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Dez 30, 2011 11:33 pm

Antes, porém, que depusesse o carrinho no extenso quintal, vi que arregalava os olhos como louca, cercada de seres que me pareceram bandidos de negras vestes.

Era ela, agora, quem acusava estranha embriaguez de pavor.

Vencera um pobre homem invigilante, mas, a meu ver, seria vencida por seres mais perversos, talvez, que ela própria:
— “Acudam-me! Acudam-me!” — gritava, espavorida.
E continuava a cena, em que a desventurada golfava súplicas em vão.

Senti-me como espectador que precisasse movimentar qualquer socorro.
E, graças à Bondade Divina, não experimentei pela mulher infeliz senão a mais viva compaixão.

Ao primeiro impulso de revolta pelo crime consumado, recordei as lições já recebidas em “Nosso Lar” e pensei na possibilidade de ser a criminosa alguma pessoa querida ao meu coração.

Se Ana estivesse no mundo, ao meu lado, na família do sangue, não desejaria auxiliá-la?
Porque haveria de acusá-la, se não lhe conhecia o passado total!

Ter-lhe-iam dado a educação na infância, a bênção do lar, a segurança de um afecto sem manchas?
Quem sabe viera de longe, como pedra incompreendida, rolando nos abismos do sofrimento?

Que laços a uniriam à vítima, igualmente digna de piedade fraternal?
Como teria começado o drama doloroso? Não sabia.

Enxergava somente a pobre mulher rodeada de sombras agressivas, implorando socorro.

Ignorava como ajudá-la, mas recordei que Ana era minha irmã, filha, do mesmo Pai, irmã que adoecera no caminho comum, sem que eu pudesse, pelo menos por agora, indagar a causa.

Procurava, comigo mesmo, algum meio de auxiliá-la, quando alguém me chamou de súbito.

Era Aniceto que exclamava, bondoso:
— Venha, André! Vicente e você têm sabido aproveitar alguma coisa.
Estou satisfeito. Seus pensamentos de fraternidade e paz muito auxiliaram essa Irmã infeliz.

Guarde a certeza disso e continue buscando a compreensão para socorrer e ajudar com êxito.

Conforme observaram de perto, sabem agora que cada um dos que aqui dormem sono atormentado, vivem estranhos pesadelos, de que não podem isentar-se de um instante para outro.

Não precisamos comentar qualquer episódio dessas existências vividas em oposição à Vontade Divina.

Bastará lembrar sempre que a dívida, em toda parte, anda com os devedores.

E com expressivo olhar, acrescentou:
— Voltemos ao centro. Devemos cooperar na oração.
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Série André Luiz - OS MENSAGEIROS - Página 3 Empty Re: Série André Luiz - OS MENSAGEIROS

Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 01, 2012 9:21 pm

XXIV - A prece de Ismália

Dentro de poucos instantes, reuníamo-nos, de novo, ao grupo.

O administrador fez um sinal luminoso, em forma triangular, e observei que todos os cooperadores se puseram de pé, em atitude respeitosa.

— É o momento da oração, no Posto de Socorro — disse Alfredo, gentil, como a prestar-nos esclarecimentos precisos.

O Sol desaparecera no firmamento, mas toda a cúpula celeste reflectia-lhe o disco de ouro.

Os tons crepusculares encheram as vizinhanças de maravilhosos efeitos de luz, muito visíveis agora ao nosso olhar, porque Alfredo, sem que eu pudesse conhecer o motivo, mandara apagar todas as luzes artificiais, antes da oração.

No centro dos pavilhões, a sombra se fizera, desse modo, muito intensa, mas o novo aspecto do firmamento, banhado em tonalidades sublimes, dava-nos a impressão da permanência em prodigioso palácio, em virtude do imenso teto azul iluminado a distância.

Fundamente impressionado, procurei convizinhar-me mais do pequeno grupo de companheiros.

Do quadro de colaboradores do castelo, apenas algumas senhoras permaneciam junto de nós, como se estivessem fazendo honrosa companhia à nobre Ismália.

Os demais, homens e mulheres, manteriam-se nos lugares de serviço que lhes competiam, não longe das criaturas mumificadas.

Notei que, embora instado, Aniceto esquivou-se à chefia espiritual da oração, alegando que, por direito, essa posição cabia à devotada esposa de Alfredo.

Ismália, então, num gesto de indefinível delicadeza, começou a orar, acompanhada por todos nós, em silêncio, salientando-se, porém, que lhe seguíamos a rogativa, frase por frase, atendendo a recomendações do nosso orientador, que aconselhou repetir, em pensamento, cada expressão, a fim de imprimir o máximo ritmo e harmonia ao verbo, ao som e à ideia, numa só vibração.

“Senhor! — começou Ismália, comovidamente — dignai-vos assim os nossos humildes tutelados, enviando-nos a luz de vossas bênçãos santificantes, nós estamos, prontos para executar vossa vontade, sinceramente, de secundar vossos alto desígnios convosco, Pai, reúnem-se os irmãos que ainda dormem, anestesiados pela negação espiritual a que se entregaram no mundo.

Desperta Senhor, se é de vossos desígnios sábios e misericordiosos, despertai-os do sono doloroso e infeliz.

Acordai-os para a responsabilidade, para a noção dos deveres justos!...

Magnânimo Rei, apiedai-vos de vossos filhos sofredores;
Criador compassivo, levantai as vossas criaturas;
Pai Justo, desculpai vossos filhos desventurados!


Permiti caia o orvalho do vosso amor infinito sobre o nosso modesto Posto de Socorro!...

Seja feita a vossa vontade acima da nossa, mas se for possível Senhor, deixai que os nossos doentes recebam um raio vivificante da vossa bondade!

A voz de Ismália penetrava-me o recesso do coração.
Observando-a, por um momento, reparei que a esposa de Alfredo se transfigurara.

Luzes diamantinas irradiavam de todo o seu corpo, em particular do tórax, cujo âmago parecia conter misteriosa lâmpada acesa.

Em vista da ligeira pausa que imprimira a oração, observei a nós outros, verificando que o mesmo fenómeno se dava connosco, embora menos intensamente.
Cada qual parecia, ali, apresentar uma expressão luminosa, gradativa.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 01, 2012 9:21 pm

As senhoras que acompanhavam Ismália estavam quase semelhantes a ela, como se trajassem soberbos costumes radiosos, em que predominava a cor azul.

Depois delas, em brilho, vinha a luz de Aniceto, de um lilás surpreendente.

Em seguida, tínhamos Alfredo, cuja luz era de um verde suave e sugestivo, sem grande esplendor.

Depois dele, vinham alguns servidores ostentando na fronte claridades sublimes, expressas em variadas cores, e, logo após, Vicente e eu, mostrávamos fraca luminosidade, a qual, porém, nos enchia de brilho intenso, considerando que a maioria dos cooperadores em serviço apresentava o corpo obscuro, como acontece na esfera carnal.

Com voz pausada e comovedora, Ismália prosseguiu:
“Temos, ao nosso lado, Senhor, infortunadas mães que não souberam descobrir o sentido sublime da fé, resvalando, imprudentemente, nos despenhadeiros da indiferença criminosa;
pais que não conseguiram ultrapassar a materialidade no curso da existência humana, incapazes de ver a formosa missão que lhes confiastes;
cônjuges desventurados pela incompreensão de vossas leis augustas e generosas;
jovens que se entregaram, de corpo e alma aos alvitres da ilusão!...


Muitos deles, atolaram-se no pantanal do crime, agravando destinos dolorosos!
Agora dormem, Pai, à espera de vossos desígnios santos.
Sabemos, contudo, Senhor, que este sono não traduz repouso do pensamento.

Quase todos os nossos asilados são vítimas de terríveis pesadelos, por terem olvidado, no mundo material, os vossos mandamentos de amor e sabedoria.

Sob a imobilidade aparente movimenta-se-lhes o Espírito, entre aflições angustiosas que, por vezes, não podemos sondar.

Perdoe-os, Pai, vossos filhos transviados e nossos companheiros de luta, necessitados de vossa mão paternal para o caminho!

Quase todos se desviaram da senda recta, pelas sugestões da ignorância que, como aranha gigantesca, tece os fios da miséria, enredando destinos e corações! Deprecando vossa misericórdia para eles, rogamos, para nós, a verdadeira noção da fraternidade universal!

Ensinai-nos a transpor as fronteiras de separação para que vejamos em cada enfermo o irmão necessitado do nosso entendimento!

Ajudai-nos a com preensão, a fim de que venhamos a perder todo impulso de acusação nas estradas da vida!

Ensinai-nos a amar como Senhor nos amou?

Também nós, Senhor, que aqui vos rogamos, fomos leprosos espirituais, cegos do entendimento, paralíticos da vontade, filhos pródigos do vosso amor!...

Também nós dormimos, em tempos idos, nos Postos de Socorro da vossa misericórdia!...
Somos simples devedores, ansiosos de resgatar imensos débitos!

Sabemos que vossa bondade nunca falha e esperamos contemplar a bênção de vida e luz!. .

Fizera Ismália nova pausa, agora mais longa.
Os olhos humedecidos de pranto. Suave calor, todavia, apossava-se-me da alma.

E tão intensa era essa nova sensação de conforto, que interrompi a concentração em mim mesmo, a fim de olhar em torno.

Fixando instintivamente o alto, enxerguei, maravilhado, grande quantidade de flocos esbranquiçados, de tamanhos variadíssimos, a caírem copiosamente sobre nós que orávamos, excepto sobre os que dormiam.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 01, 2012 9:21 pm

Tive a impressão de que eram derramados do céu sobre nossa fronte, caindo com a mesma abundância sobre todos, desde Ismália ao último dos servidores.

Não cabia em mim de admiração, quando novo fenómeno me surpreendeu.

Os flocos leves desapareciam ao tocar-nos, começando, porém, a sair de nossa fronte e do peito grandes bolhas luminosas, com a coloração da claridade de que estávamos revestidos, elevando-se no ar e atingindo as múmias.

Ainda aí, reparava o problema da gradação espiritual.
As luzes emitidas por Ismália eram mais brilhantes, intensas e rápidas, alcançando muitos enfermos de uma só vez.

Em seguida, vinham as fornecidas pelas senhoras do seu círculo pessoal.
Depois, tínhamos as de Aniceto, de Alfredo e dos demais.
Os servos de corpo obscuro emitiam vibrações fracas, mas visivelmente luminosas.

Cada qual, naquele instante de contacto com o plano superior, revelava o valor próprio na cooperação que podia prestar.

Observando-me o assombro, Aniceto falou-me aos ouvidos:
— Na prece encontramos a produção avançada de elementos-força.

Eles chegam da Providência em quantidade igual para todos os que se dêem ao trabalho divino da intercessão, mas cada Espírito tem uma capacidade diferente para receber.

Essa capacidade é a conquista individual para o mais alto.

E como Deus socorre o homem pelo homem e atende a alma pela alma, cada um de nós somente poderá auxiliar os semelhantes e colaborar com o Senhor, com as qualidades de elevação já conquistadas na vida.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jan 01, 2012 9:21 pm

XXV - Efeitos da oração

As luzes da prece inundaram o vasto recinto.

Palpitava em tudo, agora, uma claridade serena, doce, irradiante, muito diversa da luminosidade artificial.

Os flocos radiosos que partiam de nós multiplicavam-se no ar, como se obedecessem a misterioso processo de segmentação, e caíam sempre sobre os corpos inanimados e enrijecidos, dando a impressão de lhes penetrarem as células mais íntimas.

Eu estava boquiaberto.
Não me fora permitido contemplar fenómenos dessa natureza em “Nosso Lar”.
Aliás, concluía, ainda não recebera auxílio magnético às percepções, senão poucas horas antes da viagem.

A claridade crescia e estendia-se em espectáculo prodigioso.
Agora, porém, abandonáramos a atitude de recolhimento destinada à concentração de nossas próprias forças e emissão de energias vibratórias.

Nossos corpos, todavia, continuavam envolvidos em vasto círculo irradiante.
Prosseguindo, porém, o grande silêncio, notei que a luz da oração se fazia mais clara, mais penetrante.

Comecei a ver, como no caso de Ana, que todos aqueles esqueletos misérrimos apresentavam núcleos de sombra, além das máscaras mortuárias, núcleos que se mostravam dentro de formas variadíssimas.

As bolhas luminosas caíam incessantemente, mas agora, como se fossem dirigidas por uma vontade Inteligente, concentravam-se quase todas sobre as frontes imóveis.

Então, pude observar o inaudito e inconcebível para mim.
As múmias, porque não posso dar outro nome aos irmãos que dormem, começaram a dar sinais de vida.

Alguns daqueles infelizes deixavam escapar gemidos angustiosos, outros falavam em voz alta, dando conta dos pesadelos que os atormentavam, como sonâmbulos prestes a despertar.

Muitos moviam os pés e as mãos, como a se esforçarem por fugir ao sono doloroso.
Eminentemente surpreendido, reparei que dois se levantaram, distante de nós.

Recordei que ambos faziam parte daqueles que haviam recebido toda espécie de assistência, inclusive o sopro curativo.

Olharam-nos de longe, como loucos que acordassem de súbito, e dispararam a correr, espavoridos, não obstante a impressão de cadáveres ambulantes, que nos causavam.

Admirado, verifiquei que ninguém esboçou a menor disposição de segui-los.

E quando me propunha, instintivamente, a fazê-lo, Alfredo deteve-me, exclamando:
— Não se preocupe. Eles seriam amargamente surpreendidos, se fossem notificados agora de sua permanência longa entre verdadeiras múmias.

Acreditam sonhar e é melhor assim.
Não poderão fugir às nossas fortificações e voltarão a pedir socorro noutras dependências, a que serão recolhidos para adequado tratamento.

Continuamos silenciosos mais alguns minutos, e notei que as luzes se foram apagando gradativamente, ao passo que os cadáveres retomavam a imobilidade anterior.
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