LUZ ESPÍRITA
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Série André Luiz - LIBERTAÇÃO

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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Mar 11, 2012 9:56 pm

Estamos na posição de homens que, por amor, descessem a operar num imenso lago de lodo;
para socorrer eficientemente os que se adaptaram a ele, são compelidos a cobrir-se com as substâncias do charco, sofrendo-lhes, com paciência e coragem, a influenciação deprimente.

Atravessamos importantes limites vibratórios e cabe-nos entregar a forma exterior ao meio que nos recebe, a fim de sermos realmente úteis aos que nos propomos auxiliar.

Finda a nossa transformação transitória, seremos vistos por qualquer dos habitantes desta região menos feliz.

A oração, de agora em diante, deve ser nosso único fio de comunicação com o Alto, até que eu possa verificar, quando na Crosta, qual o minuto mais adequado de nosso retorno aos dons luminescentes.

Não estamos em cavernas infernais, mas atingimos grande império de inteligências perversas e atrasadas, anexo aos círculos da Crosta, onde os homens terrestres lhes sofrem permanente influenciação.

Chegou para nós o momento de pequeno testemunho.
Muita capacidade de renúncia é indispensável, a fim de alcançarmos nossos fins.

Podemos perder por falta de paciência ou por escassez de vocação para o sacrifício.

Para a malta de irmãos retardados que nos envolverá, seremos simples desencarnados, ignorantes do próprio destino.

Passamos a inalar as substâncias espessas que pairavam em derredor, como se o ar fosse constituído de fluidos viscosos.

Elói estirou-se, ofegante, e não obstante experimentar, por minha vez, asfixiante opressão, busquei padronizar atitudes pela conduta do Instrutor, que tolerava a metamorfose, silencioso e palidíssimo.

Reparei, confundido, que a voluntária integração com os elementos inferiores do plano nos desfigurava enormemente.

Pouco a pouco, sentimo-nos pesados e tive a ideia de que fora, de improviso, religado, de novo, ao corpo de carne, porque, embora me sentisse dono da própria individualidade, me via revestido de matéria densa, como se fosse obrigado a envergar inesperada armadura.

Decorridos longos minutos, o orientador apelou, diligente:
— Prossigamos! Doravante, seremos auxiliares anónimos. Não nos convém, por enquanto, a identificação pessoal.

— Mas, não será isto mentir? clamou Elói, quase refeito.
Gúbio dividiu connosco um olhar de benevolência e explicou, bondoso:
— Não te recordas do texto evangélico que recomenda não saiba a mão esquerda o que dá a direita?

Este é o momento de ajudarmos sem alarde.
O Senhor não é mentiroso quando nos estende invisíveis recursos de salvação, sem que lhe vejamos a presença.
Nesta cidade sombria, trabalham inúmeros companheiros do bem nas condições em que nos achamos.

Se erguermos bandeira provocante, nestes campos, nos quais noventa e cinco por cento das inteligências se encontram devotadas ao mal e à desarmonia, nosso programa será estraçalhado em alguns instantes.

Centenas de milhares de criaturas aqui padecem amargos choques de retorno à realidade, sob a vigilância de tribos cruéis, formadas de espíritos egoístas, invejosos e brutalizados Para a sensibilidade medianamente desenvolvida, o sofrimento aqui é inapreciável.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Mar 11, 2012 9:56 pm

— E há governo estabelecido num reino estranho e sinistro quanto este? — indaguei.
— Como não? — respondeu Gúbio, atenciosamente.
— Qual ocorre na esfera carnal, a direcção, neste domínio, é concedida pelos Poderes Superiores, a título precário.

Na actualidade, este grande empório de padecimentos regenerativos permanece dirigido por um sátrapa de inqualificável impiedade, que aliciou para si próprio o pomposo título de Grande Juiz, assistido por assessores políticos e religiosos tão frios e perversos quanto ele mesmo.

Grande aristocracia de génios implacáveis aqui se alinha, assenhoreando milhares de mentes preguiçosas, delinquentes e enfermiças...

— E porque permite Deus semelhante absurdo?
Dessa vez, era o meu colega que perguntava, de novo, semi-apavorado, agora, ante os compromissos que assumíramos.

Longe de perturbar-se, Gúbio replicou:
— Pelas mesmas razões educativas através das quais não aniquila uma nação humana quando, desvairada pela sede de dominação, desencadeia guerras cruentas e destruidoras, mas a entrega à expiação dos próprios crimes e ao infortúnio de si mesma, para que aprenda a integrar-se na ordem eterna que preside à vida universal.

De período a período, contado cada um por vários séculos, a matéria utilizada por semelhantes inteligências é revolvida e reestruturada, qual acontece nos círculos terrenos;
mas se o Senhor visita os homens pelos homens que se santificam, corrige igualmente as criaturas por intermédio das criaturas que se endurecem ou bestializam.

— Significa então que os génios malditos, os demónios de todos os tempos... — exclamei, reticencioso...
— Somos nós mesmos — completou o Instrutor, paciente — quando nos desviamos, impenitentes, da Lei.

Já perambulamos por estes sítios sombrios e inquietantes, mas os choques biológicos do renascimento e da desencarnação, mais ou menos recentes, não te permitem, nem a Elói, o desabrocho de reminiscências completas do passado.

Comigo, porém, a situação é diversa.
A extensão de meu tempo, na vida livre, já me confere recordações mais dilatadas e, de antemão, conheço as lições que constituam novidade.

Muitos de nossos companheiros, guindados à altura, não mais identificam nestas paragens senão motivos de cansaço, repugnância e pavor;
todavia, é forçoso observar que o pântano, invariávelmente, é uma zona da natureza pedindo o socorro dos servos mais fortes e generosos.

Música exótica fazia-se ouvir não distante e Gúbio rogou-nos prudência e humildade em favor do êxito no trabalho a desdobrar-se.

Reerguemo-nos e avançamos.
Fizera-se-nos tardio o passo e nossa movimentação difícil.

Em voz baixa, o orientador reiterou a recomendação:
— Em qualquer constrangimento íntimo, não nos esqueçamos da prece.

É, de ora em diante, o único recurso de que dispomos a fim de mobilizar nossas reservas mentais superiores, em nossas necessidades de reabastecimento psíquico.

Qualquer precipitação pode arrojar-nos a estados primitivistas, lançando-nos em nível inferior, análogo ao dos espíritos infelizes que desejamos auxiliar.

Tenhamos calma e energia, doçura e resistência, de ânimo voltado para o Cristo.
Lembremo-nos de que aceitamos o encargo desta hora, não para justiçar e sim para educar e servir.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Mar 11, 2012 9:56 pm

Adiantamo-nos, caminho a fora, como se fazia possível.
Em minutos breves, penetramos vastíssima aglomeração de vielas, reunindo casario decadente e sórdido.

Rostos horrendos contemplavam-nos furtivamente, a princípio, mas, à medida que varávamos o terreno, éramos observados, com atitude agressiva, por transeuntes de miserável aspecto.

Alguns quilómetros de via pública, repletos de quadros deploráveis, desfilaram a nossos olhos.
Mutilados às centenas, aleijados de todos os matizes, entidades visceralmente desequilibradas, ofereciam-nos paisagens de arrepiar.

Impressionado com a multidão de criaturas deformadas que se enfileiravam sob nosso raio visual, perfeitamente arrebanhadas ali em experiência colectiva, enderecei algumas interrogações ao Instrutor, em tom discreto.

Porque tão extensa comunidade de sofredores?
Que causas impunham tão flagrante decadência da forma?
Paciente, o orientador não se fez demorado na resposta.

— Milhões de pessoas — informou, calmo —, depois da morte, encontram perigosos inimigos no medo e na vergonha de si mesmas.

Nada se perde, André, no círculo de nossas acções, palavras e pensamentos.

O registo de nossa vida opera-se em duas fases distintas, perseverando no exterior, através dos efeitos de nossa actuação em criaturas, situações e coisas, e persistindo em nós mesmos, nos arquivos da própria consciência, que recolhe matematicamente todos os resultados de nosso esforço, no bem ou no mal, ao interior dela própria, O espírito, em qualquer parte, move-se no centro das criações que desenvolveu.

Defeitos escuros e qualidades louváveis envolvem-no, onde se encontre.

A criatura na Terra, por onde peregrinamos, ouve argumentos alusivos ao Céu e ao Inferno e acredita vagamente na vida espiritual que a espera, além-túmulo.

Mais cedo que possa imaginar, perde o veículo de carne e compreende que não se pode ocultar por mais tempo, desfeita a máscara do corpo sob a qual se escondia à maneira da tartaruga dentro da carapaça.

Sente-se tal qual é e receia a presença dos filhos da luz, cujos dons de penetração lhe identificariam, de pronto, as mazelas indesejáveis.

O perispírito, para a mente, é uma cápsula mais delicada, mais susceptível de reflectir-lhe a glória ou a viciação, em virtude dos tecidos rarefeitos de que se constitui.

Em razão disso, as almas decaídas, num impulso de revolta contra os deveres que nos competem a cada um, nos serviços de sublimação, aliam-se umas às outras através de organizações em que exteriorizam, tanto quanto possível, os lamentáveis pendores que lhes são peculiares, não obstante aferretoadas pelo aguilhão das inteligências vigorosas e cruéis.

— Mas — interferi — não há recursos de soerguer semelhantes comunidades?
— A mesma lei de esforço próprio funciona igualmente aqui.

Não faltam apelos santificantes de Cima;
contudo, com a ausência da íntima adesão dos interessados ao ideal da melhoria própria, é impraticável qualquer iniciativa legítima, em matéria de reajustamento geral.

Sem que o espírito, senhor da razão e dos valores eternos que lhe são consequentes, delibere mobilizar o património que lhe é próprio, no sentido de elevar o seu campo vibratório, não é justo seja arrebatado, por imposição, a regiões superiores que ele mesmo, por enquanto, não sabe desejar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Mar 11, 2012 9:56 pm

E até que resolva atirar-se ao empreendimento da própria ascensão, vai sendo aproveitado pelas leis universais no que possa ser útil à Obra Divina.

A minhoca, enquanto é minhoca, é compelida a trabalhar o solo;
o peixe, enquanto é peixe, não viverá fora d’água...

Sorrindo, ante a própria argumentação, concluiu bem-humorado:
— É natural, pois, que o homem, dono de vastas teorias de virtude salvadora, enquanto se demora no comboio da inferioridade seja empregado em actividades inferiores.

A Lei estima infinitamente a Lógica.
Calou-se Gübio, evidentemente constrangido pela necessidade de não acordarmos demasiada atenção em torno de nós.
Tocado, no entanto, pela miséria que ali emoldurava tanta dor, perdi-me num mar de indagações íntimas.

Que empório extravagante era aquele?
Algum país onde vicejassem tipos sub-humanos?

Eu sabia que semelhantes criaturas não envergavam corpos carnais e que se congregavam num reino purgatorial, em benefício próprio;
entretanto, vestiam-se de roupagens de matéria francamente imunda.

Lombroso e Freud encontrariam aí extenso material de observação.
Incontáveis tipos que interessariam, de perto, à criminologia e à psicanálise.

Vagueavam absortos, sem rumo.
Exemplares inúmeros de pigmeus, cuja natureza em si ainda não posso precisar, passavam por nós, aos magotes.

Plantas exóticas, desagradáveis ao nosso olhar, ali proliferam, e animais em cópia abundante, embora monstruosos, se movimentavam a esmo, dando-me a ideia de seres acabrunhados que pesada mão transformara em duendes.

Becos e despenhadeiros escuros se multiplicavam em derredor, acentuando-nos o angustioso assombro.
Após a travessia de vastíssima área, não sopitei as interrogações que me escapavam do cérebro.

O Instrutor, todavia, esclareceu, discreto:
— Guarda as perguntas intempestivas no momento.
Estamos numa colónia purgatorial de vasta expressão.

Quem não cumpre aqui dolorosa penitência regenerativa, pode ser considerado inteligência sub-humana.
Milhares de criaturas, utilizadas nos serviços mais rudes da natureza, movimentam-se nestes sítios em posição infraterrestre.

A ignorância, por ora, não lhes confere a glória da responsabilidade.
Em desenvolvimento de tendências dignas, candidatam-se à humanidade que conhecemos na Crosta.

Situam-se entre o raciocínio fragmentário do macacóide e a ideia simples do homem primitivo na floresta.

Afeiçoam-se a personalidades encarnadas ou obedecem, cegamente, aos espíritos prepotentes que dominam em paisagens como esta.
Guardam, enfim, a ingenuidade do selvagem e a fidelidade do cão.

O contacto com certos indivíduos inclina-os ao bem ou ao mal e somos responsabilizados pelas Forças Superiores que nos governam, quanto ao tipo de influência que exercermos sobre a mente infantil de semelhantes criaturas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Mar 11, 2012 9:57 pm

Com respeito aos Espíritos que se mostram nestas ruas Sinistras, exibindo formas quase animalescas, neles reparamos várias demonstrações da anormalidade a que somos conduzidos pela desarmonia interna.

Nossa actividade mental nos marca o perispírito.
Podemos reconhecer a propriedade do asserto, quando ainda no mundo.
O glutão começa a adquirir aspecto deprimente no corpo em que habita.

Os viciados no abuso do álcool passam a viver de borco, arrojados ao solo, à maneira de grandes vermes.

A mulher que se habituou a mercadejar com o vaso físico, olvidando as sagradas finalidades da vida, apresenta máscara triste, sem sair da carne.

Aqui, porém, André, o fogo devorador das paixões aviltantes revela suas vítimas com mais hedionda crueldade.

Certo, porque eu reflectisse no problema de assistência, o orientador aduziu:
— É impraticável a enfermagem individual e sistemática numa cidade em que se amontoam milhares de alienados e doentes.

Um médico do mundo surpreenderia aqui, às centenas, casos de amnésia, de psicastenia, de loucura, através de neuroses complexas, alcançando a conclusão de que toda a patogenia permanece radicada aos ascendentes de ordem mental.

Quem cura nestes lugares há de ser o tempo com a piedade celeste ou a piedade celeste por intermédio de embaixadores da renúncia, em serviços de intercessão para os espíritos arrependidos que se refugiem na obediência aos imperativos da Lei, inspirados pela boa vontade.

Alguns transeuntes repulsivos ombrearam connosco e Gúbio considerou prudente silenciar.

Notei a existência de algumas organizações de serviços que nos pareceriam, na esfera carnal, ingénuas e infantis, reconhecendo que a ociosidade era, ali, a nota dominante. E porque não visse crianças, excepção feita das raças de anões, cuja existência percebia sem distinguir os pais dos filhos, arrisquei, de novo, uma indagação, em voz baixa.

Respondeu o Instrutor, atencioso:
— Para os homens da Terra, própriamente considerados, este plano é quase infernal.

Se a compaixão humana separa as crianças dos criminosos definidos, que dizer do carinho com que a compaixão celestial vela pelos infantes?

— E porque em geral tanta ociosidade neste plano? — indaguei ainda.
— Quase todas as almas humanas, situadas nestas furnas, sugam as energias dos encarnados e lhes vampirizam a vida, qual se fossem lampreias insaciáveis no oceano do oxigénio terrestre.

Suspiram pelo retorno ao corpo físico, de vez que não aperfeiçoaram a mente para a ascensão, e perseguem as emoções do campo carnal com o desvario dos sedentos no deserto.

Quais fetos adiantados absorvendo as energias do seio materno, consomem altas reservas de força dos seres encarnados que as acalentam, desprevenidos de conhecimento superior.

Daí, esse desespero com que defendem no mundo os poderes da inércia e essa aversão com que interpretam qualquer progresso espiritual ou qualquer avanço do homem na montanha de santificação.

No fundo, as bases económicas de toda essa gente residem, ainda, na esfera dos homens comuns e, por isto, preservam, apaixonadamente, o sistema de furto psíquico, dentro do qual se sustentam, junto às comunidades da Terra.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Mar 11, 2012 9:57 pm

A essa altura, defrontamos acidentes no solo, que o Instrutor nos levou a atravessar.
Subimos, dificilmente, a rua íngreme e, em pequeno planalto, que se nos descortinou aos olhos espantadiços, a paisagem alterou-se.

Palácios estranhos surgiam imponentes, revestidos de claridade abraseada, semelhante à auréola do aço incandescente.

Praças bem cuidadas, cheias de povo, ostentavam carros soberbos, puxados por escravos e animais.
O aspecto devia, a nosso ver, identificar-se com o das grandes cidades do Oriente, de duzentos anos atrás.

Liteiras e carruagens transportavam personalidades humanas, trajadas de modo surpreendente, em que o escarlate exercia domínio, acentuando a dureza dos rostos que emergiam dos singulares indumentos.

Respeitável edifício destacava-se diante de uma fortaleza, com todos os característicos de um templo, e o orientador confirmou-me as impressões, asseverando que a casa se destinava a espectaculoso culto externo.

Enquanto nos movimentávamos, admirando o sumptuoso casario em contraste chocante com o vasto reino de miséria que atravessáramos, alguém nos interpelou, descortês:
— Que fazem?

Era um homem alto, de nariz adunco e olhos felinos, com todas as maneiras do policial desrespeitoso, a identificar-nos.

— Procuramos o sacerdote Gregório, a quem estamos recomendados — esclareceu Gúbio, humilde.
O estranho pôs-se à frente, determinou lhe acompanhássemos as passadas, em silêncio, e guiou-nos a um casarão de feio aspecto.

— É aqui! — disse em tom seco e, após apresentar-nos a um homem maduro, envolvido em longa e complicada túnica, retirou-se.
Gregório não nos recebeu hospitaleiramente.

Fitou em Gúbio os olhos desconfiados de fera surpreendida e interrogou:
— Vieram da Crosta, há muito tempo?
— Sim — respondeu nosso Instrutor —, e temos necessidade de auxílio.

— Já foram examinados?
— Não.
— E quem os enviou? — inquiriu o sacerdote, sob visível perturbação.
— Certa mensageira de nome Matilde.

O anfitrião estremeceu, mas observou, implacável:
— Não sei quem seja. Todavia, podem entrar.
Tenho serviços nos mistérios e não posso ouvi-los agora.

Amanhã, porém, ao anoitecer, serão levados aos sectores de selecção, antes de admitidos ao meu serviço.

Nem mais uma palavra.

Entregues a um servidor de fisionomia desagradável, demandamos porão escuro, e confesso que acompanhei Gúbio e Elói, de alma conturbada por receio absorvente e indefinível.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:04 pm

5 - Operações selectivas

Transcorridas longas horas em compartimento escuro, aproveitadas em meditações e preces, sem entendimentos verbais, fomos conduzidos, na noite imediata, a um edifício de grandes e curiosas proporções.

O esquisito palácio guardava a forma de enorme hexágono, alongando-se para cima em torres pardacentas, e reunia muitos salões consagrados a estranhos serviços, fluminado externa e interiormente pela claridade de volumosos tocheiros, apresentava o aspecto desagradável de uma casa incendiada.

Sob a custódia de quatro guardas da residência de Gregório, que nos comunicaram a necessidade de exame antes de qualquer contacto directo com o aludido sacerdote, penetramos o recinto de largas dimensões, no qual se congregavam algumas dezenas de entidades em deploráveis condições.

Moços e velhos, homens e mulheres, aí se misturavam em relativo silêncio.
Alguns gemiam e choravam.
Reparei que a multidão se constituía, em sua quase totalidade, de almas doentes.

Muitos padeciam desequilíbrios mentais visíveis.
Observei-lhes, impressionado, o aspecto enfermiço.

O perispírito de todos os que aí se enclausuravam, pacientes e espectadores, mostrava a mesma opacidade do corpo físico.
Os estigmas da velhice, da moléstia e do desencanto, que perseguem a experiência humana, ali triunfavam, perfeitos...

O medo controlava os mais desesperados, porque o silêncio caía, abafante, embora a inquietação que transparecia de todos os rostos.

Alguns servidores da casa, em trajes característicos, separavam, por grupos vários, as pessoas desencarnadas que entrariam, naquele momento, em selecção para julgamento oportuno.

Discretamente, o Instrutor elucidou-nos:
— Presenciamos uma cerimónia semanal dos juízes implacáveis que vivem sediados aqui.
A operação selectiva realiza-se com base nas irradiações de cada um.

Os guardas que vemos em trabalho de escolha, compondo grupos diversos, são técnicos especializados na identificação de males numerosos, através das cores que caracterizam o halo dos Espíritos Ignorantes, perversos e desequilibrados.

A divisão para facilitar o serviço judiciário é, por isto mesmo, das mais completas.
A essa altura, o pessoal de Gregório nos dera tréguas, afastando-se de nós, de algum modo, não obstante vigiar-nos das galerias repletas de gente.

Respeitado o nosso trio pelos seleccionadores que não nos alteraram a união, situávamo-nos, agora, no campo das vítimas.

Atento à explicação ouvida, indaguei, curioso:
— Todas estas entidades vieram constrangidas, conforme sucedeu connosco?
Há espíritos satânicos, recordando as oleografias religiosas da Crosta, disputando as almas no leito de morte?

O orientador obtemperou, muito calmo:
— Sim. André, cada mente vive na companhia que elege.
Semelhante princípio prevalece para quem respira no corpo denso ou fora dele.

É imperioso reconhecer, porém, que a maioria das almas asiladas neste sítio vieram ter aqui, obedecendo a forças de atracção.

Incapazes de perceber a presença dos benfeitores espirituais que militam entre os homens encarnados, em tarefas de renunciação e benevolência, em vista do baixo teor vibratório em que se precipitaram, através de delitos reiterados, da ociosidade impenitente ou da deliberada cristalização no erro, não encontraram senão o manto de sombras em que se envolveram e, desvairadas, sozinhas, procuraram as criaturas desencarnadas que com elas se afinam, agregando-se naturalmente a este imenso cortiço, com toda a bagagem de paixões destruidoras que lhes marcam a estrada.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:04 pm

Aportando aqui, sofrem, porém, a vigilância de inteligências poderosas e endurecidas que Imperam ditatorialmente nestas regiões, onde os frutos amargos da maldade e da indiferença enchem o celeiro dos corações desprevenidos e maliciosos.

— Oh! — exclamei em voz sussurrante — por que motivo confere o Senhor atribuições de julgadores a Espíritos despóticos?
Porque estará a justiça, nesta cidade estranha, em mãos de príncipes diabólicos?

Gúbio estampou na fisionomia significativa expressão e ajuntou:
— Quem se atreveria a nomear um anjo de amor para exercer o papel de carrasco?
Ao demais, como acontece na Crosta Planetária, cada posição, além da morte, é ocupada por aquele que a deseja e procura.

Vagueei o olhar, em derredor, e confrangeu-se-me toda a alma.
Na comunidade das vítimas, arrebanhadas aos magotes, como se fossem animais raros para uma festa, predominavam a humildade e a aflição;
mas, entre as sentinelas que nos rodeavam, a peçonha da ironia transbordava.

Palavrões eram desferidos, desrespeitosamente, a esmo.
A frente de vasta tribuna vazia e sob as galerias laterais abarrotadas de povo, compacta multidão se amontoava, irreverente.

Alguns minutos decorreram, desagradáveis e pesados, quando absorvente vozento se fez ouvido:
— Os magistrados! os magistrados!
Lugar! lugar para os sacerdotes da justiça!

Procurei a paisagem exterior, curiosamente, tanto quanto me era possível, e vi que funcionários rigorosamente trajados à moda dos lictores da Roma antiga, carregando a simbólica machadinha (fasces) ao ombro, avançavam, ladeados por servidores que sobraçavam grandes tochas a lhes clarearem o caminho.

Penetraram o átrio em passos rítmicos e, depois deles, sete andores, sustentados por dignitários diversos daquela corte brutalizada, traziam os juízes, esquisitamente ataviados.

Que solenidade religiosa era aquela?
As poltronas suspensas eram, em tudo, idênticas à “sédia gestatória” das cerimónias papalinas.

Varando, agora, o recinto, os lictores passaram o instrumento simbólico às mãos e alinharam-se, correctos, perante a tribuna espaçosa, sobre a qual resplandecia alarmante facho de luz.

Os julgadores, por sua vez, desceram, pomposos, dos tronos içados e tomaram assento numa espécie de nicho a salientar-se de cima, inspirando silêncio e temor, porque a turba inconsciente, em redor, calou-se de súbito.

Tambores variados rufaram, como se estivéssemos numa parada militar em grande estilo, e uma composição musical semi-selvagem acompanhou-lhes o ritmo, torturando-nos a sensibilidade.

Terminado aquele ruído, um dos julgadores se levantou e dirigiu-se à massa, aproximadamente nestes termos:
— “Nem lágrimas, nem lamentos.
Nem sentença condenatória, nem absolvição gratuita.

Esta casa não pune, nem recompensa.
A morte é caminho para a justiça.
Escusado qualquer recurso à compaixão, entre criminosos.

Não somos distribuidores de sofrimento, e, sim, mordomos do Governo do Mundo.
Nossa função é a de seleccionar delinquentes, a fim de que as penas lavradas pela vontade de cada um sejam devidamente aplicadas em lugar e tempo justos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:04 pm

Quem abriu a boca para vilipendiar e ferir, prepare-se a receber, de retorno, as forças tremendas que desencadeou através da palavra envenenada.

Quem abrigou a calúnia, suportará os génios infelizes aos quais confiou os ouvidos.
Quem desviou a visão para o ódio e para a desordem, descubra novas energias para contemplar os resultados do desequilíbrio a que se consagrou, espontaneamente.

Quem utilizou as mãos em sementeiras de malícia, discórdia, inveja, ciúme e perturbação deliberada, organize resistência para a colheita de espinhos.

Quem centralizou os sentidos no abuso de faculdades sagradas espere, doravante, necessidades enlouquecedoras, porque as paixões envilecentes, mantidas pela alma no corpo físico, explodem aqui, dolorosas e arrasadoras.

A represa por longo tempo guarda micróbios e monstros, segregados a distância do curso tranquilo das águas;
todavia, chega um momento em que a tempestade ou a decadência surpreendem a obra vigorosa de alvenaria e as formas repelentes, libertadas, se espalhem e crescem em toda a extensão da corrente.

Seguidores do vício e do crime, tremei!

Condenados por vós mesmos, conservais a mente prisioneira das mais baixas forças da vida, à maneira do batráquio encarcerado no visco do pântano, ao qual se habituou no transcurso dos séculos!...

Nesse ponto, o orador fez pausa e reparei os circunstantes.

Olhos esgazeados pelo pavor jaziam abertos em todas as máscaras fisionómicas.
O juiz, por sua vez, não parecia respeitar o menor resquício de misericórdia.

Mostrava-se interessado em criar ambiente negativo a qualquer espécie de soerguimento moral, estabelecendo nos ouvintes angustioso temor.

Prolongando-se o intervalo, enderecei com o olhar silenciosa interrogação ao nosso orientador, que me falou quase em segredo:
— O julgador conhece à saciedade as leis magnéticas, nas esferas inferiores, e procura hipnotizar as vítimas em sentido destrutivo, não obstante usar, como vemos, a verdade contundente.

— Não vale acusar a edilidade desta colónia — prosseguiu a voz trovejante —, porque ninguém escapará aos resultados das próprias obras, quanto o fruto não foge às propriedades da árvore que o produziu.

Amaldiçoados sejam pelo Governo do Mundo quem nos desrespeite as deliberações, baseadas, aliás, nos arquivos mentais de cada um.

Assinalando, intuitivamente, a queixa mental dos ouvintes, bradou, terrificante:
— Quem nos acusa de crueldade?
Não será benfeitor do espírito colectivo o homem que se consagra à vigilância de uma penitenciária?

E quem sois vós, senão rebotalho humano?
Não viestes, até aqui, conduzidos pelos próprios ídolos que adorastes?

Nesse momento, convulsivo choro invadiu a muitos.
Gritos atormentados, rogativas de compaixão se fizeram ouvir.

Muitos se prosternaram de joelhos.
Imensa dor generalizara-se.
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Série André Luiz - LIBERTAÇÃO - Página 2 Empty Re: Série André Luiz - LIBERTAÇÃO

Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:04 pm

Gúbio trazia a destra sobre o peito, como se contivesse o coração, mas, vendo por minha vez aquele grande grupo de espíritos rebelados e humilhados, orgulhosos e vencidos, lastimando amargamente as oportunidades perdidas, recordei meus velhos caminhos de ilusão e — porque não dizer? — ajoelhei-me também, compungido, implorando piedade em silêncio.

Exasperado, o julgador bradou, colérico:
— Perdão? Quando desculpastes sinceramente os companheiros da estrada?
Onde está o juiz recto que possa exercer, impune, a misericórdia?

E incidindo toda a força magnética que lhe era peculiar, através das mãos, sobre uma pobre mulher que o fixava, estarrecida, ordenou-lhe com voz soturna:
— Venha! venha!

Com expressão de sonâmbula, a infeliz obedeceu à ordem, destacando-se da multidão e colocando-se, em baixo, sob os raios positivos da atenção dele.

— Confesse! confesse! — determinou o desapiedado julgador, conhecendo a organização frágil e passiva a que se dirigia.

A desventurada senhora bateu no peito, dando-nos a impressão de que rezava o “confiteor” e gritou, lacrimosa:
— Perdoai-me! perdoai-me, ó Deus meu!

E como se estivesse sob a acção de droga misteriosa que a obrigasse a desnudar o íntimo, diante de nós, falou, em voz alta e pausada:
— Matei quatro filhinhos inocentes e tenros... e combinei o assassínio de meu intolerável esposo...
O crime, porém, é um monstro vivo.

Perseguiu-me, enquanto me demorei no corpo...
Tentei fugir-lhe através de todos os recursos, em vão... e por mais buscasse afogar o infortúnio em “bebidas de prazer”, mais me chafurdei no charco de mim mesma...

De repente, parecendo sofrer a interferência de lembranças menos dignas, clamou:
— Quero vinho! vinho! prazer!...
Em vigorosa demonstração de poder, afirmou, triunfante, o magistrado:
— Como libertar semelhante fera humana ao preço de rogativas e lágrimas?

Em seguida, fixando sobre ela as irradiações que lhe emanavam do temível olhar, asseverou, peremptório:
— A sentença foi lavrada por si mesma!
não passa de uma loba, de uma loba...

A medida que repetia a afirmação, qual se procurasse persuadi-la a sentir-se na condição do irracional mencionado, notei que a mulher, profundamente influenciável, modificava a expressão fisionómica.

Entortou-se-lhe a boca, a cerviz curvou-se, espontânea, para a frente, os olhos alteraram-se, dentro das órbitas.

Simiesca expressão revestiu-lhe o rosto.
Via-se, patente, naquela exibição de poder, o efeito do hipnotismo sobre o corpo perispirítico.

Em voz baixa, procurei recolher o ensinamento de Gúbio, que me esclareceu num cicio:
— O remorso é uma bênção, sem dúvida, por levar-nos à corrigenda, mas também é uma brecha, através da qual o credor se insinua, cobrando pagamento.

A dureza coagula-nos a sensibilidade durante certo tempo;
todavia, sempre chega um minuto em que o remorso nos descerra a vida mental aos choques de retorno das nossas próprias emissões.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:05 pm

E acentuando, de modo singular, a voz quase imperceptível, acrescentou:
— Temos aqui a génese dos fenómenos de licantropia, inextricáveis, ainda, para a investigação dos médicos encarnados.

Lembras-te de Nabucodonosor, o rei poderoso, a que se refere a Bíblia?
Conta-nos o Livro Sagrado que ele viveu, sentindo-se animal, durante sete anos.

O hipnotismo é tão velho quanto o mundo e é recurso empregado pelos bons e pelos maus, tomando-se por base, acima de tudo, os elementos plásticos do perispírito.

Notando, porém, que a mulher infeliz prosseguia guardando estranhos caracteres no semblante perguntei:
— Esta irmã infortunada permanecerá doravante em tal aviltamento da forma?

Finda longa pausa, o Instrutor informou, com tristeza:
— Ela não passaria por esta humilhação se não a merecesse.

Além disso, se se adaptou às energias positivas do juiz cruel, em cujas mãos veio a cair, pode também esforçar-se intimamente, renovar a vida mental para o bem supremo e afeiçoar-se à influenciação de benfeitores que nunca escasseiam na senda redentora.

Tudo, André, em casos como este, se resume a problema de sintonia.
Onde colocamos o pensamento, aí se nos desenvolverá a própria vida.

O orientador não conseguiu continuar.
Ao redor de nós, as lamentações se fizeram estridentes.
Interjeições de espanto e dor eram proferidas sem rumo.

O magistrado, que detinha a palavra, determinou silêncio e exprobrou, asperamente, a atitude dos queixosos.

Logo após, notificou que os Espíritos Selectores se materializariam, em breves minutos, e que os interessados poderiam solicitar deles as explicações que desejassem.

Concomitantemente, ergueu as mãos em mímica reverencial e, fazendo-nos sentir que presidia ao estranho cenáculo, fez uma invocação em alta voz, denunciando, nos gestos, a condição de respeitável hierofante, em grande solenidade.

Terminada que foi a alocução, vasto lençol nebuloso, semelhante a uma nuvem móvel, apareceu na tribuna que se mantinha, até então, despovoada.

E pouco a pouco, diante de nossos olhos assombrados, três entidades tomaram forma perfeitamente humana, apresentando uma delas, a que no porte guardava maior autoridade hierárquica, pequeno instrumento cristalino nas mãos.

Trajavam túnicas de curiosa e indefinível substância em amarelo vivo e revestiam-se de halo afogueado, não brilhante.

Essa auréola, mais acentuadamente viva em volta da fronte, desferia radiações perturbadoras, que recordavam a esbraseada expressão do ferro incandescido.

Ambos os acólitos da personalidade central do trio tomaram folhas de apontamento num cofre vizinho e, ladeando-a, desceram até nós, em silêncio.

Inesperada quietação tomou a turba, dantes agitada.
Ainda não sei de que recôndita organização provinham tais funcionários espirituais;
no entanto, reparei que o chefe da expedição tríplice mostrava infinita melancolia na tela fisionómica.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:05 pm

Alçou ele o instrumento cristalino, à frente do primeiro grupo, formado de catorze homens e mulheres de vários tipos.
Efectuou observações que não pude acompanhar e disse algo aos companheiros que se dispuseram à anotação imediata.

Antes, porém, que se retirasse, dois membros do conjunto avançaram implorando socorro:
— Justiça! justiça! — suplicou o primeiro — estou punido sem culpa...
Fui homem de pensamento e de letras, entre as criaturas encarnadas...
Porque deverei suportar a companhia dos avarentos?

Fitando o selector, angustiadamente, reclamou:
— Se escolheis com equidade, livrai-me do labirinto em que me vejo!

Não terminara, e o segundo interferiu, ajuntando:
— Magistrado venerável, por quem sois!... não pertenço à classe dos sovinas.
Imanaram-me a seres sórdidos e desprezíveis!
Minha vida transcorreu entre livros, não entre moedas...

- A Ciência fascinou-me, os estudos eram meu tema predilecto...
Pode, assim, o intelectual equiparar-se ao usurário?

O dirigente da selecção mostrou reservada piedade no semblante calmo e elucidou, firme:
— Clamais debalde, porque desagradável vibração de egoísmo cristalizante vos caracteriza a todos.

Que fizestes do tesouro cultural recebido?
Vosso “tom vibratório” demonstra avareza sarcástica.

O homem que ajunta letras e livros, teorias e valores científicos, sem distribuí-los a benefício dos outros, é irmão infortunado daquele que amontoa moedas e apólices, títulos e objectos preciosos, sem ajudar a ninguém.

O mesmo prato lhes serve na balança da vida.
— Por amor de Deus! — suplicou um dos circunstantes, comovedoramente.
— Esta casa é de justiça, em nome do Governo do Mundo! — afiançou o explicador sem alterar-se.

E impassível, embora visivelmente amargurado, pôs-se em marcha.

Auscultava uma formação de oito pessoas;
todavia, enquanto se comunicava com os assessores, acerca das observações recolhidas, um cavalheiro de faces macilentas salientou-se e exclamou, estadeando enorme fúria:
— Que ocorre neste recinto misterioso?
Estou entre caluniadores confessos, quando desempenhei o papel de homem honrado...

Criei numerosa família, nunca trai as obrigações sociais, fui correcto e digno e, não obstante aposentado desde cedo, cumpri todos os deveres que o mundo me assinalou...

Com acento colérico, aduzia, aflito:
— Quem me acusa?... quem me acusa?...
O seleccionador elucidou, sereno:
— A condenação transparece de vós mesmo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:05 pm

Caluniastes vosso próprio corpo, inventando para ele impedimentos e enfermidades que só existiam em vossa imaginação, interessada na fuga ao trabalho benéfico e salvador.

Debitastes aos órgãos robustos deficiências e moléstias deploráveis, tão-somente no propósito de conquistardes repouso prematuro.

Conseguistes quanto pretendieis.
Empenhastes amigos, subornastes consciências delituosas e obtivestes o descanso remunerado, durante quarenta anos de experiência terrestre em que outra acção não desenvolvestes senão dormir e conversar sem proveito.

Agora, é razoável que o vosso círculo vital se identifique ao de quantos se mergulharam no pântano da calúnia criminosa.

O infeliz não teve forças para a tréplica.
Submeteu-se, em lágrimas, à argumentação ouvida e retomou o lugar que lhe competia.

Alcançando o terceiro grupo, constituído de mulheres diversas, mal havia aplicado o singular instrumento ao campo vibratório que lhes dizia respeito, foi o mensageiro abordado por uma senhora, pavorosamente desfigurada, que lhe lançou em rosto atrozes queixas.

— Porque tamanha humilhação? — inquiriu em pranto copioso — fui dona de uma casa que me encheu de trabalho, voltei para cá rodeada de especiais considerações, naturalmente devidas ao meu estado social e arrebanham-me entre mulheres sem pudor?

Que autoridades são estas que impõem a mim, dama de nobre procedência, o convívio de meretrizes?
Forte crise de soluços embargou-lhe a voz.

O seleccionador, no entanto, dentro de uma calma que mais se avizinhava da frieza, declarou sem rebuços:
— Estamos numa esfera onde o equívoco se faz mais difícil.

Consultai a própria consciência.
Teríeis sido, realmente, a padroeira de um lar respeitável, como julgais?

O teor vibratório assevera que as vossas energias santificantes de mulher, em maior parte, foram desprezadas.

Vossos arquivos mentais se reportam a desregramentos emotivos em cuja extinção gastareis longo tempo.
Ao que parece, o altar doméstico não foi bem o vosso lugar.

A senhora gritou, gesticulou, protestou, mas os seleccionadores prosseguiram na tarefa a que se impunham.

Ao nosso lado, aplicou o instrumento, em que se salientavam pequeninos espelhos e falou para os auxiliares, definindo-nos a posição:
— Entidades neutras.
Fixou-nos com penetrante fulguração de olhar, como se nos surpreendesse, mudo, as intenções mais profundas e passou adiante.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:05 pm

Instado por mim, Gúbio esclareceu:
— Não fomos acusados.
Ser-nos-á possível o engajamento no serviço desejado.

— Que aparelho vem a ser esse? — indagou Elói, antecipando-me a curiosidade.
O orientador não se fez rogado e elucidou:
— Trata-se de um captador de ondas mentais.
A selecção individual exigiria longas horas.

As autoridades que dominam nestas regiões preferem a apreciação em grupo, o que se faz possível pelas cores e vibrações do círculo vital que nos rodeia a cada um.

— Porque nos considerou neutros? — interroguei por minha vez.
— O instrumento não é susceptível de marcar a posição das mentes que já se transferiram para a nossa esfera.

É recurso para a identificação de perispíritos desequilibrados e não atinge a zona superior.
— Mas — perguntei, ainda —, porque se fala nesta casa em nome do Governo do Mundo?

O Instrutor endereçou-me expressivo gesto e ajuntou:
— André, não te esqueças de que nos encontramos num plano de matéria algum tanto densa e não nos círculos de gloriosa santidade.

Não olvides a palavra “evolução” e recorda que os maiores crimes das civilizações terrestres foram cometidos em nome da Divindade.

Quanta vez, no corpo físico, notamos sentenças cruéis, emitidas por espíritos ignorantes, em nome de Deus?

Pouco a pouco, a cerimónia terminou com a mesma imponência de culto externo em que se havia iniciado e, sob a vigilância das sentinelas, tornamos ao ponto de origem, guardando inesperadas meditações e profundos pensamentos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:06 pm

6 - Observações e novidades

De volta ao domicílio de Gregório, fomos transferidos da cela trevosa para um aposento de janelas gradeadas, onde tudo desagradava à vista.

Certo, devíamos a mudança ao resultado encorajador que alcançáramos nas operações selectivas, mas, em verdade, ainda aí, nos achávamos em autêntico pardieiro.

De qualquer modo, era para nós imenso consolo contemplar algumas estrelas, através do nevoeiro que assaltava a paisagem nocturna.

O Instrutor, versado em expedições idênticas à nossa, recomendou-os não tocar os varões de metal que nos impediam a retirada, esclarecendo se achavam imantados por forças eléctricas de vigilância e acentuando que a nossa condição ainda era de simples prisioneiros.

Aproximamo-nos, porém, das janelas que nos comunicavam com o exterior e reparei que o espectáculo era digno de estudo.

Grande movimento na via pública, congregando vários grupos de criaturas, em conversação não longe de nós.
Os diálogos e entendimentos surpreendiam. Quase todos se referiam à esfera carnal.

Questões minuciosas e pequeninas da vida particular eram analisadas com inequívoco interesse;
contudo, as notas dominantes caíam no desequilíbrio sentimental e nas emoções primárias da experiência física.

Percebi diferentes expressões nos “halos vibratórios” que revestiam a personalidade dos conversadores, através das cores de variação típica.

Dirigi-me a Gúbio, buscando-lhe oportuno esclarecimento.
— Não mediste, ainda — respondeu, prestimoso —‘ a extensão do intercâmbio entre encarnados e desencarnados.

A determinadas horas da noite, três quartas partes da população de cada um dos hemisférios da Crosta Terrestre se acham nas zonas de contacto connosco e a maior percentagem desses semi-libertos do corpo, pela influência natural do sono, permanecem detidos nos círculos de baixa vibração qual este em que nos movimentamos provisoriamente.

Por aqui, muitas vezes se forjam dolorosos dramas que se desenrolam nos campos da carne.

Grandes crimes têm nestes sítios as respectivas nascentes e, não fosse o trabalho activo e constante dos Espíritos protectores que se desvelam pelos homens no labor sacrificial da caridade oculta e da educação perseverante, sob a égide do Cristo, acontecimentos mais trágicos estarreceriam as criaturas.

De alma voltada para as noções da vida imensa que o ambiente sugeria, rememorei o curso incessante das civilizações.

Pensamentos mais altos clarearam-me os raciocínios.
A Bondade do Senhor não violenta o coração.

O Reino Divino nascerá dentro dele e, à maneira da semente de mostarda que se liberta dos envoltórios inferiores, medrará e crescerá gradativamente, sob os impulsos construtivos do próprio homem.

Que temerária concepção a de um paraíso fácil!
Gúbio percebeu-me a posição mental e falou em socorro de minhas pobres reflexões íntimas:
— Sim, André, a coroa da sabedoria e do amor é conquistada por evolução, por esforço, por associação da criatura aos propósitos do Criador.

A marcha da Civilização é lenta e dolorosa.
Formidandos atritos se fazem indispensáveis para que o espírito consiga desenvolver a luz que lhe é própria.

O homem encarnado vive simultaneamente em três planos diversos.

Assim como ocorre à árvore que se radica no solo, guarda ele raízes transitórias na vida física;
estende os galhos dos sentimentos e desejos nos círculos de matéria mais leve, quanto o vegetal se alonga no ar;
e é sustentado pelos princípios subtis da mente, tanto quanto a árvore é garantida pela própria seiva.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Mar 12, 2012 11:06 pm

Na árvore, temos raiz, copa e seiva por três processos diferentes de manutenção para a mesma vida e. no homem, vemos corpo denso de carne, organização perispirítica em tipo de matéria mais rarefeita e mente, representando três expressões distintas de base vital, com vistas aos mesmos fins.

Segundo observamos, o homem exige para sustentar-se, no quadro evolucionário, segurança relativa no campo biológico, alimento das emoções que lhe são próprias nas esferas de vida psíquica que se afinam com ele e base mental no mundo íntimo.

A vida é património de todos, mas a direcção pertence a cada um.

A inteligência caída precipita-se, despenhadeiro abaixo, encontrando sempre, nos círculos inferiores que elege por moradia, milhões de vidas inferiores, junto às quais é aproveitada pela Sabedoria Celestial para maior glorificação da obra divina.

Na economia do Senhor, coisa alguma se perde e todos os recursos são utilizados na química do Infinito Bem.

Aqui mesmo, nesta cidade, tínhamos, a princípio, autêntico império de vidas primitivas que, pouco a pouco, se fez ocupado por extensas colectividades de almas vaidosas e cruéis.

Entrincheiraram-se nestes sítios, guardando o louco propósito de hostilizar a Bondade Excelsa, e exercem funções úteis junto a enorme agrupamento de criaturas, ainda sub-humanas, não obstante atenderem a serviço que para nós outros seria presentemente insuportável.

Usam a violência em largas doses, todavia, no curso dos anos, a influenciação intelectual delas trará grandes benefícios aos oprimidos de agora e estejamos convictos de que, apesar de blasonarem inteligência e poder, permanecerão nos postos que ocupam apenas enquanto perdurar o consentimento da Divina Direcção, atento ao princípio que determina tenha cada assembleia o governo que merece.

O Instrutor confiou-se a pausa mais longa e concentrei minha atenção numa dupla feminina que conversava, rente à grade.

Certa mulher já desencarnada dizia para a companheira, ainda presa à experiência física, parcialmente liberta nas asas do sono:
— Notamos que você, ultimamente, anda mais fraca, mais serviçal...
Estará desencantada, quanto aos compromissos assumidos?

A interpelada explicou um tanto confundida:
— Acontece que João se filiou a um círculo de preces, o que, de alguma sorte, nos vem alterando a vida.

A outra deu um salto à retaguarda, ao modo de um animal surpreendido e gritou:
— Orações? você está cega quanto ao perigo que isso significa?

Quem reza cai na mansidão.
É necessário espezinhá-lo, torturá-lo, feri-lo, a fim de que a revolta o mantenha em nosso círculo.
Se ganhar piedade, estragar-nos-á o plano, deixando de ser nosso instrumento na fábrica.

A interlocutora, no entanto, observou, ingénua:
— Ele se diz mais calmo, mais confiante...

— Marina — obtemperou a outra, intempestiva —, você sabe que não podemos fazer milagres e não é justo aceitar regras e intrujices de espíritos acovardados que, a pretexto de fé religiosa, se arvoram em ditadores de salvação.

Precisamos de seu marido e de muitas outras pessoas que a ele se agregam em serviço e em nosso nível, O projecto é enorme e interessante para nós.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:00 pm

Já esqueceu quanto sofremos?
Eu, de mim mesma, tenho duras lições por retribuir.
E batendo-lhe esquisitamente nos ombros, acentuava:
- Não admita encantamentos espirituais.

A realidade é nossa e cabe-nos aproveitar o ensejo, integralmente.
Volte para o corpo e não ceda um milímetro.
Corra com os apóstolos improvisados.

Fazem-nos mal.
Prenda João, controlando-lhe O tempo.
Desenvolva serviço eficiente e não o liberte.
Fira-o devagarinho.

O desespero dele chegará, por fim, e, com as forças da insubmissão que forem exteriorizadas em nosso favor, alcançaremos os fins a que nos propomos.

Nada de transigência.
Não se atemorize com promessas de inferno ou céu depois da morte.
Em toda parte a vida é aquilo que fazemos dela.

Boquiaberto com o que me era dado perceber, reparei que a entidade astuta e vingativa envolvia a interlocutora em fluidos sombrios, à maneira dos hipnotizadores comuns.

Enderecei olhar interrogativo ao nosso orientador que, após haver atenciosamente acompanhado a cena, informou, prestimoso:
—A obsessão desse teor apresenta milhões de casos.

De manhãzinha, na Esfera da Crosta, essa pobre mulher, vacilante na fé, incapaz de apreciar a felicidade que o Senhor lhe concedeu num casamento digno e tranquilo, despertará no corpo, de alma desconfiada e abatida. Oscilando entre o “crer” e o “não crer” não saberá polarizar a mente na confiança com que deve enfrentar as dificuldades do caminho e aguardar as manifestações santificantes do Alto e, em face da incerteza intima, em que se lhe caracterizam as atitudes, demorar-se-á imantada a essa irmã ignorante e infeliz, que a persegue e subjuga para conseguir deplorável vingança.

Converter-se-á, por isso, em objecto de acentuada aflição para o esposo e suas conquistas incipientes periclitarão.

— Como se libertaria de semelhante inimiga? — perguntou Elói, interessado.
— Mantendo-Se num padrão de firmeza superior, com suficiente disposição para o bem.

Com esse esforço, nobre e contínuo, melhoraria intensivamente os seus princípios mentais, afeiçoando-os ás fontes sublimes da vida e, ao invés de converter-se em material absorvente das irradiações enfermiças e depressivas, passaria a emitir raios transformadores e construtivos, em beneficio de si mesma e das entidades que se lhe aproximam do caminho.

Em todos os quadros do Universo, somos satélites uns dos outros, Os mais fortes arrastam os mais fracos, entendendo-se, porém, que o mais frágil de hoje pode ser a potência mais alta de amanhã, conforme nosso aproveitamento individual.

Expedimos raios magnéticos e recebemo-los ao mesmo tempo.

É imperioso reconhecer, todavia, que aqueles que se acham sob o controle de energias cegas, acomodando-se aos golpes e sugestões da força tirânica, emitidos pelas inteligências perversas que os assediam, demoram-se, longo tempo, na condição de aparelhos receptores da desordem psíquica.

Muito difícil reajustar alguém que não deseja reajustar-se.
A ignorância e a rebeldia são efectivamente a matriz de sufocantes males.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:00 pm

Ante o intervalo espontâneo, reparei, não longe de nós, como que ligadas às personalidades sob nosso exame, certas formas indecisas, obscuras.

Semelhavam-se a pequenas esferas ovóides, cada uma das quais pouco maior que um crânio humano.

Variavam profusamente nas particularidades.
Algumas denunciavam movimento próprio, ao jeito de grandes amebas, respirando naquele clima espiritual;
outras, contudo, pareciam em repouso, aparentemente inertes, ligadas ao halo vital das personalidades em movimento.

Fixei, demoradamente, o quadro, com a perquirição do laboratorista diante de formas desconhecidas.

Grande número de entidades, em desfile nas vizinhanças da grade, transportavam essas esferas vivas, como que imantadas às irradiações que lhes eram próprias.

Nunca havia observado, antes, tal fenómeno.
Em nossa colónia de residência, ainda mesmo em se tratando de criaturas perturbadas e sofredoras, o campo de emanações era sempre normal.

E quando em serviço, ao lado de almas em desequilíbrio, na Esfera da Crosta, nunca vira aquela irregularidade, pelo menos quanto me fora, até ali, permitido observar.

Inquieto, recorri ao Instrutor, rogando-lhe ajuda.
— André — respondeu ele, circunspecto, evidenciando a gravidade do assunto —, compreendo-te o espanto.

Vê-se, de pronto, que és novo em serviços de auxílio.
Já ouviste falar, de certo, numa “segunda morte”

— Sim — acentuei —, tenho acompanhado vários amigos à tarefa reencarnacionista, quando, atraídos por imperativos de evolução e redenção, tornam ao corpo de carne. De outras vezes, raras aliás, tive notícias de amigos que perderam o veículo perispiritual (1), conquistando planos mais altos.

A esses missionários, distinguidos por elevados títulos na vida superior, não me foi possível seguir de perto.

Gúbio sorriu e considerou:
— Sabes, assim, que o vaso perispirítico é também transformável e perecível, embora estruturado em tipo de matéria mais rarefeita.

— Sim... — acrescentei, reticencioso, em minha sede de saber.
— Viste companheiros — prosseguiu o orientador —, que se desfizeram dele, rumo a esferas sublimes, cuja grandeza por enquanto não nos é dado sondar, e observaste irmãos que se submeteram a operações redutivas e desintegradoras dos elementos perispiríticos para renascerem na carne terrestre.

Os primeiros são servidores enobrecidos e gloriosos, no dever bem cumprido, enquanto que os segundos são colegas nossos, que já merecem a reencarnação trabalhada por valores intercessores, mas, tanto quanto ocorre aos companheiros respeitáveis desses dois tipos, os ignorantes e os maus, os transviados e os criminosos também perdem, um dia, a forma perispiritual.

Pela densidade da mente, saturada de impulsos inferiores, não conseguem elevar-se e gravitam em derredor das paixões absorventes que por muitos anos elegeram em centro de interesses fundamentais.

Grande número, nessas circunstâncias, mormente os participantes de condenáveis delitos, imanam-se aos que se lhes associaram nos crimes.

Se o discípulo de Jesus se mantém ligado a Ele, através de imponderáveis fios de amor, inspiração e reconhecimento, os pupilos do ódio e da perversidade se demoram unidos, sob a orientação das inteligências que os entrelaçam na rede do mal.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:00 pm

Enriquecer a mente de conhecimentos novos, aperfeiçoar-lhe as faculdades de expressão, purificá-la nas correntes iluminativas do bem e engrandecê-la com a incorporação definitiva de princípios nobres é desenvolver nosso corpo glorioso, na expressão do apóstolo Paulo, estruturando-o em matéria sublimada e divina.

Essa matéria, André, é o tipo de veículo a que aspiramos, ao nos referirmos à vida que nos é superior.

Estamos ainda presos às aglutinações celulares dos elementos físio-perispiríticos, tanto quanto a tartaruga permanece algemada à carapaça.

Imergimo-nos dentro dos fluidos carnais e deles nos libertamos, em vicioso vaivém, através de existências numerosas, até que acordemos a vida mental para expressões santificadoras.

Somos quais arbustos do solo planetário.
Nossas raízes emocionais se mergulham mais ou menos profundamente nos círculos da animalidade primitiva.

Vem a foice da morte e cega-nos os ramos dos desejos terrenos;
todavia, nossos vínculos guardam extrema vitalidade nas camadas inferiores e renascemos entre aqueles mesmos que se converteram em nossos associados de longas eras, através de lutas vividas em comum, e aos quais nos agrilhoamos pela comunhão de interesses da linha evolutiva em que nos encontramos.

As elucidações eram belas e novas aos meus ouvidos, e, em razão disso, calei as interrogações que me vagueavam no íntimo, para atenciosamente registar as considerações do Instrutor, que prosseguiu:
— A vida física é puro estágio educativo, dentro da eternidade, e a ela ninguém é chamado a fim de candidatar-se a paraísos de favor e, sim, à moldagem viva do céu no santuário do Espírito, pelo máximo aproveitamento das oportunidades recebidas no aprimoramento de nossos valores mentais, com o desabrochar e evolver das sementes divinas que trazemos connosco.

O trabalho incessante para o bem, a elevação de motivos na experiência transitória, a disciplina dos impulsos pessoais, com amplo curso às manifestações mais nobres do sentimento, o esforço perseverante no infinito bem, constituem as vias de crescimento mental, com aquisição de luz para a vida imperecível.

Cada criatura nasce na Crosta da Terra para enriquecer-se através do serviço à colectividade.

Sacrificar-se é superar-se, conquistando a vida maior.
Por isto mesmo, o Cristo asseverou que o maior no Reino Celeste é aquele que se converter em servo de todos.

Um homem poderá ser temido e respeitado no Planeta pelos títulos que adquiriu à convenção humana, mas se não progrediu no domínio das ideias, melhorando-se e aperfeiçoando-se, guarda consigo mente estreita e enfermiça.

Em suma, ir à matéria física e dela regressar ao campo de trabalho em que nos achamos presentemente, é submetermo-nos a profundos choques biológicos, destinados à expansão dos elementos divinos que nos integrarão, um dia, a forma gloriosa.

E porque me visse na atitude do aprendiz que interroga em silêncio, Gúbio asseverou:
— Para fazer-me mais claro, voltemos ao símbolo da árvore, O vaso físico é o vegetal, limitado no espaço e no tempo, o corpo perispirítico é o fruto que consubstancia o resultado das variadas operações da árvore, depois de certo período de maturação, e a matéria mental é a semente que representa o substrato da árvore e do fruto, condensando-lhes as experiências.

A criatura para adquirir sabedoria e amor renasce inúmeras vezes, no campo fisiológico, à maneira da semente que regressa ao chão.

E quantos se complicam, deliberadamente, afastando-se do caminho recto na direcção de zonas irregulares em que recolhem experimentos doentios, atrasam, como é natural, a própria marcha, perdendo longo tempo para se afastarem do terreno resvaladiço a que se relegaram, ligados a grupos infelizes de companheiros que, em companhia deles, se extraviaram através de graves compromissos com a leviandade ou com o desequilíbrio.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:01 pm

Compreendeste, agora?
Apesar da gentileza do orientador, que fazia o possível por clarear o seu pensamento, ousei indagar:
— E se consultarmos esses esferóides vivos?
ouvir-nos-ão?
possuem capacidade de sintonia?

Gúbio atendeu, solícito:
— Perfeitamente, compreendendo-se, porém, que a maioria das criaturas, em semelhante posição nos sítios inferiores quanto este, dormitam em estranhos pesadelos.

Registam-nos os apelos, mas respondem-nos, de modo vago, dentro da nova forma em que se segregam, incapazes que são, provisoriamente, de se exteriorizarem de maneira completa, sem os veículos mais densos que perderam, com agravo de responsabilidade, na inércia ou na prática do mal.

Em verdade, agora se categorizam em conta de fetos ou amebas mentais, mobilizáveis, contudo, por entidades perversas ou rebeladas.

O caminho de semelhantes companheiros é a reencarnação na Crosta da Terra ou em sectores outros de vida congénere, qual ocorre à semente destinada à cova escura para trabalhos de produção, selecção e aprimoramento.

Claro que os Espíritos em evolução natural não assinalam fenómenos dolorosos em qualquer período de transição, como o que examinamos.

A ovelha que prossegue, firme, na senda justa, contará sempre com os benefícios decorrentes das directrizes do pastor;
no entanto, as que se desviam, fugindo à jornada razoável, pelo simples gosto de se entregarem à aventura, nem sempre encontrarão surpresas agradáveis ou construtivas.

O orientador silenciou por momentos e perguntou, em seguida:
— Entendeste a importância de uma existência terrestre?

Sim, entendia, por experiência própria, o valor da vida corporal na Crosta Planetária;
contudo, ali, diante dos esferóides vivos, tristes mentes humanas sem apetrechos de manifestação, meu respeito ao veículo de carne cresceu de modo espantoso.

Alcancei, então, com mais propriedade, o sublime conteúdo das palavras do Cristo: “andai, enquanto tendes luz”.

O assunto era fascinante e tentei Gúbio a examiná-lo, mais detidamente;
todavia, o orientador, sem trair a cortesia que lhe é característica, recomendou-me esperasse o dia seguinte.

(1) O perispírito, mais tarde, será objecto de mais amplos estudos das escolas espiritistas cristãs. — Nota do Autor espiritual.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:01 pm

7 - Quadro doloroso

De manhã, um emissário do sacerdote Gregório, com semblante mal-humorado, veio notificar-nos, em nome dele, que dispúnhamos de liberdade até as primeiras horas da tarde, quando nos receberia para entendimento particular.

Ausentamo-nos do cubículo, sinceramente desafogados.
A noite fora simplesmente aflitiva, pelo menos para mim que não conseguira qualquer quietação no repouso.

Não somente o ruído exterior se fizera contínuo e desagradável, mas também a atmosfera pesava, asfixiante.

As alucinadoras conversações no ambiente me perturbavam e feriam.
Convidou-nos Gúbio a pequena excursão educativa, asseverando-me, bondoso:
— Vejamos, André, se poderemos aproveitar alguns minutos, estudando os “ovóides”.

Elói e eu acompanhamo-lo, satisfeitos.
Coalhava-se a rua de tipos característicos da anormalidade deprimente.

Aleijados de todos os matizes, idiotas de máscaras variadas, homens e mulheres de fisionomia torturada, iam e vinham.

Ofereciam a perfeita impressão de alienados mentais.
Excepção de alguns que nos fixavam de olhar suspeitoso e cruel, com manifesta expressão de maldade, a maior parte, a meu ver, situava-se entre a ignorância e o primitivismo, entre a amnésia e o desespero.

Muitos demonstravam-se irritadiços ante a calma de que lhes dávamos testemunho.

Perante os desmantelos e detritos a transparecerem de toda parte, conclui que o esforço colectivo se mantinha ausente de qualquer serviço metódico, junto à matéria do plano.

A conversação ociosa era, ali, o traço dominante.
O Instrutor informou-nos, então, com muito acerto, de que as mentes extraviadas, de modo geral, lutam com ideias fixas, implacáveis e obcecantes, gastando longo tempo a fim de se reajustarem.

Rebaixadas pelas próprias acções, perdem a noção do bom-gosto, do conforto construtivo, da beleza santificante e se entregam a lastimável relaxamento.
Com efeito, a paisagem, sob o ponto de vista de ordem, deixava muito a desejar.

As edificações, exceptuados os palácios da praça governativa, onde se notava a movimentação de grande massa de escravos, desapontavam pelo aspecto e condições em que se mantinham.

As paredes, revestidas de substância semelhante ao lodo, mostravam-se repelentes não só à visão, mas também ao olfacto, pelas exalações desagradáveis.

A vegetação, em todos os ângulos, era escassa e mirrada.
Gritos humanos, filhos da dor e da inconsciência, eram frequentes, provocando-nos sincera piedade.

Fossem poucos os transeuntes infelizes e poder-se-ia pensar num serviço metódico de assistência individual;
mas, que dizer de uma cidade constituída por milhares de loucos declarados?

Dentro de colmeia dessa natureza, o homem sadio que tentasse impor socorro ao espírito geral não seria efectivamente o alienado mental, aos olhos alheios?

Impraticável, por isso, qualquer organização beneficente visível, a não ser através de serviço arriscado qual aquele de que o nosso Instrutor se incumbira, tocado pela renúncia, na obra de santificação com o Cristo.

Além das perturbações reinantes, capazes de estabelecer a guerra de nervos nas criaturas mais equilibradas da Crosta do Mundo, pairava na atmosfera sufocante nevoeiro que mal nos deixava entrever o horizonte distanciado.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:01 pm

O Sol, através de espessa cortina de fumo, cuja procedência me não foi possível determinar, era visto por nós, à semelhança de uma bola de sangue afogueado.

Elói, forçando o bom humor, perguntou, a propósito, se o inferno era um hospício de proporções assim tão vastas, ao que o nosso orientador respondeu aquiescendo e informando que o homem comum não possui senão vaga ideia da importância das criações mentais na própria vida.

A mente estuda, arquitecta, determina e materializa os desejos que lhe são peculiares na matéria que a circunda, esclareceu Gúbio, atencioso, e essa matéria que lhe plasma os impulsos é sempre formada por vidas inferiores inumeráveis, em processo evolutivo, nos quadros do Universo sem fim.

Marcháramos, atravessando compridos labirintos e achamo-nos diante de extensa edificação que, com boa vontade, nomearemos por asilo de Espíritos desamparados.

Enquanto encarnado, ser-me-ia extremamente difícil acreditar numa cena igual à que se nos desdobrou à visão inquieta.

Nenhum sofrimento, depois da morte do corpo, me tocara tão fundo o coração.
A gritaria, em torno, era de espantar.
Varamos lodosa muralha e, depois de avançarmos alguns passos, o pavoroso quadro se abriu dilatadamente.

Largo e profundo vale se estendia, habitado por toda a espécie de padecimentos imagináveis.
Sentíamo-nos, agora, na extremidade de um planalto que se quebrava em abrupto despenhadeiro.

A frente, numa distância de dezenas de quilómetros, sucediam-se furnas e abismos, qual se nos situássemos perante imensa cratera de vulcão vivo, alimentado pela dor humana, porque, lá dentro, turbilhões de vozes explodiam, ininterruptos, parecendo estranha mistura de lamentos de homens e animais.

Tremeram-me as fibras mais íntimas, e, não só em mim, mas igualmente no espírito de Elói, o movimento era de recuo instintivo.

O orientador, no entanto, estava firme.
Longe de endossar-nos a fraqueza, ignorou-a, deliberadamente, e asseverou, calmo:
— Amontoam-se aqui, como se fossem lenhos secos, milhares de criaturas que abusaram de sagrados dons da vida.

São réus da própria consciência, personalidades que alcançaram a sobrevivência sobre as ruínas do próprio “eu”, confinados em escuro sector de alienação mental.

Esgotam resíduos envenenados que acumularam na esfera íntima, através de longos anos vazios de trabalho edificante, no mundo físico, entregando-se, presentemente, a infindáveis dias de tortura redentora.

E, talvez porque nosso espanto crescesse à vista da tela aflitiva e tenebrosa, acrescentou, sereno:
— Não estamos contemplando senão a superfície de trevosos cárceres a se confundirem com os precipícios subcrostais.

— Mas não haverá recurso a tanto desamparo? — indagou Elói, compungidamente.

Gúbio reflectiu alguns momentos rápidos e aduziu em tom grave:
— Quando encontramos um morto de cada vez, é fácil conceder-lhe sepultura condigna, mas, se os cadáveres são contados por multidões, nada nos resta senão adoptar a vala comum.

Todos os Espíritos renascem nos círculos carnais para destruírem os ídolos da mentira e da sombra e entronizarem, dentro de si mesmos, os princípios da sublimação vitoriosa para a eternidade, quando não se encontram em simples estrada evolutiva;
contudo, nas demonstrações de ordem superior que lhes cabem, preferem, na maioria das ocasiões, adorar a morte na ociosidade, na ignorância agressiva ou no crime disfarçado, olvidando a gloriosa imortalidade que lhes compete atingir.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:02 pm

Ao invés de estruturarem destino santificante, com vistas ao porvir Infinito, menosprezam oportunidades de crescimento, fogem ao aprendizado salutar e contraem débitos clamorosos, retardando a obra de elevação própria.

E se eles mesmos, senhores de preciosos dons de inteligência, com todo o acervo de revelações religiosas de que dispõem para solucionar os problemas da alma, se confiam voluntariamente a semelhante atraso, que nos resta fazer senão seguir nas linhas de paciência por onde se regula a influenciação dos nossos benfeitores?

Sem dúvida, esta paisagem é inquietante e angustiosa, mas compreensível e necessária.

Perguntei-lhe se naqueles sítios purgatoriais não havia companheiros amigos, detentores da missão de consolar, ao que o nosso Instrutor respondeu afirmativamente.

— Sim — disse —, esta imensa colectividade dentro da qual preponderam individualidades que pelo sofrimento contínuo se caracterizam pelo comportamento sub-humano, não está esquecida.

A renúncia opera com Jesus, em toda parte.
Agora, todavia, não dispomos de ensejos para a identificação de missionários e servidores do bem.

Vamos ao estudo que nos interessa de mais perto.
Descemos alguns metros e encontramos esquálida mulher estendida no solo.
Gúbio nela fixou os olhos muito lúcidos e, depois de alguns momentos, recomendou-nos seguir-lhe a observação acurada.

— Vês, realmente, André? — inquiriu, paternal.

Percebi que a infeliz se cercava de três formas ovóides, diferençadas entre si nas disposições e nas cores, que me seriam, porém, imperceptíveis aos olhos, caso não desenvolvesse, ali, todo o meu potencial de atenção.

— Reparo, sim — expliquei, curioso —, a existência de três figuras vivas, que se lhe justapõem ao perispírito, apesar de se expressarem por intermédio de matéria que me parece leve gelatina, fluida e amorfa.

Elucidou Gúbio, sem detença:
— São entidades infortunadas, entregues aos propósitos de vingança e que perderam grandes patrimónios de tempo, em virtude da revolta que lhes atormenta o ser. Gastaram o perispírito, sob inenarráveis tormentas de desesperação, e imanam-se, naturalmente, à mulher que odeiam, irmã esta que, por sua vez, ainda não descobriu que a ciência de amar é a ciência de libertar, iluminar e redimir.

Auscultamos, de mais perto, a desventurada criatura.
Assumiu Gúbio a atitude do médico ante a paciente e os aprendizes.

A mulher sofredora, envolvida num halo de “força cinzento-escura”, registou-nos a presença e gritou, entre a aflição e a idiotia:
— Joaquim! onde está Joaquim? digam-me, por piedade!
Para onde o levaram? ajudem-me! ajudem-me!

O nosso orientador tranquilizou-a com algumas palavras e, não lhe conferindo maior atenção, além daquela que o psiquiatra dispensa ao enfermo em crise grave, observou-nos:
— Examinem os ovóides! sondem-nos, magneticamente, com as mãos.

Operei, expedito.
Toquei o primeiro e notei que reagia, positivamente.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:02 pm

Liguei, num acto de vontade, minha capacidade de ouvir ao campo íntimo da forma e, assombrado, ouvi gemidos e frases, como que longínquos, pelo fio do pensamento:
— Vingança! vingança! Não descansarei até ao fim...
Esta mulher infame me pagará...

Repeti a experiência com os dois outros e os resultados foram idênticos.
As exclamações “assassina! assassina!...” transbordavam de cada um.

Após afagar a doente com fraternal carinho, analisando-a, atencioso, o Instrutor dirigiu-nos a palavra, esclarecendo:
— Joaquim será naturalmente o companheiro que a precedeu nas lides da reencarnação.

Certo, já regressou à Terra mais densa, a fim de preparar-lhe lugar.
A pobrezinha está esperando ensejo de retorno à luta benéfica.

Vejo-lhe o drama cruel.
Foi tirânica senhora de escravos no século que findou.
Percebo-lhe as recordações da fazenda próspera e feliz, nos arquivos mentais.

Foi jovem e bela, mas desposou, consoante o programa de provas salvadoras, um cavalheiro de idade madura, que, a seu turno, já assumira compromissos sentimentais com humilde filha do cativeiro.

Embora a mudança natural de vida, à face do casamento, não abandonou ele o débito contraído.

Em razão disso, a pobre mãe e escrava, ainda moça, penitente e desditosa, prosseguiu agregada à propriedade rural com os rebentos de seu amor menos feliz.

Com a passagem do tempo, a esposa requestada e fascinante conheceu toda a extensão do assunto e revelou a irascibilidade que lhe povoava a alma.

Dirigiu-se ao marido, colérica e violenta, dobrando-o aos caprichos que lhe exacerbavam a mente.

A escrava sofredora foi separada de ambos os filhos que possuía e vendida para uma região palustre onde em breve encontrou a morte pela febre maligna.

Os dois rapazes, metidos no tronco, padeceram vexames e flagelações em frente da senzala.

Acusados de ladrões, pelo capataz, a instâncias da senhora dominada de egoísmo terrificante, passaram a exibir pesada corrente no pescoço ferido.

Viveram, no passado. sob humilhações incessantes.
No curso de reduzidos meses, caíram sem remissão, minados pela tuberculose que ninguém socorreu.

Desencarnados, reuniram-se à progenitora revoltada, formando um trio perturbador na organização ruralista que os expulsara, sustentando sinistros propósitos de desforço.

Não obstante convidados à tolerância e ao perdão por amigos espirituais que os visitavam frequentemente, nunca cederam um til nos planos sombrios em que penhoraram o coração.

Atacaram, desapiedados, a mulher que os tratara com dureza, impondo-lhe destrutivo remorso ao espírito vacilante e fraco.

Dominando-lhe a vida psíquica, transformaram-se para ela em perigosos carrascos invisíveis, utilizando todos os processos de Luta susceptíveis de acentuar-lhe as perturbações.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Mar 13, 2012 10:02 pm

Adoeceu ela, por isso, gravemente, desafiando conselhos e medidas de cura.
Embora socorrida por médicos e padres diversos, não mais recobrou o equilíbrio orgânico.

Arrasou-se-lhe o corpo físico, a pouco e pouco, incapaz de expandir-se mentalmente, no idealismo superior, que corrige desvarios íntimos e faculta a cooperação vibratória das almas que respiram em esferas mais elevadas, a desditosa fazendeira sofreu, insulada no orgulho destrutivo que lhe assinalava o caminho, dez anos de mágoas constantes e indefiníveis.

Claro que possuía, por sua vez, amigos prontos a lhe estenderem generosas mãos por ocasião da morte do corpo que se tornou inevitável;
contudo, quando nos enceguecemos no mal, inabilitamo-nos, por nós mesmos, à recepção de qualquer recurso do bem.

O Instrutor fez ligeira pausa na narrativa e continuou:
— Exonerada dos liames carnais, viu-se perseguida pelas vítimas de outro tempo, anulando-se-lhe a capacidade de iniciativa em virtude das emissões vibratórias do próprio medo perturbador.

Padeceu muitíssimo, não obstante contemplada pela compaixão de benfeitores do Alto que sempre tentaram conduzi-la à humildade e à renovação pelo amor, mas o ódio permutado é uma fornalha ardente, mantenedora de cegueira e sublevação.

Desencarnado o esposo, veio semi-louco encontrá-la no mesmo invencível abatimento, incapaz de socorrê-la em vista das próprias dores que o constrangiam a difíceis rectificações.

Os impiedosos adversários prosseguiram na obra deplorável e, ainda mesmo depois de perderem a organização perispirítica, aderiram a ela, com os princípios de matéria mental em que se revestem.

A revolta e o pavor do desconhecido, com absoluta ausência de perdão, ligam-nos uns aos outros, quais algemas de bronze.

A infeliz perseguida, na posição em que se encontra, não os vê, não os apalpa, mas sente-lhes a presença e ouve-lhes as vozes, através da inconfundível acústica da consciência.

Vive atormentada, sem direcção.
Tem o comportamento de um ser quase irresponsável.
A infortunada criatura não parecia registar as informações, ditas ali em voz alta, e que lhe diziam respeito.

Clamava amedrontada, pelo auxílio do companheiro.
Vali-me ainda do ensejo para algumas indagações.
— Diante deste quadro comovedor, como encarar a solução? — desfechei a pergunta directa.

Gúbio, todavia, observou, muito calmo:
— Gastaremos tempo.
A perturbação vem de inesperado, instala-se à pressa;
entretanto, retira-se muito devagar.
Aguardemos a obra paciente dos dias.

Após uma pausa expressiva, acentuou:
— Tudo me faz crer que os missionários da caridade já lhe reconduziram o esposo às correntes da reencarnação e é de supor que esta irmã se ache em vias de seguir-lhe as pegadas, a breve tempo.

Naturalmente, renascerá em círculos de vida torturada, enfrentando obstáculos imensos para reencontrar o ex-esposo e partilhar-lhe as experiências futuras.
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