LUZ ESPÍRITA
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Série André Luiz - LIBERTAÇÃO

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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Mar 21, 2012 10:31 pm

19 - Precioso entendimento

Certo, acreditando haver transmitido a nós outros os ensinamentos que podíamos receber, a nobre mensageira recomendou a Elói trouxesse Margarida àquele plenário amoroso, deixando perceber que pretendia consolidar-lhe o equilíbrio e fortalecer-lhe a resistência.

Transcorridos alguns minutos, a esposa de Gabriel, que se convertera em objecto de nossas melhores atenções naqueles dias, desligada do envoltório denso, compareceu no cenáculo.

Mostrava passo vacilante e estranho alheamento no olhar, revelando a semi-inconsciência em que se demorava.

Ao que me pareceu, a luz reinante não lhe afectou o olhar.
Caracterizava-se, naquela hora, pelos movimentos impulsivos, caminhando, em nosso meio, qual se fora sonâmbula vulgar.

Maquinalmente se asilou nos braços maternos que Matilde lhe oferecia e, tão depressa se acolheu no regaço da benfeitora que a envolvia em doce ternura, reagiu, favoravelmente, contemplando-nos, então, assustadiça.

Parecia acordar, pouco a pouco...
A protectora, interessada em despertar-lhe alguns centros importantes da vida mental começou a aplicar-lhe passes ao longo do cérebro, operações que não pude compreender tão bem quanto desejava.

Reparei, contudo, que Matilde lhe aplicava recursos magnéticos sobre os condutores nervosos do órgão de manifestação do pensamento, tanto quanto ao longo de toda a região do simpático, esclarecendo-me o Instrutor, mais tarde, que o estado natural da alma encarnada pode ser comparado, em maior ou menor grau, à hipnose profunda ou à anestesia temporária, a que desce a mente da criatura através de vibrações mais lentas, peculiares aos planos inferiores, para fins de evolução, aprimoramento e redenção, no espaço e no tempo.

Fenómenos de metabolismo, na organização perispirítica, fizeram-se patentes à nossa observação, porque Margarida expelia, através do tórax e das mãos, fluidos cinzento-escuros, em forma de vapor tenuíssimo, a desfazer-se no vasto oceano de oxigénio comum.

Logo após semelhante “operação de limpeza”, as zonas do sistema endocrínico emitiam radiações diamantinas, figurando-se uma constelação de caprichosos contornos a brilhar nas sombras do perispírito, até ali opaco e vulgar.

Do peito de Matilde ondas luminosas partiam ininterruptas e tudo nos fazia crer que a tutelada de Gúbio se achava, naquela hora, num banho autêntico de essências divinas.

A certa altura do singular processo de despertamento, a jovem senhora abriu desmedidamente os olhos, qual criança espantada, e fixou-nos com expressão de assombro, ensaiando movimentos de recuo e pavor.

Mas, em se voltando para o semblante doce e iluminado da benfeitora, aquietou-se, brandamente, como que magnetizada por indefinível amor.

Matilde osculou-a, enternecida, e, ao contacto daqueles lábios sublimes, Margarida, mostrando-se tocada nos recessos do ser, abraçou-lhe o busto, evidenciando ânsia suprema de integração espiritual.

Parecendo desvairada de repentino júbilo, bradou, em lágrimas comoventes:
— Mãe! Querida mãezinha!

— Sim, minha filha, sou eu — disse a interlocutora, afagando-a com extremado afecto —; o amor jamais desaparece!
A união das almas vence o tempo e a morte.

— Porque me abandonaste? — inquiriu a esposa de Gabriel, colando-se-lhe ao coração, num transporte de inexprimível ventura.
— Nunca te esqueci — elucidou a benfeitora, acolhendo-a com mais intensa ternura.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Mar 21, 2012 10:32 pm

O país da “neblina carnal” muitas vezes parece distanciar-nos uns dos outros;
entretanto, sombra alguma conseguirá separar-nos.

Nossas aspirações e esperanças se confundem, quais pontos de luz, nas trevas da separação, assim como as estrelas se assemelham a balizas brilhantes no nevoeiro nocturno, recordando-nos o infinito e a eternidade.

Ao som caricioso daquelas palavras, a ex-obsidiada parecia acordar cada vez mais largamente em nosso plano.

De olhos ansiosos, fixos na protectora, como que magnetizada por incomensurável afecto, ponderou, entre lágrimas:
— Mãezinha querida, estou cansada e infeliz!
— Quando a boa luta apenas começa? — perguntou Matilde, sorrindo.

— Sinto-me cercada de inimigos sem entranhas.
Devo ser atormentada dia e noite.
Noto invencível antagonismo entre meus sentimentos e a realidade humana.

O próprio matrimónio, em que eu depositava os mais caros sonhos, não me foi senão escuro livro de desenganos cruéis.

Trago meu coração extenuado e oprimido.
Frustração e ruína espiritual seguem-me de perto...
Por isto, sou um fardo pesado ao esposo dedicado e digno de melhor sorte...

Soluços violentos impediram-na de continuar.
A veneranda emissária enxugou-me o pranto e falou, bondosa:
— Margarida, viver no corpo terrestre, entendendo os deveres divinos que nos cabem, não é tão fácil, ante a glória infinita que em companhia dele podemos recolher.

Todos possuímos culposo pretérito a redimir.
É imperioso reconhecer, todavia, que, se a experiência humana pode ser doloroso curso de renunciação pessoal, é também abençoada escola em que o Espírito de boa vontade pode alcançar culminâncias.

Para isto, no entanto, é indispensável se abra o coração ao clima interior da bondade e do entendimento.

Somos diamantes brutos, revestidos pelo duro cascalho de nossas milenárias imperfeições, localizados pela magnanimidade do Senhor na ourivesaria da Terra.

A dor, o obstáculo e o conflito são bem-aventuradas ferramentas de melhoria, funcionando em nosso favor.
Que dizer da pedra preciosa que fugisse às mãos do lapidário, do barro que repelisse a influência do oleiro?

Modifica as mais íntimas disposições, com referência aos adversários.
O inimigo nem sempre é uma consciência agindo deliberadamente no mal.

Na maioria das vezes, atende à incompreensão quanto qualquer de nós;
procede em determinada linha de pensamento, porque se acredita em roteiro infalível aos próprios olhos, nos lances do trabalho a que se empenhou nos círculos da vida;
enfrenta, qual ocorre a nós mesmos, problemas de visão que só o tempo, aliado ao esforço pessoal na execução do bem, conseguirá decidir.

O batráquio e a ave caracterizam-se por impulsos diferentes, não obstante filhos do mesmo mundo.
É necessário, Margarida, sabermos utilizar o inimigo, nele situando nossa lição benfeitora.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Mar 21, 2012 10:32 pm

A rigor, em vista da nossa posição de inferioridade, seremos adversários naturais da obra dos Anjos, na esfera menos elevada que atravessamos presentemente;
todavia, as Potências Angélicas não nos punem a incapacidade temporária de compreensão ante os serviços divinos que lhes cabem na economia do Universo.

Ao invés de condenar-nos, identificam-nos as deficiências compadecidamente e estendem-nos braços fraternos, através de mil recursos invisíveis e indirectos, a fim de que aprendamos a escalar o monte da sublimação, em marcha para os cumes celestes.

Verificando-se pequena pausa nas observações maternais, a jovem senhora obtemperou, enlevada:
— Amada Mãezinha!
Pudessem meus ouvidos guardar sempre a doce música de tuas palavras!

Tristemente, antevejo o torvelinho das dificuldades terrenas a que devo retornar.
Tudo agora é consolação e esperança;
todavia, amanhã serei novamente prisioneira no cárcere físico e caminharei de memória anestesiada, em conflito incessante com os monstros que me assediam!

— Este, filha — acrescentou Matilde, afectuosa —, é o imperativo da tarefa que te compete realizar.
Entretanto, não percas os tesouros do tempo em considerações inúteis.
Enche as tuas horas de trabalho salutar com a possível harmonia, fonte de toda a beleza.

A inteligência que, de algum modo, já se evadiu das limitações da animalidade, encontra-se no corpo de carne, à maneira do lidador num estádio de provas benfeitoras.

Lá dentro, na arena das possibilidades sublimes que a região do nevoeiro oferece, há quem se encaminhe para cima e há quem se dirija para baixo.

Não fujas ao óbice valioso na corrida de aperfeiçoamento, nem sorvas o mentiroso elixir da ilusão, apaixonadamente usado por todos os que se deixaram vencer pelas tentações do desânimo, incapazes de aceitar o desafio que o mundo lhes endereça.

A vida, para toda alma que triunfa no carreiro áspero, é serviço, movimento, ascensão.
E à rajada de luta que te conduzirá ao píncaro luminoso, não te suponhas sozinha na jornada áspera.

Outras, aos milhares, suam e sangram, em silêncio.
Passam na cena do mundo, sem o afecto de um esposo e sem a bênção de um lar.

Não conhecem, como tu, a dádiva de um corpo normal, nem podem guardar os mínimos sonhos que arregimentas no coração feminil.

São homens esquecidos e mulheres desamparadas que passam despercebidos e humilhados, do berço ao túmulo.

Respiram em regime de tortura moral e seguem, estrada afora, desprotegidos e dilacerados, aos olhos do mundo, abafando os próprios soluços que, se ouvidos, lhes acarretariam implacável punição.

Entretanto, apesar do espesso véu de lágrimas que lhes dificulta a marcha, continuam caminhando impávidos, contando com um amanhã, cada vez mais impreciso e distante, que parece ocultar-se, indefinido, nos horizontes sem fim.

Margarida, que assinalava enternecidamente a argumentação, rogou, súplice:
— Mãezinha querida, ensina-me a continuar.
Desejo honrar a bendita oportunidade que recebi!

— Não procures ser atendida em todos os teus desejos — falou a benfeitora, suavemente —, mas procura servir, fraternalmente, a quantos te reclamem arrimo e braço forte.
Ajuda, antes de procurares auxílio.
Compreende, sem exigir compreensão imediata.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Mar 21, 2012 10:33 pm

Desculpa os outros, sem desculpar a ti mesma.
Ampara, sem a intenção de ser amparada.
Dá, sem o propósito de receber.

Não persigas o respeito humano que te faça aparecer melhor que és, mas busca, em todo tempo e lugar, a bênção divina na aprovação da própria consciência.

Não procures destacada posição, diante dos outros;
antes de tudo, aperfeiçoa os teus sentimentos, cada vez mais, sem propaganda de tuas virtudes vacilantes e problemáticas.

Age correctamente e esquece as frases vazias ou venenosas da maledicência contumaz.

Em te socorrendo das directrizes alheias, desconfia das palavras que te lisonjeiem a fantasiosa superioridade pessoal ou que te inclinem à dureza de coração.

Diante da fartura ou da escassez, recorda o serviço que o Senhor te convocou a realizar e produz o bem em seu nome, onde estiveres.

Lembra-te de que a experiência na carne é demasiadamente breve e que a tua cabeça deve permanecer tão cheia de ideais santificantes, quanto as mãos repletas de trabalho salutar.

Para que atendas, porém, a semelhante programa, é imprescindível abras o coração ao sol renovador do Sumo Bem.
De alma cerrada ao interesse pela felicidade do próximo, jamais encontrarás a própria felicidade.

A alegria que improvisares, em torno dos pés alheios, te fará mais rica de júbilo.
Na paz que semeares, encontrarás a colheita da paz que desejas.

Estes, são princípios da vida radiante.
No insulamento, ninguém recolherá a suprema alegria.
Para a sabedoria divina, tão infortunado é o pastor que perdeu o rebanho, quanto a ovelha que perdeu o pastor.

A desistência de ajudar é tão escura quanto o relaxamento de extraviar-se.
O egoísmo conseguirá criar um oásis, mas nunca edificará um continente.
É indispensável, Margarida, aprenderes a sair de ti mesma, auscultando a necessidade e a dor daqueles que te cercam.

Nesse ínterim, calou-se a voz da protectora e, sentindo-se banhada na infinita luz daqueles momentos inesquecíveis, a esposa de Gabriel indagou, embriagada de ventura:
— Ó Deus! Pai Misericordioso, a que devo atribuir a graça inolvidável desta hora?

Matilde, pretendendo talvez imprimir ampla familiaridade à cena a que assistíamos, levantou-se, abraçada à filha espiritual, e, caminhando ao nosso encontro, apresentou-nos a ela, por particulares amigos.

Confraternizadora palestra estabeleceu-se, extinguindo-se a onda de lágrimas que nos visitava, indistintamente, ante a conversação comovedora e inesquecível.

Chegou, entretanto, o momento em que a benfeitora se revelou interessada em despedir-se.

Antes, porém, cravou o olhar muito lúcido na ex-obsidiada e falou-lhe, resoluta:
— Margarida, agora que reténs, tanto quanto possível, regular consciência de ti mesma em nossa esfera de acção, ouve o apelo que te endereçamos.

Não suponhas que te visito pelo simples prazer de consolar-te, o que seria talvez induzir-te ao caminho da despreocupação irresponsável que nunca nos dirige à verdadeira paz. A finalidade divina há de ser, em tudo, a alma de nossa acção.

O lavrador que amanha o solo e o socorre com irrigação confortadora, algo espera da sementeira que lhe reclama o esforço diário.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Mar 21, 2012 10:33 pm

O amparo do Alto, directo ou indirecto, reservado ou ostensivo, não é apenas mera exibição de poder celestial.

Os moradores dos círculos mais elevados não se arriscariam a descer, sem objectivos de ordem superior, ao domicílio da mente encarnada, assim como os artistas da inteligência não se animariam a movimentar espectáculos de cultura intelectual, sem fins educativos, junto aos irmãos de raciocínios e sentimentos ainda rudimentares ou inferiores.

O tempo é valioso, minha filha, e não podemos menoscabá-lo, sem grave prejuízo para nós mesmos.

Ante a expressão de surpresa que a tutelada de Gúbio estampava no semblante inquieto, Matilde continuou:
— Em breves anos, voltarei também ao círculo de lutas em que te debates.

— Tu? — gritou Margarida, apalermada, ante a perspectiva de renascimento carnal para o ser iluminado que se mantinha à nossa vista — porque te seria imposta semelhante pena?

— Não te guardes em tamanha incompreensão da lei do trabalho — ajuntou a mensageira, sorrindo —; a reencarnação nem sempre é simples processo regenerativo, embora, na maioria das vezes, constitua recurso correctivo de Espíritos renitentes na desordem e no crime.

A Crosta da Terra é comparável a imenso mar onde a alma operosa encontra valores eternos aceitando os imperativos de serviço que a Bondade Divina nos oferece.

Além disso, todos temos doces laços do coração, que se demoram, por muitos séculos, retidos ao fundo do abismo.
É indispensável buscar as pérolas perdidas para que o paraíso não permaneça vazio de beleza ao nosso olhar.
Depois de Deus, o amor é a força gloriosa que alimenta a vida e move os mundos.

A benfeitora fitou a jovem senhora, enlevada, fez pequena pausa e aduziu:
— Em razão disto, espero não desconheças a santidade do ministério maternal, na orientação dos Espíritos renascentes.

Nossas melhores possibilidades se perdem na “esfera do recomeço”, por falta de braços decididos e conscientes que nos guiem através dos labirintos do mundo.

Carinho, quase sempre, não falta no santuário familiar, onde a alma se habilita à recapitulação de valiosa aventura;
entretanto, a ternura absoluta é tão nociva quanto a absoluta aspereza.

Não ignoras, filha amada, que a entidade mais enobrecida, em retomando o veículo de carne, é compelida a sofrer-lhe os regulamentos.

As leis fisiológicas, que dominam na Crosta, não fazem excepção.
Impõem-se sobre os justos com o mesmo rigor dentro do qual funcionam para os pecadores.

O anjo que desça ao fundo da mina de carvão continuará naturalmente a ser um anjo na vida íntima;
entretanto, não escapará ao clima deprimente do subsolo.

O esquecimento temporário me acompanhará, nos abafadores das células físicas, mas o êxito desejável somente me felicitará se eu puder contar com a tua orientação robusta e vigilante.

Bem sei que, depois, regressando por tua vez ao envoltório que te liga ao círculo comum da luta terrestre, olvidarás, igualmente, a nossa conversação desta hora. No entanto, a saúde e a harmonia que te inundarão a estrada doravante, aliadas ao optimismo e à esperança, que persistirão em teu espírito por recordações indeléveis e vagas destes instantes divinos, não te deixarão esquecer de todo.

Defende o teu corpo, como quem preserva um recipiente sagrado para o serviço do Senhor e espera-me em tempo breve.
Viveremos mais juntas, na peregrinação meritória.

Nos abençoados elos do sangue seremos mãe e filha, de maneira a aprendermos, mais intensamente, a ciência da fraternidade universal.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Mar 21, 2012 10:34 pm

Realmente, Margarida, o meu retorno ser-te-á sacrifício doloroso ao corpo frágil e delicado;
todavia, ajuda-me na sementeira renovada para que eu te seja útil na colheita infalível.

Não me recebas, nos braços, por boneca mimosa e impassível.
Adornos externos nunca trazem felicidade legítima ao coração, e, sim, o carácter edificado e cristalino, base segura de que se expande a boa consciência.

A estufa pode alimentar as flores mais lindas da Terra, mas não produz os melhores frutos.
A árvore benfeitora não prescindirá do carinho e da assistência constante do pomicultor.

É imperioso reconhecer, porém, que somente se fortalecerá sob a temperatura atormentadora da canícula, debaixo de aguaceiros salutares ou aos golpes da ventania forte.

A luta e o atrito são bênçãos sublimes, através das quais realizamos a superação de nossos velhos obstáculos.

É necessário não menosprezá-los, identificando neles o ensejo bendito de elevação.
Compreende-me as necessidades para que eu te possa entender no momento justo.
As conveniências humanas são respeitáveis, mas as conveniências espirituais são divinas.

Auxilia-me a conquistar equilíbrio nas primeiras, a fim de atender aos imperativos celestiais do espírito eterno.

Logo que me sintas nos braços, não me relegues à garridice e à inutilidade, a pretexto de guardar-me em maternal protecção.

Não é com enfeites exteriores que ajudaremos o vegetal precioso a crescer e frutificar, mas, sim, com o esforço perseverante da enxada, com a vigilância na defesa, com o adubo estimulante e com a poda benfeitora.

Não me percas de vista, para que o amor e a gratidão a Deus perdurem para sempre em minha memória frágil.
Socorre-me em tempo para que eu seja útil, no momento oportuno.

Edificados com a lição indirecta que se nos administrava, reparamos que Margarida, em copioso pranto, prometia tudo quanto lhe era solicitado.

A doce palestra interessava-nos a todos e, por nossa vontade, seria indefinidamente alongada no tempo;
porém, Matilde agora revelava no olhar a preocupação de ausentar-se.

Dirigiu, ainda, brandas frases de reconforto à filha querida, envolveu-a em operações magnéticas, reajustando-lhe os centros perispiríticos, carinhosamente, e rogou o auxílio de Elói para que a esposa de Gabriel regressasse ao envoltório carnal.

Despedindo-se em definitivo, a grande mentora acrescentou algumas recomendações de adeus.
— Margarida — disse, bondosa —, não te esqueças do reino de beleza que podes improvisar no santuário doméstico.

Foge, resoluta, dos perigosos fantasmas do ciúme e da discórdia.
Aprende a renunciar, nas questões pequeninas, para recolheres com facilidade a luz que emana do sacrifício.

Não comprometas, por bagatelas, o êxito espiritual que a experiência te pode oferecer.
Estás livre dos males exteriores, mas ainda te não libertaste dos males próprios.

Confia no Divino Poder e não desfaleças, ainda mesmo quando a tempestade te açoite as fibras mais íntimas do coração.

Mãe e filha permutaram um abraço cheio de indefinível ternura e, encaminhando-se para Gúbio, a este explicou Matilde, discreta, o trabalho que planeara para as horas seguintes, asseverando que nos esperaria em paisagem próxima.

Logo após, agradeceu-nos com extrema gentileza, não nos oferecendo oportunidade de exprimir-lhe o reconhecimento e o júbilo que nos possuíam a alma.

Em seguida, ausentou-se, restituindo, naturalmente, ao nosso orientador as forças que lhe subtrairá, em carácter temporário.

Gúbio, então, retomou as rédeas do trabalho, notificando que, excepção feita a quatro companheiros que montariam guarda fraterna junto ao lar de Gabriel, deveríamos partir todos, na direcção dos círculos mais altos com escala em um dos “campos de saída” da esfera carnal.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:06 pm

20 - Reencontro

A noite ia avançada, mas o nosso Instrutor, vagueando o olhar em torno, parecia consultar a paisagem externa, ensimesmado, pensativo...

Logo após, fitou, enternecido, a filha espiritual que passara a convalescer em brando e defendido repouso.
Orou, longamente, junto dela, na câmara íntima e, em seguida, veio anunciar-nos o instante da partida.

Aves tornando ao ninho de esperança e de paz, deveríamos, agora, transportar connosco outros pássaros de asas semi-mutiladas que a tormentadas paixões ameaçava.

Todos os corações, ali socorridos, demandariam, junto de nós, outros campos de acção regenerativa e redentora.

Aquelas entidades sofredoras e amigas, ainda mesmo as que se conservavam nas mediações da loucura pelos desequilíbrios do sentimento a que se haviam confiado, tinham lágrimas de alegria e reconhecimento nos olhos.

Em cada uma palpitava o anseio de rectificação e de vida nova.
Por isto mesmo, talvez, cravavam o olhar inquieto e jubiloso em nosso orientador, como que a lhe devorarem as palavras.

— Todos os companheiros incorporados à nossa missão destes dias — avisava Gúbio, paternal desde que se mantenham perseverantes no propósito de auto-restauração, seguem ao nosso lado, com acesso aos círculos de trabalho condigno, onde estudantes do bem e da luz lhes acolherão, com simpatia, as aspirações de vida superior.

Espero, contudo, que não aguardem milagres na esfera próxima.
O trabalho de reajustamento próprio é artigo de lei irrevogável, em todos os ângulos do Universo.

Ninguém suplique proteccionismo a que não fez jus, nem flores de mel às sementes amargas que semeou em outro tempo.
Somos livros vivos de quanto pensamos e praticamos e os olhos cristalinos da Justiça Divina nos lêem, em toda parte.

Se há um ministério humano, na Crosta da Terra, determinando sobre as vidas inferiores da gleba planetária, temos, em nossas linhas de acção, o ministério dos anjos, dominando em nossos caminhos evolutivos.

Ninguém trai os princípios estabelecidos.
Possuímos agora o que ajuntamos no dia de ontem e possuiremos amanhã o que estejamos buscando no dia de hoje.

E como emendar é sempre mais difícil que fazer, não podemos contar com o favoritismo, na obra laboriosa do aprimoramento individual, nem provocar solução pacífica e imediata para problemas que gastamos longos anos a entretecer – A prece ajuda, a esperança balsamiza, a fé sustenta, o entusiasmo revigora, o ideal ilumina, mas o esforço próprio na direcção do bem é a alma da realização esperada.

Em razão disso, ainda aqui, a bênção do minuto, a dádiva da hora e o tesouro das oportunidades de cada dia hão de ser convenientemente aproveitados se pretendemos santificadora ascensão.

Felicidade, paz, alegria, não se improvisam.
Representam conquistas da alma no serviço incessante de renovar-se para a execução dos Desígnios Divinos.

Felizmente, desde agora estamos abrigados no santuário da boa vontade e, ainda neste instante, cabe-nos não esquecer a promessa evangélica:
“quem perseverar até ao fim, será salvo.

A Graça Celestial, sem dúvida, é um sol permanente e sublime.
Urge, porém, a criação de qualidades superiores em nós, para fixar-lhe os raios e recebê-los.
Doce intervalo mostrou-nos o júbilo reinante.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:06 pm

Salutar optimismo transbordava de todos os rostos.
Saldanha, de olhos fitos em nosso dirigente, confundia-nos pelo pranto de contrição purificadora, a correr-lhe, abundante, dos olhos.

Antes que o nosso Instrutor pudesse retomar o fio da palavra encorajadora e vigilante, algumas irmãs entoaram formoso hino de louvor à bondade do Cristo, com visível desassombro no olhar firme, dantes ansioso e dorido, enchendo-nos o coração de intraduzível bem-estar.

Raios de safirina luz derramaram-se profusamente sobre nós, enquanto as vozes harmoniosas e singelas se espalhavam, em derredor, tangendo-nos as fibras mais recônditas, nos recessos do ser.

Terminado o cântico melodioso e tocante que nos recordava os pensamentos sublimes de inolvidável Salmo de David (1), o Instrutor retomou a palavra e informou que, não obstante as santificadas alegrias daquela hora, a batalha não estava finda.

Faltava-nos o epílogo, esclareceu com inflexão mais grave na voz.

Matilde antecipara-se, de modo a esperar-nos em região intermediária, em cujo clima vibracional lhe seria possível materializar-se, de novo, aos olhos de todos, realizando o sonhado reencontro espiritual com o filho de outras eras que, a breve tempo, nos procuraria na condição de vingador.

Evidenciando manifesta preocupação no olhar muito lúcido, o nosso orientador prosseguiu esclarecendo que Gregório, ciente das novidades havidas no drama de Margarida e informado acerca da renovação de muitos companheiros e colaboradores dele, agora francamente inclinados ao bem, entediados da ignorância e do ódio, da perversidade e da insensatez, se revoltara contra ele Gúbio, dispondo-se a buscá-lo para um ajuste de que se julgava credor.

Explicou, emocionado, que num duelo espiritual, como aquele a esboçar-se, esperava de todos nós o auxílio eficiente da prece e das emissões mentais de amor puro.

Não deveríamos receber os doestos e insultos de Gregório por ofensas pessoais, nem levar suas atitudes à conta de maldade ou grosseria.

Competia-nos observar-lhe nos gestos de incompreensão a dor que se lhe cristalizara no Espírito oprimido e inconformado, vendo-lhe nas palavras, não a maldade deliberada, mas, sim, a eclosão de uma revolta doentia e infeliz que não poderia prejudicar e ferir senão a ele próprio.

O pensamento é uma força vigorosa, comandando os mínimos impulsos da alma e, se nos entregássemos à reacção espiritual, armada de ódio ou desarmonia, pactuaríamos com a violência, impedindo, não só a manifestação providencial de Matilde, a benfeitora, mas também a renovação de Gregório, que guardava a inteligência centralizada no mal.

Emissões de mágoa ou revide colocar-nos-iam em trabalho contraproducente.

As vibrações de amor fraternal, quais as que o Cristo nos legou, são as verdadeiras energias dissolventes da vingança, da perseguição, da indisciplina, da vaidade e do egoísmo que atormentam a experiência humana.

Além disso, tornou o Instrutor bondoso, cumpria-nos considerar que aquela mente transviada do trilho divino se caracterizava muito mais pela moléstia do orgulho ferido e impenitente, que pela perversidade.

Gregório era tão-somente um infeliz, quanto nós mesmos em passado próximo ou remoto, acicatado por rebeliões e remorsos interiores a lhe desajustarem os sentimentos.

Merecia, por isso mesmo, nossa dedicação carinhosa e confortadora, ainda mesmo que nos visitasse com aparências de celerado ou de louco.

Nossa conduta, aliás, nada apresentava de surpreendente, em semelhante capítulo, porque não fora para ensinar-nos outras lições que o Cristo trabalhara em benefício de todos e padecera na cruz, sem ninguém.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:07 pm

Notificou-nos, ainda, que o sacerdote das sombras se faria acompanhar, em sua vinda até nós, de muitos companheiros tão envenenados mentalmente quanto ele, e que, contra essa equipe de criaturas inimigas da luz, cabia-nos formar um todo de defesa harmónica, através da fraternidade legitima, da oração intercessora e do amor espiritual que se compadece e age em favor da restauração do bem.

Valendo-se da pausa que se impusera, natural, Saldanha perguntou ao nosso mentor se não devíamos organizar pelo menos um movimento coordenado de repulsão enérgica, ao que o dirigente, sábio e amigo, respondeu, sorrindo:
— Saldanha, em companhia do Mestre que abraçamos, só há lugar para o trabalho sadio, com entendimento das lições de sacrifício e iluminação que nos deixou.

Não acredites que um golpe possa desaparecer com outro golpe.
Não se cura a ferida, aprofundando o sulco da carne em sangue.
A cicatriz abençoada surge sempre à custa de enfermagem, remédio ou rectificação, com ascendentes de amor.

Quem pretende o Reinado do Cristo entrega-se a Ele.
Somos servos. A defesa, qualquer que seja, pertence ao Senhor.

O ex-perseguidor calou-se, humilde.
Decorridos alguns minutos, algo constrangidos afastamo-nos, em bloco, da vivenda em que tantos ensinamentos preciosos havíamos recebido.

Amparados os mais doentes naqueles que se mostravam mais fortes, retiramo-nos, cautelosos, pondo-nos a caminho da zona preestabelecida.

Duas horas de jornada, sob a supervisão de Gúbio perfeitamente treinado em experiências daquela natureza, conduziram-nos ao local desejado.

O campo, em torno, era singularmente belo.
Verdejante planalto, coroado de luar, convidava-nos à meditação e à prece, e brisas ligeiras e frescas da madrugada como que nos bafejavam o cérebro convidando-nos a reconfortar as fontes do pensamento.

Nosso Instrutor fez-nos sentar em semicírculo, compelindo-nos a recordar várias cenas evangélicas e informou, com visível emoção, que, segundo mensagem particular por ele registada, Gregório e os dele já se haviam colocado em nosso encalço e que, se alguns dos companheiros procurassem evitar-lhe a presença, qualquer fuga, em nosso agrupamento, se fazia impraticável, em virtude de a elevada percentagem de peregrinos, ali reunidos, se revelarem incapazes de volitação em alto plano, pela densidade do padrão mental em que se mantinham.

Cabia-nos, pois, agora, a atitude de oração e expectativa amorosa de quem sabia compreender, ajudar e perdoar.

Do zimbório estrelejado desciam valiosos estímulos para nós.
Constelações tremeluziam distantes, enquanto a Lua, silenciosa e bela, parecia disposta a testemunhar-nos o esforço cristão.

Reparei que o nosso dirigente, insulado na relva macia, assumia a mesma posição de instrumento mediúnico, qual acontecera na reunião que vínhamos de efectuar, porque me entregou, confiante, a direcção da assembleia, o que aceitei, dentro de preocupação extrema, embora sem hesitar.

Providenciada semelhante medida, Gúbio passou a elevada condição mental, por intermédio da oração.

Acompanhamo-lo, reverentes.
Não havia gosto para conversações estranhas ao problema delicado daquela hora.

Demorávamo-nos em observação expectante, quando ruído longínquo nos anunciou a alteração dos acontecimentos.

O Instrutor, não obstante palidíssimo, dando-nos a ideia de que já se achava em comunicação com entidades superiores e imperceptíveis ao nosso olhar, mais uma vez nos exortou ao silêncio, à paciência, à serenidade e à prece, recomendando-nos seguir todos os fatos, sem revolta, sem mágoa e sem desânimo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:07 pm

Não foi preciso esperar muito.

Alguns minutos se desdobraram apressados e Gregório, com algumas dezenas de assalariados, surgiu em campo, investindo-nos com palavrões que se caracterizavam pela dureza e violência.

Os recém-chegados apareceram acompanhados de grande cópia de animais, em maioria monstruosos.

Noutras circunstâncias, sem a bênção do aviso salutar, provavelmente teríamos debandado, mas Gúbio, cuja superioridade conhecíamos por experiência própria, ali se mantinha, resoluto e imperturbável, emitindo ondas de luminosidade intensa, veiculando forças magnéticas, imponderáveis, que, dirigidas sobre nós, como que nos supria de recursos necessários ao procedimento irrepreensível.

Por mim, ao reparar as máscaras sinistras que se abeiravam de nós, confesso que, em tempo algum, senti tamanha ameaça de medo e tão profundo contágio de confiança.

O sacerdote das sombras avançou para o nosso orientador, à semelhança de general parlamentando na praça, antes de começar a batalha, e acusou sem rodeios:
— Miserável hipnotizador de servos ingénuos, onde se alinham tuas armas para o duelo desta hora?

Não contente em prejudicar-me os projectos mais íntimos, num problema de ordem pessoal, aliciaste numerosos colaboradores meus, em nome de um Mestre que não ofereceu aos que o acompanharam senão sarcasmo, martírio e crucificação!

Acreditas, porventura, esteja eu disposto, por minha vez, a aceitar princípios que relaxam a dignidade humana?
Admites, acaso, permaneça, a meu turno fascinado pelos feiticeiros de tua estirpe?

Traidor da palavra empenhada, confundir-te-ei os poderes de bruxo desconhecido!
Não creio no amor açucarado que elegeste por senha de luta!
Creio na força que governa a vida e que te dobrará, igualmente, aos meus pés!

Percebendo que o nosso orientador não se erguia, como que chumbado ao solo, compelido por indefinível prostração, não obstante cercado de intensa luz, o sacerdote dos mistérios negros, acariciando os copos da espada luzente, acentuou, irado:
— Covarde, não te levantas para ouvir-me a acusação justa e digna?

Perdeste também o brio, semelhando-te a quantos te antecederam no movimento de humilhação que persiste no mundo, há quase dois mil anos?

Também, noutra época, acreditei na celestial protecção através da actividade religiosa, nos ideais em que hoje te empenhas.
Entendi, contudo, a tempo, que o Trono Divino paira distante demais para que nos preocupemos em alcançá-lo.

Não há um Deus misericordioso e sim uma Causa que dirige.
Essa causa é inteligência e não, sentimento – Encastelei-me, assim, na força determinativa para não soçobrar.

O “querer”, o “mandar” e o “poder” estão em minhas mãos.
Se tuas mágicas prevalecem acima dos princípios que consagro e defendo, aceita a luva que te lanço à face! Combatamos!

Gregório espraiou torvo olhar pela assistência muda e exclamou:
— Aqui descansam inermes, ao teu lado, os meus colaboradores que adormeceram, vergonhosamente, ao teu cântico sedutor;
entretanto, cada qual deles me pagará, muito caro, a defecção e a desobediência.

Fixou, com mais atenção, os olhos felinos na assembleia, mas, excepto eu, que deveria permanecer atento à tarefa direccional que me fora cometida, ninguém ousou modificar a atitude de profunda concentração nos propósitos de humildade e amor a que fôramos conclamados.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:07 pm

Demonstrando acentuado desapontamento, em face dos insultos sem resposta, o temível director de legiões sombrias abeirou-se, mais estreitamente, de nosso Instrutor sereno e bradou:
— Levantar-te-ei, por mim mesmo, usando os sopapos que mereces.

Antes, porém, que conseguisse ligar o intento à acção, delicado aparelho luminoso surgiu no alto, à maneira de garganta improvisada em fluidos radiantes, como as que se formam nas sessões de voz directa, entre os encarnados, e a voz cristalina e terna de Matilde ressoou, acima de nossas cabeças, exortando-o, com amorosa firmeza:
— Gregório, não enregeles o coração quando o Senhor te chama, por mil modos, ao trabalho renovador!
O teu longo período de dureza e secura está terminado.

Não intentes contra os abençoados aguilhões de nosso Eterno Pai!
O espinho fere, enquanto o fogo o não consome;
e a pedra mostra resistência, enquanto o fio d’água a não desgasta!

Pára a tua alma, filho meu, findou a noite em que a tua razão se eclipsou no mal.
A ignorância pode muito; no entanto, é simples nada quando a sabedoria espalha os seus avisos.
Não admitas que os monstros da negra magia te alimentem o coração com a felicidade desejável!

O temido perseguidor mantinha-se confundido, semi-aterrado, ao passo que nós mesmos, os circunstantes ligados à missão de Gúbio, não conseguíamos dissimular a imensa surpresa que nos dominava, ante o quadro imponente e inesperado.

Compreendi que a benfeitora se valia dos fluidos vitais de nosso orientador para exprimir-se, naquele plano, qual o fizera, horas antes, na residência de Margarida.

O sacerdote transviado, num complexo de espanto, rebelião e amargura, tinha agora o aspecto de uma fera enjaulada.

— Acreditas, porventura — prosseguiu a voz materna, adulçorada —, que o amor pode alterar-se no curso do tempo?
Supuseste, um dia, que eu te pudesse esquecer?
Olvidaste a imantação de nossos destinos?

Peregrine minhalma através de mil mundos, suspirarei sempre pela integração de nossos espíritos.

A luz sublime do amor que nos arde nos sentimentos mais profundos pode resplandecer nos precipícios infernais, atraindo para o Senhor aqueles que amamos.

Gregório, ressurge!
E, numa inflexão de lágrimas que desarmaria o raciocínio mais enrijecido, acentuou:
— Lembra-te! Deixaste morrer nos séculos os projectos de amor que traçamos na Toscana e na Lombardia distantes?

Esqueceste nossos votos ao pé dos altares humildes?
Olvidaste as cruzes de pedra que nos ouviam as orações?
Não prometemos ambos trabalhar em comum pela purificação dos santuários de Deus na Terra?

Sempre grande e belo no combate à política venal dos homens, cristalizaste na mente os desvarios do orgulho e da vaidade, adquiridos ao contacto de uma coroa putrescível.

Afogaste ideais preciosos na corrente de ouro mundano e perdeste a visão dos horizontes divinos, mergulhando-te na sombra dos cálculos pela extensão do império de teus caprichos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:08 pm

Incensaste a grandeza dos poderosos do mundo em desfavor dos humildes, incentivaste a tirania espiritual, crendo-te possuidor de autoridade infalível, e supunhas que o Céu, além da morte, nada mais fosse que simples cópia dos Tribunais e das Cortes da Terra.

Tremendos desenganos surpreenderam-te o despertar, e, embora humilhado e padecente, coagulaste os pensamentos no ácido venenoso da revolta e elegeste a escravização das inteligências inferiores por única posição digna de conquistar.

Durante séculos, tens sido apenas rude disciplinador de almas criminosas e perturbadas que o túmulo encontrou na imprudência e no vício.

Não te doerá, porém, filho meu, a triste condição de génio desprezível?
Semelhante pergunta não morre sem resposta.
Falam por ti o imenso tédio do mal e a profunda solidão interior que presentemente te invadem as horas.

Aprendeste com infinito desapontamento que os tesouros divinos não repousam em frias arcas de valores amoedados, e sabes, agora, que Jesus dispõe de escasso tempo para frequentar basílicas sumptuosas, não obstante respeitáveis, porque da escura senda humana emergem soluços de peregrinos sem luz e sem lar, sem arrimo e sem pão...

Via-se que a benfeitora, quase asfixiada pela emoção, apresentava enorme dificuldade para continuar, mas, após longa pausa, que ninguém ousou interromper, prosseguiu, comovida:
— Como pudeste esquecer, por alguns dias de autoridade efémera na Terra, as nossas redentoras visões do Cristo angustiado na cruz?

Aderiste aos Dragões do Mal pela simples verificação de que a tiara passageira não te poderia aureolar a cabeça nos domínios da vida eterna a que a morte nos arrebatou;
entretanto, o Divino Amigo jamais descreu das nossas promessas de serviço e espera por nós com a mesma abnegação do princípio.

Vamos! Sou Matilde, alma de tua alma, que, um dia, te adoptou por filho querido e a quem amaste como dedicada mãe espiritual.

Calou-se a voz da mensageira, interditada pela corrente de pranto.
Foi então que Gregório, fazendo quanto lhe era possível por manter-se de pé, gritou, como ansioso por fugir a si mesmo.

— Não creio! não creio! Estou só!
Consagrei-me ao serviço das sombras e não tenho outros compromissos.
Transbordava-lhe da voz menos altiva um tom de pavor indescritível.

Parecia disposto à fuga, francamente transformado.
Mas, ante a assembleia extática e silenciosa, mantinha-se magnetizado pela palavra da benfeitora que se fazia ouvir, austera e doce, bela e terrível, escalpelando-lhe a consciência.

Espraiou o olhar de leão ferido através de todos os ângulos do campo que nos situava, e, sentindo-se no centro de quantos assistiam, ali, atónitos, à cena inesperada, exteriorizou na expressão fisionómica todo o desespero extremo que lhe vagava nalma, arrancou a espada da bainha e bradou encolerizado:
— Vim para combater, não para argumentar.
Não temo sortilégios.

Sou um chefe e não posso perder os minutos com palavras tergiversantes.
Não admito a presença de minha mãe espiritual de outras eras.
Conheço as artimanhas dos fascinadores e não tenho outra alternativa senão duelar.

Fitando a delicada forma de luz que pairava no espaço, acrescentou:
— Por quem és! Anjo ou demónio, aparece e combate! Aceitas meu desafio?
— Sim... — respondeu Matilde, com ternura e humildade.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:08 pm

— Tua espada? — trovejou Gregório, arquejante.
— Vê-la-ás dentro em breve...

Após alguns momentos de ansiosa expectativa, apagou-se a garganta luminosa que brilhava sobre nós, mas leve massa radiante e disforme surgiu, não longe, à nossa vista.

Compreendi que a valorosa emissária se materializaria, ali mesmo, utilizando os fluidos’ vitais que o nosso orientador lhe forneceria.

Júbilo e assombro dominavam a assembleia.
Em poucos instantes, erguia-se Matilde, a nosso olhar, de rosto velado por véu de gaze tenuíssima.

A túnica alva e luminescente, aliada ao porte esguio e nobre, sob a auréola de safirina luz de que se tocava, traziam à lembrança alguma encantada madona da Idade Média, em repentina aparição.

Adiantava-se, digna e calma, na direcção do sombrio perseguidor;
todavia, Gregório, perturbado e impaciente, atacou-a de longe e empunhou a lâmina em riste, exclamando, resoluto:
— Às armas! às armas!...

Matilde estacou, serena e humilde, embora imponente e bela, com a majestade de uma rainha coroada de Sol.

Decorridos alguns instantes ligeiros, movimentou-se novamente e, alçando a destra radiosa até ao coração, caminhou para ele, afirmando, em voz doce e terna:
— Eu não tenho outra espada, senão a do amor com que sempre te amei!

E de súbito desvelou o semblante vestalino, revelando-lhe a individualidade num dilúvio de intensa luz.

Contemplando-lhe, então, a beleza suave e sublime, banhada de lágrimas, e sentindo-lhe as irradiações enternecedoras dos braços que, agora, se lhe abriam, envolventes e acolhedores, Gregório deixou cair a lâmina acerada e de joelhos se prosternou, bradando:
— Mãe! Minha mãe! Minha mãe!...

Matilde enlaçou-o e exclamou:
— Meu filho! Meu filho! Deus te abençoe! Quero-te mais que nunca!

Verificara-se, ali, naquele abraço, espantoso choque entre a luz e a treva, e a treva não resistiu...
Gregório, como que abalado nos refolhos do ser, regressara à fragilidade infantil, em pleno desmaio da força que o sustinha.

Finalmente, iniciara sua libertação.
A benfeitora, enlevada, recolhera-o, elanguescido, nos braços, enquanto numerosos membros da sombria falange fugiam espavoridos.

Matilde, vitoriosa, agradeceu em palavras que nos faziam vibrar as fibras mais recônditas da alma, e, em seguida, confiou aos nossos cuidados o filho vencido, asseverando-nos que o abnegado Gúbio se encarregaria de guardar, por algum tempo, aquele que ela considerava o seu divino tesouro.

Após abraçar-nos, generosa, desmaterializou-se ao nosso coro de hossanas, a fim de seguir, de mais longe, a preparação do futuro glorioso.

Refez-se o nosso orientador, reintegrando-se em nosso grupo de serviço.
Edificado, feliz, Gúbio sustentou Gregório, inerte, nos braços à maneira do cristão fiel que se orgulha de suportar o companheiro menos feliz.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Mar 22, 2012 10:09 pm

Orou, cercado de claridade santificante, arrancando-nos lágrimas irreprimíveis de alegria e reconhecimento e, depois, ante a paz que se estabelecera, triunfante e ditosa, deu por finda a nossa tarefa, dispondo-se a guiar a heterogénea, mas expressiva colectividade de novos estudantes do bem, recolhidos nos trabalhos de salvação de Margarida, até a importante e abençoada colónia de trabalho regenerador.

Surgira, para mim, a despedida
Tinha meus olhos húmidos de pranto.

O Instrutor abraçou-me e, retendo-me junto do coração, falou, bondoso:
— Jesus te recompense, filho meu, pelo papel que desempenhaste nesta jornada de libertação.
Nunca te esqueças de que o amor vence todo ódio e de que o bem aniquila todo mal.

Quis responder, esclarecendo que somente a mim, discípulo inábil, cabia o dever de gratidão;
todavia, incoercível emotividade prendeu-me a voz.

O orientador, no entanto, leu-me no olhar os sentimentos mais profundos e sorriu, em retirada.
Elói, também, rumou para longe, em busca de outros sectores.

E voltando, sozinho, ao meu domicílio espiritual, roguei, chorando:
Mestre de Bondade Infinita, não me abandones!
Ampara-me a insuficiência de servo imperfeito e infiel!


Em torno, reinava insondável e sublime silêncio.

Mas, enquanto o horizonte se tingia de rubro preludiando a festa da aurora, a estrela matutina brilhava, tremeluzindo aos meus olhos, qual celeste resposta de luz.

(1)Salmo 90. — Nota do autor espiritual.

Fim

§.§.§- O-canto-da-ave

Caro amigo:
Se você gostou do livro e tem condições de comprá-lo, faça-o, pois assim estarás ajudando diversas instituições de caridade; que é para onde os direitos autorais desta obra são destinados.


Muita Paz
Que Jesus o abençoe
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