LUZ ESPÍRITA
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Série André Luiz - Nosso Lar

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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 20, 2011 9:43 pm

A maioria, no entanto, estaciona.
Temos então a multidão de almas que demoram séculos e séculos, recapitulando experiências.

Os primeiros seguem por linhas rectas.
Os segundos caminham descrevendo grandes curvas.
Nessa movimentação, repetindo marchas e refazendo velhos esforços, ficam à mercê de inúmeras vicissitudes.

Assim é que muitos costumam perder-se em plena floresta da vida, perturbados no labirinto que tracejam para os próprios pés.

Classificam-se, aí, os milhões de seres que perambulam no Umbral.

Outros, preferindo caminhar às escuras, pela preocupação egoística que os absorve, costumam cair em precipícios, estacionando no fundo do abismo por tempo indeterminado. Compreendeu?

As elucidações não poderiam ser mais claras.

Sensibilizado, porém, com a extensão e complexidade do assunto, ponderei:
- Entretanto, que me diz dessas quedas? Verificam-se apenas na Terra?
Somente os encarnados são susceptíveis de precipitação no despenhadeiro?

Lísias pensou um minuto e respondeu:
- Sua observação é oportuna.

Em qualquer lugar, o espírito pode precipitar-se nas furnas do mal, salientando-se, porém, que nas esferas superiores as defesas são mais fortes, imprimindo-se, consequentemente, mais intensidade de culpa na falta cometida.

- Entretanto - objectei -, a queda sempre me pareceu impossível nas regiões estranhas ao corpo terreno.
O ambiente divino, o conhecimento da verdade, o auxílio superior figuravam-se-me antídotos infalíveis ao veneno da vaidade e da tentação.

O companheiro sorriu e esclareceu:
- O problema da tentação é mais complexo.
As paisagens do planeta terrestre estão cheias de ambiente divino, conhecimento da verdade e auxílio superior.

Não são poucos os que compartem, ali, de batalhas destruidoras entre as árvores acolhedoras e os campos primaveris;
muitos cometem homicídios ao luar, insensíveis à profunda sugestão das estrelas;
outros exploram os mais fracos, ouvindo elevadas revelações da verdade superior.

Não faltam, na Terra, paisagens e expressões essencialmente divinas.
As palavras do enfermeiro calavam-me fundo no espírito.

De facto, em geral, os guerreiros estimam a destruição na primavera e no estio, quando a Natureza estende no solo e no firmamento maravilhas de cor, perfume e luz;
os latrocínios e homicídios são praticados, de preferência, à noite, quando a Lua e as estrelas enchem o planeta de poesia divina.

A maioria dos verdugos da Humanidade constitui-se de homens eminentemente cultos, que desprezam a inspiração divina.

Renovando minha concepção referente à queda espiritual, acrescentei:
- Contudo, Lísias, poderá você dar-me uma ideia da localização dessa zona de Trevas?
Se o Umbral está ligado à mente humana, onde ficará semelhante lugar de sofrimento e pavor?
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 20, 2011 9:44 pm

- Há esferas de vida em toda parte - disse ele, solícito -, o vácuo sempre há de ser mera imagem literária.

Em tudo há energias viventes e cada espécie de seres funciona em determinada zona da vida.

Depois de pequeno intervalo, em que me pareceu meditar profundamente, continuou:
- Naturalmente, como aconteceu a nós outros, você situou como região de existência, além da morte do corpo, apenas os círculos a se iniciarem da superfície do globo para cima, esquecido do nível para baixo.

A vida, contudo, palpita na profundeza dos mares e no âmago da terra.
Além disso, há princípios de gravitação para o espírito, como se dá com os corpos materiais.
A Terra não é somente o campo que podemos ferir ou menosprezar, a nosso bel-prazer.

É organização viva, possuidora de certas leis que nos escravizarão ou libertarão, segundo nossas obras.
É claro que a alma esmagada de culpas não poderá subir à tona do lago maravilhoso da vida.

Resumindo, devo lembrar que as aves livres ascendem às alturas;
as que se embaraçam no cipoal sentem-se tolhidas no voo, e as que se prendem a peso considerável são meras escravas do desconhecido.
Percebe?

Lísias, porém, não precisaria fazer-me esta pergunta.

Avaliei, de pronto, o quadro imenso de lutas purificadoras, a desenhar-se ante meus olhos espirituais, nas zonas mais baixas da existência.

Como alguém que precisa ponderar bastante, para exprimir-se, o companheiro pensou, pensou... e concluiu:
- Qual acontece a nós outros, que trazemos em nosso íntimo o superior e o inferior, também o planeta traz em si expressões altas e baixas, com que corrige o culpado e dá passagem ao triunfador para a vida eterna.

Você sabe, como médico humano, que há elementos no cérebro do homem que lhe presidem o senso directivo.

Hoje, porém, reconhece que esses elementos não são propriamente físicos e sim espirituais, na essência.

Quem estime viver exclusivamente nas sombras, embotará o sentido divino da direcção.

Não será demais, portanto, que se precipite nas Trevas, porque o abismo atrai o abismo e cada um de nós chegará ao local para onde esteja dirigindo os próprios passos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 20, 2011 9:44 pm

45 - NO CAMPO DA MÚSICA

À tardinha, Lísias convidou-me para acompanhá-lo ao Campo da Música.
- É preciso distrair-se um pouco, André! - disse ele, gentil.

Vendo-me relutante, acentuou:
- Falarei a Tobias. A própria Narcisa consagrou o dia de hoje ao descanso. Vamos!
Eu, porém, observava em mim mesmo singular fenómeno.

Não obstante a escassez dos meus dias de serviço, já dedicava grande amor àquelas Câmaras.

As visitas diárias do Ministro Genésio, a companhia de Narcisa, a inspiração de Tobias, a camaradagem dos companheiros, tudo isso me falava particularmente ao espírito.

Narcisa, Salústio e eu aproveitávamos todos os instantes de folga para melhorar o interior, aqui e ali, suavizando a situação dos enfermos, que estimávamos de todo o coração, como se fossem nossos filhos.

Considerando a nova posição em que me encontrava, acerquei-me de Tobias, a quem o enfermeiro do Auxilio dirigiu a palavra com respeitosa intimidade.

Recebendo a solicitação, meu iniciador no trabalho anuiu, satisfeito:
- Óptimo programa! André precisa conhecer o Campo da Música.

E, abraçando-me:
- Não hesite. Aproveite! Volte à noite, quando quiser.
Todos os nossos serviços estão convenientemente atendidos.

Acompanhei Lísias, reconhecidamente.
Atingindo-lhe a residência, no Ministério do Auxílio, tive a satisfação de rever a senhora Laura e informar-me quanto ao regresso da abnegada mãe de Eloísa, que deveria regressar do planeta, na próxima semana.

A casa estava repleta de contentamento.
Havia mais beleza no interior doméstico, novas disposições no jardim.

Despedindo-nos, a dona da casa me abraçou e falou, bem-humorada:
- Então, doravante, a cidade terá mais um frequentador para o Campo da Música! Tome cuidado com o coração!...
Quanto a mim, ainda ficarei hoje em casa.

Vingar-me-ei de vocês, porém, muito breve!
Não me demorarei a buscar meu alimento na Terra!...
Em meio da geral alegria, ganhamos a via pública.

As jovens faziam-se acompanhar de Polidoro e Estácio, com quem palestravam animadamente.

Lísias, a meu lado, logo que deixamos o aeróbus numa das praças do Ministério da Elevação, disse carinhoso:
- Finalmente, vai você conhecer minha noiva, a quem tenho falado muitas vezes a seu respeito.

- É curioso - observei, intrigado - encontrarmos noivados, também por aqui...
- Como não? Vive o amor sublime no corpo mortal, ou na alma eterna?
Lá, no círculo terrestre, meu caro, o amor é uma espécie de ouro abafado nas pedras brutas.

Tanto o misturam os homens com as necessidades, os desejos e estados inferiores, que raramente se diferenciará a ganga do precioso metal.

A observação era lógica. Reconhecendo o efeito benéfico da explicação, prosseguiu:
- O noivado é muito mais belo na espiritualidade.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 20, 2011 9:44 pm

Não existem véus de ilusão a obscurecer-nos o olhar. Somos o que somos.
Lascínia e eu já fracassamos muitas vezes nas experiências materiais.

Devo confessar que quase todos os desastres do pretérito tiveram origem na minha imprevidência e absoluta falta de autodomínio.

A liberdade que as leis sociais do planeta conferem ao sexo masculino, ainda não foi devidamente compreendida por nós outros.

Raramente algum de nós a utiliza no mundo em serviço de espiritualização.
Amiúde, convertemo-la em resvaladouro para a animalidade.
As mulheres, ao contrário, têm tido, até agora, a seu favor, as disciplinas mais rigorosas.

Na existência passageira, sofrem-nos a tirania e suportam o peso das nossas imposições;
aqui, porém, verificamos o reajustamento dos valores.

Só é verdadeiramente livre quem aprende a obedecer.
Parece paradoxo e, todavia, é a expressão da verdade.

- Contudo - indaguei -, tem você em mira novos planos para os círculos carnais?
- Nem podia ser de outro modo - explicou ele, pressuroso -, necessito enriquecer o património das experiências e, além disso, minhas dívidas para com o planeta são ainda enormes.

Lascínia e eu fundaremos aqui, dentro em breve, nossa casinha de felicidade, crendo que voltaremos à Terra precisamente daqui a uns trinta anos.

Havíamos alcançado as cercanias do Campo da Música.
Luzes de indescritível beleza banhavam extenso parque, onde se ostentavam encantamentos de verdadeiro conto de fadas.

Fontes luminosas traçavam quadros surpreendentes: um espectáculo absolutamente novo para mim.

Antes que pudesse manifestar minha profunda admiração, Lisias recomendou bem-humorado:
- Lascínia sempre se faz acompanhar de duas irmãs, às quais, espero faça você as honras de cavalheiro.

- Mas, Lísias. . - respondi, reticencioso, considerando minha antiga posição conjugal - você deve compreender que estou ligado a Zélia.

O enfermeiro amigo, nesse instante, riu a valer, acrescentando:
- Era o que faltava! Ninguém quer ferir seus sentimentos de fidelidade.
Não creio, no entanto, que a união esponsalícia deva trazer o esquecimento da vida social.

Não sabe mais ser o irmão de alguém, André?
Ri-me, desconcertado, e nada pude replicar.
Nesse momento, atingimos a faixa de entrada, onde Lísias pagou gentilmente o ingresso.

Notei, ali mesmo, grande grupo de passeantes, em torno de gracioso coreto, onde um corpo orquestral de reduzidas figuras executava música ligeira.

Caminhos marginados de flores desenhavam-se à nossa frente, dando acesso ao interior do parque, em várias direcções.

Observando minha admiração pelas canções que se ouviam, o companheiro explicou:
- Nas extremidades do Campo, temos certas manifestações que atendem ao gosto pessoal de cada grupo dos que ainda não podem entender a arte sublime;
mas, no centro, temos a música universal e divina, a arte santificada, por excelência.

Com efeito, depois de atravessarmos alamedas risonhas, onde cada flor parecia possuir seu reinado particular, comecei a ouvir maravilhosa harmonia dominando o céu.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 20, 2011 9:45 pm

Na Terra, há pequenos grupos para o culto da música fina e multidões para a música regional.
Ali, contudo, verificava-se o contrário.
O centro do campo estava repleto.

Eu havia presenciado numerosas agregações de gente, na colónia, extasiara-me ante a reunião que o nosso Ministério consagrara ao Governador, mas o que via agora excedia a tudo que me deslumbrara até então.

A nata de "Nosso Lar" apresentava-se em magnífica forma.
Não era luxo, nem excesso de qualquer natureza, o que proporcionava tanto brilho ao quadro maravilhoso.

Era a expressão natural de tudo, a simplicidade confundida com a beleza, a arte pura e a vida sem artifícios.

O elemento feminino aparecia na paisagem, revelando extremo apuro de gosto individual, sem desperdício de adornos e sem trair a simplicidade divina.

Grandes árvores, diferentes das que se conhecem na Terra, guarnecem belos recintos, iluminados e acolhedores.

Não somente os pares afectuosos demoravam nas estradas floridas.
Grupos de senhoras e cavalheiros entretinham-se em animada conversação, valiosa e construtiva.

Não obstante sentir-me sinceramente humilhado pela minha insignificância ante aquela aglomeração selectíssima, experimentava a mensagem silenciosa, de simpatia, no olhar de quantos me defrontavam.

Ouvia frases soltas, relativamente aos círculos carnais, e, contudo, em nenhuma palestra notei o mais ligeiro laivo de malícia ou de acusação aos homens.

Discutia-se o amor, a cultura intelectual, a pesquisa científica, a filosofia edificante, mas todos os comentários tendiam à esfera elevada do auxílio mútuo, sem qualquer atrito de opinião.

Observei que, ali, o mais sábio restringia as vibrações de seu poder intelectual, ao passo que os menos instruídos elevavam, quanto possível, a capacidade de compreensão para absorver as dádivas do conhecimento superior.

Em palestras numerosas, recolhia referências a Jesus e ao Evangelho, e, no entanto, o que mais me impressionava era a nota de alegria reinante em todas as conversações.

Ninguém recordava o Mestre com as vibrações negativas da tristeza inútil, ou do injustificável desalento, Jesus era lembrado por todos como supremo orientador das organizações terrenas, visíveis e invisíveis, cheio de compreensão e bondade, mas também consciente da energia e da vigilância necessárias à preservação da ordem e da justiça.

Aquela sociedade optimista encantava-me.
Diante dos olhos, tinha concretizadas as esperanças de grande número dos pensadores verdadeiramente nobres, na Terra.

Grandemente maravilhado com a música sublime, ouvi Lísias dizer:
- Nossos orientadores, em harmonia, absorvem raios de inspiração nos planos mais altos, e os grandes compositores terrestres são, por vezes, trazidos às esferas como a nossa, onde recebem algumas expressões melódicas, transmitindo-as, por sua vez, aos ouvidos humanos, adornando os temas recebidos com o génio que possuem.

O Universo, André, está cheio de beleza e sublimidade.
O facho resplendente e eterno da vida procede originariamente de Deus.

O enfermeiro do Auxilio, todavia, não pôde continuar.

Fôramos defrontados por gracioso grupo.
Lascínia e as irmãs haviam chegado e era preciso atender aos imperativos da confraternização.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 20, 2011 9:45 pm

46 - SACRIFÍCIO DE MULHER

Um ano se passou em trabalhos construtivos, com imensa alegria para mim.

Aprendera a ser útil, encontrara o prazer do serviço, experimentando crescente júbilo e confiança.
Até ali, não voltara ao lar terrestre, apesar do imenso desejo que me espicaçava o coração.

Às vezes, intentava pedir concessões, nesse particular, mas alguma coisa me tolhia.
Não recebera auxilio adequado, não contava, ali, com o carinho e apreço de todos os companheiros?

Reconhecia, portanto, que, se houvesse proveito, de há muito teria sido encaminhado ao velho ambiente doméstico.
Cumpria, pois, aguardar a palavra de ordem.

Além disso, não obstante desdobrar actividades na Regeneração, o Ministro Clarêncio continuava a responsabilizar-se pela minha permanência na colónia.

A senhora Laura e o próprio Tobias não se cansavam de me lembrar esse facto.

Por diversas vezes tinha defrontado o generoso Ministro do Auxilio e, no entanto, mantinha-se ele sempre silencioso sobre o assunto.

Aliás, Clarêncio nunca modificava a atitude reservada, no desempenho das obrigações concernentes à sua autoridade.

Apenas pelo Natal, quando me encontrara nos festejos da Elevação, tocara levemente no assunto, adivinhando-me as saudades da esposa e dos filhinhos.

Comentara as alegrias da noite e asseverara não andar longe o dia em que me acompanharia ao ninho familiar.

Agradeci, comovidamente, esperando, cheio de bom ânimo.
Entretanto, atingíramos setembro de 1940, sem que visse a realização de meus desejos.

Confortava-me, porém, a certeza de haver preenchido todo o meu tempo nas Câmaras de Rectificação, com serviço útil. Não descansara.

Nossas tarefas prosseguiam sempre, sem solução de continuidade.
Habituara-me a cuidar dos enfermos, a interpretar-lhes os pensamentos.

Não perdia de vista a pobre Elisa, encaminhando-a, de maneira indirecta, a melhores tentames.
À medida, porém, que se consolidava meu equilíbrio emocional, intensificava-se-me a ansiedade de rever os meus.

A saudade doía fundo.
Em compensação, de longe em longe era visitado por minha mãe, que nunca me abandonou à própria sorte, embora permanecesse em círculos mais altos.

A última vez que nos avistáramos, ela me disse que tencionava cientificar-me de projectos novos.

Aquela atitude maternal de suave conformação nos sofrimentos morais que lhe feriam a alma sensível, comovera-me profundamente.

Que novas resoluções teria tomado?
Intrigado, esperei-lhe a visita, ansioso de conhecer-lhe os planos.

Com efeito, nos primeiros dias de setembro de 1940, minha mãe veio às Câmaras e, depois das saudações carinhosas, comunicou-me o propósito de voltar à Terra.

Em tom afectuoso, explicou o projecto.
Mas, surpreendido e discordando de semelhante decisão, protestei:
- Não concordo. Voltar a senhora à carne? Porquê?
Internar-se, de novo, no caminho escuro, sem necessidade imediata?
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:15 pm

Mostrando nobre expressão de serenidade, minha mãe ponderou:
- Não consideras a angustiosa condição de teu pai, meu filho?
Há muitos anos trabalho para reerguê-lo e meus esforços têm sido improfícuos.

Laerte é hoje um céptico de coração envenenado.
Não poderia persistir em semelhante posição, sob pena de mergulhar em abismos mais fundos.

Que fazer, André?
Terias coragem de revê-lo em tal situação, esquivando-te ao socorro justo?
- Não - respondi, impressionado -;
trabalharia por auxiliá-lo;
mas a senhora poderá ajudá-lo mesmo daqui.

- Não duvido. No entanto, os espíritos que amam, verdadeiramente, não se limitam a estender as mãos de longe.

De que nos valeria toda a riqueza material, se não pudéssemos estendê-la aos entes amados?
Poderíamos, acaso, residir num palácio relegando os filhinhos à intempérie?
Não posso ficar a distância.

Já que poderei contar contigo aqui, doravante reunir-me-ei a Luísa a fim de auxiliar teu pai a reencontrar o caminho certo.

Pensei, pensei, e redargui:
- Insistiria, no entanto, com a senhora.
Não haverá meios de evitar essa contingência?

- Não. Não seria possível. Estudei detidamente o assunto.
Meus superiores hierárquicos foram acordes no conselho.
Não posso trazer o inferior para o superior, mas posso fazer o contrário.

Que me resta, senão isso?
Não devo hesitar um minuto.
Tenho em ti o amparo do futuro.

Não te percas, pois, meu filho, e auxilia tua mãe, quando puderes transitar entre as esferas que nos separam da crosta.

Entrementes, zela por tuas irmãs, que talvez ainda se encontrem nas sombras do Umbral, em trabalho activo de purgação.

Estarei novamente no mundo, em breves dias, onde me encontrarei com Laerte para os serviços que o Pai nos confiar.

- Mas - indaguei - como se encontra ele com a senhora? Em espírito?
- Não - disse minha mãe com significativa expressão fisionómica.

Com a colaboração de alguns amigos, localizei-o na Terra, a semana passada, preparando-lhe a reencarnação imediata sem que ele nos identificasse o auxílio directo.

Quis fugir das mulheres que ainda o subjugam, talvez com razão, e aproveitamos essa disposição, para jungi-lo à nova situação carnal.

- Mas isso é possível? E a liberdade individual?
Minha mãe sorriu, algo triste, e obtemperou:
- Há reencarnações que funcionam como drásticos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:16 pm

Ainda que o doente não se sinta corajoso, existem amigos que o ajudam a sorver o remédio santo, embora muito amargo.

Relativamente à liberdade irrestrita, a alma pode invocar esse direito somente quando compreenda o dever e o pratique.

Quanto ao mais, é indispensável reconhecer que o devedor é escravo do compromisso assumido.

Deus criou o livre-arbítrio, nós criamos a fatalidade.
É preciso quebrar, portanto, as algemas que fundimos para nós mesmos.

Enquanto me perdia em graves pensamentos, continuou ela, retomando as anteriores observações:
- As infelizes irmãs que o perseguem, entretanto, não o abandonam, e, não fosse a Protecção Divina por intermédio de nossos guardas espirituais, talvez lhe subtraíssem a oportunidade da nova reencarnação.

- Deus meu! - exclamei.
Será então possível?
Estamos à mercê do mal até esse ponto?
Simples joguetes em mão dos inimigos?

- Essas interrogações, meu filho - esclareceu minha progenitora, muito calma -, devem pairar em nossos corações e em nossos lábios, antes de contrairmos qualquer débito, e antes de transformarmos irmãos em adversários para o caminho.
Não tomes empréstimos à maldade...
- E essas mulheres? - indaguei. Que será feito dessas infelizes?

Minha mãe sorriu e respondeu:
- Serão minhas filhas daqui a alguns anos.
É preciso não esqueceres que irei ao mundo em auxílio de teu pai.

Ninguém ajuda eficientemente, intensificando as forças contrárias, como não se pode apagar na Terra um incêndio com petróleo.
É indispensável amar, André!

Os que descrêem perdem o rumo verdadeiro, peregrinando pelo deserto;
os que erram se desviam da estrada real, mergulhando no pântano.
Teu pai é hoje um céptico e essas pobres irmãs suportam pesados fardos na lama da ignorância e da ilusão.

Em futuro não distante, colocarei todos eles em meu regaço materno, realizando minha nova experiência.

E, olhos brilhantes e húmidos, como se estivesse a contemplar horizontes do porvir, rematou:
- E mais tarde... quem sabe?
Talvez regresse a "Nosso Lar", cercada de outros afectos sacrossantos, para uma grande festividade de alegria, amor e união...

Identificando-lhe o espírito de renúncia, ajoelhei-me e beijei-lhe as mãos.
Desde aquela hora, minha mãe não era apenas minha mãe.

Era muito mais que isso.

Era a mensageira do Amparo, que sabia converter verdugos em filhos do seu coração, para que eles retomassem o caminho dos filhos de Deus.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:16 pm

47 - A VOLTA DE LAURA

Não só minha mãe se preparava para regressar aos círculos terrenos.

Também a senhora Laura encontrava-se em vésperas do grande cometimento.

Avisado por alguns companheiros, aderi à demonstração de simpatia e apreço que diversos funcionários, particularmente do Auxílio e da Regeneração, iam prestar à nobre matrona, por motivo de sua volta às experiências humanas.

Realizou-se a homenagem afectuosa na noite em que o Departamento de Contas lhe entregou a notificação do tempo global de serviço na colónia.

Não é possível traduzir, em letras comuns, a significação espiritual da festa íntima.
Povoava-se a encantadora residência de melodias e luzes.
As flores pareciam mais belas.

Numerosas famílias foram saudar a companheira, prestes a regressar.

Os visitantes, na maioria, cumprimentavam-na, carinhosos, ausentando-se, sem maiores delongas;
no entanto, os amigos mais íntimos lá permaneceram até alta noite, tive, assim, ocasião de ouvir observações curiosas e sábias.

A senhora Laura me pareceu mais circunspecta, mais grave.
Notava-se-lhe o esforço para acompanhar a corrente de optimismo geral.

Repleta a sala de estar, a progenitora de Lísias explicava ao representante do Departamento:
- Creio não me demorar mais que dois dias.
Terminaram as aplicações do Serviço de Preparação, do Esclarecimento.

E, com um olhar algo triste, concluía:
- Como vê, estou pronta.
O interlocutor tomou expressão de sincera fraternidade e acrescentou, estimulando-a:
- Espero, entretanto, que se encontre animada para a luta.

É uma glória seguir para o mundo, nas suas condições.
Milhares e milhares de horas de serviço a seu favor, perante a comunidade de mais de um milhão de companheiros.
Além disso, os filhinhos constituirão seu belo estímulo à retaguarda.

- Tudo isso me reconforta - exclamou a dona da casa, sem disfarçar a preocupação íntima -, mas devemos compreender que a reencarnação é sempre uma tentativa de magna importância.

Reconheço que meu esposo me precedeu no enorme esforço, e que os filhos amados serão meus amigos de todo instante; contudo...

- Ora essa! não se deixe levar por conjecturas - atalhou o Ministro Genésio -, precisamos confiar na Protecção Divina e em nós mesmos.

O manancial da Providência é inesgotável.
É preciso quebrar os óculos escuros que nos apresentam a paisagem física como exílio amargoso.

Não pense em possibilidades de fracasso;
mentalize, sim, as probabilidades de êxito.

Além do mais, é justo confiar alguma coisa em nós outros, seus amigos, que não estaremos tão longe, no tocante à "distância vibratória".

Pense na alegria de auxiliar antigas afeições, pondere na glória imensa de ser útil.

Sorriu a senhora Laura, parecendo mais encorajada, e asseverou:
- Tenho solicitado o socorro espiritual de todos os companheiros, a fim de manter-me vigilante nas lições aqui recebidas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:16 pm

Bem sei que a Terra está cheia da grandeza divina.
Basta recordar que o nosso Sol é o mesmo que alimenta os homens;
no entanto, meu caro Ministro, tenho receio daquele olvido temporário em que nos precipitamos.

Sinto-me qual enferma que se curou de numerosas feridas...
Em verdade, as úlceras não mais me apoquentam, mas conservo as cicatrizes.
Bastaria um leve arranhão, para voltar a enfermidade.

O Ministro esboçou o gesto de quem compreendia o sentido da alegação e revidou:
- Não ignoro o que representam as sombras do campo inferior, mas é indispensável coragem, e caminhar para diante.

Ajudá-la-emos a trabalhar muito mais no bem dos outros, que na satisfação de si mesma.
O grande perigo, ainda e sempre, é a demora nas tentações complexas do egoísmo.

- Aqui - tornou a interlocutora sensatamente -, contamos com as vibrações espirituais da maioria dos habitantes educados, quase todos, nas luzes do Evangelho Redentor;
e ainda que velhas fraquezas subam á tona de nossos pensamentos, encontramos defesa natural no próprio ambiente.

Na Terra, porém, nossa boa intenção é como se fora bruxuleante luz num mar imenso de forças agressivas.
- Não diga isso - atalhou o generoso Ministro -, não dê tamanha importância às influências das zonas inferiores.
Seria armar o inimigo para que nos torturasse. O campo das ideias é igualmente campo de luta.

Toda luz que acendermos, de facto, na Terra, lá ficará para sempre, porque a ventania das paixões humanas jamais apagará uma só das luzes de Deus.

A senhora pareceu agora ver tudo mais claro, em face dos conceitos ouvidos;
mudou radicalmente a atitude mental e falou, cobrando novo alento:
- Estou convencida, agora, de que sua visita é providencial.

Precisava levantar energias.
Faltava-me essa exortação.
É verdade: nossa zona mental é campo de batalha incessante.

É preciso aniquilar o mal e a treva dentro de nós mesmos, surpreendê-los no reduto a que se recolhem, sem lhes dar a importância que exigem.
Sim, agora compreendo.

Genésio sorriu satisfeito e acrescentou:
- Dentro do nosso mundo individual, cada ideia é como se fora uma entidade à parte...
É necessário pensar nisso.

Nutrindo os elementos do bem, progredirão eles para nossa felicidade, constituirão nossos exércitos de defesa;
todavia, alimentar quaisquer elementos do mal é construir base segura para os nossos inimigos verdugos.

A essa altura, o funcionário das Contas observou:
- E não podemos esquecer que Laura volta à Terra com extraordinários créditos espirituais.

Ainda hoje, o Gabinete da Governadoria forneceu uma nota ao Ministério do Auxílio, recomendando aos cooperadores técnicos da Reencarnação o máximo cuidado no trato com os ascendentes biológicos que vão entrar em função para constituir o novo organismo de nossa irmã.

- Ah! é verdade - disse ela -, pedi essa providência para que não me encontre demasiadamente sujeita à lei da hereditariedade.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:17 pm

Tenho tido grande preocupação, relativamente ao sangue.

- Repare - disse o interlocutor, solicito - que o seu mérito em "Nosso Lar" é bem grande, porquanto o próprio Governador determinou medidas directas.

- Não se preocupe, portanto, minha amiga - exclamou o Ministro Genésio, sorridente -, terá ao seu lado inúmeros irmãos e companheiros a colaborarem no seu bem-estar.

- Graças a Deus! - disse a senhora Laura, confortada - faltava-me ouvi-lo, faltava-me ouvi-lo...
Lísias e as irmãs, às quais se unia agora a simpática e generosa Teresa, manifestaram alegria sincera.

- Minha mãe precisava esquecer as preocupações - comentou o abnegado enfermeiro do Auxílio -; afinal de contas, não ficaremos aqui a dormir.

- Têm razão - aduziu a dona da casa -; cultivarei a esperança, confiarei no Senhor e em todos vocês.

Em seguida, os comentários voltaram ao plano da confiança e do optimismo.
Ninguém comentou a volta à Terra, senão como bendita oportunidade de recapitular e aprender, para o bem.

Ao despedir-me, alta noite, a senhora Laura disse-me em tom maternal:
- Amanhã à noite, André, espero igualmente por você.
Faremos pequena reunião íntima.

O Ministério da Comunicação prometeu-nos a visita de meu esposo.
Embora se encontre nos laços físicos, Ricardo será trazido até aqui, com o auxílio fraternal de companheiros nossos.

Além disso, amanhã estarei a despedir-me. Não falte.

Agradeci, comovidamente, esforçando-me por ocultar as lágrimas das saudades prematuras que me despontavam no coração.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:17 pm

48 - CULTO FAMILIAR

Talvez que a praticantes do Espiritismo não fosse tão surpreendente a reunião a que compareci, em casa de Lísias.

Aos meus olhos, porém, o quadro era inédito e interessante
Na espaçosa sala de estar, reunia-se pequena assembleia de pouco mais de trinta pessoas.

A disposição dos móveis era a mais simples.
Enfileiravam-se poltronas confortáveis, doze a doze diante do estrado, onde o Ministro Clarêncio assumira posição de director, cercando-se da senhora Laura e dos filhos.

A distância de quatro metros, aproximadamente, havia um grande globo cristalino, da altura de dois metros presumíveis, envolvido, na parte inferior, em longa série de fios que se ligavam a pequeno aparelho, idêntico aos nossos alto-falantes.

Numerosas indagações me bailavam no cérebro.
Na sala extensa, cada qual tomara lugar adequado, mas observava conversações fraternas em todos os grupos.

Achando-me ao lado de Nicolas, antigo servidor do Ministério do Auxílio e íntimo da família de Lísias, ousei perguntar alguma coisa.

O companheiro não se fez rogado e esclareceu:
- Estamos prontos; contudo, aguardamos a ordem da Comunicação.

Nosso irmão Ricardo está na fase da infância terrestre e não lhe será difícil desprender-se dos elos físicos, mais fortes, por alguns instantes.

- Mas virá ele até aqui? - indaguei.
- Como não? - revidou o interlocutor. - Nem todos os encarnados se agrilhoam ao solo da Terra.
Como os pombos-correios que vivem, por vezes, longo tempo de serviço, entre duas regiões, espíritos há que vivem por lá entre dois mundos.

E, indicando o aparelho à nossa frente, informou:
- Ali está a câmara que no-lo apresentará.
- Por que o globo cristalino? - perguntei, curioso. - Não poderia manifestar-se sem ele?

- É preciso lembrar - disse Nicolas, atenciosamente - que a nossa emotividade emite forças susceptíveis de perturbar.
Aquela pequena câmara cristalina é constituída de material isolante.
Nossas energias mentais não poderão atravessá-la.

Nesse instante, foi Lísias chamado ao fone por funcionários da Comunicação.
Era chegado o momento.
Poder-se-ia começar o trabalho culminante da reunião.

Verifiquei, no relógio de parede, que estávamos com quarenta minutos depois da meia-noite.
Notando-me o olhar interrogativo, disse Nicolas em voz baixa:
- Somente agora há bastante paz no recente lar de Ricardo, lá na Terra.

Naturalmente, a casa descansa, os pais dormem, e ele, em a nova fase, não permanece inteiramente junto ao berço...

Não lhe foi possível continuar.
O Ministro Clarêncio, levantando-se, pediu homogeneidade de pensamentos e verdadeira fusão de sentimentos.

Fez-se grande quietude, e Clarêncio disse comovedora e singela prece.
Em seguida, Lísias se fez ouvir na citara harmoniosa, enchendo o ambiente de profundas vibrações de paz e encantamento.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:17 pm

Logo após, Clarêncio tomou novamente a palavra:
- Irmão - disse - , enviemos, agora, a Ricardo a nossa mensagem de amor.

Observei, então, com surpresa, que as filhas e a neta da senhora Laura, acompanhadas de Lísias, abandonavam o estrado, tomando posição junto dos instrumentos musicais.

Judite, Iolanda e Lísias se encarregaram, respectivamente, do piano, da harpa e da citara, ao lado de Teresa e Eloísa, que integravam o gracioso coro familiar.

As cordas afinadas casaram os ecos de branda melodia e a música elevou-se, caríciosa e divina, semelhante a gorjeio celeste.

Sentia-me arrebatado a esferas sublimes do pensamento, quando vozes argentinas embalaram o interior.

Lísias e as irmãs cantavam maravilhosa canção, composta por eles mesmos.

Muito difícil frasear humanamente as estrofes significativas, cheias de espiritualidade e beleza, mas tentarei fazê-lo para demonstrar a riqueza das afeições nos planos de vida que se estendem para além da morte:

Pai querido, enquanto a noite
Traz a bênção do repouso,
Recebe, pai carinhoso,
Nosso afecto e devoção!...

Enquanto as estrelas cantam
Na luz que as empalidece,
Vem unir à nossa prece
A voz do teu coração.

Não te perturbes na estrada
De sombras do esquecimento,
Não te doa o sofrimento,
Jamais te firas no mal.
Não temas a dor terrestre,
Recorda a nossa aliança,
Conserva a flor da esperança
Para a ventura imortal.

Enquanto dormes no mundo,
Nossas almas acordadas
Relembram as alvoradas
Desta vida superior;
Aguarda o porvir risonho,
Espera por nós que, um dia,
Volveremos à alegria
Do jardim do teu amor.

Vem a nós, pai generoso,
Volta à paz do nosso ninho,
Torna às luzes do caminho,
Inda que seja a sonhar;
Esquece, um minuto, a Terra
E vem sorver da água pura
De consolo e de ternura
Das fontes de "Nosso Lar".

Nossa casa não te olvida
O sacrifício, a bondade,
A sublime claridade
De tuas lições no bem;
Atravessa a sombra espessa,
Vence, pai, a carne estranha,
Sobe ao cume da montanha,
Vem connosco orar também.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:17 pm

Às derradeiras notas da bela composição, notei que o globo se cobria, interiormente, de substância leitoso-acinzentada, apresentando, logo em seguida, a figura simpática de um homem na idade madura.

Era Ricardo.
Impossível descrever a sagrada emoção da família, dirigindo-lhe amorosas saudações.

O recém-chegado, após falar particularmente à companheira e aos filhos, fixou o olhar amigo em nós outros, pedindo fosse repetida a suave canção filial, que ouviu banhado em lágrimas.

Quando se calaram as últimas notas, falou comovidamente:
- Oh! meus filhos, como é grande a bondade de Jesus, que nos aureolou o culto doméstico do Evangelho com as supremas alegrias desta noite!

Nesta sala temos procurado, juntos, o caminho das esferas superiores;
muitas vezes recebemos o pão espiritual da vida e é, ainda aqui, que nos reencontramos para o estímulo santo. Como sou feliz!

A senhora Laura chorava discretamente.
Lísias e as irmãs tinham os olhos marejados de pranto.
Percebi que o recém-chegado não falava com espontaneidade e não podia dispor de muito tempo entre nós.

Possivelmente, todos ali mantinham análoga impressão, porque vi Judite abraçar-se ao globo cristalino, ouvindo-a exclamar carinhosamente:
- Pai querido, diga o que precisa de nós, esclareça em que poderemos ser úteis ao seu abnegado coração!

Observei, então, que Ricardo pousou o olhar profundo na senhora Laura e murmurou:
- Sua mãe virá ter comigo, em breve, filhinha!

Mais tarde, virão vocês, igualmente!
Que mais eu poderia desejar, para ser feliz, senão rogar ao Mestre que nos abençoe para sempre?

Todos chorávamos, enternecidos.
Quando o globo começou a apresentar, de novo, os mesmos tons acinzentados, ouvi Ricardo exclamando, quase a despedida:
- Ah! filhos meus, alguma coisa tenho a pedir-lhes do fundo de minh'alma!
Roguem ao Senhor para que eu nunca disponha de facilidades na Terra, a fim de que a luz da gratidão e do entendimento permaneça viva em meu espírito!...

Aquele pedido inesperado me sensibilizou e surpreendeu ao mesmo tempo.
Ricardo endereçou a todos saudações carinhosas e a cortina de substância cinzenta cobriu toda a câmara, que, em seguida, voltou ao aspecto normal.

O Ministro Clarêncio orou com sentimento e a sessão foi encerrada, deixando-nos imersos em alegria indescritível.

Dirigi-me ao estrado para abraçar a senhora Laura, exprimindo-lhe de viva voz minha profunda impressão e reconhecimento, quando alguém me atalhou os passos quase junto à dona da casa, que se ocupava a atender às numerosas felicitações dos amigos presentes.

Era Clarêncio, que me falou em tom amável:
- André, amanhã acompanharei nossa irmã Laura à esfera carnal.
Se lhe apraz, poderá vir connosco para visitar sua família.

Não podia ser maior a surpresa.
Profunda sensação de alegria me empolgou, mas lembrei instintivamente o serviço das Câmaras.

Adivinhando-me, porém, o pensamento, o generoso Ministro voltou a dizer:
- Você tem regular quantidade de horas de trabalho extraordinário a seu favor.

Não será difícil a Genésio conceder-lhe uma semana de ausência, depois do primeiro ano de cooperação activa.

Possuído de júbilo intenso, agradeci, chorando e rindo ao mesmo tempo.

Ia, enfim, rever a esposa e os filhos amados.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:18 pm

49 - REGRESSANDO A CASA

Imitando a criança que se conduz pelos passos dos benfeitores, cheguei à minha cidade, com a sensação indescritível do viajante que torna ao berço natal depois de longa ausência.

Sim, a paisagem não se modificara de maneira sensível.
As velhas árvores do bairro, o mar, o mesmo céu, o mesmo perfume errante.

Embriagado de alegria, não mais notei a expressão fisionómica da senhora Laura, que denunciava extrema preocupação, e despedi-me da pequena caravana, que seguiria adiante.

Clarêncio abraçou-me e falou:
- Você tem uma semana ao seu dispor.
Passarei aqui diariamente para revê-lo, atento aos cuidados que devo consagrar aos problemas da reencarnação de nossa irmã.

Se quiser ir a "Nosso Lar", aproveitará minha companhia. Passe bem, André!
Último adeus à dedicada mãe de Lísias e me vi só, respirando o ar de outros tempos, a longos haustos.
Não me demorei a examinar pormenores.

Atravessei celeremente algumas ruas, a caminho de casa.
O coração me batia descompassado, à medida que me aproximava do grande portão de entrada.

O vento, como outrora, sussurrava carícias no arvoredo do pequeno parque. Desabrochavam azáleas e rosas, saudando a luz primaveril.

Em frente ao pórtico, ostentava-se, garbosa, a palmeira que, com Zélia, eu havia plantado no primeiro aniversário de casamento.

Ébrio de felicidade, avancei para o interior.
Tudo, porém, denotava diferenças enormes.
Onde estariam os velhos móveis de jacarandá?

E o grande retrato onde, com a esposa e os filhinhos, formávamos gracioso grupo?
Alguma coisa me oprimia ansiosamente. Que teria acontecido?
Comecei a cambalear de emoção.

Dirigi-me à sala de jantar, onde vi a filhinha mais nova, transformada em jovem casadoura.

E, quase no mesmo instante, vi Zélia que saía do quarto, acompanhando um cavalheiro que me pareceu médico, à primeira vista.

Gritei minha alegria com toda a força dos pulmões, mas as palavras pareciam reboar pela casa sem atingir os ouvidos dos circunstantes.

Compreendi a situação e calei-me, desapontado.
Abracei-me à companheira, com o carinho da minha saudade imensa, mas Zélia parecia totalmente insensível ao meu gesto de amor.

Muito atenta, perguntou ao cavalheiro alguma coisa que não pude compreender de pronto.

O interlocutor, baixando a voz, respondeu, respeitoso:
- Só amanhã poderei diagnosticar seguramente, porque a pneumonia se apresenta muito complicada, em virtude da hipertensão.

Todo o cuidado é pouco, o Dr. Ernesto reclama absoluto repouso.
Quem seria aquele Dr. Ernesto?

Perdia-me num mar de indagações, quando ouvi minha esposa suplicar, ansiosa:
- Mas, doutor, salve-o, por caridade!
Peço-lhe! Oh! não suportaria uma segunda viuvez.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 21, 2011 11:18 pm

Zélia chorava e torcia as mãos, demonstrando imensa angústia.
Um corisco não me fulminaria com tamanha violência.
Outro homem se apossara do meu lar.

A esposa me esquecera. A casa não mais me pertencia.
Valia a pena de ter esperado tanto para colher semelhantes desilusões?

Corri ao meu quarto, verificando que outro mobiliário existia na alcova espaçosa.
No leito, estava um homem de idade madura, evidenciando melindroso estado de saúde.

Ao lado dele, três figuras negras iam e vinham, mostrando-se interessadas em lhe agravar os padecimentos.

De pronto, tive ímpetos de odiar o intruso com todas as forças, mas já não era eu o mesmo homem de outros tempos.

O Senhor me havia chamado aos ensinamentos do amor, da fraternidade e do perdão.

Verifiquei que o doente estava cercado de entidades inferiores, devotadas ao mal;
entretanto, não consegui auxiliá-lo imediatamente.

Assentei-me, decepcionado e acabrunhado, vendo Zélia entrar no aposento e dele sair, varias vezes, acariciando o enfermo com a ternura que me coubera noutros tempos, e, depois de algumas horas de amarga observação e meditação, voltei, cambaleante, à sala de jantar, onde encontrei as filhas conversando.

Sucediam-se as surpresas.
A mais velha casara-se e tinha ao colo o filhinho.
E meu filho? Onde estaria ele?

Zélia instruiu convenientemente uma velha enfermeira e veio palestrar, mais calmamente, com as filhas.

- Vim vê-los, mamãe - exclamou a primogénita -, não só para colher notícias do Dr. Ernesto, como também porque, hoje, singulares saudades do papai me atormentam o coração.

Desde cedo, não sei por que penso tanto nele.
É uma coisa que não sei bem definir...
Não terminou. Lágrimas abundantes borbotavam-lhe dos olhos.

Zélia, com imensa surpresa para mim, dirigiu-se à filha autoritariamente:
- Ora essa! Era o que nos faltava!...
Aflitíssima como estou, tolerar as suas perturbações.

Que passadismo é esse, minha filha?
Já proibi a vocês, terminantemente, qualquer alusão, nesta casa, a seu pai.
Não sabe que isso desgosta o Ernesto?

Já vendi tudo quanto nos recordava aqui o passado morto;
modifiquei o aspecto das próprias paredes, e você não me pode ajudar nisso?

A filha mais jovem interveio, acrescentando:
- Desde que a pobre mana começou a se interessar pelo maldito Espiritismo, vive com essas tolices na cachola.
Onde já se viu tal disparate?
Essa história dos mortos voltarem é o cúmulo dos absurdos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 22, 2011 11:21 pm

A outra, embora continuasse chorando, falou com dificuldade:
- Não estou traduzindo convicções religiosas.
Então é crime sentir saudades de papai?
Vocês também não amam, não têm sentimento?

Se papai estivesse connosco, seu único filho varão não andaria, mamãe, a praticar por aí tantas loucuras.

- Ora, ora - tornou Zélia, nervosa e enfadada -, cada qual tem a sorte que Deus lhe dá.
Não se esqueça de que André está morto.
Não me venha com lamúrias e lágrimas pelo passado irremediável.

Aproximei-me da filha chorosa e estanquei-lhe o pranto, murmurando palavras de encorajamento e consolação, que ela não registou auditiva, mas subjectivamente, sob a feição de pensamentos confortadores.

Afinal, via-me em face de singular conjuntura!
Compreendia, agora, o motivo pelo qual meus verdadeiros amigos haviam procrastinado, tanto, o meu retorno ao lar terreno.

Angústias e decepções sucediam-se de tropel.
Minha casa pareceu-me, então, um património que os ladrões e os vermes haviam transformado.

Nem haveres, nem títulos, nem afectos!
Somente uma filha ali estava de sentinela ao meu velho e sincero amor.

Nem os longos anos de sofrimento, nos primeiros dias de além-túmulo, me haviam proporcionado lágrimas tão amargas.

Chegou a noite e voltou o dia, encontrando-me na mesma situação de perplexidade, a ouvir conceitos e a surpreender atitudes que nunca poderia ter suspeitado.

À tardinha, Clarêncio passou, oferecendo-me o cordial da sua palavra amiga e recta.

Percebendo meu abatimento, disse, solícito:
- Compreendo suas mágoas e rejubilo-me pela óptima oportunidade deste testemunho.
Não tenho directrizes novas.

Qualquer conselho de minha parte, portanto, seria intempestivo.
Apenas, meu caro, não posso esquecer que aquela recomendação de Jesus para que amemos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos, opera sempre, quando seguida, verdadeiros milagres de felicidade e compreensão, em nossos caminhos.

Agradeci, sensibilizado, e pedi que me não desamparasse com o necessário auxílio.
Clarêncio sorriu e despediu-se.

Então, em face da realidade, absolutamente só no testemunho, comecei a ponderar o alcance da recomendação evangélica e reflecti com mais serenidade.

Afinal de contas, por que condenar o procedimento de Zélia?
E se fosse eu o viúvo na Terra?
Teria, acaso, suportado a prolongada solidão?

Não teria recorrido a mil pretextos para justificar novo consórcio?
E o pobre enfermo? Como e por que odiá-lo?
Não era também meu irmão na Casa de Nosso Pai?

Não estaria o lar, talvez, em piores condições, se Zélia não lhe houvesse aceitado a aliança afectiva?
Preciso era, pois, lutar contra o egoísmo feroz.

Jesus conduzira-me a outras fontes.
Não podia proceder como homem da Terra.
Minha família não era, apenas, uma esposa e três filhos na Terra.

Era, sim, constituída de centenas de enfermos nas Câmaras de Rectificação e estendia-se, agora, à comunidade universal.

Dominado de novos pensamentos, senti que a linfa do verdadeiro amor começava a brotar das feridas benéficas que a realidade me abrira no coração.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 22, 2011 11:21 pm

50 - CIDADÃO DE "NOSSO LAR"

Na segunda noite, sentia-me cansadíssimo.

Começava a compreender o valor do alimento espiritual, através do amor e do entendimento recíprocos.

Em "Nosso Lar", atravessava dias vários de serviço activo, sem alimentação comum, no treinamento de elevação a que muitos de nós se consagravam.

Bastava-me a presença dos amigos queridos, as manifestações de afecto, a absorção de elementos puros através do ar e da água mas ali não encontrava senão escuro campo de batalha, onde os entes amados se convertiam em verdugos.

As meditações preciosas que a palavra de Clarêncio me sugerira, davam-me certa calma ao coração.

Compreendia, finalmente, as necessidades humanas.
Não era proprietário de Zélia, mas seu irmão e amigo.

Não era dono de meus filhos e, sim, companheiros de luta e realização.

Recordei que a senhora Laura, certa feita, me afirmara que toda criatura, no testemunho, deve proceder como a abelha, acercando-se das flores da vida, que são as almas nobres, no campo das lembranças, extraindo de cada uma a substância dos bons exemplos, para adquirir o mel da sabedoria.

Apliquei ao meu caso o proveitoso conselho e comecei recordando minha mãe.
Não se sacrificara ela por meu pai, a ponto de adoptar mulheres infelizes como filhas do coração?

"Nosso Lar" estava repleto de exemplos edificantes.
A Ministra Veneranda trabalhava séculos sucessivos pelo grupo espiritual que lhe estava mais particularmente ligado ao coração.

Narcisa sacrificava-se nas Câmaras para obter endosso espiritual, de regresso ao mundo, em tarefa de auxílio.

A senhora Hilda vencera o dragão do ciúme inferior.
E a expressão de fraternidade dos demais amigos da colónia?

Clarêncio me acolhera com devotamento de pai, a mãe de Lísias me recebera como filho, Tobias como irmão.

Cada companheiro de minhas novas lutas me oferecia algo de útil à construção mental diferente, que se erguia, célere, no meu espírito.

Procurei abstrair-me das considerações aparentemente ingratas que ouvia no ambiente doméstico e deliberei colocar acima de tudo o amor divino, e, acima de todos os meus sentimentos pessoais, as justas necessidades dos meus semelhantes.

No meu cansaço, procurei o apartamento do enfermo, cujo estado se agravava de momento a momento.

Zélia amparava-lhe a fronte e dizia, banhada em lágrimas:
- Ernesto, Ernesto, tem pena de mim, querido! Não me deixes só!
Que será de mim se me faltares?

O doente acariciava-lhe as mãos e respondia com imenso afecto, apesar da forte dispneia.

Roguei ao Senhor energias necessárias para manter a compreensão imprescindível e passei a interpretar os cônjuges como se fossem meus irmãos.

Reconheci que Zélia e Ernesto se amavam intensamente.
E, se de facto me sentia companheiro fraternal de ambos, devia auxiliá-los com os recursos ao meu alcance.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 22, 2011 11:21 pm

Iniciei o trabalho procurando esclarecer os espíritos infelizes que se mantinham em estreita ligação com o enfermo.

Minhas dificuldades, porém, eram enormes.
Sentia-me abatidíssimo.

Nessa emergência, lembrei certa lição de Tobias, quando me dissera:
- "aqui, em 'Nosso Lar', nem todos necessitam do aeróbus para se locomoverem, porque os habitantes mais elevados da colónia dispõem do poder de volitação;
e nem todos precisam de aparelhos de comunicação para conversar a distância, por se manterem, entre si, num plano de perfeita sintonia de pensamentos.


Os que se encontrem afinados desse modo, podem dispor, à vontade, do processo de conversação mental, apesar da distância".

Lembrei quanto me seria útil a colaboração de Narcisa e experimentei.
Concentrei-me em fervorosa oração ao Pai e, nas vibrações da prece, dirigi-me a Narcisa encarecendo socorro.

Contava-lhe, em pensamento, minha experiência dolorosa, comunicava-lhe meus propósitos de auxílio e insistia para que me não desamparasse.

Aconteceu, então, o que não poderia esperar.
Passados vinte minutos, mais ou menos, quando ainda não havia retirado a mente da rogativa, alguém me tocou de leve no ombro.

Era Narcisa que atendia, sorrindo:
- Ouvi seu apelo, meu amigo, e vim ao seu encontro.
Não cabia em mim de contentamento.

A mensageira do bem fixou o quadro, compreendeu a gravidade do momento e acrescentou:
- Não temos tempo a perder.
Antes de tudo, aplicou passes de reconforto ao doente, isolando-o das formas escuras, que se afastaram como por encanto.

Em seguida, convidou-me com decisão:
- Vamos à Natureza.

Acompanhei-a sem hesitação, e ela, notando-me a estranheza, acentuou:
- Não só o homem pode receber fluidos e emiti-los.
As forças naturais fazem o mesmo, nos reinos diversos em que se subdividem.

Para o caso do nosso enfermo, precisamos das árvores.
Elas nos auxiliarão eficazmente.
Admirado da lição nova, segui-a, silencioso.

Chegados a local onde se alinhavam enormes frondes, Narcisa chamou alguém, com expressões que eu não podia compreender.

Daí a momentos, oito entidades espirituais atendiam-lhe ao apelo.
Imensamente surpreendido, vi-a indagar da existência de mangueiras e eucaliptos.

Devidamente informada pelos amigos, que me eram totalmente estranhos, a enfermeira explicou:
- São servidores comuns do reino vegetal, os irmãos que nos atenderam.

E, à vista da minha surpresa, rematou:
- Como vê, nada existe de inútil na Casa de Nosso Pai.
Em toda parte, se há quem necessite aprender, há quem ensine;
e onde aparece a dificuldade, surge a Providência.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Dez 22, 2011 11:22 pm

O único desventurado, na obra divina, é o espírito imprevidente, que se condenou às trevas da maldade.

Narcisa manipulou, em poucos instantes, certa substância com as emanações do eucalipto e da mangueira e, durante toda a noite, aplicamos o remédio ao enfermo, através da respiração comum e da absorção pelos poros.

O enfermo experimentou melhoras sensíveis.
Pela manhã, cedo, o médico observou, extremamente surpreendido:
- Verificou-se esta noite extraordinária reacção! Verdadeiro milagre da Natureza!

Zélia estava radiante. Encheu-se a casa de alegria nova.
Por minha vez, experimentava grande júbilo n’alma.
Profundo alento e belas esperanças revigoravam-me o ser.

Reconhecia, eu mesmo, que vigorosos laços de inferioridade se haviam rompido dentro de mim, para sempre.

Nesse dia, voltei a "Nosso Lar" em companhia de Narcisa e, pela primeira vez, experimentei a capacidade de volitação.

Num momento, ganhávamos grandes distâncias.
A bandeira da alegria desfraldara-se em meu íntimo.

Comunicando à enfermeira generosa minha impressão de leveza, ouvi-a esclarecer:
- Em "Nosso Lar", grande parte dos companheiros poderia dispensar o aeróbus e transportar-se, à vontade, nas áreas de nosso domínio vibratório;
mas, visto a maioria não ter adquirido essa faculdade, todos se abstêm de exercê-la em nossas vias públicas.


Essa abstenção, todavia, não impede que utilizemos o processo longe da cidade, quando é preciso ganhar distância e tempo.

Nova compreensão e novos júbilos me enriqueciam o espírito.

Instruído por Narcisa, ia da casa terrestre à cidade espiritual e vice-versa, sem dificuldade de vulto, intensificando o tratamento de Ernesto, cujas melhoras se firmaram, francas e rápidas.

Clarêncio visitava-me, diariamente, mostrando-se satisfeito com o meu trabalho.
Ao fim da semana, chegara ao termo de minha primeira licença nos serviços das Câmaras de Rectificação.

A alegria tornara aos cônjuges, que passei a estimar como irmãos.
Era preciso, pois, regressar aos deveres justos.
A luz dormente e caríciosa do crepúsculo, tomei o caminho de "Nosso Lar", totalmente modificado.

Naqueles rápidos sete dias, aprendera preciosas lições práticas no culto vivo da compreensão e da fraternidade legítimas.

A tarde sublime enchia-me de magnos pensamentos.
Como é grande a Providência Divina! - dizia, a monologar intimamente.
Com que sabedoria dispõe o Senhor todos os trabalhos e situações da vida!

Com que amor atende a toda a Criação!
Algo, porém, me arrancou da meditação a que me recolhera.
Mais de duzentos companheiros vinham ao meu encontro.

Todos me saudavam, generosos e acolhedores, Lísias, Lascínia,
Narcisa, Silveira, Tobias, Salústio e numerosos cooperadores das Câmaras ali estavam.
Não sabia que atitude assumir, colhido, assim, de surpresa.

Foi, então, que o Ministro Clarêncio, surgindo à frente de todos, adiantou-se, estendeu-me a destra e falou:
- Até hoje, André, você era meu pupilo na cidade;
mas, doravante, em nome da Governadoria, declaro-o cidadão de "Nosso Lar".


Por que tamanha magnanimidade se meu triunfo era tão pequenino?

Não conseguia reter as lágrimas de emoção que me embargavam a voz.

E, considerando a grandeza da Bondade Divina, atirei-me aos braços paternais de Clarêncio, a chorar de gratidão e de alegria.

§.§.§- O-canto-da-ave

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Muita Paz
Que Jesus o abençoe
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