LUZ ESPÍRITA
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:55 am

O golpe - vol. 3
Robson Pinheiro

pelo espírito Ângelo Inácio

Série A Política das Sombras
––––––––––
O PARTIDO, vol. 1
A QUADRILHA, vol. 2
O GOLPE, vol. 3

Citação
Sumário
Preâmbulo
Carta do espírito José do Patrocínio à gente brasileira


Capítulo 1 – Os filhos da besta
Capítulo 2 – A Horda
Capítulo 3 – Mensageiro da justiça
Capítulo 4 – Assuntos urgentes
Capítulo 5 – Na noite mais escura, na treva mais densa…
Capítulo 6 – Táctica de guerra
Capítulo 7 – Moderna obsessão
Capítulo 8 – Navalha do crime
Capítulo 9 – Testando limites
Capítulo 10 – Guerra de facções
Epílogo – Tango em Mendoza

referências bibliográficas
outras obras de Robson Pinheiro
sobre o autor
Guardiões da Humanidade
notas


“Sede sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário, anda em redor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar”
1 PEDRO 5:8

“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos.”
MATEUS 5:6

“Porque, se Deus não perdoou aos anjos que pecaram, mas, havendo-os lançado no inferno, os entregou às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo; tendo os olhos cheios de adultério, e não cessando de pecar, engodando as almas inconstantes, tendo o coração exercitado na avareza, filhos de maldição; estes são fontes sem água, nuvens levadas pela força do vento, para os quais a escuridão das trevas eternamente se reserva.”
2 PEDRO 2:4,14,17
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:55 am

Preâmbulo
COM O PARTIDO: projecto criminoso de poder, lançado em maio de 2016, por ocasião da instauração do processo de impeachment contra a então presidente do Brasil, o espírito Ângelo Inácio introduziu a série A política das sombras. Na ocasião, recomendou que a Carta do espírito Tancredo Neves à nação brasileira, publicada originalmente cerca de nove meses antes, fosse convertida em prefácio daquela obra. Porém, mais outro espírito, na altura, quis se manifestar.
José do Patrocínio (1853–1905) foi jornalista, farmacêutico e líder abolicionista fluminense, tendo sido ele próprio filho de mãe escrava. Morreu aos 51 anos de idade, após ter enfrentado até mesmo o desterro no Amazonas, em virtude de textos publicados em seu jornal, fechado durante a vigência do estado de sítio na incipiente república brasileira. Como espírito, permanece interessado nos rumos e nos contornos que ganham a política e a nação brasileiras, conforme se pode ver no texto a seguir, rascunhado em agosto de 2015 e concluído apenas dez meses depois. Note-se que a mensagem — até o momento, inédita — permanece actual.
Belo Horizonte, agosto de 2015.


Carta do espírito José do Patrocínio à gente brasileira
Amigos e irmãos de todos os povos, meus irmãos brasileiros, Deus abençoe o povo brasileiro nos desafios das horas incertas!

ANTE O QUADRO INQUIETANTE que se alastra no cenário nacional, ante as dores do povo diante dos sacrifícios pelos quais passa a nação, não olvidemos Jesus, o divino timoneiro que embala a embarcação terrestre, conduzindo os destinos do mundo ao porto da sua misericórdia. Sobretudo neste momento pelo qual passa o planeta, em pleno andamento do processo de transição — no qual parece, aos olhos do vulgo, que as coisas saíram do controle em diversas nações —, unamo-nos na fé e na oração, conectando-nos com as fontes superiores do bem e da luz, com os guardiões invisíveis da humanidade. Porém, não nos detenhamos apenas em vibrações; pronunciemo-nos todos em favor da justiça, da equidade, da dignidade e dos valores conquistados ao longo dos séculos.
Em oração, auxiliemos quanto for possível, a fim de que aqueles que temporariamente detêm o poder em suas mãos não se sintam desamparados. Isso porque eles, de maneira mais acentuada, carregam sobre os ombros o peso das decisões que poderão afectar expressiva parcela da população já tão sofrida e desgastada do nosso país. Os que tentam acertar, em qualquer âmbito em que se encontrem, precisam de orações de qualquer um de nós.
A família brasileira, os religiosos, os espiritualistas, aqueles que mantêm a chama da fé acesa no templo do coração devem se unir e ter a coragem de se manifestar, de ser o fermento que leveda a massa, de dar sua opinião e de posicionar-se, de maneira ordeira. Roguemos que a inspiração se derrame sobre quem dela carece, a fim de conduzir o povo brasileiro ao equilíbrio de forças, tão necessário a este momento delicado.
Se é verdade que forças de oposição ao bem e ao progresso estão em guerra declarada contra as realizações e as conquistas da nação, também existe outra verdade indiscutível. É que, acima de todos nós, as bênçãos de Jesus patrocinam a actuação dos guardiões superiores por meio daqueles que se irmanam no objectivo de contornar — quiçá superar — a situação actual.
Convém que a democracia, a pátria, os cidadãos brasileiros, o povo de todas as classes sociais abandonem ideias sectárias e ilusões acerca da existência de um plano, um grupo ou um partido salvacionista. Importa agir em conjunto, deixando de lado diferenças, brigas, intrigas e disputas para ver quem dominará, de modo a trabalhar por uma nação mais forte e fortalecer as lideranças que tentam, ainda que de forma limitada ou acanhada, conduzir a embarcação nacional a um porto seguro. Não há como não lembrar: aqueles que estão no poder e que governam, confie-se neles ou não, são tão humanos quanto vós; são filhos do mesmo Pai e requerem apoio e prece, ansiando por saber que os bons torcem e oram para que vençam as dificuldades mais expressivas. Nunca esqueçamos que eles, como nós, caem, erram, choram, passam noites sem dormir, pois ninguém, em sã consciência, vê uma situação deste naipe, como ora ocorre ao país, e se sente confortável, alheio a apreensões de toda espécie. Os que governam, por mais que se discorde deles, também sofrem, têm suas lutas internas e se digladiam com as mesmas falanges espirituais que se opõem ao bem.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:55 am

Não obstante, tal verdade não justifica a inércia e a omissão dos bons; não aduz à aceitação, de braços cruzados, dos mais ardorosos descalabros, pois estamos em pleno combate contra forças espirituais da maldade, que intentam impedir que esta nação cumpra seu legado espiritual.
Se é uma realidade que vivemos um momento de crise, num campo de batalha espiritual cujo palco são a nação e o próprio planeta, por outro lado, saibamos ter compaixão, perseverar e nos unir em torno de um pacto nacional regido pelo condão de promover auxílio. Não desistamos de ser bons somente porque os maus proliferam ao redor. Tenhamos coragem de lutar pela justiça e pelo bem, mesmo que os lobos estejam, neste momento, arregimentando-se em derradeiros golpes, movidos pelo mais profundo desatino.
A nação brasileira tem a missão futura de levar ao mundo uma ideia mais clara a respeito de conceitos como amor, fraternidade, bondade e civilidade. Contudo, o Brasil é uma nação jovem no cenário do mundo, que ainda vive a fase de adolescência em face de outras nações mais antigas. Outros povos, na época em que tinham essa mesma idade, viveram períodos muitíssimo conturbados e experimentaram revoluções incomuns, muitas vezes com repercussões desumanas para sua população. Apesar do rastro de dor e de amargura, muitos deles conseguiram superar tais situações mediante a união de forças, embora não sem dor ou desgaste de cidadãos e governantes.
Ninguém é perfeito. Caso os que detêm o poder logrem fazer tão somente bem feito, já convém nos dar por satisfeitos. Se porventura conseguirem se unir os opostos e se fortificar em torno de um pacto abrangente em prol da nação, que leve em conta a necessidade do povo e o fato de que o país é mais importante do que suas facções, mais ainda terão condições de superar a crise vigente.
Que a lei se cumpra para todos, no entanto, digladiarem-se uns contra os outros, trocarem acusações de parte a parte, reduzindo tudo a mero jogo de poder, não nos levará a nada. A nau soçobra, e, portanto, é fundamental unir as forças, unir as habilidades, unir as possibilidades de cada lado, de cada partido, de cada cidadão; urge que cada qual dê o melhor de si e se pronuncie publicamente em favor da nação, e não em favor de si próprio ou de idealismos que só beneficiam a quem deseja o poder a todo custo. Sabendo que atravessamos um momento de crise, em meio a uma tempestade avassaladora, é crucial dar as mãos e formar um feixe de varas, unidos no propósito de fazer o Brasil superar este momento e prosseguir na construção do seu futuro. Do contrário, cabe indagar: até onde a dor, a calamidade, o caos e a insensatez terão de chegar para que a busca pela solução ganhe lugar de destaque, à frente de disputas, querelas e divergências?
Unir-se não implica abandonar os próprios ideais ou a perspectiva sobre a situação, a vida e as forças que concorrem nos bastidores deste momento histórico de desafios. Unir-se significa, diante da crise que afecta a todos, calar temporariamente as dissidências, os discursos inflamados e os pontos de discórdia, no intuito de fortalecer a nação, que neste momento precisa do melhor de cada um, do melhor de cada lado, independentemente das particularidades defendidas por este ou aquele. Acima dos partidos, das corporações e das facções está o povo, a nação, a família brasileira. Portanto, conclamamos nossos irmãos, de todas as religiões e os matizes, a se unirem em oração, não importa a visão partidária e pessoal que porventura nutram — direito que assiste a cada um. Mas que não se restrinjam apenas a vibrações, pois o mal só será superado quando os realmente bons se manifestarem, expuserem-se em nome do que acreditam; enfim, quando os bons deixarem de ser tímidos ou covardes. Somente assim o bem prosperará na Terra.1
Que cada família possa se expressar ostentando a bandeira da paz, elevando-se, pelo pensamento, ao director sublime do planeta, rogando que tenha misericórdia dos que sofrem, dos que governam, dos que tentam acertar. Silenciemos as acusações e reunamo-nos em apoio à mudança, sabendo que toda crise passa, mas que, para passar, impõe que simplifiquemos a vida e as exigências cada vez mais, a fim de subsistir com qualidade. O momento exige que façamos a nossa parte, que falemos, que lutemos uma cruzada pacífica, mas não covarde; que tenhamos a coragem de ir às ruas e às avenidas reclamar dos representantes do povo o cumprimento dos deveres para com os cidadãos a quem teoricamente representam. Somente então haverá mudanças reais. Esconder-se em casas de oração, dizendo rezar ou vibrar sem se expor, sem se envolver, é atitude indigna daquele que diz seguir a Cristo, o verdadeiro revolucionário do planeta.
As forças das trevas não podem contra as energias do bem. Jamais! Importa é nos conscientizar disso. Trabalhemos para respeitar a opinião alheia, acima de tudo nos unindo, pois a hora exige muito mais acção e atitude do que inércia e passividade ante promessas vazias e discursos inflamados.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:56 am

É hora de romper a hipnose imposta em larga escala por aqueles que, até agora, deram mostras de desrespeito à nação, às leis e à sociedade brasileira. Calar-se e deixar passar este momento sem se pronunciar é ser conivente com o mal, que se disfarça em pele de ovelha, além de constituir atitude com potencial de agravar ainda mais a crise em andamento.
Precisamos nos envolver, pois quem ama se envolve; quem ama esta terra se revolve em paixão por aquilo em que acredita e pelo futuro que deseja. Médiuns, pastores, padres, o povo de santo, esotéricos, universalistas e todas aquelas lideranças e referências na busca por espiritualidade: que se envolvam, que se misturem ao povo, que se cubram com as vestimentas brancas da paz e saiam do ostracismo, manifestando-se pelo bem, pela família brasileira, pelo povo e pela nação. Devemos nos envolver, mesmo nós, os que habitamos esta outra dimensão da vida; não fiquemos calados ou de braços cruzados diante da onda de pessimismo, de conspurcação e corrupção, perante a vaga de corruptores e de pusilânimes que se vendem para continuar dominando sob o signo do mal. Ninguém pode reclamar daquilo que permite.
Se realmente move-nos a indignação contra as forças destruidoras das trevas, que fizeram súbditos e representantes entre quem, um dia, foi alvo de confiança, está na hora de elevar a voz para erguer os ânimos dos filhos da Terra, para exortar e estimular. Mesmo daqui, continuamos amando aqueles que ficaram do outro lado do rio da vida. Sendo assim, não nos calaremos, mesmo que os pretensos donos da verdade espiritual reprovem nossa atitude, defendendo, em última análise, que a postura adequada seria a omissão, nesta hora de graves consequências para o povo, as instituições do bem e o destino de toda a nação. Não se intimidem com os comentários de censura e repreensão, pois os que assim agem, sem o saberem, sofrem processo de hipnose dos sentidos, em franco estágio de fascinação.
Jesus proclamou os princípios do Reino, da política divina, ao proferir o Sermão da Montanha. Em seus actos, demonstrou preocupar-se com os destinos da sociedade, envolveu-se com o povo, e sua trajectória sintetiza uma proposta de vida que revolucionou o mundo depois dele. Não podemos nos calar, impassíveis, diante da necessidade do povo! Não estamos mortos, mas vivos na imensidade, interessados no progresso da nação e do planeta, bem como na felicidade de toda a gente. Que a família brasileira se congregue em torno da superação das barreiras da discórdia e do repúdio às atitudes irresponsáveis, levianas e criminosas patrocinadas pelas forças das trevas; que se una na construção de um mundo melhor, de uma nação mais robusta, regida por ideais nobres, que sempre foram o esteio do país. Urge fazer do Brasil a grande nação a qual o país foi destinado a se tornar.
Abençoada gente brasileira, que deveria se orgulhar de saber fazer samba com as próprias dores e os desafios, que enfrenta as lutas com o som do pandeiro e a cantiga do povo a embalar as noites, não raro com a musicalidade festiva do povo a bailar. Abençoado país que sabe conviver com os opostos — apesar dos que intentam estabelecer o contrário — e é capaz de unir povos e credos como nenhum outro, empregando a voz do sentimento, a qual se sobrepõe às diferenças de variada ordem.
Uma nação de dimensões continentais, mas que sabe unir pela palavra, pela cultura e pela fraternidade todos os sotaques, todos os trejeitos de povos diferentes, que fizeram e fazem desta terra o recanto abençoado de suas peregrinações. É uma terra tão bendita que oferta a todos os povos que para aqui vêm, a cada um, o clima propício para se desenvolver, para conviver e transformar desafios em canção, em poesia, em sementes de evolução.
Abençoado recanto onde se reuniram seres especiais, como Irmã Dulce, Padre Damião, Chico Xavier e tantos outros, anónimos ou não; onde canta o coração da fé de tantas crianças, que esperam de vocês a união e o apoio para prosseguir crescendo e levando esta terra em seu coração e em suas almas.
Por tudo isso e muito mais, cultivemos o optimismo, mesmo diante dos ventos que fazem bailar os salgueiros, que ameaçam tanto a casa pequenina sobre a rocha quanto a mansão ou a cobertura às margens do mar do Leblon ou de Copacabana. Observando o Redentor lá no alto daquele monte, de braços abertos, abençoando não somente a cidade, como também o país, descruzemos nossos braços e trabalhemos um pouco mais, pois, após a tempestade e o vendaval, surgem a bonança e a calmaria, de modo que os brasileiros, o povo da terra do Cruzeiro do Sul, possam se refazer, construir seu futuro sobre bases mais sólidas e legítimas de verdadeira fraternidade.

ROBSON PINHEIRO
pelo espírito José do Patrocínio
(Versão final em junho de 2016.)

“Vi subir do mar uma besta que tinha sete cabeças e dez chifres, e sobre os seus chifres dez diademas, e sobre as suas cabeças um nome de blasfémia.”
APOCALIPSE 13:1

“A besta que viste foi e já não é, e há de subir do abismo, e irá à perdição; e os que habitam na terra (cujos nomes não estão escritos no livro da vida, desde a fundação do mundo) se admirarão, vendo a besta que era e já não é, ainda que é.”
APOCALIPSE 17:8
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:56 am

Capítulo 1 – Os filhos da besta
Venha, Ângelo! — falou Pai João, convidando-me a voltar a um antigo local onde eu estivera antes com a equipe dos guardiões. — Ranieri nos aguarda, pois quer que veja algo que pode lançar luz sobre diversos acontecimentos. Porém, não iremos somente os três. Lower, o escritor que também faz parte da equipe, nos acompanhará, assim como Júlio Verne e dois guardiões.
“Parece algo muito sério” — pensei, contudo, sem me pronunciar.
— O que veremos talvez ajude você e seus leitores a esclarecerem fatos pretéritos e até mesmo futuros, tendo em vista o que se passa actualmente no mundo, além de elucidar determinados aspectos relacionados à forma como você escreve os livros.
— Por que Lower vai connosco? Ele não está justamente em meio a uma imersão nos assuntos de espiritualidade, buscando entender os lances que lhe ocorreram?
— Exactamente por isso, Ângelo. Tal é a razão pela qual ele precisa revisitar certas memórias que o atormentam desde muito tempo, tanto quanto a alguns outros escritores e médiuns.
Encontramos Ranieri junto com Verne num dos meus locais predilectos na cidade de Aruanda.1 Era um dos parques mais belos que já havia visto, repleto de flores e árvores de diversas cores e espécies, algumas das quais já extintas na Terra. Artistas caminhavam por ali, conversando sobre seus projectos para a próxima encarnação; grupos de espíritos bailavam sobre o local, deslizando sobre a atmosfera subtil da metrópole espiritual. O ar se mostrava deveras rarefeito, embora respirássemos sem dificuldade. Logo apareceu Lower, acompanhado dos dois guardiões citados. Em seguida, tomamos lugar numa nave pequena, envolta em potentes campos de força. Era o suficiente para nos conduzir em segurança até as regiões inóspitas que visitaríamos. Cumprimentei Lower e, enquanto conversávamos amenidades sobre o trabalho que eu desenvolvia com os encarnados, ele explicava:
— Durante muito tempo de minha vida, como você sabe, Ângelo, tive pesadelos intensos e recorrentes.
— Sim! Foi esse um dos motivos por que você me pediu, no passado, para participar da equipe de mais de 140 escritores, quase todos desencarnados, da qual faz parte hoje. Tanto os outros como você me escolheram como uma espécie de porta-voz e editor da turma.
— Isso mesmo. Porém, recentemente, pedi aos administradores da metrópole onde vivo para regressar ao ambiente que tanto me perseguiu ao longo dos anos, a respeito do qual me expressei em um dos meus contos. Foi a maneira como encontrei para me livrar das impressões de sonhos e pesadelos, tal como fizeram nossos amigos Vale Owen, W. Voltz e outros mais.2 Comigo, no entanto, o incómodo persiste, portanto, eu queria muito revisitar o lugar. É como se houvesse algo relacionado àquelas memórias e imagens, algo indecifrável, que não consigo elaborar. Durante anos evitei retornar ao local, pois temo que as lembranças estejam deturpadas pela minha interpretação. Então soube que outros espíritos, alguns escritores, têm visitado o tal ambiente por causa da mesma inquietação. Não sei se, no meu caso, o desconforto é ainda maior, mas…
— E quanto aos orientadores desencarnados? Eles não lhe deram nenhuma dica a respeito, quem sabe sobre o significado dessas imagens e paisagens? Hoje sei que não são fantasias suas, pois Pai João e eu estivemos lá, juntamente com Ranieri e a equipe de Jamar.3
— Claro! Eu mesmo dei as coordenadas a Júlio Verne e a um dos guardiões a fim de facilitar a localização da caverna. De todo modo, a única orientação que recebi foi procurar o pessoal aqui, de Aruanda, e verificar a possibilidade de voltar ao local, junto com o velho João Cobú, caso possa me auxiliar. Precisava contar com sua ajuda também, pois você mergulhou mais fundo nas questões relativas à espiritualidade e sabe bem como esse assunto sempre me soou difícil e incompreensível. Talvez seja realmente a hora de rever locais aonde fui, segundo vocês dizem, em desdobramento e que, mais tarde, retratei em meus escritos.
— Que, aliás, são muito tensos e intensos, não é verdade?
— Em demasia, na verdade, Ângelo. Foi esse um dos motivos que me levaram a me juntar ao grupo de escritores e pedir para que você, na medida do possível, revisitasse os temas abordados por mim e desse a visão espiritual, portanto, mais real dos acontecimentos, retirando o acréscimo fruto da minha interpretação, muito dramática e recheada de figuras de linguagem que descambaram para o horror.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:56 am

— Sabe o que concluí, Lower? Nenhum texto ficcional, seja romance, conto, novela ou outro género que se conceba, está de todo apartado de certas verdades. Creio sinceramente que você foi um médium; aliás, é um médium ainda deste lado da vida. Visitou, por meio de sonhos e do desdobramento, a realidade tal qual ela é. No entanto, como era um médium sem conhecimento de espiritualidade e nenhuma noção de espiritualismo, acabou dando sua própria interpretação aos fatos observados fora do corpo, sem qualquer pretensão além da ficção. Enfim, é um processo mais ou menos comum a toda criação artística.
“Quanto à nossa excursão, faremos o possível para lhe ajudar, até porque eu mesmo tenho muito a aprender com essas experiências. Pai João me convidou para revisitar determinado local, e agora sei do que se trata após conversar com você. O tempo que passei naquele ambiente, de fato, foi curto. Contudo, fico a imaginar o que o velho quer que eu entenda. De todo modo, as indicações que você nos deu foram essenciais para desvendarmos os mistérios envolvendo os donos do poder nas regiões sombrias do submundo. Sem sua contribuição, talvez restasse uma grande lacuna na história dos daimons.”
Lower se acomodou, pensativo, num dos assentos da nave dos guardiões, enquanto Pai João olhava para mim, dando a entender que eu devia deixar nosso amigo acordar naturalmente para a realidade dos fatos. A experiência nocturna vivida por ele no passado foi análoga à de outros escritores e alguns médiuns: mesmo local, mesmo contexto, ainda que em épocas diferentes. De qualquer modo, cada qual deve despertar para o contexto espiritual de tudo que o envolve no momento apropriado. Até mesmo eu ignorava que aquela nova visita aos lugares onde havíamos vivenciado certas histórias estaria associada a questões tão nevrálgicas e dramáticas no cenário internacional contemporâneo, notadamente no Brasil. À altura da partida, Pai João provavelmente já sabia muito mais do que deixava transparecer.
Enquanto deslizávamos pela atmosfera psíquica do planeta, adentrando domínios sombrios sob a tutela dos guardiões, Ranieri4 falou, ao passo que Verne permanecia em silêncio absoluto, como era do feitio dele.
— Como bem sabe, Ângelo, a maior parte de minha produção mediúnica foi realizada por meio do desdobramento, faculdade que Kardec chamou de sonambulismo.5 Visitava lugares e presenciava cenas na dimensão extrafísica, sob a condução de Verne, e, de volta à vigília, relatava as experiências em forma de texto. O que distingue dos seus escritos atuais, Ângelo, os livros produzidos por intermédio de minhas habilidades psíquicas são as figuras de linguagem que empreguei. Na minha época de encarnado, deparava com bastante rigidez mental do movimento espírita, que, de tão ortodoxo, incitou Verne a me recomendar tal estratégia. Depois de conversar longamente com Chico sobre minhas experiências fora do corpo, ele também me aconselhou a adoptar a linguagem figurada, pois avaliávamos que, na ocasião, o leitor espírita médio ainda não estava maduro o suficiente para encontrar descrições objectivas da realidade.
— De certa forma, Ranieri, você preparou o caminho para que, décadas mais tarde, eu pudesse escrever sobre os mesmos fatos com uma linguagem mais directa. Também devem ser consideradas as características distintas dos médiuns dos quais Verne e eu nos utilizamos. Um deles, você, estava muito comprometido com o movimento espírita, cujas convenções lhe cerceavam bastante. Tendo em vista a falta de abertura mental à época, a opção pela linguagem simbólica parece-me, sinceramente, ter sido a mais apropriada. No meu caso, escrevo em parceria com alguém que conseguiu romper com certo igrejismo vigente e que não se interessa por transitar no movimento ortodoxo, embora actue no âmbito do espiritismo, isto é, da filosofia espírita. Isso me favorece tremendamente, pois assim posso me exprimir de modo mais livre, sem me preocupar com o que poderiam dizer, pensar ou divulgar no meio espiritista.
— Sim, hoje noto isso com clareza. Ainda bem que podemos nos unir, tanto médiuns desencarnados e alguns encarnados como diversos escritores deste nosso mundo, para falar, sem rodeios, aos que se encontram na carne. Verne, pelo que sei, está estreando na psicografia também.
Olhei cismado para o antigo autor francês, acomodado a alguns metros de mim e de Ranieri, na expectativa de que ele desse algum sinal de vida, mas nada. Permanecia mergulhado em pensamentos e parecia mesmo alheio a nós. Talvez estivesse conversando, por via telepática, com o velho João Cobú; talvez… Quem sabe apenas não quisesse se envolver.
— Não se preocupe, meu caro — falou Ranieri. — Verne é assim mesmo, de poucas palavras e dado a meditações profundas.
— E por acaso não sei?!
Aproximamo-nos da região extrafísica que era nosso destino. Pai João sabia muito bem o que deveríamos observar. Os dois guardiões, Dmitri e Antero, permaneciam calados, sobretudo porque estavam em contacto ininterrupto com a equipe que ficara a cargo de vigiar o ambiente para o qual nos dirigíamos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:56 am

Desde nossa primeira visita, quando Lower nos informara acerca da localização da caverna ou do espaço dimensional onde se ocultava um dos senhores do abismo, Jamar destacara uma equipe de guardiões, em carácter permanente, incumbindo-a de montar equipamentos a fim de monitorar os estranhos fenómenos que ocorriam naquele lugar. Porém, eles não tinham resposta para tudo, muito pelo contrário. Faltava-lhes entender quais energias e equipamentos sustentavam aquele local, pois, com certeza, já há milénios era utilizado por um dos mais altos na hierarquia das sombras. No entanto, embora estivesse sob vigilância desde então, a área não era cercada, tampouco havia impedimento para que espíritos ali se apresentassem, desencarnados ou não. Tanto assim que, mesmo após ali comparecermos e desbaratarmos certos mistérios envolvendo o número 1 dos dragões, continuavam indo parar ali diversos médiuns, que acabavam por descrever o local de maneira análoga à forma como fizeram Lower e os que o precederam.
Era uma região inóspita. À medida que nos aproximávamos, cenas e imagens ligadas àquele local começavam a ser percebidas por todos nós. Havia algo ali que precisava ser desvendado oportunamente. Entretanto, aquele não era o momento adequado. Precisávamos descobrir outra coisa.
Ao desembarcarmos da pequena nave dos guardiões, percebemos que havia um contingente de mais de cinquenta entidades de prontidão no local, portando diversos armamentos eléctricos e de pulsos magnéticos. Porém, não tivemos muito tempo para observar os detalhes envolvendo aquela guarnição nem os artefactos montados por eles para estudar o local. Como se uma força poderosa agisse sobre nossos corpos espirituais, fomos imediatamente conduzidos para dentro da caverna, como se esta fosse uma espécie de apêndice energético, uma bolha dentro do espaço-tempo. Para minha surpresa — mas não de Pai João nem de Ranieri ou Verne —, ali estava a diabólica entidade novamente.
— Mas… — balbuciou Lower, enquanto eu me achava completamente incrédulo diante do que via.
— Como pode a entidade estar aqui, neste ambiente — indaguei —, passado tanto tempo desde que o visitamos, se os maiorais foram destituídos do poder, isto é, não gozam mais do prestígio e da influência de outrora? Todos sabemos que estão em prisões eternas nas regiões do abismo, aguardando o último juízo para que sejam expatriados. Não entendo…
Lower parecia entrar num estado mental incomum ao rever as cenas que o incomodaram durante anos, mesmo depois de tudo que escrevera a respeito. Pai João o acolheu, colocando o braço direito sobre seu ombro, acalmando-o.
A entidade parecia imponente como sempre. O ambiente, como outrora, apresentava a atmosfera carregada de partículas electromagnéticas incomuns. Acima de nós, não conseguia divisar o céu. Não sei se havia um céu naquela dimensão sombria. Havia alguma coisa leitosa no tecto, como se não fosse o tecto de uma caverna. Talvez por isso eu soubesse que a tal caverna, na realidade, era uma bolha energética incrustada em algum espaço dimensional.
Era apenas um céu diferente aquilo que víamos? A substância leitosa parecia ter vida própria, pois se mexia constantemente, movimentava-se, como se fossem nuvens inflando e se esvaziando, feitas de um material estranho a tudo o que era conhecido pelos homens da Terra. Depois de algum tempo lidando com esse tipo de ambiente, com a realidade de dimensões diferentes, eu ainda me impressionava.
Olhei atentamente e notei que Lower estava com as emoções à flor da pele. Não era para menos: como da primeira vez em que ali estive, o lugar permanecia deveras assustador. O amigo escritor, no entanto, vivia uma verdadeira catarse, como se eclodissem todas as sensações que sentira, de modo mais ou menos consciente, em seus pesadelos e tormentos recorrentes.
Eis que deparávamos com ele outra vez. Um ser ou um demónio, no verdadeiro sentido da palavra. Agora, porém, eu sabia se tratar de um ser advindo das estrelas, o que, na época do primeiro contacto, eu não suspeitava por mim mesmo. Alto, mas de uma palidez que eu nunca vira em ninguém. Esbanjava elegância, diferentemente da ideia que se faz de um demónio. De olhos vivos, trazia cabelos cor de fogo, que desciam como cobras em torno do corpo esguio, até abaixo dos joelhos, e denotavam vida própria. Os cabelos apresentavam alguma mudança, mas somente depois eu pude perceber a realidade do que ocorrera ao longo de tanto tempo desde que estivéramos ali juntamente com os guardiões. Algo se transformara radicalmente.
Uma bata cor de cobre envolvia aquele ser, que trazia na consciência, repercutindo, o grito de milhões e milhões de seres assassinados, tanto por ele quanto em decorrência de seus actos e decisões nos mundos por onde passara. Era um processo obsessivo em escala e magnitude sem precedentes que vivia a entidade maléfica, algo de proporções planetárias. Um manto roxo, ainda mais estranho, pendia ao longo do corpo, envolvendo toda a bata. Mas nada naquela indumentária tinha grande significado, pois vez ou outra tudo se modificava, as cores e também as formas, embora a compleição longilínea do ser se mantivesse inalterada.
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro Empty Re: O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:57 am

Aparentava ser um homem, porém de altura bem maior que o normal para os padrões humanos, e apenas sua postura depunha contra o aspecto, de resto, sóbrio e elegante. Caminhava lenta, quase penosamente, mirando-nos, de quando em vez, conquanto, ao mesmo tempo, tivesse o olhar muito distante, como se estivesse fora daquele ambiente. Noutro momento, a entidade estranha olhava para os lados, como se estudasse cada gesto, cada movimento seu antes mesmo de fazê-lo.
Pai João amparou Lower em seus braços, pois este ameaçava desmaiar. Verne aproximou-se, ainda silencioso por demais, observando a estranha aparição como se não fosse percebido por ela. Com efeito, havia algo muito estranho ali, bem diferente da primeira vez em que visitamos o local. Mas não saberia dizer o quê.
Sentimos todos uma força descomunal, única, a irradiar daquela figura; era algo como nunca havia sentido de ninguém.
De repente, adentraram o ambiente, ignorando-nos, dois outros seres que reverenciaram o primeiro. Mas ainda não foi isso o que me causou maior espanto. O primeiro ser, esguio, chegou próximo a algo que se assemelhava a um rio de fogo — o mesmo líquido viscoso que eu vira anteriormente e que Lower descrevera para nós, que obedecia a certa correnteza —, de dentro do qual eu ouvi saírem gemidos, prantos, xingamentos e outros sons incompreensíveis para mim.
Lower despertava do aparente desmaio e exclamou, quase se engasgando:
— A mesma visão que tive por anos a fio, da qual pensei haver me livrado! Os gemidos, os gritos de dor…
Pai João o amparou e disse-lhe:
— Calma, meu filho, calma. Vamos o socorrer!
Foi neste momento que Verne finalmente resolveu se manifestar:
— Nada disso aqui é real; tranquilizem-se.
Espantei-me efectivamente com a fala de Júlio Verne. Ele continuou:
— Estamos diante de uma projecção mental. A imagem do dragão e as demais cenas ficaram impregnadas na matéria escura da qual é feita essa bolha energética que todos percebem como sendo uma caverna.
“O que aparenta ser um rio de lavas é, na realidade, um composto orgânico que o ser utilizava para manter a própria forma, com a qual se apresentava perante aqueles com quem lidava, ainda que esta seja similar à da visão que Ranieri teve quando o trouxe por essas paragens…”
Os cabelos da estranha entidade pareciam ter vida própria, como da outra vez em que observei o mesmo cenário. Determinada música reverberava no ar; engolfava o ambiente em tempo integral, penetrando inevitavelmente em mim. Logo entendi por que, tanto para Lower quanto para alguns médiuns e escritores que ali estiveram, em processo de desdobramento, tudo remetia a uma espécie de inferno.
Verne prosseguiu, depois de receber um olhar significativo de Pai João, que permanecia amparando Lower:
— Vejam agora o que acontecerá — falou ele, olhando para mim, especialmente.
O ser estranho, de mundos distantes, começou a metamorfosear-se. Os cabelos diferentes, dotados de vida própria, converteram-se em tentáculos; o corpo contorceu-se por inteiro, até assumir o aspecto de um dragão, tal como descrito em filmes fantásticos e contos místicos.
Ranieri falou, impressionado:
— Foi o que eu vi, a mesma figura que descrevi em meus livros!
— Também conhecida como a besta do Apocalipse — acrescentou Verne.
— Exactamente… Figura já bastante conhecida de muitos escritores, é ícone do livro profético de João Evangelista.
— Reparem no que acontecerá com o que antes pareciam ser os cabelos da criatura — tornou Verne.
O dragão — agora, sim, o estranho ser manifestava-se plenamente como um dragão — exibia o couro cor de cobre e, em vez de cabelos, alguns tentáculos lhe saíam da cabeça, num quadro a um só tempo bizarro e sombrio.
— Observem as pontas dos tentáculos, observem… — indicou novamente o renomado ficcionista francês. Todos pusemo-nos a mirá-las. Havia cabeças, de proporção diminuta, todas com olhos, boca e dentes afiados, cujas feições igualmente se metamorfoseavam, adquirindo constantemente nova aparência. A criatura parecia ter inúmeras formas de se apresentar.
— Essa é uma figura comum a muitos escritos proféticos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:57 am

Enquanto Verne discorria, o dragão modificou-se outra vez e voltou a assumir o feitio da entidade esguia, porém, agora como uma medusa, com os tentáculos mexendo-se a partir de sua cabeça, em lugar das mechas que avistáramos antes. Tudo soava soturno, sombrio e sem sentido naquele momento; até Pai João tomar a palavra e dizer:
— Você, Ângelo, bem como Ranieri, Lower e outros escritores e médiuns, teve acesso a esta dimensão. Mas, como a verdade é feita à luz da aurora, ela vai brilhando pouco a pouco, até ser dia perfeito.6 Assim, é chegada a hora de você saber o significado da visão, e você, Lower, dos sonhos que teve. Notem as cabeças, seja da medusa, seja da entidade, seja do dragão. Todas as figuras representam a mesma realidade.
Fixamos as diversas cabeças pequenas e constatamos que proferiam palavrões, ignomínias e maldições; diziam coisas horrendas, cada uma por si, em contenda com as demais. Os tentáculos assustavam até mesmo os dois seres que haviam se achegado à estranha entidade.
— Cada cabeça dessas representa uma corrente política patrocinada pelo dragão no mundo. As imagens que vêem — falava o velho João Cobú — são apenas um reflexo do que estava na mente do daimon desde a época em que ele concebeu este lugar, com a tecnologia e a técnica que já detinha. Quando vocês vieram aqui, todos numa ocasião diferente, cada qual percebeu tão somente o que estava apto a perceber.
“Como dizia, essas cabeças simbolizam, meus filhos, diversas ideologias políticas vigentes ainda hoje, após metamorfoses mil, por meio das quais o projecto dos daimons permanece vivo na actualidade. Cada cabeça sintetiza uma forma de governo, uma ideologia programada ou patrocinada directamente pelas forças das trevas a fim de perpetuar o projecto de poder criminoso dos dragões mesmo depois que eles fossem sepultados magneticamente nas correntes eternas, para onde foram degredados.
“Representam, nesse contexto, o comunismo, o socialismo, o fascismo, o nazismo, o chavismo, o lulopetismo, o populismo, os extremismos à direita e à esquerda do espectro político; enfim, correspondem aos diversos meios de totalitarismo, de castração da liberdade, de exploração de todos os matizes, bem como de aviltamento moral e de corrupção em andamento no mundo. Todos esses fenómenos obedecem a uma programação feita pelos daimons, que, ao longo de anos, de séculos e milénios, instigaram uma pauta que visa embaralhar a mente dos que trabalham pelo progresso do mundo, a fim de impedir que o planeta Terra avance à nova fase de seu projecto espiritual. Os tentáculos são, na verdade, os filhos da besta, a semente do mal disfarçada de regimes de governo e de meios de governar; são o programa milenar dos dragões em plena acção no mundo, cada qual com uma máscara, um nome diferente, mas tendo na cabeça do dragão a origem comum.”
— Ou seja… — aventurei-me na tentativa de falar.
Entretanto, continuou Pai João:
— Todas essas facções, as quais disputam actualmente o poder no mundo, são subproduto do planeamento estratégico dos maiorais, que é administrado pelos chefes de legião, os espectros. Nas cenas que vimos, são representados pelas duas figuras que se achegaram ao daimon. Apenas mudam de nome, e, assim como o dragão ou maioral modifica sua aparência em conformidade com seus planos, esses projectos políticos de poder, até mesmo os que se mostram rivais entre si, tão somente se transformam, modificam-se, fundem-se. À primeira vista, são opositores, mas, quando se vêem em perigo, o sangue da besta e do dragão, que corre em suas veias, faz com que se unam e se fundam até. Aos olhos dos mortais, arrefecem as intrigas, mesclam-se as ideologias e os partidos se reconfiguram. Mas tudo, tudo serve ao teatro perpetrado pelos maiorais.
— Dessa forma — completou Júlio Verne —, viemos aqui para lhes esclarecer, pois foram todos avisados, em épocas diferentes, a respeito das mesmas coisas, das mesmas verdades. Além disso, podemos deduzir que, em regra, não há nenhuma ideologia política que mereça muito crédito. Em maior ou menor grau, todas as correntes estão contaminadas pelo mesmo sangue, têm o mesmo dna de concupiscência, a qual está entranhada em todo lugar. Com efeito, há muitos homens de bem que tombam e se deixam levar por visões políticas e de mundo que têm nos daimons sua génese.
— É como diz o famoso texto bíblico, meus filhos: “Porque surgirão falsos cristos e falsos profetas, e farão tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora, enganariam até os escolhidos”7 — citou Pai João.
Desta vez fui eu que me senti abalado, profundamente abalado. Lower me abraçou; recobrava a lucidez após tanto tempo incomodado com as imagens que vira durante anos a fio, no corpo e fora dele.
Depois da visão do ser estranho e das explicações dadas por João Cobú e Verne, voltamos a observar o entorno, agora sob outra perspectiva.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:57 am

O ser muito esguio, de braços longos, também elegantes, mas não tão magros, lavava seu rosto no caudaloso rio de fogo, enquanto o líquido escorria pelas suas mãos. Imunizava-se, ao que tudo indicava, no intuito de evitar a perda da forma astral, a regressão da feição até certo ponto humana, tal como acontecera com colegas e partidários do sistema de poder que representava. Enfim, eu o via como verdadeiramente era: uma espécie de demónio escondido na aparência de um ser humano, embora diferente dos seres humanos da Terra.
Pude notar quando aqueles dois seres que entraram no ambiente em determinado momento voltaram-se para nós. Percebi, então, que não estavam no ambiente, mas que aquilo tudo era reflexo das formas mentais, das formas-pensamento do ser do espaço, que ficaram impregnadas no ambiente, na matéria escura da qual tudo ali era composto. Os dentes dos dois espectros eram pontiagudos, e sua face exibia uma crueldade desmedida, diferentemente do ser esguio, que chamei de demónio extraterrestre. Senti que eles também não eram terráqueos, mas isso pouco importa, já que estão circunscritos ao nosso planeta até que recebam o decreto do Alto, por ordem de Miguel, para que sejam expatriados.
Tão logo assim pensei, a entidade esboçou um sorriso irónico em minha direcção. Concluí que, ao se envolverem com questões de ordem política, defendendo que lado for, os homens penetram questões de ordem espiritual de seriíssimas implicações. Uma vez que estamos todos numa guerra espiritual de grandes proporções, é essencial não perdermos de vista que o lado onde militamos não é o da política partidária de nenhum homem, mas é o lado de Cristo, o representante da política divina do “amai-vos uns aos outros”.8
Afinal de contas, soube naquele instante o que deveria fazer: era imperativo retomar as obras que abordavam as relações entre política — a política dos dois lados da vida — e realidade espiritual, que por tudo perpassa e em tudo subsiste.

E, quanto aos dez chifres, daquele mesmo reino se levantarão dez reis; e depois deles se levantará outro, o qual será diferente dos primeiros, e abaterá a três reis.
DANIEL 7:24

“Todo reino dividido contra si mesmo será arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá. Se Satanás expulsa Satanás, está dividido contra si mesmo. Como, então, subsistirá seu reino?”
MATEUS 12:25-26
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:57 am

Capítulo 2 – A Horda
Tudo parecia convergir para aquela cidade. Poderia muito bem ser São Paulo, Rio de Janeiro ou alguma capital do Nordeste. Mas não! Era um lugar ainda mais especial. Chegara até a ser profetizado por Dom Bosco, segundo reza a tradição. O sacerdote italiano teria visto, no século XIX, um anjo apontar a região como centro de muita riqueza, como a “terra prometida” na nova pátria. Ao redor, havia outros redutos chamados cidades-satélite, importantes no contexto em que foram criados e cuja vida girava em torno da capital federal. De uma delas, dava para ver os acontecimentos ao longe. Na verdade, mesmo de outros estados notava-se que algo incomum se passava na esfera extrafísica de Brasília.
Um burburinho de gente, de pessoas que disputavam o poder, parecia se avolumar cada vez mais na cidade, na dimensão humana, física, arena onde as batalhas eram travadas, conforme costumavam julgar observadores igualmente humanos. Grande parte deles nem suspeitava de que aqueles indivíduos eram apenas médiuns, marionetes de outros seres sombrios, os quais digladiavam pelo poder não somente no Brasil, mas em regiões mais abrangentes, visando ao futuro próximo, quando pretendiam alastrar seu regime nefasto para muito além do continente. Aliás, só não o dominavam por completo no momento, tal como outros quadrantes do globo, porque ruíra todo o sistema de poder absolutista dos soberanos das sombras nas regiões espirituais da maldade.1 Entre os homens, os encarnados, havia aqueles que resistiam, os representantes do Cordeiro, com destaque para aqueles que nem de longe imaginavam ser seus agentes, pois que não eram religiosos — aliás, a maioria destes não admitia como fato concreto a batalha espiritual que estava em pleno curso nos bastidores da vida.
Após os episódios nos quais a intervenção dos guardiões fora necessária, a fim de restabelecer o equilíbrio da balança de poder, novos acontecimentos vinham à tona.
— Este é o melhor momento vivido pela nação, meu caro Watab — declarou Jamar, observando nas cercanias o movimento que ia em direcção a Brasília.
— Por certo nossos representantes no mundo dos encarnados não estão tão optimistas quanto você, amigo.
— Não mesmo. Mas você há de concordar que este país atravessa um momento muito peculiar e, ao mesmo tempo, muito promissor. Jamais se soube tanto a respeito da estrutura de poder sustentada pela corrupção. Na verdade, aos olhos das pessoas que nunca haviam se envolvido nas questões políticas do país, é como se todo este movimento de combate aos corruptos — e, no caso mais grave, aos que usam a corrupção como trampolim para atingir fins bem mais pertinazes — tivesse se iniciado apenas há alguns poucos anos. Mas sabemos que não. O que vêem agora é o desfecho de uma história que, há bastante tempo, vem sendo encenada nos bastidores da vida política nacional e que finalmente emerge das sombras onde se ocultava. Neste momento, vêm à tona toda a lama e a sujeira escondidas por anos a fio. Por isso mesmo, meu amigo, é que digo que esta é uma das ocasiões mais promissoras da história do Brasil.
“Considere que, até então, quase nada se conhecia a respeito de toda essa rede de corrupção, intriga, compra de apoio e votos, propina institucionalizada e crime organizado. Já não é mais assim. Tudo há de vir a lume; toda a podridão será desmascarada. Tal fato é um progresso que não se pode desprezar, pois, em passado recente, havia podridão similar, porém mascarada. Na altura, a população elegia seus representantes sem saber realmente quem eram e o que faziam às escondidas. Ao menos agora, Watab, caso continuem escolhendo indivíduos corrompidos e francamente comprometidos com interesses espúrios será porque endossam semelhante atitude e, assim, tornam-se cúmplices; não podem mais alegar inocência ou ignorância, tampouco se queixar de terem sido enganados.”
— Ou seja, Jamar, vivemos uma época em que cada um é compelido a tomar conhecimento do que está em curso e a decidir, conscientemente, a quem dará seu aval.
— Isso não quer dizer que as coisas tendem a melhorar, por ora, tendo em vista o que se vê nos porões da política e nos bastidores da vida. Entretanto, no mundo inteiro situações semelhantes são enfrentadas e têm sido processadas. Vem à superfície tudo aquilo que antes permanecia escondido. É a limpeza, a faxina que está em pleno andamento na casa planetária. Daqui a pouco, a poeira abaixa, e enfim veremos quem é quem — inclusive quem nunca mais retornará ao palco das lutas neste orbe.
— Reurbanização, juízo e limpeza da estrutura extrafísica do planeta.
— É claro… — ponderou Jamar, um tanto quanto pensativo. — Bastante preocupante é o fato de que muitos que se dizem do bem ainda não acordaram para a condição em que se encontram: a de plena guerra espiritual, e não em meio a um romance ou a um drama no palco do mundo. Nos bastidores da vida, forças espirituais se posicionam e se entrincheiram.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:57 am

Isso é grave, meu caro, pois que a maioria dos religiosos e dos apologistas do Evangelho se limita a pensar de forma estanque, convencida de que as questões que mobilizam os noticiários e a sociedade se restringem à esfera política, esquecendo-se do célebre pensamento de um ilustre espírito que, a certa altura, assevera aos homens: “frequentemente são eles [os espíritos] que vos dirigem”.2
Era um fim de semana, um domingo, e talvez ninguém no mundo dos encarnados tivesse visto os acontecimentos. Também era possível que poucos esperassem que algo diferente ocorresse, pois muita gente acreditava que, uma vez afastados Ella e seus representantes mais próximos do governo, as coisas melhorariam instantaneamente. Ledo engano. A raiz da maldade e da concupiscência se alastrara nas mais variadas direcções. Uma das cabeças da hidra de Lerna3 fora abatida, mas novas surgiam, e seus tentáculos haviam se espalhado de tal maneira que dificilmente restava quem não tivesse sido tocado. Luta árdua, longa e intensa devia ser travada antes que as coisas voltassem à aparente normalidade.
O movimento estranho vinha de longe. Podia-se notá-lo desde a torre mais alta ou, quem sabe, desde a catedral mais conhecida e famosa de Brasília. Havia um alvoroço, um rebuliço que produzia um som confuso, talvez fruto de uma algaravia que, se os humanos mortais tivessem ouvido, jamais compreenderiam. Algo similar ao adejar de morcegos ou de algum animal pré-histórico pôde ser ouvido sem exigir grande atenção. Em meio a tudo, guinchos agudos ao extremo ouviam-se na dimensão extrafísica da cidade. Mal os embates dos últimos lances no Congresso Nacional terminaram, aproximaram-se outros seres. Quem sabe a qual estirpe pertenciam?
Espíritos comuns e certos mentores de núcleos espiritualistas, bem como guardiões e guardiãs, perceberam com total nitidez o brado sinistro na forma de um som doloroso, lacrimoso, que penetrava o lugar e reverberava nos prédios abaixo. Soava como um estrépito abafado, e os seres do qual provinha escondiam-se ou confundiam-se em meio a brumas trevosas e sombrias de um mundo que, além de bizarro, era inimaginável aos homens da terra de Santa Cruz. Moviam-se aquelas criaturas acima dos prédios; iam e vinham como que em busca de algo, alguém ou determinado grupo de homens. Certo número delas espalhara-se pela região hoteleira, e outras encaminhavam-se, provavelmente, para residências oficiais de representantes do governo. Grupos menores de espíritos, parecendo arruaceiros, partiam em diversas direcções à procura de presas até então ignoradas.
Jamar e Watab levantaram-se em meio aos fluidos densos da atmosfera psíquica que pairava sombria sobre o lugar e se atiraram rumo ao bando maior, apenas para deixar claro que os guardiões não abandonaram seus postos e estavam atentos a tudo. Não era uma convocação para o confronto. Quando os primeiros seres avistaram a aura dos guardiões, emitiram um sibilo lamentoso, alguns gritos sub-humanos que ecoaram na atmosfera astral da cidade. Os sentinelas superiores deram-se as mãos e rodopiaram acima do Planalto Central, com suas espadas chamejantes, deixando propositadamente seu rastro magnético para que fosse notado pelas entidades vis. O burburinho dos seres maléficos irradiou-se por aquelas paragens assim que perceberam os dois agentes do Alto envoltos numa luz iridescente, como se fossem dois cometas gémeos movendo-se numa coreografia afinada, um ao lado do outro. De repente, era como se houvessem se fundido e se tornado uma bola de luz que flamejava através das dimensões mais próximas, deixando antever-se o rasgo dimensional por meio do qual se vislumbravam as estrelas distantes de um universo paralelo.
Tudo foi percebido pelas entidades que se aproximavam da capital federal em apenas um átimo, alguns segundos somente, pois não conseguiam suportar o rebrilhar da aura dos representantes de Miguel, que não intentaram esconder ou amortizar-lhe o brilho. Era um sinal que advertia as sombras perversas quanto à presença de uma base daqueles que zelavam pela justiça divina nas imediações. Reafirmavam, assim, às entidades barulhentas, fosse qual fosse a estirpe ou o grau alcançado na hierarquia das trevas, que seus actos não passariam impunes indefinidamente. Movendo-se na velocidade de um raio, a dupla rasgou as fileiras dos artífices da maldade, deixando-os amedrontados. Não obstante, reagruparam-se após perceberem que os emissários da justiça, aparentemente, haviam se retirado.
Brasília viu-se invadida por espíritos maléficos, pois para ali rumaram atraídos pelas vibrações e pela sintonia daqueles que, investidos do poder público ou do mandato popular, chamaram-nos mediante sua disposição mental e emocional, reforçada por actos repreensíveis, quando não inomináveis.
Em paralelo, a capital federal subitamente se encheu de sentinelas, guardiões e recrutas, que respondiam ao chamado de seu comandante. As entidades funestas que invadiam a cidade perceberam que, realmente, não estavam sozinhas. Os guardiões não atacaram em nenhum momento, mas tornaram patente a atenção devotada ao que se passava, muito embora não pudessem interferir de maneira intensa sem que houvesse meios para tal.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:58 am

Como sempre, dependiam da vontade dos homens e de suas deliberações, pois que actuavam em consonância com seu livre-arbítrio.
À primeira vista, os bandos de entidades dispersavam-se pela cidade sem haver um plano muito elaborado. No entanto, era apenas medo da investida dos guardiões. Os líderes sombrios, porém, sobretudo chefes e subchefes, permaneciam a postos, tremendo e xingando, tomados de ira, pois não esperavam que ainda restassem sentinelas de prontidão, uma vez transcorridos os acontecimentos à época do impeachment.4
As tropas de mercenários reagruparam-se em seguida, tão logo escutaram o som ensurdecedor de um instrumento que lembrava uma trombeta improvisada. Um ser esquálido, uma espécie de demoniozinho que mais parecia um réptil, foi quem primeiro se mostrou, jogando-se ou sendo jogado à frente dos guardiões, os quais, entendendo a provocação, deixaram-no livre, sem corresponder à afronta pueril. O sujeito, cuja forma espiritual medonha dava mostras de afectar-lhe a capacidade de se locomover sozinho nos fluidos ambientes, cambaleava ou ziguezagueava de um lado para outro, esbarrando-se ora num, ora noutro espírito de sua horda, sendo atiçado de um lado para outro pelos próprios correligionários. Era um infeliz usado pelos comandos da elite das sombras. Um lacaio apenas, e não um ser propriamente do mal. Pernas compridas, desmesuradamente compridas, e braços esqueléticos conferiam-lhe o aspecto de uma espécie de lagartixa alada. Movimentava rapidamente os membros nos fluidos ambientes, como se nadasse ou se se debatesse em meio aquoso. Emitia grunhidos e fazia esgares, de modo que os demais de sua trupe riam-se e debochavam dele, pois bem sabiam que ele servia tão somente para distrair os representantes do Cordeiro, muito embora esse tipo de distracção não surtisse o efeito desejado com os guardiões — que conheciam muito bem as artimanhas do inimigo. A entidade infeliz estava aflita, em franco desespero. Berrava inutilmente enquanto era atirada de um lugar para outro como uma bola de futebol por jogadores.
Nesse momento, advindas das profundezas, dos buracos do abismo e sob o comando de forças da maldade que se encastelavam em bases situadas na sub-crosta, dezenas de criaturas bizarras eram expelidas pela terra. Dos bueiros da cidade, das fendas do solo, dos lugares usados para reuniões políticas espúrias, horripilantes criaturas subiam à tona, como que impulsionadas pelos sentimentos e pelas atitudes mais vis dos que as chamavam por afinidade vibratória. Cerca de trinta ou quarenta entidades virulentas emergiam do solo, como se viessem de um mundo localizado em galerias e poços profundos. Assim que apareciam na superfície, saíam correndo, fugindo do brilho das espadas chamejantes dos guardiões, que elas avistavam ao longe. Iam como um bando de bichos do mato, que partiam em debandada, porém se abrigavam em gabinetes da administração federal, de parlamentares e de outras autoridades.
Mas se enganaria quem pensasse que erraram o alvo. Apesar da forma atabalhoada, da algazarra aparente, havia planeamento no trajecto que faziam. Tudo indicava que foram treinados para assim agir em caso de urgência ou de manifestação dos guardiões superiores. Os alvos da turba eram conhecidos por cada uma daquelas entidades e haviam sido previamente assinalados. Os chefes da Horda, afinal, sabiam precisamente o que queriam, assim como não ignoravam os embates da trupe anterior com os guardiões, pois foram informados por seus observadores. Por essa razão, queriam evitar a todo custo o combate corpo a corpo. Afinal, não alimentavam ilusões quanto à derrota que sofreriam num confronto do género.
A alta cúpula dos vândalos espirituais e da organização criminosa que actuavam em Brasília e em diversos estados do país consistia de cientistas políticos desencarnados, de mestres da hipnose colectiva, bem como de magos que dominavam o pensamento e conheciam técnicas eficazes de intrusão mental. Além de especialistas de características variadas, seu cortejo também contava com espíritos usados para distrair os opositores — os que se denominavam filhos do Cordeiro —, entre outros criminosos do bando, alguns dos quais encarnados. Em desdobramento, estes últimos serviam abertamente a seus senhores; quando em vigília, vestiam togas e trajes sofisticados e ocupavam posições de destaque nos círculos empresarial, industrial e do poder. Em caso contrário, eram indivíduos ligados ao narcotráfico, corruptos e corruptores de toda espécie, além de guerrilheiros disfarçados de líderes sindicais e de movimentos ditos sociais. Em comum, todos tinham a engrenagem em que se embrenhavam — ganhar dinheiro, dominar e obter o máximo de poder —, de modo que eles próprios não se davam conta de que eram parte de uma teia de manipulação mental e emocional da qual não cogitavam escapar.
Os líderes sindicais, especialmente, dispunham-se a tudo, até mesmo a afundar o país se preciso fosse, desde que mantivessem os privilégios de que usufruíam, na medida em que se alimentavam como vampiros da própria gente que alegavam defender.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:58 am

Esta, por sua vez, deixara-se hipnotizar por seus algozes e não se importava em ser vampirizada; uma vez que abdicara do direito de pensar por si mesma, constituíra-se em marionete na mão de manipuladores de ambos os lados da vida.
Enquanto, nos bastidores da vida, desenhava-se uma nova batalha espiritual, no plano físico a quadrilha representada por certos empresários, homens de poder, políticos e seus laranjas conjugava-se em novos arranjos. Aliados à corja, homens parasitas, espalhados pelas diversas classes sociais, empregavam recursos espúrios para induzir os mais ignorantes a pensarem que estavam defendendo direitos populares, enquanto, na verdade, aplicavam tais tácticas de guerrilha apenas para servir aos anseios de seus manipuladores. Eram auxiliados por mercenários de largo espectro político-partidário, que se deixaram contaminar pelo veneno da corrupção ou a ela se entregaram de forma obstinada, vislumbrando o projecto criminoso de poder que os guiava.
Todo esse elenco constituía o exército dos famigerados seres da Horda, das sombrias legiões do crime e da maldade. Isso sem contar os pseudo-intelectuais e um sem-número de educadores, professores e alunos de escolas e universidades que, sem suspeitarem da realidade espiritual por trás da maldade daquelas criaturas, faziam parte da refinada estratégia levada a cabo pelos dirigentes das dimensões ocultas. Assim, a Horda buscava aprofundar seu domínio em Brasília, em Caracas, em Havana e em outros centros visados pelas hostes da maldade nos lugares espirituais.5
De um lado, a súcia pairava sobre a capital federal. Desde paragens distantes vibratoriamente, vinham tal como se fossem pássaros negros, morcegos encobertos por uma fuligem, uma fumaça virulenta e tóxica, a se espalharem pelas margens do Lago Paranoá, notadamente no Plano Piloto, de maneira a penetrar diversos sectores da administração pública e de algumas embaixadas ali estabelecidas. De outro lado, havia postos avançados das esferas sublimes naquelas imediações. Ali existiam agentes das falanges da justiça, também encarnados. Pequenos grupos reuniam-se para acção e oração e, assim, estabeleciam sintonia com os guardiões superiores. As sombras não poderiam menosprezar os filhos do Cordeiro de diversas denominações, os quais se irmanam em oração, e outros colaboradores mais, que conheciam técnicas eficazes e agiam no intuito de ajudar os guardiões no estabelecimento de uma base avançada naquelas paragens.
Aproveitando a energia telúrica emanada de minerais para alimentar baterias de magnetismo e criações mentais inferiores, magos negros fixaram base logo abaixo da superfície. A pauta era a acção dos representantes de Miguel.
— É necessário ficarmos mais atentos quanto aos miseráveis que se intitulam guardiões — falou um dos seres, que se mostrava envolto em um manto de escuridão, arrastando uma toga preta pelos corredores aparentemente sem fim de uma base localizada, vibratoriamente, abaixo do Plano Piloto.
— Há bem pouco tempo, eles venceram nossos enviados, que intentavam actuar no Congresso Nacional. Agora, que se aproximam outra facção de poder e seus emissários, os sentinelas da justiça resolveram mostrar suas garras. É prudente alertar os donos da Horda contra o perigo que significa enfrentar soldados da abominação. Afinal, parece sábio nos unirmos à facção recém-chegada, pois acredito que planeja o mesmo que nós.
A acção dos guardiões sobre a cidade de Brasília deixou os magos em alvoroço. Pareciam tempos difíceis para estes, embora pudessem sempre contar com seus manipulados encarnados, dentro e fora do governo. Era-lhes claro que não seria fácil o próximo lance da batalha.
— Por outro lado, convém ter cuidado com os espíritos da Horda, pois eles querem conquistar o poder aqui tanto quanto nós.
— Sim, é claro. No entanto, quem sabe possamos nos unir temporariamente, uma vez que temos o mesmo propósito? Depois que obtivermos a vitória sobre os arautos da justiça, decidiremos entre nós quem dominará, se nós ou a Horda.
Apesar do pavor que tomava conta dos magos, ao notarem a proximidade e as actividades dos guardiões, esboçaram uma gargalhada forçada, nervosa, na ânsia de projectarem segurança. Não convenciam nem a si mesmos, porém. O silêncio imperou outra vez entre eles. Um especialista entre os magos retomou o discurso após alguns instantes:
— Percebam, senhores da escuridão, que os espíritos da Horda são outras entidades, pois nossos instrumentos não se enganam. Medi sua vibração e estou certo de que são seres muito mais belicosos que os anteriores derrotados pelos guardiões. Detêm especialistas mais competentes em sua ordem. Convém ponderar se devemos nos aliar a eles agora ou, então, esperar o momento ideal.
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro Empty Re: O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 11:58 am

— E qual seria esse momento ideal, miserável das trevas? Qual? Pois não é agora que nossos planos têm sido descobertos? Não é agora que agem os guardiões, os agentes da justiça, encarnados e desencarnados, para desmascarar nossos representantes entre os homens? Não creio que possamos esperar por mais tempo.
Todos pensaram na veracidade das palavras do mago mais experiente entre eles. Estavam até certo ponto alvoroçados, pois entendiam que os membros da Horda eram substitutos dos que pereceram diante dos guardiões e reuniam mais perícia do que os subjugados naquela batalha. Entretanto, nem mesmo os magos conheciam quais estratégias seriam usadas pela nova facção para alcançar o domínio, tampouco quais armas e recursos detinham.
Para encerrar com suas palavras o pensamento de todos ali, asseverou o mago da mente, o velho Egbá:
— Em geral, os que chegam para substituir os que foram vencidos são mais vorazes e perigosos do que os primeiros. Sempre é assim — falou, suspirando. — Quem sucede aos que falharam na missão anterior costuma ser pior e mais competente.
Assim que chegaram ao local onde se encontravam seus aparelhos de comunicação com as outras dezasseis bases dos magos, accionaram os dispositivos e convocaram os representantes de cada um dos covis onde se enjaulavam as perigosas entidades, de onde articulavam processos obsessivos mais complexos que acometiam políticos e autoridades de toda sorte.
— Atenção, atenção, todos os senhores da escuridão! Emergência, emergência!
Um a um manifestou-se, cada qual a partir de sua base no subsolo da capital, todas arraigadas entre as rochas da sub-crosta, em cavernas e antros, de onde partiam com seus comandos. Quando todos responderam, a entidade maligna falou, conclamando todos:
— Precisamos desenvolver uma acção conjunta urgentemente. Todos sabem dos últimos eventos que os guardiões patrocinaram. Nossos representantes na Terra, tanto neste país quanto em outros da América Latina e do Caribe, têm sido revelados um a um. É um efeito dominó. Cada um que é desmascarado entrega um ou mais correligionários, e assim por diante. Dispomos de poucos trunfos na manga.
Fez-se silêncio por alguns minutos. Logo após, Egbá tomou a palavra e falou:
— Aproximou-se uma tal Horda, um grupo de especialistas das trevas mais profundas. Os guardiões a detectaram antes de nós. Os infelizes representantes da justiça divina congregam-se sob os céus de Brasília. Em paralelo a essa reunião, nossos instrumentos detectaram que os vermes rastejantes enviados pelos donos da Horda se espalharam por diversos departamentos públicos e também por casas, residências oficiais, hotéis e outros redutos onde habitam os homens que nos interessam. De certa maneira, esses espíritos abjectos, esses demoniozinhos insignificantes servem aos nossos propósitos, porém, não sabemos que programa foi inserido na mente deles, nem o que são capazes de fazer.
“Entretanto, eis o mais urgente e importante: caso os donos da Horda dominem, alcancem seu intento, perderemos nosso poder. Então, está em jogo não apenas nosso mando sobre os representantes em Brasília, Caracas, Havana e outras cidades cruciais para nossos planos, mas, sobretudo, nossa soberania nas regiões espirituais da maldade. Enquanto os homens encarnados nem suspeitam do que ocorre entre nós, os ditadores do abismo e donos do poder, compreendemos que a vitória não será assim tão fácil.
“Em suma, precisamos nos reunir urgentemente. Eis que convoco o poder mais ínfero do mundo para que deliberemos o mais rapidamente possível. Recomendo uma conferência com todos os representantes, vós, os mais miseráveis e malignos senhores da escuridão.”
Em silêncio absoluto, as entidades das trevas enviaram seu consentimento mental para Egbá e marcaram a conferência emergencial, na qual seriam tratados assuntos urgentes quanto ao processo obsessivo geral e complexo em andamento. As entidades das trevas lidavam com outra configuração de poder, que, aparentemente, viera para conduzir a acção concernente aos personagens reunidos em Brasília e em diversas cidades do continente.

“Porque aos seus anjos dará ordens a teu respeito, para te guardarem em todos os teus caminhos.”
SALMOS 91:11
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro Empty Re: O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:41 pm

Capítulo 3 – Mensageiro da justiça
Próximo ao topo da Torre de TV, a 240m de altura, no centro do Eixo Monumental, ao fim do qual se divisava o Congresso Nacional, em Brasília, pairavam Watab, Kiev, Dmitri, Semíramis e Astrid, observando em todas as direcções possíveis. Examinavam, com especial cautela, as dimensões próximas à Crosta, para que quaisquer eventualidades não os pegassem de surpresa. Atentos à Horda misteriosa que se aproximara da capital, os guardiões lhe deixaram bem claro que havia ali um contingente de sentinelas da justiça divina que não poderia ser menosprezado. Preocupada com a situação, Semíramis falava aos amigos:
— Fico sempre a imaginar qual é a causa real dos problemas enfrentados por este país. Não vivi aqui em nenhuma de minhas vidas, mas me afeiçoei deste povo e desta terra por tudo de belo e de bom que noto aqui. Para além das belezas e das riquezas naturais extraordinárias, vê-se um povo acolhedor, dotado de uma força descomunal para produzir. Porém, permeia isso tudo o nó da corrupção, do levar vantagem às custas do próximo, do jeitinho de se burlar o que é certo; trata-se de um fenómeno social que mina o programa para que o Brasil se estabeleça como o celeiro do mundo. Fico intrigada quanto ao destino desta gente e desta nação.
Watab fitou a amiga guardiã e pensou na dedicação das amazonas do astral ao trabalho, na alma que colocam em tudo que fazem, motivadas simplesmente pela chance de colaborar com a causa da humanidade. Tendo isso em mente, o guardião da noite comentou, não sem antes fazer a ressalva de que exprimiria um ponto de vista pessoal:
— Essa é uma questão, Semíramis, que remonta a séculos, à ocasião da chegada dos europeus a esta terra abençoada e mesmo antes disso. Primeiramente, devemos considerar a causa espiritual, já que situações complexas desenvolvidas em solo europeu foram transferidas para a nova terra junto com seus protagonistas dos dois lados da vida. A Europa é um continente onde a civilização floresceu há mais tempo em relação à América, portanto, era um palco de lutas mais antigas, tanto quanto mais complexas nos dois planos da vida. Os elementos advindos do Velho Mundo, por essa razão, tiveram preponderância sobre o panorama espiritual da nova terra, uma vez que os espíritos de procedência europeia para cá trouxeram incontáveis dramas, vícios, intrigas, isto é, o fruto de processos obsessivos históricos. A partir dessa visão, podemos entender como se materializou no Novo Mundo, nesta pátria em particular, um sistema de administração e de governo que se caracterizou pela irresponsabilidade e pelo compadrio, acompanhado da falta de demarcação clara entre público e privado.
“Trata-se de uma situação que reflecte, também, o que se passava com as levas de espíritos em constante turbulência e as facções de poder nas regiões inferiores, que disputavam o novo território, pois os líderes sombrios já sabiam muito bem da destinação do continente e do país no que concerne às ideias cristãs.
“Assim, mesmo que, em meio a tudo a que assistimos na actualidade, alguém pense que a América não é o terreno ideal para o florescimento de uma nova humanidade e das sementes do Evangelho, como código cósmico, a meu ver, é justamente este o território ideal — e a nação brasileira desempenha um papel central nesse contexto. Em que outro lugar deve ser plantada a semente de uma nova era senão em meio ao estrume da corrupção, que existe em todos os quadrantes do planeta, mas aqui se evidencia de modo tão escancarado? Precisamente em meio aos mais renitentes pecadores, aos mais assoberbados criminosos do passado, revestidos de nova roupagem por intermédio da reencarnação, é onde mais se faz necessária uma releitura do Evangelho ou da política cósmica do Cordeiro. ‘Os sãos não necessitam de médico, mas, sim, os que estão doentes; eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores ao arrependimento’:1 onde essas palavras ganhariam mais sentido? Ora, justamente onde há carência de intenso investimento nas sementeiras do bem e da verdade. Além do mais, em terras brasileiras se reuniram, apesar das características corruptíveis, seres que já tiveram largo contacto com as ideias e os valores cristãos em encarnações passadas, na velha Europa.
“Desde a chegada dos primeiros europeus ao continente e ao país, quando as falanges de espíritos derrotados espiritualmente vieram para cá, encarnados ou não, o sistema falido dos seres da escuridão — a política dos daimons — incumbiu-se de agir. Aproveitando-se das características corruptíveis dos espíritos e das pessoas exiladas, bem como dos que aqui aportaram aparentemente por vontade própria, as sombras inspiraram, desde os primórdios, a implantação de um sistema que se caracteriza pelo favorecimento de amigos e familiares, com interesses pessoais prevalecendo largamente sobre os interesses da população e da nação. Habitualmente, essa prática até poderia parecer restrita aos encarnados. Todavia, o que acontecia entre os homens àquela época era tão somente o reflexo das políticas sombrias traçadas no plano extra-físico, sob o comando dos emissários dos dragões.
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro Empty Re: O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:42 pm

“Naquela altura, os chefes de legião haviam dividido o mundo em dez territórios, disputados acirradamente entre eles. Então, os representantes das trevas mais densas escolheram, a partir de estudos minuciosos, os alvos aos quais dirigiriam maior poder de fogo. Por meio da ciência das sombras e, principalmente, devido à indicação de antigos magos que tinham grande cobiça pela terra de Santa Cruz, eles rastrearam onde havia maior concentração de energia — os chacras desta terra —, e, desde séculos atrás, maltas das mais especializadas instalaram-se nas regiões astrais correspondentes a cidades como Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e até a cronologicamente longínqua Brasília, entre outros locais. As observações indicaram que naqueles ambientes havia maior probabilidade de erguerem-se centros importantes na vida da nova colónia e, futuramente, da nação. Distribuíram os territórios extra-físicos correspondentes entre as facções que detinham maior afinidade vibratória entre si, verdadeiras famílias cármicas dotadas de espíritos especializados em corrupções morais de toda sorte. A partilha, contudo, deu-se de forma ligeiramente diferente daquela que os homens costumam adoptar no plano físico, pois a fizeram visando a séculos vindouros, e não somente a alguns anos adiante, como é natural aos encarnados.
“Certo é que o modelo dos artífices das sombras, conforme agiam no plano extra-físico, só vingou e se reproduziu ano após ano, século após século porque os homens que aqui viveram — e os que hoje vivem — responderam com vontades e acções à inspiração dos que, do outro lado do véu que separa as dimensões, manipulam os acontecimentos. Foi assim que, com o passar do tempo, a situação de correspondência vibratória entre os espíritos das regiões ínferas e os indivíduos que exercem o poder tornou-se o mal que assola esta nação, além de se constituir num processo complexo de obsessão em nível nacional. Isso tudo sem nos reportarmos a outros países deste hemisfério, cujo quadro não é assim tão diverso do que vemos no Brasil.”
— Podemos realmente pensar num processo obsessivo, Watab? Não corremos o risco de ser extremistas em nossa forma de pensar a respeito dos problemas graves que o povo enfrenta? — perguntou Astrid, interessada no assunto.
— Obsessão, sim, minha cara. E das mais complexas, pois que a raiz do mal está alastrada em diversos departamentos da vida nacional, abrangendo desde empresários e representantes de classe até os ocupantes de cargos públicos, tais como parlamentares, governadores, prefeitos, magistrados, secretários, ministros e presidentes, entre tantos outros. O próprio povo também está envolvido, já que, em grande medida, mostra-se muito mais atento ao benefício de que usufruirá do que às implicações de suas atitudes para toda a gente ao longo dos anos vindouros nesse processo arraigado de corrupção. Como esse tipo de comportamento definitivamente não é inspirado por espíritos superiores, o há de ser por que categoria?
“Miremos o horizonte, minha cara, e perceberemos que aquela turba de espíritos da Horda só vem para cá porque é atraída pelos pensamentos e pelas acções dos indivíduos que exercem as posições de mando. Não fosse assim, tantos não estariam mancomunados a fim de boicotar a Justiça e seus agentes. Estes intentam higienizar o país, trazendo à luz os autores de comportamentos que destroem a nação e os dilapidadores do poder público, que se corrompem e corrompem o país.
“Com efeito, trata-se de um processo endémico de obsessão, do tipo mais complexo, jamais visto, uma vez que se alastra na forma de uma cultura em meio à população — e esse ponto é gravíssimo por si só; possivelmente, o que acarreta as consequências mais daninhas. Tudo isso, por óbvio, é avalizado por entidades sombrias que tencionam obstruir o progresso, pois conhecem o papel que este país deve desempenhar no contexto do planeta.”
— Realmente não teria melhor argumento, Watab — tornou Astrid, apreciando as palavras do guardião. — Aliás, evidência que sugere o quadro descrito por você é que mesmo a saída de Ella do poder e as investidas do homem forte não foram suficientes para convencer a esmagadora maioria da população acerca do legado monstruoso que restou para ser amargado pelas gerações futuras e administrado pelos governos desde então. Trata-se de uma maldição que pesará sobre os ombros da nação por longo tempo ainda, mas que não é vista por todos.
Após respirar profundamente, e seu olhar abranger para além do Plano Piloto sobre o qual se situavam, Astrid acrescentou:
— É como afirmou o espírito Tancredo Neves: “Se, por um lado, não se apresenta alguém que reúna condições genuínas e plenas de representar a nação e o povo brasileiro fazendo frente a essa marca da corrupção que avassala desde Brasília até a base mesma da sociedade — isto é, o povo comum —, pelo menos nos resta a alternativa de optarmos por uma ética ou, quem sabe, pela possibilidade de mudar, uma vez que o horizonte não nos aponta um líder ou uma liderança isenta de chances de perpetuar o erro.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:42 pm

Ou, mais modestamente: diante do quadro dramático em que se vê a nossa nação, errar menos já seria de muito bom grado diante do extremo a que chegaram os representantes eleitos democraticamente pelo nosso povo”.2
— Sem dúvida — retrucou Semíramis. — Porém, o legado mais complexo e sobremodo maldito não é o político puramente, mas aquele atinente ao modo de pensar e agir incutido como marca na alma das pessoas, conforme o próprio Tancredo observou. Dificilmente a geração actual conseguirá alijar-se desse modelo de pensamento que ficou registrado como fórmula de governar e que, hoje, faz parte da cultura nacional de maneira tão notória e expressiva. Isso, sim, é determinante para os lances futuros e o que virá pela frente. Com a multidão amplamente aberta à influência de entidades que não querem o bem da nação, fico a imaginar quando terminará essa luta. Será que ocorrerá a volta do antigo regime e dos mesmos atores?
— Seja como for, vai demorar bastante até que mais camadas da população adquiram consciência da parcela que lhes cabe das responsabilidades que imputam aos governantes e, enfim, assumam a condução de seus destinos. Enquanto isso, vamos lutar, trabalhar com perseverança, apesar de sabermos que a maioria dos encarnados ainda não acredita que, nessa batalha, enfrentamos forças ocultas poderosas, e não meros mortais.
Um e outro trocaram mais algumas impressões e opiniões sobre o que esperar a respeito dos acontecimentos vindouros. Ao intervir, Kiev, que até então se mantivera calado, deu certa inclinação um pouco mais abrangente à conversa, relacionando o assunto ao contexto internacional:
— Os acontecimentos neste país estão intimamente conectados a fenómenos semelhantes que ocorrem na Venezuela, em Cuba, na Rússia e em alguns outros países. Estão todos envolvidos numa rede complexa de interferências espirituais, obsessivas, sem precedentes na história de vários deles.
— Se nos atentarmos às conexões espirituais por trás dos comportamentos sociais e pessoais dos elementos-chave, aqueles que lideram os processos de corrupção a serviço de causas espúrias — complementou Dmitri —, poderemos pensar num fenómeno global de interferência extrafísica. Caso consideremos o próprio juízo geral3 em andamento, poderemos compreender o desespero das entidades envolvidas em toda essa história.
— Estamos, de facto, em meio a uma guerra espiritual — afirmou Watab outra vez, para logo suspirar profundamente, enquanto observava ao longe os movimentos da Horda de seres malévolos. — Evidentemente, não emprego o termo “guerra” com a conotação que recebe no contexto terreno. Não se trata de combate visando à subjugação, à destruição e à eliminação do inimigo, como se dá numa guerra convencional entre os homens.
Visivelmente interessada no tema que as palavras do amigo suscitavam, Semíramis resolveu se manifestar, mudando ligeiramente o rumo da conversa. Exímia estudiosa dos eventos dos quais participaram os antigos daimons e seus asseclas, ela expandiu a análise que se fazia até então:
— Nessa guerra milenar, meus caros, algo toma meus pensamentos, por conhecer o perigo e a extensão dos danos que poderão ocorrer. Sabemos que os antigos soberanos das dimensões de frequência mais baixa do planeta aglutinaram e ainda hoje aglutinam vibrações deletérias, poderosas e destruidoras, que partem da mente de espíritos maus e em sofrimento, de ambos os lados da vida. Formaram, assim, uma espécie de foco ou núcleo de forças da escuridão. Essas forças são emanações de dor, ódio e sofrimento absorvidas e irradiadas sobretudo das dimensões mais próximas da Crosta e do próprio mundo dos encarnados. Esse aglomerado de energias densas, absolutamente nocivas, alimenta as frentes de poder, os instrumentos da maldade e os projectos audaciosos dos seres sombrios. Quase se pode dizer que tal amálgama constitui um tipo de entidade, dotada de vida artificial, cujas reverberações podem ser canalizadas para provocar calamidades sociais e naturais, tanto físicas quanto extrafísicas, de grande impacto. Basta pensar no potencial das energias vitais exsudadas em guerras, morticínios e genocídios, onde quer que aconteçam manifestações do género, de cunho violento.
— Imaginem só — interferiu Astrid — a força concentrada que irradia de desencarnes colectivos, tanto de ectoplasma quanto de outras formas de energia densa a ele associadas…
— Pois é, amigos! Como não ligar os eventos da arena física a questões astrais, transcendentes? De que modo se pode deixar de identificar profundas consequências espirituais para os povos da Terra em eventos de ordem social, política e diplomática se as relações entre os acontecimentos em ambas as dimensões são assim tão patentes, como no exemplo que demos?
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:42 pm

Certo silêncio provocado pelas reflexões das guardiãs tomou conta de todos ali enquanto ainda flutuavam sob os céus de Brasília. Dmitri tomou a iniciativa de comentar algo mais, depois de reflectir sobre as guerras e as disputas em outros recantos do planeta:
— Eis que penso um pouco mais longe quando considero tudo isso. Uma guerra envolvendo as grandes potências, sobretudo neste momento, seria de todo indesejável, mas não tão improvável. Com base no que Semíramis dizia, é preciso considerar a demanda de energia por parte das entidades malignas, principalmente magos negros e cientistas a eles consorciados. Imaginemos tudo que disseram desencadeado pela detonação de armamento nuclear, por exemplo.
Todos compreenderam o alcance das palavras de Dmitri. Ele se referia à possibilidade de uma guerra em larga escala com as armas mais letais que os homens hoje têm à disposição. Notando o silêncio prolongado dos interlocutores, o guardião continuou:
— O amálgama escuro astralino a que Semíramis chamou entidade, e outros denominaram egrégora, é uma grande fonte de abastecimento para as entidades perversas, se não a maior. O efeito da interacção entre elementos atómicos e tal energia é, em certa medida, desconhecido; não se sabe o tamanho do estrago que é capaz de causar não somente no plano físico, mas também no astral, notadamente nas cidades erguidas no plano mais próximo da Crosta. É importante ponderar tudo isso ao avaliar a dimensão dos problemas humanos, levando os homens a perceberem que fenómenos de natureza política, social e económica podem muito bem repercutir sobre a vida e as energias nos planos extra-físicos. Isso explica, entre outros motivos, o interesse de espíritos sombrios em manipular directamente os acontecimentos naquelas esferas. Confirma-se, assim, que nada há no mundo que escape à interferência de entidades espirituais. Nada ocorre no mundo físico, social ou moral que não esteja associado à acção de inteligências extracorpóreas, malévolas ou não.
— Precisaremos das energias dos nossos agentes encarnados — declarou Watab, o guardião africano e dirigente dos guardiões da noite, equipe que se especializara no enfrentamento de magos negros. — Necessitamos de agentes dispostos a servir, que deixem de lado suas diferenças e se coloquem definida e definitivamente ao lado dos representantes da justiça divina.
Respirou fundo e anunciou o que ninguém queria ouvir naquele momento:
— Jamar acaba de se comunicar telepaticamente comigo. As entidades da Horda se dirigem às residências de ministros do Supremo Tribunal Federal e de alguns senadores. Parece que já estabeleceram seu alvo.
Ao dizer isso, imediatamente ascendeu nos fluidos ambientes, tomando a rota do ponto de encontro com Jamar. Rodopiando em torno do próprio eixo, fez um gesto de despedida aos amigos, que ficaram sob a supervisão de Semíramis, a fim de prosseguir rumo aos alvos que seriam visitados pelos integrantes da Horda.
Jamar também convocara outro espírito, alguém que ainda não tinha trabalhado na psicosfera do Brasil, nem sequer da América Latina. Era um guardião de alta estirpe espiritual, que viera para auxiliar os agentes superiores da Terra no processo de selecção das almas, considerando o desterro planetário que se avizinhava. Vinha observar e avaliar a actuação dos agentes do bem ao redor do globo, de modo a verificar o nível de compromisso do maior número possível deles.
Dirigiram-se os três para outra região do país em busca de recurso energético, de ectoplasma e também de energias psíquicas apropriadas para serem utilizadas nos próximos lances da batalha.

ANOITECIA SOBRE A MORADA DOS HOMENS quando os três guardiões superiores desceram lentamente à frente da residência do agente encarnado. Muitas pessoas não imaginavam que naquele local transcorriam acontecimentos graves, intimamente associados a seres invisíveis que transitavam entre uma e outra dimensão da vida. Poucos desconfiavam; bem poucos tinham plena consciência dos fatos.
O trio aproximou-se lentamente e logo foi visto por uma guarnição que tomava conta do lugar. Jamar foi reconhecido ainda à distância, assim como Watab. O outro, no entanto, foi somente reverenciado com um leve aceno de cabeça por parte dos sentinelas de plantão.
— Neste momento nosso amigo e pupilo descansa, senhor. Hoje parece ter sido um dia muito atribulado para ele e seus colegas no trabalho.
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro Empty Re: O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:42 pm

— Vamos entrar mesmo assim, amigo. Obrigado por nos avisar. Alguma intrusão energética ou consciencial? Algum assediador de outra dimensão?
— Os mesmos de sempre, senhor. Mas temos tido êxito ao repeli-los. Neste lar não entram, nem o violam com energias nefastas. Encaminhei ao comando central nossas observações a respeito do assédio feito pelo homem forte e seus comparsas. Tão logo possível, dê atenção ao assunto, por favor — falou Omar para seu superior.
— Hoje ainda deliberarei sobre suas observações, caro guardião.
— Tenho certeza disso, senhor — respondeu o chefe daquela guarnição. Ele sabia que Jamar, além de dedicado, invariavelmente cumpria com o que falava. Nem sempre lhe era agradável desempenhar certas obrigações quando tratava com emissários das sombras, mas ainda assim era pontual, rigidamente pontual, quando empenhava sua palavra.
O estranho ser que acompanhava Jamar observou os sentinelas envolvendo a casa do agente encarnado e ponderou:
— Você tem amigos fiéis. Isso é muito bom. Eles não apenas obedecem a seu comando, mas são amigos, parceiros, e isso é muito melhor do que ter soldados e seguidores dispostos tão somente a cumprir ordens.
Jamar aquiesceu ante o comentário de Anu-ep, o guardião de procedência extraterrestre.
O agente encarnado não gostava de se expor para além do que exigia o cumprimento de seus deveres. Vivia sem ostentação, como vive uma família de classe média no país. Esposa e filhos também estavam, de certa forma, ligados à causa da justiça e da educação.
— Nosso agente foge dos holofotes e dedica-se com afinco a questões de sua alçada jurídica. Como era de se esperar, muitos dos opositores, que alegam inocência, tentam prejudicá-lo a qualquer custo; esquadrinham sua vida pessoal e seu histórico profissional em busca de algo que o desmereça e o exponha ao descrédito. Ele responde com silêncio e mais trabalho — falou Jamar. — Apesar de tudo isso, é um homem como qualquer outro: de um lado, apresenta elementos que merecem ser reciclados; de outro, detém muitos predicados que, por ora, não se vêem na maioria.
Adentraram o ambiente Watab, Jamar e Anu-ep. Aproximaram-se devagar, como se ingressassem em um templo. A residência era algo muito comum, sem nada que chamasse a atenção. Antes que ingressassem nos aposentos do agente da justiça, dois outros guardiões, especialistas sob o comando de Watab, estavam de prontidão no local e advertiram:
— Olá, senhores! — cumprimentou um dos dois oficiais. — Por favor, peço que esperem um pouco mais, pois nosso agente está prestes a terminar uma ducha. Creio que, no mais tardar, em cinco minutos poderão adentrar o recinto sem invadir sua privacidade.
Watab assentiu, pois fora ele próprio que designara ambos os sentinelas para a função e lhes dera as instruções, que, como se via, seguiam à risca.
— Desculpem-nos a forma de agir, senhores, mas nosso agente é estrito no que tange à privacidade — um deles complementou. — Preferimos respeitar o jeito do nosso agente, pois ele conquistou uma posição que faz jus ao nosso cuidado pessoal.
— Entendemos tudo isso, amigo — concordou Jamar.
Enquanto aguardavam, os visitantes ficaram à vontade para observar a moradia quase espartana do representante da justiça. Jamar media cada detalhe do ambiente extra-físico, notadamente os instrumentos ali instalados.
Passados alguns instantes, o consentimento foi dado pelo oficial de plantão. O trio, então, adentrou o quarto e encontrou o agente recostando-se por alguns minutos antes de sair novamente e voltar a seus afazeres. Jamar aproximou-se e olhou directamente nos olhos do agente.
— É esse aí? — perguntou Anu-ep. — Foi ele quem primeiro atendeu ao clamor de vocês?
— Exactamente — respondeu Jamar, enquanto mantinha o olhar fixo no homem sobre a cama, recostado em dois travesseiros, procurando repousar. — Ele faz uma prece neste momento, rogando forças para continuar seu trabalho. Às vezes, ele ora por aqueles com quem tem de lidar nos processos judiciais; pede que possam entender, enquanto é tempo, as responsabilidades que lhes concernem nos eventos em que tomaram parte.
— Pensei que ele vivesse num local maior, mais aconchegante e com mais recursos — comentou Anu-ep.
A presença de Jamar induziu o homem a fazer uma oração mais fervorosa. Em seguida, o guardião superior afastou-se, cedendo lugar a Watab, que assumiu o papel de exímio magnetizador. Invisíveis, os guardiões esperavam apenas aquele momento de relaxamento do agente encarnado.
— Não pensei que ele fosse pessoa tão importante assim para o projecto dos guardiões — falou Anu-ep, acentuando suas palavras.
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O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro Empty Re: O golpe - Ângelo Inácio/Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:43 pm

— Sim, ele é importante pelo que faz e pelo que representa — asseverou Jamar, de maneira enfática.
Watab emitiu um pulso de energia muito intenso, sem fazer grandes movimentos, a não ser estender seu braço direito e espalmar a mão sobre a fronte do homem recostado, fazendo jorrar um jacto de luz até seu chacra frontal. Imediatamente, ele projectou-se na dimensão extrafísica, pairando acima da cama, e pôde ver os três seres que o visitavam.
— Salve, guardiões! Que bom que vieram. Desculpem-me se porventura me demorei; sabem como é a vida no corpo físico — principiou o agente, agora desdobrado. — Devo cuidar bem do instrumento dado a mim pela bondade divina. Afinal, preciso concluir o projecto que me foi confiado.
— Não precisa se desculpar, amigo — disse Jamar. — Sabemos como é atarefado. Gostaríamos de trocar algumas poucas palavras, pois sabemos que terá muito trabalho ainda na noite de hoje. Enquanto conversamos rapidamente, faremos uma revitalização em seu corpo físico, dedicando especial atenção à zona cerebral, pois precisará estar muito alerta durante os próximos lances da batalha que está por vir.
Após apresentar Anu-ep ao agente desdobrado, Jamar prosseguiu, tomando providências para que as palavras ficassem registradas na memória espiritual do agente da justiça:
— Permaneça atento às nossas intuições. Recebemos ordens directamente de Miguel para ampará-lo. Blindamos você e os outros agentes da Justiça e temos conduzido recursos para fortalecê-los. Porém, as forças da maldade se congregam para lançar nova ofensiva contra as conquistas do bem e da equidade. Um grupo de especialistas das sombras acaba de aportar em Brasília. É uma horda de seres bastante determinados; miram alvos que identificaram previamente como os que desempenharão o papel de médiuns seus nos propósitos espúrios.
“Grande movimento de energia é forjado, neste momento, do lado de cá da barreira que separa as dimensões. Faremos com que novos fatos e elementos venham à tona, e isso causará furor nos espíritos malignos, naqueles que defendem a desordem, o sistema de caos reinante, bem como nos que assaltam o país e fomentam a corrupção institucionalizada em vários níveis. Embora isso abale as estruturas do actual governo, o que tem de vir virá e não tardará.4 É preciso que o povo saiba como tem sido prejudicado e conheça quem o lidera. Prepare urgentemente sua equipe e muna-se de fé, coragem e determinação, pois estaremos juntos, como sempre. Você terá meu total apoio e protecção.”
— Fico apenas preocupado com minha família…
— Faremos o que for possível; confie! Mas saiba que a situação mexerá com todos vocês. O homem forte já recrutou seus comparsas, e Ella trabalha na surdina para desfazer o movimento em prol da justiça que você representa nesta hora. Portanto, não se engane: dirão calúnias contra você, levantarão provas forjadas contra sua honestidade e o difamarão, invadindo até sua vida particular. Esteja preparado para tudo; lembre-se que nosso governador espiritual enfrentou sistema semelhante e venceu exactamente no momento em que as forças da oposição julgaram que ele havia sucumbido. O bem ainda não predomina sobre a Terra, portanto, amigo, ore com fervor, mas mantendo, como sempre, um olho fechado e outro aberto. Afinal de contas, um soldado não deve jamais se esquecer de que está numa batalha diária. Contamos com você, pois muitos dos próximos lances dependerão da equipe sob seu comando.
— Então devo aguardar momentos ainda mais complicados no panorama político e social?
— Isso mesmo. As estruturas de muitos departamentos da vida nacional serão abaladas. Partirão para cima de você e dos outros agentes da justiça com todo o ímpeto, querendo impedir e sabotar o trabalho que exercem. Fique atento, guardião! — disse Jamar, encerrando a comunicação com o agente da justiça encarnado, o qual trabalhava numa cidade da região Sul do país.
Watab o conduziu de volta ao corpo físico, já revigorado, graças ao magnetismo que ele próprio transmitira durante o diálogo terminado. O homem despertou, assentou-se na cama e, respirando fundo, proferiu uma breve oração:
— Senhor, obrigado pela protecção dos seus anjos da justiça. Use-me, ó Pai, como seu instrumento, e me dê sabedoria para continuar fiel ao seu projecto para mim nesta vida.
Os guardiões ainda ouviram as últimas palavras do agente, que então se levantava. Viram filigranas de luz descerem sobre o lar de quem actuava em nome dos guardiões no plano dos encarnados. Vultos invisíveis aos olhos humanos transitavam entre uma dimensão e outra, enquanto um grupo de sentinelas, de oficiais da justiça divina, assumia seu posto ao lado daquele homem, que sairia de casa poucos minutos depois, para dar prosseguimento a mais uma demanda em seu ofício na instância do Poder Judiciário.

“O Senhor julgará os povos; julga-me, Senhor, conforme a minha justiça e conforme a integridade que há em mim.”
SALMOS 7:8
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:44 pm

Capítulo 4 – Assuntos urgentes
Watab, Dmitri e outros guardiões desceram, num voo rasante, e pararam sobre o ponto de encontro entre o senador e o ministro. Notaram a agitação de ambos no instante em que um carro saía em disparada com um homem que não poderia ser visto ali, na companhia deles. Watab deu um sinal para os amigos, acenando com a mão direita, como a indicar que a temperatura das coisas em breve esquentaria. Riscando a atmosfera com uma pequena explosão, fruto do contacto da antimatéria do plano extra-físico com a matéria densa do mundo dos encarnados, eles arremeteram, rasgando o céu nocturno com marcas iridescentes.
As cidades abaixo deles sucediam umas às outras, de tal forma que a velocidade com que cruzavam a atmosfera se assemelhava à de uma poderosa espaço nave riscando o céu de algum mundo distante. Voavam muito além da barreira do som. Logo se via, abaixo dos poderosos guardiões, uma mancha verde, onde então mergulharam. De repente, uma floresta parecia os engolir. Eram trespassados por todo o verde, o cheiro da mata, as árvores e as flores, além das folhas dos arbustos, que os açoitavam. Atravessavam aquele reduto de mata atlântica sem se ressentirem dos obstáculos naturais que somente os encarnados enfrentavam. Lançaram-se os guardiões no meio da mata, espantando as sombras e deixando um rastro de luz imperceptível aos olhos dos homens, mas perfeitamente registrado pelos pequenos animais ali presentes, que se retiraram em caminhada lenta, como a pressentir que ali havia algo a ser respeitado e, talvez, reverenciado. Os emissários do Alto atravessaram os troncos das árvores, que, naquele momento, estavam repletos de seres elementais, os quais olharam os visitantes com surpresa.
Em seguida, os guardiões divisaram a clareira mais próxima, local previamente escolhido pelo próprio Jamar, que os esperava. Suavemente, desceram ao solo, em completo silêncio, embora ao derredor se pudessem ouvir os sons comuns a uma floresta tropical, com seus habitantes dos mundos animal e elemental. Devido às irradiações de sua aura, que se estendiam por todos os lados, caso os embaixadores da justiça divina fossem vistos pelos mortais comuns, provavelmente seriam descritos como anjos luminosos, cujas asas se estendiam por uma envergadura semelhante à de um paraquedas.
Tão logo pousaram — como uma borboleta pousa sobre uma flor, já que tão suave e delicadamente tocaram o chão —, o rebrilhar da aura dos guerreiros diminuiu de intensidade, restando apenas leve luminosidade envolvendo os corpos robustos, que guardavam aparência perfeitamente humana, com porte altivo e elegante. Via-se apenas um lampejo de suas espadas, instrumentos preciosos de trabalho, fruto da tecnologia sideral. Tais armamentos assumiam feição quase material à medida que seu aspecto coruscante arrefecia, à semelhança do que ocorria com a aura dos guardiões.
Jamar poderia ser confundido com um capitão altaneiro. Era como se ele, ligado ao comandante das milícias celestes — o próprio Miguel —, reflectisse, por alguns instantes a mais, o brilho das estrelas. Apresentava cabelos amendoados com nuances douradas. Até então, aguardava os guardiões, seus amigos, com o olhar que denotava a paixão pelo trabalho que desempenhava e a dedicação ao ideal abraçado. Trazia o rosto um pouco tenso, marcado, porém, com a firmeza de quem sabe muito bem o que está por vir e como enfrentar os eventos decisivos que provavelmente sucederiam em breve.
Jamar, novamente, fazia-se acompanhar do espírito Anu-ep, guardião que viera auxiliar nos momentos de trabalho intenso em meio ao processo de expatriação dos espíritos da Terra. Representando as guardiãs, Astrid estava ao seu lado, além de Mauá, o qual pedira a interferência de Jamar e de seu time de sentinelas na situação nacional.1 Vestiam trajes diferentes, de tonalidade bege associada ao branco opaco. Todos usavam tons pastel, excepto a guardiã, cujas roupas eram negras.
Watab apresentou-se já entregando seu relatório num instrumento de alguns centímetros, o qual tinha a propriedade de projectar um holograma caso fosse necessário. Os demais guardiões reverenciaram Jamar e seus convidados com um leve menear da cabeça e, logo em seguida, proferiram sua saudação: “Justiça e paz!”.
Foi Watab quem principiou:
— Todos os espíritos adversários se escondem, Jamar, mas temo que entrarão em guerra as duas facções: a Horda, recém-chegada, contra os magos negros, pois esses se reúnem neste momento com o intuito de arregimentar forças e traçar estratégias para lidar com seus rivais. Os senhores da escuridão não se conformam em perder controle sobre os alvos, que consideram deles por direito, para aquele grupo, provavelmente enviado a mando dos espectros. Disputam o domínio sobre deputados, senadores e a própria presidência da república.
— Tudo bem — disse Jamar. — Fiquemos atentos aos lances que estão por vir. Em breve, surgirão elementos no âmbito judicial e na própria política que abalarão os alicerces da nação. E será só o começo. Conhece alguma outra facção directamente associada a esse processo?
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:44 pm

— Diversos espíritos ligados aos alvos, no plano físico, têm sido aliciados pelo bando recém-chegado, que intenta assenhorar-se da mente dos protagonistas. Trata-se de um processo de obsessão realizado de uma forma que, em circunstâncias anteriores, não se mostrara inteiramente. Não detectamos o ser que chefia a quadrilha do lado de cá em parte alguma. Como dirige seus lacaios à distância, ele se preserva, permanecendo no abrigo de quaisquer eventualidades.
— Interessante. Que me diz do presidente?
— Ele está ciente do que ocorrerá, Jamar. Sabe que irá dispor de um tempo breve para se segurar no poder. Teremos de evitar o pior.
— E o empresário? — perguntou Astrid.
— Sem chances de se safar. Ele próprio fez uma parceria com representantes da Procuradoria-Geral da República, mas alguns agentes já providenciam recursos que o levarão a se curvar diante da lei. Não tivemos escolha. Ele escaparia ileso; deixaria o fogo consumir os demais enquanto desdenharia da população.
Anu-ep expressou sua opinião por meio de um gesto, aprovando as iniciativas do time.
— Como está o senador agora? E os demais envolvidos? — indagou Jamar.
— Trata-se de uma situação delicada — tornou Watab. — Certos contactos são feitos para disfarçar suas pegadas; uma aliança é discutida com um dos magistrados do Supremo. Nenhuma novidade diferente do que se espera de um político cuja imagem está prestes a ser abalada.
Jamar fitou os amigos, apreensivo, e comentou:
— Não, nem me preocupo com esse, mas com os homens de toga. Esses, sim, têm sido vistos como alvo, embora alguns deles já tenham se vergado em carácter mais ou menos definitivo sob a acção de entidades vis. Entre os demais, há apenas dois com quem podemos contar. Faz-se necessário conversar com alguns deles fora do corpo urgentemente. Você pode providenciar isso, por favor, Dmitri? O stf está minado, e o Senado, nem se fala.
“De qualquer maneira, se porventura evitarmos o suicídio de duas das pessoas chave relacionadas às questões graves que repercutem na imprensa nacional, já me dou por satisfeito. Neste momento crítico, uma reviravolta assim lançaria o país no caos, de acordo com nossa avaliação.”
Watab e Dmitri olharam em direcção a Anu-ep ao perceberem, pelas palavras do guardião, que a situação poderia ser bem mais grave caso não interferissem. Uma enxurrada de delações abalaria a república, e alguns atingidos, mesmo esperando que algo acontecesse, não tinham noção do quanto seriam tragados pela lama de suas atitudes espúrias quando elas fossem reveladas.
— Estimo que alguns deles escaparão por um triz — tomou a palavra Dmitri —, pois têm a seu favor um dos ministros, que fará de tudo para livrá-los, uma vez que ele próprio tem muito a temer. Além do mais, é uma indicação do homem forte, com quem mantém laços estreitos. Esse, por sua vez, permanece latente no momento, como determinam seus mandarins do astral. Tal como um vírus, aguarda as defesas e a imunidade do país baixarem aos menores patamares para, então, ressurgir com seu golpe dificilmente disfarçado.
— De todo modo, amigos, vamos lutar para que os impactos sobre a nação sejam amenizados — contemporizou Watab. — Infelizmente, não podemos esperar muito das pessoas de bem, pois, neste momento, em vez de irem às ruas, elas se retraem. Em certa medida, é compreensível, pois a instabilidade da hora causa dúvida até mesmo acerca de qual bandeira se deve defender. Do outro lado, também estão reticentes os que fustigam, desde seus gabinetes, agitadores e manifestantes a soldo, recorrendo, para tanto, a aparelhos aliciados por sua política abominável. Além do receio de serem arrastados pela enxurrada de escândalos e denúncias, que parecem não ter fim, temem a volta ao público das massas que exigem o cumprimento da lei e o respeito à Justiça, o que aumentaria ainda mais a pressão sobre eles. Por essas e outras razões, nem os responsáveis directos pelo movimento das ruas nem tampouco os políticos estimulam a multidão a se lançar a campo.
— Não obstante, precisávamos das energias da população pacífica. Na falta desse elemento, porém, recorreremos aos nossos agentes e veremos com quem poderemos contar — concluiu Dmitri.
Jamar só demorou uns segundos para processar tudo, meneando a cabeça, consternado diante do alcance do processo obsessivo, que se imantava numa malha finíssima, enredando mais e mais partidos e homens públicos numa rede nefasta cujo pano de fundo era a corrupção em alto grau e larga escala. Tanto nos gabinetes dos políticos corrompidos quanto nos escritórios dos empresários e de outros cúmplices havia malfeitores espirituais, obsessores a instigar, inspirar e induzir os indivíduos que lhe eram aliados ou marionetes a cometerem os maiores descalabros.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:44 pm

Espíritos superiores encontravam barreiras e dificuldades severas para penetrarem na psicosfera da capital federal e agirem junto aos envolvidos na usina de escândalos que parecia tomar o lugar da administração nacional. As raízes do mal proliferaram-se de tal maneira que poucos homens públicos e talvez nenhum dos partidos políticos tenham restado incólumes.
O homem forte aproveitava a eclosão do cenário que planejara, como salvaguarda, e agia na surdina para dar o golpe a qualquer momento. Era parte da estratégia, que, ainda que fosse ameaçada, a hidra já teria alastrado seus tentáculos tão profundamente que o sistema se mostraria irremediavelmente infectado pela praga nefasta e resistente. Afinal, as tácticas de guerrilha do Foro de São Paulo — que é a própria criatura mitológica materializada em sua versão latino-americana — não foram desenhadas apenas para o cenário vitorioso em todas as etapas. Era assim que o homem forte detinha trunfos que a maioria desconhecia, embora derivassem do fenómeno que ora vinha à tona: a institucionalização sistemática da corrupção como método de administrar e governar, como política partidária, banalizada a ponto de ser considerada dado da realidade, e nada mais, aos olhos daqueles que se comportavam como cabeças da hidra sul-americana ou, meramente, compraziam-se em servir-lhe de alimento.
Foi Astrid quem quebrou o breve silêncio, em tom apreensivo:
— O que os amigos relataram até agora já é notícia suficiente — disse ela, achegando-se perto de Jamar.
Dmitri também manifestou certa inquietação, embora procurasse disfarçá-la com um sorriso forçado:
— Nunca tivemos acontecimentos aparentemente tão numerosos e ruins, mas que, no fundo, denotam progresso, já que tem vindo à tona muito do que os seres da oposição lograram esconder por algum tempo. Nisso tudo, vejo emergir uma nota de esperança para o povo e as instituições ao perceber que tantas coisas encontrarão seu destino nas mãos da Justiça!
Jamar olhou para cima, como a fazer alusão à soberania da justiça divina, e sorriu um sorriso cauteloso.
— Podemos esperar muitos percalços e desdobramentos e vê-los com optimismo, amigo guardião. Mas o fato é que, sozinhos, não nos compete interferir; sozinhos, não nos cabe realizar aquilo que os próprios homens não desejam. Como em todos os casos até aqui, dependemos da ajuda de nossos agentes encarnados. Se porventura superarem diferenças e se unirem mais, poderemos contar com uma força de trabalho nada desprezível. Assim, faremos com que a justiça divina prevaleça, de braços dados com a misericórdia.
Calando-se por alguns instantes, o líder dos guardiões logo continuou:
— Há pessoas de bem que tombarão junto com os enredados na teia da corrupção. Houve quem acreditasse e, mais do que isso, encampasse os projectos apresentados pelos políticos e pelos empresários que protagonizaram os golpes desferidos pela hidra. Por óbvio, na hora do saneamento, serão jogados na fogueira juntamente com os malfeitores. Não obstante, no caso dos homens de bem, de quem foi genuinamente enganado, cujo pecado é mais ingenuidade que falta de escrúpulos, devemos amenizar ao máximo sua queda.
“Em patamar de maior gravidade, outro plano de acção se faz necessário. Refiro-me ao fato conhecido de que os dirigentes do sistema criminoso de poder trabalham arduamente a fim de obstruírem a acção da Justiça. Há um projecto em curso, e bem adiantado, que foi abraçado por alguns ministros, cujo objectivo é calar os agentes encarnados da Justiça. Quero que você, Watab, pessoalmente, tome a dianteira nessa frente de trabalho. O processo obsessivo em andamento no país é tão agudo que as garras afiadas da hidra intentam criar obstáculos à própria justiça, tanto a divina quanto a humana. Estão a forjar elementos para incendiar o povo contra nossos agentes, aqueles que desempenham seu papel no mundo como representantes da lei e da ordem e da equidade.”
Houve certo incómodo por parte de todos ali presentes quando eles notaram que Jamar falava exactamente dos planos que eram articulados pelos apoiadores do homem forte, que se mantinha discreto por demais ante os eventos que vinham a público naquele momento.
— Assim — prosseguiu Jamar —, caso tenhamos êxito, as palavras de Dmitri poderão se cumprir. Isto é, por mais que tudo dê sinais de piora, deterioração e erro, como se as coisas estivessem mal encaminhadas, a verdade será outra. Desta vez, avançaremos mais, e a Justiça começa a dar passos mais concretos entre as fileiras dos criminosos de colarinho branco, desmascarando, portanto, as artimanhas do mal. Isso explica a investida das sombras sobre os homens que dominam o país. Os espíritos das trevas temem que toda a sua artimanha seja desfeita e que seus mais ilustres mediadores entre os humanos sejam desmascarados. Essa é a razão por que atacam com novas forças, com um novo contingente.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qui Jan 26, 2023 8:45 pm

Estão temerosos e acuados. Diante do que está por vir e das informações cuja revelação abalará por certo tempo as estruturas da nação, haverá ao menos uma temporada de recuo ou retrocesso na acção dos artífices da maldade.
— Os espíritos do mal que patrocinam as acções da quadrilha e espalharam tentáculos pela massa de partidos do Brasil e também da América do Sul — disse Mauá, que até então se mantivera calado — terão muito o que responder em breve. Seus superiores não os perdoarão devido ao que está por vir, que abalará a estrutura de poder de seus aliados encarnados. Enquanto a população em geral tenderá a ver a exposição das entranhas da politicagem com olhos de apreensão, perguntando-se “Onde vamos parar?”, enxergamos esse momento histórico do país como algo valioso, pois já passa da hora de virem a público as falcatruas e o que mais estava escondido, lesando o brasileiro. Por certo, ninguém de nós tem a ilusão de que tudo cessará de um momento para outro. As forças da oposição ao Cordeiro não descansarão e farão o que estiver ao seu alcance para obstruírem a Justiça. Contudo, o bem prevalecerá.
— Temos guardiões a postos em todos os departamentos, mas carecemos da ajuda dos amigos do plano físico — insistiu Jamar. — Sem o auxílio deles, tudo poderá ser bastante demorado. Ainda bem que vemos brotar uma nova consciência de que todos devem participar e de que lidamos, afinal, com questões espirituais, e não com políticas humanas. Mesmo assim, temos ordens superiores para não intervirmos, a menos que seja absolutamente necessário.
— Mas Jamar… — reagiu Dmitri com certa indignação diante da realidade das investidas da Horda. Reconsiderou e achou por bem ponderar. — Será que esses espíritos patrocinadores da desgraça humana nunca conseguem infligir sofrimento e problemas o bastante?
— Temos de convir, caro Dmitri — respondeu o comandante interpelado —, que nenhum obsessor age com autonomia plena em relação ao obsidiado. Tal como ocorre connosco, os guardiões da humanidade, eles também dependem dos indivíduos que influenciam. Não somos capazes de fazer tudo por conta própria, sem nos sujeitarmos à disposição humana, à dedicação e à parceria estabelecida com nossos agentes encarnados. Na verdade, no cenário em foco, eles têm empregado muito pouco esforço no processo obsessivo. Apenas estimulam os alvos escolhidos naquilo que já querem, efectivamente, fazer. Propiciam situações e armam ciladas, mas são os homens que caem por si próprios nos precipícios da obsessão. Nesse caso, uma obsessão colectiva, sobremodo complexa, cuja libertação exigirá do povo uma reacção à altura.
Antes de prosseguir, Jamar fez breve pausa e mirou os olhos de Dmitri, olhos claros e de uma expressividade incrível, tão cheios de ardor pelo trabalho e de apreço pelas vidas humanas e, ao mesmo tempo, tão ternos e de uma doçura sem igual quando se trata dos agentes do bem e da justiça.
— Guardião amigo, preocupamo-nos com tudo isso, especialmente com as artimanhas dos inimigos da humanidade. Todavia, sabemos que tudo tem um propósito e que nenhuma nação amadurecerá sem passar por momentos difíceis. A vitória não vem sem lutas! O sofrimento da população talvez sirva para que ela acorde, participe e se envolva mais, ainda que esse despertar demore muito a se consumar. Em suma, não podemos subtrair a liberdade da nação. Afinal de contas — concluiu Jamar, colocando a mão sobre o ombro de Dmitri —, cada povo tem os governantes que merece; tal é uma lei que não podemos burlar.
— Que venham os desafios! — exclamou Astrid, segurando firme a espada que trazia embainhada. Ela fitou Watab e Dmitri e perguntou com um ar de sarcasmo: — Vocês por acaso têm mais notícias alentadoras ou felizes?
— Claro! — respondeu Watab. — Notícias dos nossos agentes. Eles têm se agrupado e se organizado melhor. Durante o nosso Encontro Mundial, apareceram pessoas dedicadas, e, ao longo das vivências realizadas, detectamos entre elas mais de trinta dispostas a ajudar sem pieguice e de maneira resoluta. Além disso, identificamos mais de cem com forte potencial de doação de ectoplasma, o suficiente para nos abastecermos energeticamente durante as nossas actividades, embora nem sempre todos eles saibam como fazer isso. Há ainda uns cinco com potencial genuíno para treinarmos como agentes, que poderão ajudar até em outras partes do mundo.
Diante da menção desses fatos e dessas conquistas, Astrid riu gostosamente, quase de modo malicioso, enquanto os demais guardiões ficaram sem entender a reacção da guardiã. Jamar apenas meneou a cabeça, sugerindo que conhecia a motivação da amazona.
— Assim sendo, teremos de testar alguns dos nossos agentes — retomou Watab.
— Prontifico-me a ficar mais próximo dos agentes encarnados e a acompanhá-los nas provas pelas quais passarão — disse Dmitri.
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