LUZ ESPÍRITA
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Lírios de Esperança- Ermance Dufaux / Wanderley Oliveira

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Lírios de Esperança- Ermance Dufaux / Wanderley Oliveira - Página 6 Empty Re: Lírios de Esperança- Ermance Dufaux / Wanderley Oliveira

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Ago 18, 2018 8:47 pm

— Inácio, não será melhor que Marcondes tenha mais tempo?
— Não. A solução de Marcondes está aqui, lembra-se?...
— Ah! - e colocou a mão na testa, num gesto típico - sim, recordei!
Leve-o então à câmara dos ovóides.
— Está melhor? - perguntou Dona Modesta amparando-lhe a testa.
— Dona Modesta, perdoe-me a fraqueza.
Uma coisa é ler sobre isto.
Outra é vivê-la.
— Não há porquê pedir perdão, amigo.
Siga com Inácio. Ele vai levá-lo ao seu destino.
— Agradeço-lhe, Dona Modesta - e saiu ainda olhando assustado para o biombo.
Caminhando pelos longos corredores, foi o psiquiatra de Uberaba quem puxou assunto:
— Antes que me pergunte, já vou lhe explicar quem é aquela criatura.
— É humano, doutor?
— Completamente, não!
Apenas em metamorfose temporária.
Na literatura espírita, você deve ter lido algo sobre os dragões.
— É um dragão?
— Exactamente.
— Mas aquela aparência39...
— Para que você tenha noção onde pode chegar a mente!
Agora procure se desligar.
Vamos visitar um local muito delicado que solicita-nos o clima da oração e do sentimento puro.
— Aonde vamos?
— À câmara dos ovóides.
— O senhor captou meu desejo?
— Digamos que estou virando médium...
— Tinha muito desejo de visitar aquele...
— Aquele?...
— O ovóide que foi retirado de mim pela cirurgia.
— Ele está lá.
Na entrada, uma enorme placa com os dizeres:
"Todo aquele que crer em mim, ainda que esteja morto viverá".40
A pedido do médico, Marcondes ficou em uma ante-sala que funcionava como local de encontro. O ex-dirigente pesquisava os detalhes do local.
Quando folheava um pequeno livro de reflexões, teve uma surpresa que mudaria sua vida na erraticidade:
— Marcondes, veja quem está aqui!
Ainda assentado, foi levantando lentamente com os olhares esgazeados, o coração disparou, os olhos marejados dirigiram-se ao médico como se solicitasse uma autorização e o doutor disse:
— Não vai abraçá-la?!
— Eulália! Minha querida... - abraçaram-se ternamente.
— Marcondes, que saudades!
Que saudades!... - ela chorou copiosamente.
— Você está mais jovem e bela - e deslizava a mão pelos cabelos da companheira.
— Eu fui informado de que estava no Hospital, mas aprendi a esperar.
— Acompanho-lhe também os passos.
Graças à Dona Modesta e esse médico irreverente - mostrou-se bem íntima do médico, apontando e balançando o indicador por duas vezes - tenho sido aconselhada a aguardar esse momento com paciência.
— Vou deixá-los a sós por um instante.
Apresente sua tarefa a ele, Eulália.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Ago 18, 2018 8:47 pm

Regresso logo. E tenham juízo...
— Pode deixar, doutor.
Deixe Marcondes aos meus cuidados.
— Eulália, eu...
Eulália solicitou carinhosamente silêncio.
— Não vamos falar de nós aqui.
Teremos tempo e lugar para isso.
Venha, quero lhe mostrar o que faço no Hospital - e pegou o companheiro pela mão.
— Veja só!
Marcondes não sabia se olhava para ela, ou para o que lhe mostrava.
— São ovóides.
Eu vi no filme de minha cirurgia.
O interesse do aprendiz se dividia entre aquelas almas penalizadas pela máxima loucura e o olhar de Eulália.
Ficavam em pequenas incubadoras do tamanho de uma caixa de sapatos, similares àquela usada em sua cirurgia.
Algumas maiores, outras minúsculas.
Ao todo, passavam de três mil histórias.
Ninguém poderia supor que aquela ante-sala viria desembocar em um salão que ocupava quase metade do corredor subsolo 02.
Médicos e auxiliares movimentavam-se em intenso trabalho.
Nos casos em que as incubadoras eram abertas para análise, ouviam-se alguns silvos, zunidos estranhos, incomparáveis, emitidos por aquelas criaturas.
Marcondes, muito atento a tudo, vivia uma emoção inédita, dividido entre a dor de ver aqueles quadros e a alegria de reencontrar Eulália.
De repente, algo muito forte, como se fosse uma energia de atracção fez Marcondes largar a mão de Eulália, virar-se para o lado contrário onde andavam e afirmar:
— Lá estão eles! - apontando para algumas incubadoras perto da parede.
— Quem?
— Nossos filhos!
Eulália não suportou a emoção e deixava as lágrimas rolarem espontâneas sem dizer palavra por alguns instantes.
— Como você sabe?
— Não sei explicar. São eles?
— Sim, são eles.
Oito ovóides que carreguei no ventre.
Meus filhos amados.
— Por isso você está aqui!...
— Pretendo recebê-los novamente na carne.
Antes, porém, trabalho pela recomposição de suas formas.
Veja, olhe este aqui.
Seu último nome foi Mareei Pyrré.
Olhe só como começa a formar uma perninha deste lado.
— Meu Jesus!
Quanto tempo leva para isso?
— Nestas quase duas décadas de serviço, é a primeira forma mais parecida com membros humanos entre todos.
— Qual deles é...
Você sabe...
— Este estava com você - apontou para o menor de todos.
— Está diferente da filmagem.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Ago 18, 2018 8:47 pm

— Com o tempo, perdem a cor arroxeada e a matéria viscosa que o envolvia.
— Isso é bom?
— Óptimo!
— Posso!...
— Claro! Toque-o assim.
Pegando a mão de Marcondes, Eulália juntou o indicador e o dedo médio, localizando o que seria a cabeça, orientando para passar de muito leve e com carinho os dois dedos.
Depois de alguns toques de ternura, o ovóide parecia ter acordado.
Vibrava como o coração humano.
Inchava e desinchava.
Um zunido forte foi ouvido, e Marcondes assustou-se.
Imediatamente, verificou uma intensa dor na região genital, sendo levado, rapidamente, de volta à ante-sala.
— Sente-se melhor? - perguntou-lhe Eulália.
— Que aconteceu?
— Frequência vibratória.
— Ele sabe quem sou?
— Não. Mas sente.
— Jesus! O que se lê nos livros nem se compara à realidade.
São frios e húmidos. E...
— Repugnantes...
Não tenha receios de se expressar - interveio Eulália.
— É verdade - confirmou Marcondes.
— Somente sob a luz do amor, pode-se amar essas criaturas.
— Apesar disso, sinto-me atraído para eles.
— São nossos compromissos...
— Concordo.
Ainda que não saiba o que posso fazer por eles.
— Está passando a dor?
— Está diminuindo.
— Vai passar.
— Você está aqui este tempo todo, desde o desencarne?
— A câmara tornou-se meu lar, Marcondes.
Logo depois de socorrida, após a morte, passei por cirurgias complexas até extirpar o último ovóide.
Chegaram a diagnosticar que, somente regressando à carne, poderia ser feita a desvinculação de dois deles.
Entretanto, graças a hábeis servidores do Cristo, do Mais Alto, fui encaminhada à colónia específica de ovóides, onde recebi tratamento adequado.
— Sinto-me refeito!
— Vamos chamar o Doutor Inácio e...
— Não. Agora não - interrompeu o cavalheiro, segurando-a pelo braço e olhando-a com firmeza.
— Marcondes, sei de seus sentimentos.
Eu também estou como um caldeirão de saudade e alegria.
Mas, devido aos nossos impulsos nem sempre dignos, pediria que todo nosso encanto afectivo fosse vivido na companhia de nossos tutores em favor de nós mesmos. Compreende?
— Sim, Eulália! Desculpe-me.
— Não há nada para ser desculpado, meu amor - e apertou as mãos do companheiro com incontido carinho, beijando-lhe a face com respeito.
— É que estou como um menino ao revê-la!
— Eu também! Porém, desta vez, nosso encontro obedece à incomparável ocasião de recomeço e aprendizado.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Ago 18, 2018 8:47 pm

Compete-nos agir como filhos sob guarda dos nossos orientadores no que tange ao futuro.
Se nos permitiram o reencontro depois da fuga dos deveres, é para que possamos recompor o passado e construir nossa felicidade eterna.
— Esteja certa de que é meu desejo, Eulália.
Custe-me quanto custar!
Dou-me por satisfeito em abraçar-te sem culpa.
Mesmo amando-a tanto, ainda não havia experimentado tão sublime emoção.
— Ocorre o mesmo comigo.
— Quero pedir-lhe perdão, Eulália.
— Perdão? Pelo quê?
— Por envolvê-la em provas desnecessárias.
— Prova voluntária, seria o termo adequado.
Nada é desnecessário Marcondes.
Já posterguei em demasia o compromisso que me aguarda a cooperação junto a estas almas.
Não tenho mais tempo e preciso de seu apoio.
— Chamemos Doutor Inácio.
Que de sua boca venha o melhor para nós - externou Marcondes com sinceridade.
O par afectivo mostrava-se disposto a conter seus impulsos amorosos, destinando suas emoções de afinidade para o serviço do amor universal.
Consultaram o médico amigo que em resposta lhes disse:
— Um momento novo se avizinha para vocês dois.
Eulália prepara seu retorno e você, Marcondes, ingressa em vivências indispensáveis ao seu ajustamento.
Além disso, temos uma notícia boa para ambos... - e fez um suspense.
— Fale logo, doutor, quer nos matar do coração.
— Mortos não morrem, minha filha... - caçoou.
— Já tivemos um momento tão belo em nosso reencontro, que boa notícia poderemos ter?
— Selena está de regresso hoje à tarde, depois do longo curso com Odílio Fernandes.
__ Selena?! Minha mãezinha de outrora!
Não vejo o instante de abraçá-la.
É muito para meu coração em um só dia.
__ Faremos, portanto, uma reunião com Modesta, dentro de alguns dias, a fim de traçarmos metas de trabalho e crescimento.
Enquanto isso, ambos acompanharão Modesta e a mim nos atendimentos do segundo andar.
Existem vários casos que constituirão preciosas lições às suas novas experiências.
Vamos ao trabalho!
O encontro entre Selena, Marcondes e Eulália foi coroado de ventura.
Os laços se reataram em bases de esperanças com os compromissos futuros para o bem de todos.

39 Nota da autora espiritual: abstemo-nos dos detalhes por não constituir objectivo deste trabalho.
40 João, 11:25
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Ago 18, 2018 8:47 pm

23 - Tribuna da Humildade
"O Espiritismo se tornará crença comum, ou ficará sendo partilhado, como crença, apenas por algumas pessoas?
Certamente que se tornará crença geral e marcará nova era na história da humanidade, porque está na natureza, e chegou o tempo em que ocupará lugar entre os conhecimentos humanos"

O Livro dos Espíritos, questão 798.

O aprendizado não cessava.
Marcondes e Selena renovavam-se a cada dia.
Cada história revelava-lhes um mundo novo de reflexões acerca da imortalidade.
Aproximando o momento no qual traçariam os planos para o futuro sob os auspícios de Dona Modesta, foram convidados a conhecer uma das mais divulgadas tarefas de recuperação do Hospital Esperança, a tribuna da humildade.
Naquela tarde, o grupo compunha-se de vinte e cinco participantes.
Entre eles, dez evangélicos, cinco espíritas, cinco terapeutas que orientavam a técnica e alguns convidados e cooperadores.
Nos corredores do pavilhão Judas Iscariotes seguia Dona Modesta, matrona, acompanhada de Marcondes e Selena que se dirigiam para a tribuna.
Uma sala pequena para cinquenta pessoas, disposta em circulo, com um pequeno púlpito.
A disposição didáctica era interessante, porque, ao contrário do habitual, o palestrante ficava em posição abaixo do nível da plateia, lembrando mais as construções de teatro ao ar livre que propriamente um ambiente para exposição.
Antes do início, Selena interrogou:
— Qual o objectivo da técnica?
— Uma promoção para trabalhadores que completam algum tempo de labor junto ao pavilhão Judas Iscariotes.
O objectivo é vencer as escaramuças acumuladas durante a última reencarnação, e que ainda reflectem desfavoravelmente em seus afazeres.
— Quem falará hoje?
— Pastor Jânio.
— É pastor mesmo, ou apenas apelido?
— Um evangélico.
— Mas...
— Selena, estamos na hora do início, depois, teremos tempo para o diálogo.
Vamos nos assentar - concluiu Dona Modesta.
Um terapeuta de nome Carlos fez a abertura da reunião e convidou o nosso irmão para assumir.
Jânio é homem de meia idade.
Devoto dos ramos protestantes, fundou e actuou, por décadas, nas igrejas evangélicas no nordeste do Brasil, estado do Ceará.
Como não tinha dificuldades com público, assumiu a tribuna, olhou-nos a todos por um instante e pareceu emocionar-se ao olhar para Dona Modesta.
Então pronunciou:
— Amigos, perdoem-me a emoção.
É estranho que um homem acostumado a grandes públicos esteja, literalmente, engasgado ao olhar para esta pequena plateia.
Quero dizer, inicialmente, como fui orientado pelo meu terapeuta:
consultaram-me, previamente, e aceitei colocar minha vida em aberto.
Se estivesse na Terra, teria motivos de sobra para esconder o que vou dizer.
Porém, aqui, na vida espiritual, perdi todas as razões para uma vida de mentiras.
Tive uma juventude detestável, atolada no vício, até conhecer Marisa, a mãe de meus três filhos e a mulher responsável pela minha trilha religiosa.
Filha de evangélicos devotos, Marisa conquistou-me o coração e incentivou-me os cuidados cristãos à luz da religião.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:16 pm

Fundei uma igreja adesa a um enorme grupo já consagrado do evangelismo social.
Quando percebi como é fácil aglutinar multidões e convencer-lhes, perdi de vez o sentido de minha vinculação ao Evangelho.
Planos nefandos, rotulados por iniciativas louváveis para a causa, incendiaram-me os pensamentos.
Pastores experientes induziram-me a crer em uma senda inevitável para quantos servem ao Senhor:
a riqueza e a ostentação.
Com o argumento de sermos instrumentos poderosos de convencimento, passei ao consumo das ideias estratégicas sem laço com o coração.
Marisa, mãe zelosa e habituada aos argumentos dos seus pais, jamais me questionou as decisões, fazendo parte de tudo com a alma.
Eu, no entanto, passei a ter metas de conforto e luxúria.
Somente minha mãe, mulher espírita, dada à assistência aos pobres, preocupava-se com meu destino.
Porém, entre o vício de outros tempos e o homem de agora, minha mãezinha preferia o homem religioso a que me converti.
Nunca assumi para ninguém...
Detestava consultar a bíblia...
Sempre achei enfadonhos os textos...
Quando lia algo que me tocava o sentimento, abria um canal para culpas infindáveis; afinal quem era o Jânio senão um jovem ex-viciado e agora um pastor ganancioso?
Sentia-me pequeno, inferior.
Apesar de agraciado por multidões, tinha vontade de estiolar o cérebro.
Os conflitos aumentavam.
A ansiedade tomava-me de assalto.
Quando tive a coragem de consultar um dos grandes pastores, veio o conselho:
"seu problema é um só, Jânio!
Mulher... mulher...".
Então o último hausto de honestidade esvaiu-se de vez.
Preferi o equívoco, pois me agradou a ideia de que uma "autoridade" maior abonasse minha conduta com o seguinte argumento:
"pessoas dedicadas como nós temos alguns descontos perante Deus..."
A igreja estava abarrotada de fieis hipnotizados.
Mulheres belas e sofridas à procura de homens nobres e atenciosos.
Foi fácil, mais uma vez, foi fácil...
Minha mãe, novamente, foi convocada a agir, pois uma das crentes de que abusei passou a frequentar-lhe o centro espírita.
Sempre tinha um bom argumento, e tudo ficava como estava, a caminho da queda.
O prazer durante um bom tempo fez sentir-me melhor, mas depois...
Aí sim, veio o pior...
A depressão! Não conseguia esconder a tristeza, o enfado, a loucura por dentro.
Não tive alternativa ante o volume cruel de obrigações, senão pretextar uma longa viagem com a família.
As tricas políticas por fim afastaram-me do púlpito.
Em uma noite de dor, não suportei e dei cabo da vida...
Vejam essa marca.
E, surpreendendo a todos, abriu a camisa, mostrando o peito com larga marca cicatrizada por todo o tórax, parecendo uma velha casca de maracujá toda enrugada.
— No corpo físico, jamais alguém veria uma cicatriz dessa natureza.
Somente na vida espiritual pode-se aferir os efeitos do suicídio no perispírito.
Aqui, entretanto, a cada dia que olho no espelho para mim mesmo... - ele caiu em pranto convulsivo, sendo auxiliado por seu terapeuta com um lenço.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:16 pm

Olho para mim mesmo e penso na vida, penso em tudo que fiz, penso na parte boa de toda a minha história que resolvi esquecer:
os filhos queridos ainda pequenos, a mulher sincera, a bênção da religião, a mãe bondosa que não sei onde se encontra...
Jânio parou por um instante sob o influxo da emoção.
O público presente mantinha-se atento à fala do companheiro.
Os mais sensíveis, entre eles Dona Modesta, deixavam as lágrimas lavar a face.
E o pastor continuava:
— Que fiz para merecer socorro?
Não imagino.
Mas essa mulher que aqui está - e apontou para Dona Modesta -, tornou-se minha nova mãe, retirando-me de charcos de dor e loucura.
Passados cinco meses nesta casa de amor e misericórdia, ainda carregando o peso da culpa e as dores cruéis no peito, só posso mesmo agradecer e oferecer-me para algo fazer em favor de alguém.
Gostaria muito de pedir perdão a algumas pessoas.
Como não sei se as verei, peço licença a vocês presentes para me permitirem um ato de amor em favor da minha paz.
Jânio olhou com atenção para a plateia e, como se sondasse o íntimo de cada qual com sua capacidade de percepção magnética, repentinamente, ajoelhou-se em frente a um dos presentes, e beijou-lhe os pés.
Não conhecia a pessoa, nem sabia o nome e disse em voz alta:
— Meu irmão qual o seu nome?
— Célio
— Então, Célio, em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem glorifico, peço-lhe perdão, a ti meu irmão, porque mesmo não lhe tendo ofendido directamente, nem lhe conhecendo, vejo mágoa em seu olhar, vejo tristeza em sua fisionomia. Perdoe-me, Célio, não errei por intenção.
Fui um equivocado, um iludido por mim mesmo.
Amo a Jesus e quero segui-lo.
Perdoe-me irmão querido - e prorrompeu, novamente, em prantos, sendo abraçado efusivamente por Célio que demonstrou aceitar plenamente a atitude do Pastor.
Todos estavam emocionados ao extremo com a sinceridade de Jânio.
Não resistindo ao acto de perdão, seu terapeuta o recolheu em abraço fraternal e pediu a Célio que assumisse a tribuna para falar o que desejasse.
Jânio acalmara sua alma.
Sua fácies alterou, tornando-se leve, esboçando um sorriso e, de seu peito, uma fraca luminosidade podia agora ser percebida.
Do alto, um filete de luz prateada, porém com altíssimo potencial de amor, penetrava seu centro gástrico em profusão de bondade e ternura.
Os trabalhos continuavam.
Depois do pronunciamento sensibilizado de Célio, Jânio regressou à tribuna para responder a várias questões dos evangélicos presentes.
Em verdade, o tribuno fez uma catarse do grupo, aliviando suas próprias lutas.
Terminadas as alocuções que duraram sessenta minutos, os grupos se dispersaram, ficando Dona Modesta, Marcondes e Selena.
— Dona Modesta, que acontecerá com ele agora? -interrogou Selena.
— Estará mais aliviado e com novas amizades.
Viram como os evangélicos o cercaram?
— Ainda bem que nós espíritas não temos erros tão clamorosos!
- expressou Marcondes.
— Só mesmo quem não conhece com profundidade os dramas possíveis poderia afirmar algo assim, meu caro Marcondes!
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:16 pm

— Pelo menos suicídio eu nunca ouvi dizer que exista entre os espíritas.
Quero dizer, com excepção de Jandira que está nas alas restritas.
— Meu filho! Meu filho!
Não queira saber do sofrimento de muitos amigos de lide em plena sombra.
Em nossa ala de suicidas, temos inúmeros casos de espíritas.
— Dona Modesta!
Será possível?!
Nem os espíritas escapam?
- indagou Selena com curiosidade.
— Nem mesmo os espíritas escapam.
Viram a narrativa de Jânio.
A depressão é doença subtil que vem assolando muitos amigos de ideal, que não reconhecem, com humildade, sua condição enfermiça.
Temos casos de suicidas espíritas que jamais admitiram a possibilidade de consultar um psiquiatra.
— O que seria um contra-senso!
— Contra-senso por quê, Marcondes?
— Onde já viu um espírita necessitar de psiquiatra?
Isso seria admitir que não se vive o Evangelho, ou pior, que a doutrina não está sendo suficiente para nosso equilíbrio e orientação.
— Ledo engano!
A questão não está na doutrina, nem no Evangelho e sim em nós, os espíritas.
Somente desconhecendo a natureza de nossas necessidades, ou tentando ignorar a extensão de nossa inferioridade, pode-se exarar uma declaração como esta, pois, em verdade, a superlativa importância pessoal tem sido uma enfermidade comum entre amigos de lide.
Você lembra das lições obtidas com H. na ala dos unificadores?
— Lembro.
— Pois fique sabendo que muitos daqueles que já se encontram no segundo andar, em melhores condições, optaram pelo suicídio.
— Não consigo imaginar como um espírita, particularmente um líder espírita, pode chegar a tal ponto.
— É mais fácil que você possa imaginar, Marcondes.
O caso de Jânio ilustra bem esta trajectória.
— A senhora quer dizer que alguns espíritas fazem o mesmo percurso dele?
— Alguns fazem percurso pior.
— Então não são espíritas!
— Marcondes!
Pense em sua experiência pessoal, amigo querido, e diga-me se poderia se considerar espírita.
— Sabe de uma coisa, Dona Modesta?!
— Diga.
— Estou deixando de acreditar nos espíritas.
— Se me permite a sinceridade, acho que o senhor nunca acreditou.
— Talvez! Talvez!
— E digo mais: por pouco não deixou de acreditar na doutrina.
— Isso também, Dona Modesta?!
— Pois tenho motivos para acreditar que sim.
— Quais?
— Pelo interesse com o qual você assistiu à prelecção de Jânio.
— Não entendi bem...
A senhora quer dizer que...
— Quero dizer - interrompeu a matrona - que você adoraria fazer algumas perguntas e não teve coragem, porque diziam respeito às suas crenças mais íntimas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:16 pm

Se estivesse na Terra, uma hora dessas, abandonaria tudo e seguiria outra designação religiosa, envolvido pela sinceridade de Jânio.
— Dona Modesta!
Não seja indiscreta, porventura andou lendo meus pensamentos?
— Mais que isso...
— Não fiz as perguntas, porque o grupo de evangélicos deve ter lá seus problemas e abafaram o homem após a fala.
Não queria me envolver em coisas de protestantes...
— Acha mesmo que foi colocado neste grupo a mercê do acaso?
— Não existe acaso, não é mesmo, Dona Modesta?!
— A Doutrina Espírita é uma bênção de alívio e paz para quem a busca e absorver-lhe as lições.
Todavia, para quantos estacionam na superfície de seus ensinos, transforma-se em fardo consciencial.
Por essa razão, alguns confrades recorrem a alternativas.
Cansam de espiritismo!
— Cansar de espiritismo?!
Nunca havia pensado nisto!
Confesso-lhe que, se pudesse fazer ou viver algo aqui que não envolvesse a doutrina, seria uma experiência interessante.
Quem sabe estudar filosofia?
— Estudar filosofia e continuar se enganando?
Este cansaço, Marcondes, é proveniente do descompasso que criamos na interiorização dos princípios doutrinários.
O Espiritismo brilha somente para quem lhe oferece um espelho translúcido no coração capaz de reflectir-lhe a claridade infinita e benfazeja.
— Dona Modesta, posso perguntar? - indagou Selena.
— Já perguntou.
— Que faz Jânio neste Hospital?
— Prepara-se para trabalhar pelo bem das igrejas reformadas.
Guarda vínculos estreitos com o Hospital, porque foi um pedido de sua mãe que, ao fim da existência tornou-se espírita.
Ele fará um trabalho específico e árduo de convencimento e mudança de conceitos entre os evangélicos aqui presentes, para se adaptarem à realidade que querem negar.
— Temos por aqui alas específicas de evangélicos?
— Todos os seguidores e amantes da mensagem cristã encontram asilo nesta casa.
— Como são tratados, considerando que os orientadores do Hospital são espíritas?
— Com carinho e respeito incondicionais.
Essa a orientação de Eurípedes e do próprio Cristo quando asseverou:
"Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros".41
Há almas, nesta casa, com saudade das diversões terrenas.
Temos um centro cultural que reproduz parte dessas manifestações, com fins de entretenimento educativo através de teatro, música e cinema.
Temos também uma capela com fins terapêuticos para aquelas almas que sequer encontram motivos para continuarem a viver.
Carecem de manifestações exteriores.
Apesar disso, não é incomum encontrar alguns espíritas frequentando-a em preces sentidas e autênticas.
Nosso nosocómio é um centro de recuperação que reproduz muitos cenários terrenos com fins motivacionais e restauradores.
Claro que, em colónias mais ajustadas às finalidades ascensionais do espírito, certamente tais manifestações são abolidas, objectivando a consciência.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:17 pm

Aqui no Hospital Esperança, apesar de sua feição educacional, não conseguimos, por agora, escapar de sua característica eminentemente socorrista, atrelada ao mundo terreno.
Observando a fisionomia absorta de Marcondes, Dona Modesta provocou:
— Está intrigado com a capela, Marcondes?
— Como lhe disse, Dona Modesta, acho que vou parar de ficar surpreso.
Não duvido de mais nada.
Vou tentar ver tudo com naturalidade.
— Sua fala merece umas palmas - manifestou a orientadora com alegria - pois esse é o espírito da vida: naturalidade.
Vivê-la como ela é.
Celebrando a existência com fraternidade ao diverso, ao aposto, ao contrário.
Felizes são aqueles que conseguem caminhar dessa forma.
Distantes da terrível doença do preconceito e da indiferença.
— Por qual razão a senhora nos trouxe aqui? -intercedeu novamente Selena, que estava muito reflexiva sobre as novas informações daquela hora.
— Esta é a tribuna da humildade!
Já passaram por aqui alguns espíritas conhecidos, fazendo de seus mais singelos "pecados" um verdadeiro tributo à autenticidade.
Outros, em situações mais graves, tiveram a coragem de revelar desvios clamorosos de sua vida corporal.
— Expondo-se assim, de forma pública?!
— Mais cedo ou mais tarde, todos nós teremos que tratar nossas mais secretas amarguras e feridas.
É o preço pela liberdade.
Teremos que apontar nossas chagas para que o Médico Divino possa sará-las.
E apontar significa olhá-las no espelho da consciência.
Só é capaz de operar dignamente, nesse sentido, aquele que adoptar a postura mental da humildade.
Humildade é o ato de amarmo-nos como somos.
A tribuna, para esses, não passa de uma técnica auxiliar.
— Parece-me muito cruel ter que se expor assim.
Como será usada esta informação depois?
Não sei quanto ao mundo em que me encontro, mas, no plano físico, se agíssemos assim, certamente seríamos macerados.
Nossas informações seriam usadas contra nós e ai daquele que se expor!
— Não posso discordar de semelhante verdade.
Aqui, porém temos objectivos bem definidos e só participam da tribuna os pacientes que tiveram suas fichas exaustivamente analisadas.
O ato de se expor em nosso plano é sinónimo de alguém que, primeiramente, expôs-se a si próprio.
Assim como a regressão de vidas passadas é recomendável em alguns casos, a "tribuna psicológica" só terá efeitos benéficos para determinadas almas com traços peculiares de auto conhecimento.
— Em síntese, qual a função da tribuna?
— Sobretudo, encorajar os outros a se assumirem.
Ampliarem seu lento trabalho de desilusão, retirarem máscaras.
Existe um acompanhamento de especialistas terapêuticos de diversas modalidades, cujas qualidades morais são resultado de longo serviço de amor à dor alheia.
Cinco, entre vinte e cinco integrantes do grupo de hoje, são psicólogos e admiráveis estetas das ciências da alma.
Terapeutas psíquicos.
— Somente novatos a frequentam?
— Somente quem deseje vencer a si.
Temos sessões mais profundas em que alguns corações mais conscientes, de posse de muitas informações de suas vidas pretéritas, explicam as falhas da existência recém-finda sob a óptica de sua trajectória milenar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:17 pm

Algo maravilhoso e profundo, capaz de fazer nascer a sublime virtude da compaixão quando entendemos que aquilo que parece queda, na maioria dos casos, é avanço e crescimento, considerando as transactas existências carnais.
— Meu Deus!
— Que foi, Marcondes?
— Passou uma bobagem pela minha cabeça.
— Não é bobagem.
Antes fosse do jeito que você pensou.
— A senhora está lendo meus pensamentos?
— Mais que isso, repito...
— Mais?!
— Leio seus sentimentos
— O que senti?
— Desejo sincero de que esta fosse a realidade dos centros espíritas.
— Será possível que, um dia, venha a ser assim, Dona Modesta?
— Não tenha dúvida.
— Quando?
— Quando os espíritas desistirem dos estereótipos e laborarem pela maioridade.
Segundo Doutor Bezerra, temos setenta anos para instauração deste período; o período da maioridade.42
— É muito tempo...
— Um piscar de olhos...
— Permita-me uma pergunta meio rude, ante suas colocações, seria crível admitir que os espíritas estivessem teatralizando moral?
— Inconscientemente.
— Explique melhor, por favor.
— Não o fazem por deliberação, intencionalmente.
Apenas se defendem do que não desejam expor...
— Então teatralizam.
— Teatralizamos.
— Não me incluo nessa postura.
— Não se inclui por pura ausência de lucidez quanto a seu mundo subjectivo.
— O que a senhora quer dizer? - falou meio irritado o velho dirigente Marcondes.
— Que dificilmente alguém escapa de encenar virtude em nosso meio, amigo querido.
Faz parte das etapas de avanço.
Primeiro, os gérmens da reforma íntima fermentam longamente nos escaldantes caldeirões da intelectualidade.
Somente depois, bem depois, é que se inicia uma metamorfose nos escaninhos do coração, no qual, definitivamente, processa-se a reforma autêntica, a conquista do self.
Para cada um, esse tempo é diferente.
Diante do exposto, poderíamos denominar o irmão Jânio como um protestante espírita!
— Pastor espírita?
— Assusta-lhe a nomenclatura?
— É a pureza novamente não é, Marcondes?
— Para mim, existe um só tipo de espírita.
— E os outros...
— Os outros podem se dizer espíritas, mas não são.
— Qual seu conceito do verdadeiro espírita.
— O de Kardec.
Aquele que se esforça para domar suas más tendências.43
— E se o pastor Jânio estiver enquadrado nessa condição?
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:17 pm

— Mas ele não é um evangélico?
— Evangélico e verdadeiro espírita, segundo a conceituação Kardequiana.
Como ficamos?
— Ainda assim!
O que ele acredita ou sabe sobre mediunidade, reencarnação e os fundamentos espíritas?
— Kardec não fala que se reconhece o verdadeiro espírita por acreditar nos fundamentos espíritas.
— Está subentendido na fala do codificador, evidentemente, que ele se refere a quem crê.
— Marcondes, o que você acredita em relação ao futuro?
Teremos homens espíritas, ou homens de bem?
— O Espiritismo é a revelação da Verdade.
O homem terá que adopta-la inevitavelmente.
— Nem por isso todos vão ter de se tornarem espíritas. Concorda?
— Discordo. Mais cedo ou mais tarde, terão de se tornarem espíritas.
— Você não acha que seria mais razoável pensar que todos adoptarão os fundamentos da doutrina, mas cada qual conforme sua cultura e designação religiosa?
— Isso seria desfigurar o Espiritismo em sua pureza?
— E qual a pureza do Espiritismo?
— A que foi dada por Kardec.
— Kardec fez o Espiritismo possível em seu tempo.
Sem retirar-lhe a condição de missionário da Nova Era, o codificador foi um homem de seu tempo, sujeito à cultura de sua nação.
Veja que os próprios livros da codificação contêm larga influência da corrente positivista e mesmo da igreja.
Conquanto tenha sido um investigador incomparável, esteve submisso, como não poderia ser diferente, ao "caldo cultural" de sua época.
Vindo para o Brasil, a doutrina assimilou, por sua vez, os traços religiosos e sociais do nosso país.
— O que a senhora quer dizer com isso?
— Que o Espiritismo chamado de puro é uma criação da cabeça humana, tomada pelo preconceito, e que os espíritas de hoje são um "novelo cultural católico", um fenómeno social e histórico.
As práticas e conceitos doutrinários foram talhados pelo arcabouço milenar do homem religioso.
— Não, Dona Modesta!
Desculpe-me a interferência!
A senhora está exagerando e misturando as coisas.
Se todos pensarem dessa forma, onde vai parar o Espiritismo?
— Vai parar no lugar que ninguém, em tempo algum, conseguirá detê-lo de chegar.
— Onde?
— No terreno neutro.
Vai se tornar uma crença geral como afirma a sabedoria do Espírito Verdade, mas não uma religião geral.
__ ?...
— Vamos ler aqui um trecho de A Génese XVII, item 3 2:
"Afim de chegarem a esta, as religiões terão que encontrar-se num terreno neutro, se bem que comum a todas; para isso, todas terão que fazer concessões e sacrifícios mais ou menos importantes, conformemente à multiplicidade dos seus dogmas particulares.
Mas, em virtude do processo de imutabilidade que todas professam, a iniciativa das concessões não poderá partir do campo oficial; em lugar de tomarem no alto o ponto de partida, tomá-lo-ão em baixo por iniciativa individual.
Desde algum tempo, um movimento se vem operando de descentralização, tendente a adquirir irresistível força.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:17 pm

O princípio da imutabilidade, que as religiões hão sempre considerado uma égide conservadora, tornar-se-á elemento de destruição, dado que, imobilizando-se, ao passo que a sociedade caminha para frente, os cultos serão ultrapassados e depois absorvidos pela corrente das ideias de progressão."
— Como interpretar esse trecho?
— O Espiritismo não cria a renovação social e nem incute espiritualidade no povo.
A Terra avança paulatinamente para a maioridade na busca da noção abrangente de civilização.
Essa maioridade humana requer uma doutrina tão clara quanto o Espiritismo.
As pessoas se espiritualizam com ou sem o Espiritismo.
— Suponhamos que seja como a senhora diz.
E se eu quiser continuar espírita conforme o conceito que tenho de verdadeiro Espiritismo?
— É um direito que lhe cabe.
Contudo entenda que não é verdadeiro para todos.
Não será o caminho adoptado pela maioria ante o inexequível fenómeno mundial de espiritualização.
O seu conceito de pureza é parte nessa diversidade.
Merece ser acatado como parte de um todo.
— Falando assim, sinto um enorme desânimo para com o trabalho dos unificadores, do esforço que fazem milhares de homens pelo bem da doutrina.
— Essa a questão!
O bem da doutrina.
O homem realiza o que pode de melhor no seu conceito pela causa, pela doutrina.
No entanto, esquece que ela defende e prega o amor incondicional ao semelhante.
Ama-se a doutrina e desama o alvo central dela própria.
Uma incoerência que precisa ser corrigida.
— Isso me causa uma terrível insegurança.
— Em relação a quê?
— Aos exageros doutrinários, por exemplo!...
— Nesse enfoque, logo teremos "espíritas católicos", "espíritas umbandistas"...
— Teremos, não! Já temos!
Além deles, começam a surgir os "espíritas psicólogos", "espíritas artistas", "espíritas administradores", "espíritas ocasionais" e outros tantos.
— E como fica essa situação?
De espíritas, eles só têm o nome.
Como disse a senhora, são ocasionais.
São espíritas "em parte", ou seja, naquilo que lhes diz respeito.
— Explique melhor.
— O caso do psicólogo que se diz espírita, porque usa alguns conceitos espíritas em seu trabalho, podemos considerá-lo espírita?
— Sem dúvida.
— Ah, Dona Modesta! - debochou o dirigente - não consigo aceitar isso nunca!
Só porque um psicólogo ou um umbandista utiliza alguns conceitos espíritas, dizerem-se espíritas?! É demais!
— Por que demais?
— E onde fica a vivência dos princípios?
Quão distantes não estão do que propõe o Espiritismo!
— E o que propõe o Espiritismo?
— A reforma, a melhora, a ética do bem.
— Analisado dessa forma, pode-se fazer uma pergunta:
como se encontram os que se dizem verdadeiros espíritas em relação a essa reforma, a essa melhora, a essa ética do bem?
— Fazendo o melhor que podem para honrá-la dentro dos centros espíritas, firmes na tarefa.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:18 pm

— Mas com as mesmas lutas de todo ser humano, concorda?
— Concordo.
E o que tem isso a ver.
— Tem a ver que cada qual dará o passo possível em direcção a essa melhora, e não se surpreenda de encontrar por aqui alguns homens como o pastor Jânio, que jamais ouviram falar em Espiritismo e oferecem testemunhos como o que você ouviu e que, no entanto, encontram-se melhores que muitos espíritas nesse conceito defendido por você.
O maior problema do cristianismo primitivo foi ter banido o amor de suas relações.
Se usasse hierarquia e ritual, mas amasse...
— A senhora está pregando um Espiritismo ritualizado em nome do amor?
— Sou a favor do amor acima de quaisquer conotações filosóficas e religiosas.
— E os conceitos doutrinários, como ficarão nesse caso?
— São irretocáveis, desde que os vivamos em espírito e verdade.
O amor é o centro de convergência de todos os fundamentos espíritas.
Se advogarmos os princípios sem exemplos de amor legítimo, estaremos vivendo o processo chamado institucionalização, isto é, o aprisionamento de sentimentos em detrimento das convicções.
Essa atitude conduz ao desamor.
E uma das suas mais viris manifestações chama-se indiferença, isto é, a acção emocional de quem não pretende interagir com os diferentes e suas diferenças.
— E o modelo criado pelos unificadores, pelo esforço de Bezerra de Menezes, cuja história se confunde com as nascentes do Espiritismo brasileiro?
— O modelo inicial foi necessário.
O problema é torná-lo modelo definitivo.
O próprio Doutor Bezerra tem visão clara sobre as necessidades do momento, sendo ele próprio o mentor desta nova etapa das ideias espíritas para o mundo.
Acordos e iniciativas conjuntas com condutores espirituais de diversas nações são celebrados constantemente.
Há um clamor desses corações que amparam as nações da Terra no intuito de que as vertentes filosóficas do Espiritismo alcancem o território sob seus auspícios.
— Posso fazer mais uma pergunta atrevida?
— Adoro perguntas atrevidas!
— A senhora acabou de ler um trecho da codificação.
Aqui mesmo no Hospital, já os vi em pleno uso nas diversas mesas de estudo; o que a senhora pensa dos livros de Kardec?
— São como uma bóia.
— Uma bóia?...
— Para que serve uma bóia? - indagou Dona Modesta em atitude professoral.
Uma bóia é apoio a quem não sabe nadar!
— Nesse caso, sob aspecto espiritual, a humanidade inteira precisa dela.
— Precisam até que aprendam a nadar e singrar mares desconhecidos com o esforço pessoal.
— Quer dizer...
— Quero dizer que há muito por se desvendar.
A codificação abriu o véu da imortalidade, para que o homem penetrasse o mundo desconhecido da vida futura.
No entanto, o texto de Kardec não disse a última palavra.
Ao invés de sermos tão textuais em relação ao codificador, deveríamos estudar sua postura coerente, sua sensatez, sua prudência e sua capacidade investigativa.
O próprio codificador já renovou seu foco sobre o trabalho que ele mesmo realizou, acompanhando o progresso...
— O Espiritismo é a terceira revelação.
É a Verdade.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Ago 19, 2018 8:18 pm

— Caminho para a verdade e a vida.
— Caminho?
— Sem dúvida, o mais claro caminho oferecido por Deus ao homem para sua espiritualização na Terra.
— O melhor, eu diria!
— Prefiro não pensar dessa forma.
— Não? Por quê?
— O melhor para cada um tem conotações diversificadas.
Voltamos à origem de nossa conversa.
É mais interessante tornar-se um homem de bem, que um espírita dentro dessa conceituação estereotipada.
O Espiritismo dissecou a imortalidade.
Abriu panoramas para analisar a continuidade da vida.
Desvendou a "anatomia do céu" e orientou como alcançá-lo.
Mas não disse tudo.
Pequena ponta do imenso véu está aberta pela sabedoria dos ensinos espíritas.
O mérito da doutrina é conferir lógica aos princípios religiosos de todos os tempos e conectá-los com a ética da benevolência aplicada.
Indiscutivelmente, sem quaisquer reducionismos, o triunfo da doutrina não foi somente o de reafirmar a imortalidade, um princípio já consagrado em várias culturas, mas sim o de dissecar esse tema, esquadrinhando a "anatomia da morte", conferindo-lhe carácter comportamental.
A lógica adveio da experimentação, e a ética sobressaiu dessa como sendo a alma das ideias espíritas.
A lógica ilumina a razão para conquista de uma fé racional, e a ética impulsiona o ser para adopção dos caminhos libertadores rumo à consciência divina de nós mesmos.
— Confesso que a argumentação da senhora balança meus conceitos.
Todavia não consigo aceitar, de coração, suas colocações.
Para mim, o verdadeiro espírita é só um e não tem meio termo.
O verdadeiro espírita é aquele que está na comunidade, seguindo os preceitos de Kardec.
— A comunidade espírita, em verdade, é um exemplo no que tange ao esforço sacrificial para vencer a rotina imprimida pelas ilusões mundanas.
É uma seara bendita que deve ser interpretada como excelsa enfermaria para recuperação de nós próprios.
Em que somos diferentes dos demais religiosos?
Já vivemos a ética da imortalidade?
Qual de nós venceu por completo a roda dos interesses pessoais?
Quantos já desenvolvemos o pensamento reencarnacionista a ponto de iniciar o projecto do futuro retorno?
Necessário avaliar que as vitórias e aquisições, à luz do espírito imortal, não passam de matrizes valorosas, porém embrionárias para germinações na longa peregrinação evolutiva.
Não se equivoque!
A comunidade espírita brasileira é um centro de recuperação para almas acentuadamente enfermas tanto quanto nós três...
— Perdoe-me a sinceridade que faz bem ao seu gosto, mas não sei se chamo a senhora de louca ou inteligente! - manifestou o dirigente com humor.
— Pouca diferença existe entre loucura e inteligência.
Digamos que os inteligentes são loucos educados...
De minha parte, creio que nem isso eu seja.
Sou uma louca... Louca pelo Cristo!
A vida de qualquer discípulo não é mais a mesma depois de passar pela tribuna da humildade.
A tarefa criada por Dona Maria Modesto Cravo, sob aprovação de nosso director, alcança índices gloriosos na libertação de almas aprisionadas às suas próprias mentiras.
Qual de nós não terá que subir a essa tribuna ao longo do espinhoso caminho da desilusão?

41 João 13:35.
42 Seara Bendita, Editora Dufaux - mensagem "Atitude de Amor".
43 O Evangelho Segundo Espiritismo, capítulo XVII, item 4
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Ago 20, 2018 8:08 pm

24 - Geração Solidária
Não se deve entender que por meio dessa emigração de Espíritos sejam expulsos da Terra e relegados para mundos inferiores todos os Espíritos retardatários.
Muitos, ao contrário, aí voltarão, porquanto muitos há que o são porque cederam ao arrastamento das circunstâncias e do exemplo"

A Génese, capítulo XVIII. A Geração Nova, item 29.

Após intenso labor em dias seguidos de auxílio e socorro, Dona Modesta convidou Cícero Pereira, Marcondes e Selena para um instante de entretenimento em sua residência, nas cercanias do Hospital Esperança.
O momento era de intimidade.
A anfitriã conservava os velhos traços da mineira hospitaleira.
Uma boa xícara de chá refazente era servida enquanto a conversa absorvia-os em clima de descontracção.
— Quanta dor nessas plagas! - manifestou Selena.
— A vida espiritual tem também suas alegrias, não é mesmo, Dona Maria? - atalhou o Professor Cícero.
— É verdade! Muitas alegrias!
— Dona Modesta, fui informada, em conversas de rotina com servidores do Hospital, que a senhora guarda vínculos profundos com algumas criaturas no plano físico! Seria a mentora deles?
— Ah, Selena!
A história é longa...
Quer mesmo saber?
— Adoraria!
— Estávamos em plena década de quarenta.
O Sanatório Espírita Uberabense comemorava conquistas essenciais junto ao trabalho desobsessivos dos pacientes.
Inácio, na condição de médico humanitário e investigador, sob tutela de Eurípedes que se valia de minhas faculdades sensitivas, desenvolvia métodos de recuperação jamais imaginados.
Nossas reuniões de intercâmbio obedeciam ao critério da espontaneidade.
Que saudades desse tempo inesquecível!
Começaram a aparecer da parte de Doutor Bezerra, a esse tempo, alguns pedidos de socorro para almas tratadas com desvelado carinho pelo benfeitor.
Seu amor era tanto que me penalizava pela situação daqueles espíritos.
Alguns deles eram justiceiros - assalariados de organizações ligadas aos dragões da maldade.
Doutor Bezerra dizia:
"O socorro medianímico a essas almas tombadas significa o trabalho paciente de investir no futuro luminoso da humanidade.
Um dia, eles usarão a força e a inteligência de que são depositários na implantação do reinado do bem.
Falta-lhes direcção.
Nossa tarefa, portanto, reveste-se de grande importância ante o contingente de medidas levadas a efeito pelos organizadores planetários em favor dos destinos regenerativos de nossa amada Terra.
Laços estreitos nos ligam a esses corações na tessitura do tempo..."
Naquele tempo, nunca vou me esquecer, em um sábado, no início da década de cinquenta, após desgastantes actividades no Sanatório, fui me refazer um pouco em meu quarto.
Estava assentada na beira da cama, quando adentrou Eurípedes e falou-me:
— Dona Modesta, temos que ter muito carinho com essas almas a que estamos assistindo nas reuniões de intercâmbio.
Perguntei-lhe espontaneamente:
— Benfeitor, existe algum motivo especial?
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Ago 20, 2018 8:08 pm

— Nossos irmãos têm muito medo da reencarnação.
Querem protecção e temem novos fracassos.
Como peregrinaram pelo caminho obscuro da justiça impiedosa, sabem que também podem ser cobrados e castigados.
— Como poderei ajudar, querido benfeitor?
— Eles estão sendo preparados para um glorioso futuro.
Sabem que a senhora tem o tempo de vida física traçado.
Sabem também que é esperada por aqui para assumir graves responsabilidades junto ao Hospital Esperança.
Então, muitos deles, especialmente os que guardam vínculos com nosso passado, têm nos pedido tutela e amparo.
Regressarão nesta década e na seguinte com tarefas definidas.
— Terei condições para algo realizar?
— Eles esperam que os conforte com a promessa de assisti-los ao longo da tarefa de reerguimento consciencial na carne. Pedem o seu aval, Dona Modesta.
— Mas não seria melhor que Inácio, quem os "doutrina", fizesse essa fiança?
Ou mesmo você, meu benfeitor, que já se encontra liberto do corpo e dando-lhes todo carinho?
— Eles sentem o seu amor de mãe.
Querem a senhora e têm o nosso consentimento.
— E o que preciso fazer para que possam acreditar que vou ampará-los?
— Regressaremos com muitos deles nas reuniões para o diálogo promotor dessas promessas de luz.
— Mas poderei saber a razão de tão carinhosa manifestação de carinho de Doutor Bezerra com esses corações?
— Eles retornam como lírios de esperança, colhidos e preparados pelo paladino do amor, com missões junto à obra redentora do Cristo.
— Querido benfeitor!
Com tantas lutas e sentimentos como podem ser mensageiros do Cristo?
— Trazem o coração encharcado de culpas e dores, entretanto são almas valorosas pelas disposições comunitárias que apresentam em suas inúmeras trajectórias carnais...
Dona Modesta, para que possa entender como Deus assiste almas desse porte moral, estude o belíssimo texto "A Geração Nova" contido em A Génese de Allan Kardec.
Foi assim que me vi compelida a fazer infinitas promessas de tutela nos últimos quinze a vinte anos de minha peregrinação na carne44, junto a inúmeras almas desoladas.
Seja nas reuniões mediúnicas, ou mesmo fora do corpo, durante o repouso, envolvia-os em emotivos acordos de sensibilidade e ternura.
Acreditavam solenemente em mim.
Tornei-lhes mãe em espírito.
Eu passaria para cá e eles para o corpo.
Com sinceridade, enquanto no corpo, não imaginava satisfatoriamente, dentro de meu espírito indagador, sobre como se daria semelhante destino.
Desencarnei, e uma das primeiras iniciativas de Doutor Bezerra foi dizer-me que precisava de conhecer meus filhos adoptivos na Terra, que foram atendidos pelas minhas faculdades mediúnicas.
Tinham entre dois a quinze anos de vida física.
Lembro-me que a primeira criança visitada era ainda uma menina muito clara.
Ao vê-la, chorei copiosamente sem saber exactamente a razão.
Visitei um a um.
Eram quase trinta.
Todos, médiuns.
Espalhados por esse país do Evangelho, passaram a ser parte intensiva de minhas realizações nesta casa de amor.
Estão, pouco a pouco, com tenazes lutas interiores, buscando sua redenção.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Ago 20, 2018 8:09 pm

Com o tempo, assumirão suas tarefas doutrinárias.
Tenho procurado, com auxílio e orientação do Mais Alto, uni-los pelos laços sacrossantos da fraternidade e da afinidade de propósitos.
O cumprimento do compromisso assumido significa a redenção espiritual para muitos deles.
Acompanhar os passos de meus tutelados tornou-se a mais gratificante tarefa.
Tenho muitas alegrias quando os vejo ajustados, crescendo.
Mas nem tudo tem sido facilidade e pura alegria.
Muitos têm sofrido as cruéis lâminas da justiça que um dia aplicaram sem amor.
À frente de responsabilidades imensas, sucumbem sob a expiação do orgulho e dos ímpetos de mando.
Estão aprisionados às teias do personalismo, esse estado mental de centralização em si mesmo. Outros, conquanto as tenazes provas, prosseguem intimoratos, embora carentes de apoio incondicional.
— E a senhora prossegue assistindo-os? - perguntou Selena.
— Com o tempo, vim a ser mais esclarecida sobre os meus laços com aquelas criaturas.
Além de elos do pretérito, faziam parte do grupo de escolhidos por Doutor Bezerra para compor a geração solidária.
O compromisso é mais amplo que eu mesma podia supor...
A história sensibilizava Selena e Marcondes.
Como de costume, o momento de entretenimento entre almas ávidas por aprenderem tornava-se repasto educativo.
Curioso com a nova expressão, indagou Marcondes:
— Pode nos explicar o que seja a geração solidária?
— Creio que o Professor Cícero é a pessoa certa para falar do tema - colocou Dona Modesta.
Ele, inclusive, depois do desencarne45, chegou a cooperar no renascimento de alguns deles.
Sem pestanejar, o professor participou da conversa pela primeira vez.
— Em razão da índole mental dos que organizaram o movimento espírita brasileiro, Doutor Bezerra, antecipando medidas preventivas contra o excesso institucional, em plena década de quarenta, iniciou os preparativos para reencarnar oitenta líderes com tarefas definidas junto à colectividade doutrinária.
A geração solidária tem esse nome, porque a solidariedade indistinta, acima de quaisquer preconceitos ou bandeiras, seria o traço moral marcante desse grupo.
Somente os solidários constroem a benevolência efectiva.
Se formos apenas tolerantes e bons trabalhadores sem o quinhão da solidariedade, corremos o risco de construir obras circunscritas ao raio de nossas necessidades e interesses.
A solidariedade é composta pelo exercício da inteligência, da acção sacrificial e do desprendimento.
É transcender o limite da primeira para a segunda milha, conforme o ensino de Jesus.
Seriam, portanto, os arejadores, aqueles que fomentam o "oxigénio" ante os rigores das convenções, capazes de asfixiar os melhores programas de elevação e progresso.
— Seriam então preparados directamente por Doutor Bezerra? - manifestou o dirigente.
— Um grupo de educadores, ligados ao coração de Eurípedes Barsanulfo, passaram a ser os preceptores do projecto, tendo à frente Commenius46 - almas de elevada estirpe moral, que prepararam os oitenta líderes com as mais legítimas noções da educação pelo coração, acendendo a chama da aspiração de um porvir redentor para todos eles.
Até hoje, continuam velando pelos passos de nossos irmãos.
Devidamente orientados, os oitenta servidores foram incumbidos de romper com os limites, ampliando os horizontes das áreas a que cada qual ficou responsável.
Ampliariam conceitos e trabalhariam com intuitos renovadores na comunidade doutrinária.
— Actuariam em quais áreas?
— Trinta deles, com programas na mediunidade, cuja missão seria dilatar a noção sobre a interacção das sociedades física e espiritual, culminando em uma visão mais realista e multifacetada da vida extrafísica.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Ago 20, 2018 8:09 pm

Outros trinta seriam os expoentes da cultura, pensadores com a missão de fertilizarem a gleba com visão pluralista, rica de diversidade, cujos conceitos dilatassem a fé racional, dissolvendo o dogmatismo e o preconceito.
E vinte operários para fundação de institutos com os traços organizacionais de cidadania espírita, uma interacção de conhecimentos e um campo de trocas para alavancar o progresso social.
A geração solidária tem por missão corroborar com a implantação do período social do Espiritismo previsto por Allan Kardec na Revista Espírita, em novembro de 1869.
A esses oitenta corações foi entregue a santificada oportunidade de edificarem os pilares para o tempo da maioridade na colectividade doutrinária.
—Conseguirão mudar, sozinhos, a feição do movimento?
Apenas oitenta pessoas?!
— São oitenta mentes com grande poder de influência e formação de opinião.
Entretanto, em torno deles, estende-se uma cadeia de milhares de corações ligados pelos laços de cooperação e afinidade.
Eles serão apenas os detonadores das referências de transição entre um tempo de mutações céleres e necessárias do conhecimento espírita.
Esses oitenta arautos estimularão, em tese, a renovação dos modelos institucionais, das práticas doutrinárias e do perfil moral do verdadeiro homem de bem.
Alargarão horizontes e referências éticas para a comunidade no iniciar do milénio, focadas no trabalho em equipe e no compromisso com a causa, e não com a casa.
— Apesar das lutas que carregam, poderíamos considerá-los missionários?
— São almas com experiências sucessivas nas áreas em que assumiram compromisso.
Os médiuns são corações que já estagiaram nas furnas da maldade, guardando em seu psiquismo, uma clara ideia das movimentações da perversidade.
Dotados de larga resistência mental, serão sementes de serviços socorristas complexos na criação de novos modelos de relação espiritual.
Os pensadores são os corações que desenvolveram a arte de comunicar ideias novas conectadas à base universalista do Espiritismo, convergindo a acção espírita para uma relação sadia e uma ética de cidadania com a sociedade.
O grupo dos dirigentes é composto por almas que dominam larga habilidade para criação de novos modelos de trabalho e acção cooperativa em rede.
— Quer dizer que reencarnaram na década de quarenta? - voltou a participar Selena.
— Alguns nos fins de quarenta e, a maioria, na década de cinquenta.
— Esses oitenta líderes poderão falhar?
— São cartas vivas de esperança a serviço da obra redentora do Cristo.
São as sementes férteis de novos tempos.
Virão depois os cultivadores, os arautos de uma nova civilização no campo social.
Existem chances enormes de se desviarem, entretanto o contingente de dor e amargura experimentado nos sucessivos fracassos de outras tentativas, ser-lhes-ão o esteio seguro e promissor.
Além disso, pela envergadura da tarefa a que se submetem, serão alvo de muito amparo, tendo em vista a natureza árdua de suas missões.
— E como estão hoje?
— Pouco mais de vinte por cento cumprem suas tarefas a contento.
Sessenta por cento estão inseguros sobre os rumos a tomar em suas actividades ante as ameaças do tradicionalismo.
E quase vinte por cento já desistiram totalmente.
Muitos dirigentes renderam se ao comodismo.
Alguns médiuns entregaram-se ao interesse pessoal, e quase todos os pensadores transformaram-se em rigorosos juízes da seara com sua habilidade de enxergar.
Em tese, exceptuando os que se mantiveram fiéis, os demais se fascinaram com as sugestões do cansaço e da excessiva capacidade de filosofar e questionar sem realizar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Ago 20, 2018 8:09 pm

— Meu Deus! Então vinte por cento desistiram?
Mas como pode ser?
Não foram tão preparados por Bezerra?
— Suas ideias, amigo querido, reflectem o espírito de menor esforço, uma ilusão comum à maioria dos seguidores do Cristo.
Somente estudando com atenção o capítulo evangélico de Maria de Magdala, encontraremos entendimento preciso sobre quem são os trabalhadores da última hora.
Esses vinte por cento não desistiram por simples opção.
Em verdade, sequer chegaram a ter consciência da missão que lhes estava destinada.
Sequer imaginavam o quanto os céus depositaram sobre seus ombros.
— Não foram então avisados?
— Diz O Evangelho Segundo Espiritismo, no capítulo XXI, item 9:
"Outra consideração:
os verdadeiros missionários de Deus ignoram-se a si mesmos, em sua maior parte; desempenham a missão a que foram chamados pela força do génio que possuem, secundado pelo poder oculto que os inspira e dirige a seu mau grado, mas sem desígnio premeditado.
Numa palavra:
os verdadeiros profetas se revelam por seus actos, são adivinhados, ao passo que os falsos profetas se dão, eles próprios, como enviados de Deus.
O primeiro é humilde e modesto; o segundo, orgulhoso e cheio de si, fala com altivez e, como todos os mendazes, parece sempre temeroso de que não lhe dêem crédito ".
— Portanto uma missão verdadeira nunca é revelada.
É descoberta.
É construída.
Somente agora, depois do esforço sacrificial de quantos se mantêm firmes na empreitada, convém-nos dar notícias ao mundo físico sobre tal assunto, considerando a extensão das responsabilidades assumidas por esses arautos da diversidade.
Esses oitenta homens e mulheres estão em plena maturidade das forças físicas.
Essa Boa Nova chegar-lhes-á como estímulo renovador e confirmação oportuna aos roteiros luminosos que escolheram para suas existências.
— Não lhes incensará a vaidade?
— Para os decididos a servir, será visto como responsabilidade adicional.
Para os indecisos, será um incómodo educativo.
Para os desistentes, um alerta recuperativo.
— E... - ficou constrangido o aprendiz.
— Pode indagar à vontade, Marcondes.
Não tenha receios da curiosidade inútil.
— Todos estão na carne?
— Sim.
— E se falharem?
— Os oitenta são os chamados.
Se não fizerem, vamos às "esquinas", como diz a predica evangélica das Bodas(4).
Contudo alguns recursos de protecção e estímulo poderão ser suspensos.
— E qual o objectivo de serem retirados esses recursos?
— Deixarem os irmãos na carne colherem o fruto amargo da inconsciência com o qual aprenderão a melhor cuidarem dos tesouros celestes.
— Não será um ato de covardia e abandono? - interveio Marcondes um tanto alterado.
— Amigo querido, a misericórdia não pode incentivar a proliferação do joio na leira divina quando chega o instante inevitável da ceifa.
Se ela atua incessante, ainda que abonando falhas e desajustes humanos, é porque, ao lado do joio nocivo, emergem lentamente as sementes viçosas de trigo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Ago 20, 2018 8:09 pm

Porém, se as sementes promissoras, por algum motivo, deixam de ser lançadas na cova fria do sacrifício, para oferecem o fruto desejável, então o Senhor da vinha deve tomar medidas para não perder sua colheita de esperança e paz.
Tocada pela resposta, Selena questionou:
— As missões de nossos companheiros permanecerão sempre restritas às áreas especificas?
— Nem sempre.
Alguns deles, devido ao ímpeto de servir e aprender, poderão estagiar nos três campos distintos, sendo que serão mais hábeis, em particular, naquele que foram mais bem preparados.
Encontraremos, por exemplo, médiuns que serão difusores da cultura nova, podendo vir a ampliar sua esfera de acção na fundação de institutos de cidadania.
— Quando serão preparadas novas missões para o movimento espírita?
— Minha filha, todos os dias são preparados mentes e corações pelo Espírito Verdade para servirem em Sua obra.
Não imagine a geração solidária como um acontecimento isolado ou de importância histórica incomparável.
—Então Doutor Bezerra já preparou outros missionários?
—Não somente ele, mas todos os servidores do amor incondicional não cessam em medidas pela implantação do bem na Terra.
A geração solidária. foi apenas a primeira leva colectiva de espíritos, que fizeram seu projecto reencarnatório a partir de uma missão delineada, integralmente, dentro do Hospital Esperança.
Após quase uma década de funcionamento, já que foi criado, no iniciar da década de trinta, os trabalhos foram se especializando a ponto de constituir um núcleo avançado de reencarnações, conquanto não seja sua especialidade.
Doutor Bezerra solicitou a Eurípedes ajuda para a comunidade espírita nos idos de 1940.
Eurípedes resgatou e preparou, pessoalmente, os oitenta.
Depois deles, já tivemos milhares de almas com renascimento corpóreo programado nesta casa, sob tutela de nosso director.
— Todos no meio espírita?
— A maioria.
Alguns servem em comunidades estrangeiras,
onde o coração de Eurípedes guarda imensos compromissos.
— Pode me dar uma ideia?
— Na Grécia e na Abissínia.
— Apesar de não serem missionários, creio que esse grupo tem alguma qualidade em comum para terem sido escolhidos.
Concorda, professor? - interveio novamente o ex-dirigente goiano.
— Concordo. São almas que trazem em comum uma excelente qualidade:
estão cansados de errar. Faliram inúmeras vezes em tarefas colectivas.
Guardam extensa bagagem política, intelectual e religiosa.
Conhecem bem os atalhos da perdição.
— E essa qualidade lhes bastará?
— Cansados do mal, repudiam, antes de tudo, em si mesmo, o mal que irão combater na leira cristã.
Tornam-se, dessa forma, portadores de uma apólice de segurança contra os velhos ímpetos de ver os problemas de fora e não por dentro.
Com essa qualidade, colocarão a missão acima de quaisquer outras realizações de suas vidas.
Somente então descansarão de si próprios, servindo e amando, aprendendo e sacrificando.
— Perdoe-me a insistência, mas o senhor ainda não me respondeu.
Somente com essa qualidade terão êxito?
— Jamais podemos assegurar êxito a quem quer que seja na reencarnação.
Tomamos sempre providências cautelares.
O Hospital Esperança lhes será abrigo e ninho de refazimento.
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Todavia, para ser mais claro, posso lhe assegurar que somente esse quesito pode não lhes ser o suficiente contra a lisonja e o personalismo.
Confiamos muito mais em outra medida de vigilância adoptada em seus projectos reencarnatórios.
— E qual é?
— A condição de parceiros afectivos.
Corações que lhes serão arrimo emocional indispensável ao tentame.
— O senhor estará falando de protecção espiritual especial?!
— Não. A protecção será especial no que tange aos recursos de nosso plano.
Nenhum projecto do amor sobrevive sem esse círculo de amparo, as trincheiras de amor ao Cristo.
Os ataques subtis dos antipatizantes do bem se renovam a cada dia em inteligência e persistência.
Contudo, por mais misericórdia de nossa parte - os que nos achamos fora da matéria densa - não ultrapassaremos o valor dos parceiros afectivos que o homem pode contar em seu próprio plano de acção.
— Que parceiros são esses, professor?
— Estou falando do lar, o sagrado átrio das operações de crescimento da alma.
Estou falando da família, especialmente a família espiritual com a qual esses bandeirantes, inexoravelmente, haverão de contar ante tais desafios.
Quaisquer grupos ou equipes que lhes devotem amor sem exigências, ser-lhe-ão repasto e fonte de ânimo para a jornada.
— Família espiritual?...
Hum! Hum! Velha questão subjectiva para mim, professor!
Já tive muita decepção em acreditar que fulano ou beltrano fizesse parte de minha família espiritual.
Sempre ouvi a expressão, mas somente agora, estando "morto", começo a me interessar por ela.
Como reconhecer a família espiritual?
Dona Modesta, atenta ao diálogo, depois de terminar seu chá, com muita fleuma, dirigiu-se ao professor:
— Permita-me professor?
— Ninguém melhor para falar do tema que a senhora!
— A família espiritual é constituída pelos corações que, na tessitura do tempo, criaram laços afectivos profundos, sendo que, em muitas ocasiões, esses laços foram desprezados pela desonra moral.
Ainda assim, perante o monturo das decepções e das mágoas, o amor é o esteio da família espiritual.
Nesse capítulo das obras espirituais, muitos de nós somos colocados, pela reencarnação, no caminho de nossas afinidades.
Como a Terra ainda é uma escola de reeducação, tais afinidades, resgatadas pelo esquecimento do passado, surgem nas fileiras dos serviços doutrinários, atraindo-nos para uma proximidade espontânea, um encanto para caminhar juntos no ideal de enobrecimento moral.
Entretanto, se descuidarmos de viver os convites da Boa Nova evangélica, podemos reactivar as sombras do pretérito.
Nessa conjuntura, mesmo os afins serão convocados a intenso esforço de recuperação para se amarem, sendo-lhes exigido tributos de sacrifício e renúncia, abnegação e ternura no intuito de conseguirem manter as obras cristãs que ergueram sob a égide da espiritualização.
— Então nem mesmo as afinidades são garantias de êxito?
— Afinidade, assim como tudo que a vida nos brinda para celebrar o bem, são responsabilidades pelas quais devemos zelar com a máxima prudência, para que jamais se transformem em pasto de arbitrariedade, ou espelho para projectar nossas carências. Afinidade espiritual deve significar arrimo para confiança e estímulo para crescer sem os equívocos da ilusão.
Seja como for, esteja certo que, mesmo entre os afins, a construção do reino do Cristo, na intimidade, exigirá tempo e devoção para a construção de relações sadias e duradouras, que libertem e edifiquem os valores imortais.
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— Pelo que vejo, tinha conceitos muitos superficiais de afinidade espiritual.
— Para muitos, afinidade é estar com aquele que pensa da mesma maneira, ou que tem os mesmos gostos!...
— E não é?
— Os afins, à luz do espírito imortal, são aqueles que constroem juntos na fieira do tempo, a devoção espontânea e o respeito incondicional, fazendo-se amigos honestos e companheiros leais ao regime da confiança espontânea, ainda mesmo que divirjam sobre os mais variados pontos de vista.
Na obra do Cristo, os afins são aqueles que decidem se amar, apesar das diferenças...
A conversa tomava rumos instrutivos sem perder o encanto do momento festivo, um verdadeiro recreio educativo.
Professor Cícero e Dona Modesta, que já haviam repetido a mesma história infinitas vezes, contavam-na como se fosse uma novidade, com desvelo.

44 Maria Modesto Cravo desencarnou em 08 de agosto de 1964.
45 Cícero dos Santos Pereira desencarnou em 04 de novembro de 1948.
46 Johann Amos Commenius, educador alemão.
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25 - Planos para o futuro
"Para quem iremos nós Senhor se tens a palavra de Vida Eterna?"
Mateus, 6:28 a 30

Chegara o dia da reunião com Dona Modesta.
Seriam discutidos o destino e traçadas metas para Selena e Marcondes.
Ao todo, haviam passado seis meses de permanência com nossos amigos na "Casa de Eurípedes" - como é chamado, por muitos, o Hospital Esperança.
Marcondes e Selena concluíram uma síntese de sua pregressa reencarnação.
Apesar dos percalços naturais, com espantosa rapidez, adaptaram-se à rotina dos serviços enobrecedores.
Restava-lhes, como era justo, talhar o carácter, rever pontos de vista, educar valores, cooperar.
Ninguém se livra de si próprio.
Essa é a grande lição da morte física.
Os dramas conscienciais, os impulsos, as enfermidades morais, persistem além-túmulo.
A boa vontade e a alegria de servir - alma das tarefas doutrinárias - atraem protecção e misericórdia.
Contudo a alforria mental é galgada por quantos se entregam ao afanoso trabalho de crescimento interior.
Nem sempre a contenção de impulsos conduz à transformação.
Nem sempre a actividade doutrinária significa libertação.
Assim como nem sempre a experiência do conhecimento adiciona paz e serenidade.
Velhas ilusões de grandeza têm banido, de corações puros e bem intencionados, a oportunidade da reeducação.
Inúmeros companheiros, avassalados por prestígio e facilidades, abandonam a essência e encantam-se com a forma, as exterioridades.
O resultado inevitável desse trajecto de descuidos impensados é a negligência com deveres primordiais ao equilíbrio da alma após a morte.
A sábia indagação do codificador e a inspirada resposta dos Sábios Guias merecem muita meditação:
"Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?"
— Não; cumpre-lhe fazer o bem no limite de suas forças, porquanto responderá por todo mal que haja resultado de não haver praticado o bem."47
Imperioso disputar o bem, abolir folgas, renunciar gostos.
— "Oh verdadeiros adeptos do Espiritismo!...
Sois os escolhidos de Deus!
Ide e pregai a palavra divina.
Ê chegada a hora em que deveis sacrificar à sua propagação os vossos hábitos, os vossos trabalhos, as vossas ocupações fúteis.
Ide e pregai. "48
Marcondes continuava procurando seu mentor.
Selena tinha suas crises intermitentes de angústia em relação ao futuro da casa espírita.
No andar térreo, na hora aprazada, reuniram-se Dona Modesta, Doutor Inácio e o trio que começava a desenhar um futuro de bênçãos para a extensa família espiritual:
Marcondes, Selena e Eulália.
A benfeitora, após as saudações afectuosas, especialmente entre Selena e Eulália, coordenou a fala:
— Meus filhos, sempre chega o instante divino de falarmos sobre o futuro, tecermos planos em favor de nossa paz.
Temos inúmeros casos similares nesta casa de amor, nos quais almas queridas arquitectaram o regresso à carne em bases de compromisso e reajustamento, crescimento e cooperação.
O retorno de Selena e Marcondes para cá preencheu de esperança o coração de Eulália, que rogou a Bezerra a intercessão benfazeja em favor de suas lutas.
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Reunimo-nos aqui, não só para auxiliá-los a pensar esse futuro, mas também para encaminhar-lhes um apelo de nosso director, Eurípedes Barsanulfo.
— Um apelo de Eurípedes para nós?
É algo grave assim? - expressou Marcondes.
— Estamos reunindo informações sobre vários casos do Hospital Esperança para enviá-las aos homens.
Eurípedes fez um convite aos administradores da casa nesse sentido.
Compulsando os arquivos do Pavilhão Judas Iscariotes, sob nossa tutela, gostaríamos de destinar a história de vocês, com urgência, ao plano físico, no formato de um livro mediúnico.
Vocês nos permitem?
— Dona Modesta!
O que há de tão sério em nossa história para ser motivo de livro? - questionou Selena.
— Sua pergunta é muito feliz, Selena.
É exactamente por não ter nada de tão extraordinário, assim que julgamos ser um relato oportuno aos irmãos de ideal.
Lutas e frustrações pertinentes à expressiva maioria de nós, apenas isso!
Nada tão sério; apenas os descuidos do caminho, suficientes, como todos sabemos, para causar-nos dor e decepção, angústia e aflição.
Imagina-se entre os confrades de ideal que, tornam-se necessárias atitudes trágicas, para colher os espinhos da infelicidade nestas plagas.
Temos catalogado, nos alfarrábios de Inácio, o "escriba" do pavilhão - caçoou Dona Modesta - mais de setecentas histórias, entre as quais, pelo menos quatrocentas constituem uma casuística única, ou seja, ainda não revelada ao mundo físico pela literatura mediúnica.
Queira Deus que os médiuns tenham fôlego e coragem para suportarem as refregas e nos ensejarem a bênção de remetê-las aos homens.
Inácio prepara o médium de Uberaba para seu primeiro ensaio neste sentido.
— Já sei até o título que darei à obra! - interveio o médico.
— E qual será doutor? - indagou curioso o ex-dirigente goiano.
— Sob as Cinzas do Tempo.49
— De que trata?
— O resgate de Torquemada, quando Modesta e eu nos encontrávamos ainda encarnados no Sanatório Espírita Uberabense.
— Dessa maneira - continuou Dona Modesta - conto com a colaboração de vocês.
Além disso, temos anotações nas fichas de Marcondes e Selena que falam de aspirações novas.
O professor relata - e tomou de uma pequena folha de anotações - que Marcondes mostrou sensibilidade com os dramas do segundo andar e interesse em visitar os médiuns no plano físico que passaram pela sua direcção.
Selena, após o ciclo de estudos junto a Odílio Fernandes, está muito empenhada em auxiliar o "Centro Espírita Paulo e Estêvão" na recondução de suas actividades espirituais.
Não faltará trabalho.
Tomaremos as providências pelo bem de todos.
Quanto à Eulália, ela prepara seu retorno ao corpo. Logicamente, por essa razão, precisaremos de que alguém ocupe seu labor na câmara dos ovóides.
Sem pestanejar, reagiu Marcondes:
— Dona Modesta, se estiver em minhas condições...
— Muito bem! - interrompeu a matrona - está escolhido!
— Rápido assim? - e riram todos da forma como foi resolvida a questão.
— Apenas um ponto necessita ser acertado entre nós.
Antes que ingressem em tarefas junto ao plano físico, recomendo que arejem suas concepções sobre as novas bússolas que guiarão a mediunidade com Jesus neste século da transição planetária.
Eulália! - chamou Dona Modesta.
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