LUZ ESPÍRITA
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Série André Luiz - E A VIDA CONTINUA...

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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Jul 07, 2012 10:20 pm

A senhora calou-se e Fantini aparteou:
— Instrutor, se não sou importuno, estimaria saber se o mensageiro de sua confiança inspeccionou a situação de nossos companheiros na residência do Guarujá...

— Sim, mas não foram achados ali. Estão em São Paulo.
— Na casa de Vila Mariana?
— Caio e Vera, sim...

— E Elisa?
— Há precisamente seis dias foi internada para tratamento numa clínica de saúde mental.
— Meu Deus!... Como as coisas se modificam!...

Instada por Serpa, a filha assumiu responsabilidades e a doente não pôde resistir.
As notícias recebidas, no entanto, destacam enorme gravidade nos prognósticos, quanto à nova posição orgânica de Elisa.

Sou constrangido a comunicar-lhes que a enferma piorou muito, quanto ao processo obsessivo de que é vítima, e, à face dos recursos circulatórios precários, surgiu-lhe uma trombose cerebral progressiva, indicando desencarnação próxima. Tudo isso, após terrível desgosto...

— Que desgosto? — interpelou Fantini, atónito. O instrutor, imperturbável:
— Averiguamos que Serpa, de algumas semanas para cá, pressionou Vera para que se retirasse da progenitora a faculdade de dirigir os próprios negócios.

Advogado de muitas relações, muniu-se de influências diversas e, assim que convenceu a futura sogra a hospitalizar-se para tratamento, assegurando não passaria de dois a três dias, obteve, com as certidões devidas, o despacho da autoridade competente, favorável aos seus propósitos.

E apresentou esses propósitos aos amigos, em todas as providências, como sendo da jovem a quem promete desposar.

Claro que o choque para Elisa foi algo de muito doloroso, ao reconhecer, na instituição de saúde em que se encontra, a impossibilidade de mobilizar os seus recursos económicos.

Isso porque, apesar de obsessa, está perfeitamente lúcida.
Para nós, é a criatura de mediunidade torturada, com fenómenos psíquicos por agora incompreensíveis a quantos lhe desfrutam a convivência...

Para Serpa e Vera, é um caso de senilidade precoce...

— Caio, então... agora...
A frase hesitante de Ernesto esmoreceu-lhe na boca.

Ribas, no entanto, completou-a:
— É o procurador de nossa doente e da filha, com poderes legais para manejar-lhes todos os bens...

Ante os dois interlocutores, espantados:
— A vista dos factos e admitindo o imperativo de nosso entendimento tão arejado quanto possível, é forçoso informar você, Fantini, de que os seus terrenos em Santos já foram vendidos, anteontem, conforme resoluções de Serpa, que se investiu na posse de alguns milhões de cruzeiros, a título de corretagem.

Não digo isso como quem julga o comportamento menos feliz de um companheiro, mas sim porque necessitamos planear o futuro, com a obrigação de nos determos em minudências mesmo indesejáveis...

— Que ladrão!... — o grito acusativo de Ernesto vibrou, insopitado.
— Meu Deus!... Mais uma vez, Caio, malfeitor!
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:35 pm

Ribas fixou um gesto de paternal benevolência e opôs a contradita:
— Evitemos a crueldade, fujamos de qualquer violência.
Indispensável envolver Serpa e Vera em ondas de nossa melhor simpatia.

— Porquê? — bradou Fantini, desolado.
— Vocês não devem esquecer que os dois, na equipe doméstica, são amigos providenciais.

Se vocês operarem com segurança, no apoio afectivo de que Caio não prescinde, esposará Vera e será o pai de Mancini na existência próxima.

Sem dúvida, agindo assim, resgatará o débito que lhe é próprio, porquanto, havendo subtraído Túlio à vida física, é obrigado a restituir-lhe esse mesmo património, segundo os princípios de causa e efeito. Além disso, porém, tranquilizará Evelina, encarregando-se no mundo da reeducação de um Espírito, cujo destrambelho emotivo tanto trabalho vem custando à nossa amiga.

— Entendo tudo isso, mas... — abalançava-se Fantini a interpor argumento menos favorável, que Ribas cortou, esclarecendo:
— Sei, Fantini, o que você pensa.

Você, apegado ainda à família consanguínea que o Senhor lhe emprestou na Terra, reconhece que Serpa começou a apoderar-se daquilo que foi sua razoável fortuna.

Você, indiscutivelmente, não se deve iludir.

Assim como já negociou os lotes que lhe pertenciam em Santos, disporá talvez de todo o material que você aprecia ainda como sendo os seus apartamentos de aluguer em São Paulo, a sua residência de Guarujá, as suas apólices, as suas jóias, os seus depósitos bancários e até mesmo o seu pequeno mundo doméstico de Vila Mariana...

Aceite a realidade, meu amigo.
Todas as suas propriedades no campo físico, mediante a desencarnação, passaram ao domínio de outras vontades e ao controle de outras mãos.

A vida reclama o que nos empresta, dando-nos em troca, seja onde seja, o que fazemos dela, junto dos outros...
Todas as transformações a que nos referimos virão, na certa, logo Caio consiga fazer de sua filha a esposa legítima.

Entretanto, abstenhamo-nos de classificá-lo por ladrão e malfeitor.
Ele é, sim, um filho de Deus, tanto quanto nós, sacando no futuro.

Toma hoje, por empréstimo, à sua viúva e à sua filha os recursos que você lhes deixou, por fruto de uma existência imensamente laboriosa, julgando que realiza brilhante proeza de inteligência...

Entretanto, a pessoa enganada é ele mesmo, o nosso pobre amigo...

— Mas, como?

O mentor, sereno, clareou o assunto:
— Supondo assenhorear largos créditos, Caio apenas assume largas dívidas, perante as Divinas Leis.

Retendo os patrimónios materiais de Elisa e Vera, experimentará, instintivamente, a fome de acção para enriquecer-se cada vez mais.

Apaixonar-se-à pelo dinheiro e tão cedo se sentirá saciado.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:35 pm

Ao invés de aproveitar as alegrias da vida simples, andará distante da verdadeira felicidade, escravizado que ficará, por muito tempo, à ambição de ganhar e ganhar, amontoar e amontoar...

E isso tudo, no fim, será revertido em benefício... Sabe de quem?
— Estimaria saber... — apontou Ernesto, estomagado.

— Dos seus familiares, meu caro, e principalmente de Elisa, a quem ele presentemente impele à desencarnação prematura, com apontamentos insensatos, sequioso de lhe governar as vantagens económicas em regime de ilusória impunidade.

— Oh! Explique-nos!... — solicitou Ernesto, ansioso.

Ribas apanhou pequeno mapa, dentre os papéis que compulsava, e elucidou, indicando figurações aqui e ali:
— A desencarnação de Elisa está prevista para breves dias, mas o renascimento dela, depois de reequilíbrio seguro em nossa estância, poderá ocorrer, conforme nosso esquema, dentro de cinco a seis anos.

Com a permissão de nossos Maiores, será ela filha de Serpa e Vera, se vocês trabalharem no socorro a ambos, com muito amor...

Renascerá depois de Mancini, que lhes será o primogénito...

Como é fácil de perceber, daqui a trinta anos, mais ou menos, ocasião considerada provável para o retorno de Caio à Vida Espiritual, devolverá ele à sogra espoliada — então sua filha — tanto quanto a Vera Celina, na condição de viúva, todos os patrimónios de que hoje se apropria.

E restitui-los-á positivamente aumentados, acrescidos de grandes rendimentos, ao mesmo tempo em que terá trabalhado o bastante para legar a Túlio, na existência nova, uma situação material invejável...

Diante de Evelina e Ernesto estupefactos com a segurança das Leis de Deus, Ribas pareceu encerrar os estudos, advertindo:
— Longe de nós a intenção de categorizar Serpa à conta de larápio ou delinquente;
ele é nosso aliado, nosso amigo.

O que nos compete fazer, de imediato, é rogar ao Senhor fortalecê-lo com a bênção da saúde física e da euforia espiritual, a fim de que viva tranquilo, no casulo terrestre, por muitos e muitos anos.

E, sorrindo:
— Chegará o tempo em que vocês dois se aprestarão, quanto possível, a fim de resguardar-lhe as garantias pessoais e ampliar-lhe os lucros dignos, de maneira a proteger o futuro dos entes caros.

Imploremos a Deus faça dele um homem rico e bondoso, diligente e realizador.
Precisamos dele e, consequentemente, Caio precisa de nós.

Notando a senhora Serpa que a conversação descambava para o término, apressou-se a dizer:
— Instrutor, e meu pai?
Venho sonhando para ele o regresso ao berço terreno.

— Isso igualmente já consta de nosso esquema.
Sabíamos, Evelina, que você, filha dedicada e amorosa, cogitaria de ajudá-lo...

Fomos informados de que você ontem já lançou no coração materno a ideia-semente que frutificará com o Amparo Divino, suplicando à nossa irmã Brígida o recolha, no lar, como menino perfilhado.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:35 pm

Seu apelo foi muito feliz e, com semelhante medida, Amâncio Terra, seu padrasto, receberá o socorro merecido.

Em verdade, ele exterminou o corpo de Desidério, seu pai, alucinado na paixão que lhe enceguecia o espírito, e apossou-se-lhe da casa e dos recursos...

É um homem ateu e evidentemente criminoso, mas profundamente humano e caritativo.

Recolheu os bens de seu pai;
no entanto, ao dilatá-los, com administração judiciosa e profícua, fez-se o esteio económico para mais de duzentos espíritos reencarnados, os seus servidores e rendeiros, com os descendentes respectivos...

Há mais de vinte anos, a todos protege, com a vigilância de um pai atento e bom.
Nunca abandonou os que enfermassem, nunca desprezou os caídos em prova, nunca deixou crianças ao desamparo...

Sim!... Ele assassinou Desidério, seu pai, e responderá por essa falta, nos tribunais da vida, mas escravizou-se a Brígida, sua progenitora, de quem procura satisfazer os menores desejos na posição de marido honesto e fiel...

Tantas preces sobem do mundo, a favor dele, para a Infinita Misericórdia de Deus, pelas consolações e alegrias que espalha, que chegou a merecer mais amplas atenções de nossos Maiores...

Fomos recomendados ontem para que a sua filial rogativa seja atendida no momento oportuno...

E quanto a seu pai, segundo a sua petição, retornará, com a Bênção do Senhor, ao convívio do homem que ainda odeia, mas aprenderá a ver-lhe as qualidades nobres e amá-lo-á enternecidamente, como a um pai verdadeiro, de quem receberá abnegação e ternura, apoio e bons exemplos.

Ribas silenciou por momentos e, em seguida, acentuou, qual se estivesse respondendo a certas dúvidas dos ouvintes:
— É inegável que Amâncio possui apenas mais dez anos de permanência no corpo físico, de acordo com os dados esclarecedores que nos foram enviados, com objectivos de estudo;

no entanto, para um homem com os serviços prestados que ele tem, não nos será difícil obter, junto aos Poderes Superiores, moratória de quinze a vinte anos a mais, prolongando-se-lhe o tempo na existência actual...

Á face de tudo isso, esperamos possa ele realmente conquistar do Senhor a felicidade de receber Desidério por filho — através do concurso de um casal humilde —, a fim de conferir-lhe vida nova e devolver-lhe, no porvir, todos os bens de que foi, um dia, despojado...

Esteja certa, Evelina, de que seu pai, reorientado pelo verdugo de outro tempo, hoje transfigurado em obreiro do bem, na escola do trabalho, será um homem equilibrado e com todos os recursos para ser feliz.

Ribas pausou, de novo, alguns instantes e, logo após, anunciou:
— Nosso esquema inclui um acontecimento importante...

Nos dias que virão, seremos chamados a aproximar os lares de Serpa e Amâncio, porquanto Desidério e Elisa, reencarnados, realizarão venturoso matrimónio em plena juventude...

Envidaremos esforço máximo, para que Desidério se despeça de nós, em breve tempo, na direcção da vida física...

Evelina chorava de jubilosa emoção, meditando na justiça perfeita de Deus, e Ernesto reflectia, empolgado de assombro, ante a lógica do plano estabelecido.

Sopitando a comoção encharcada de lágrimas, a senhora Serpa articulou nova pergunta:
— E minha mãe?
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:36 pm

— Sua mãezinha — aclarou o mentor — acompanhará os destinos de Amâncio...
Seu pai desposou-a, mas não amava...

Tanto assim que, nas anotações e relatórios de que dispomos, você ainda estava no berço terrestre e ele já gravitava para outros campos sentimentais.

— Tantos projectos! — especulou Fantini transformar figuras em obras exige trabalho e trabalho... quem se responsabilizará pela execução de semelhantes planificações?

O mentor lançou-lhe benevolente olhar e falou para ambos:
— Vocês já ouviram falar em guias espirituais?

Ernesto e a companheira esboçaram silencioso gesto de estranheza.

E Ribas:
— Pois é...
Vocês dois serão os encarregados do serviço em perspectiva, com todas as tarefas-satélites que lhe forem consequentes.

Esforçar-se-ão para que Serpa e Vera se consorciem;
para que Elisa se recupere após a desencarnação, no menor prazo possível;

para que Desidério volte ao renascimento físico, nas condições desejáveis, e auxiliarão, ainda, a Elisa, no retorno à Terra, com o dever de amparar-lhes o berço e a meninice, além de que estarão colaborando não só para que a futura progenitora de Desidério conquiste recursos adequados a acolhê-lo no claustro materno, como também para que o nosso amigo, a reencarnar, venha a sentir-se convenientemente instalado, na posição de filho adoptivo...

E nada de esquecer nosso Mancini, que prossegue requerendo atenções especiais;
o encaminhamento dele no futuro, o enlace de Elisa e Desidério, mais tarde, depois das providências com que nos empenharemos a reaproximar as famílias Terra e Serpa...

Num gesto marcante de bom-humor:
— Trabalho para trinta anos, meus amigos!

Para início de ajuste, considerem-se vinculados à nossa cidade, em serviço, no mínimo de trinta anos pela frente!...

Ernesto contemplou Evelina, tomado de profundo enternecimento.
E pensava que ela e ele haviam sido rechaçados da memória dos que mais amavam, quase que totalmente esquecidos, recusados, afastados, substituídos.

A ex-senhora Serpa — pois que a moça se reconhecia francamente liberada pelas atitudes de Caio, quanto ao prosseguimento de qualquer compromisso de natureza afectiva — fixava Ernesto e sintonizava-se-lhe com a onda de ideias e emoções.

Estavam os dois com a paz de consciência e a sós um com o outro, na empresa que os chamava.

Fantini pareceu-lhe mais espiritualizado pelos sofrimentos dos dias últimos, qual se a fogueira de aflições ocultas lhe houvesse remodelado a forma e retocado o semblante.

Entreolharam-se e compreenderam-se.

Todos os entes queridos, da Terra, excepção de Brígida que ainda mantinha pensamentos de ternura e saudade para a filha distante, dispensavam-lhes a presença e o concurso.

Entretanto, necessitavam agir e construir, a favor deles mesmos.

E ao modo de aliados que se reencontram para veneráveis misteres, no campo da vida, se prometeram, sem palavras, irmanar os corações, transferindo um para o outro os sagrados tesouros afectivos que se lhes devolviam da Terra, convencidos de que precisavam da escora recíproca para a longa jornada que se lhes descerrava aos anseios de redenção.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:36 pm

23 - Ernesto em serviço

A obra de assistência espiritual por parte de Fantini e Evelina avançava com segurança, entre as melhoras de Túlio e os tentames de reaproximação com Desidério, que não se desvinculava de Elisa, então relegada às próprias reflexões no sanatório a que fora conduzida.

O trabalho para Ernesto se fazia, porém, cada vez mais difícil, porquanto o adversário não perdia ocasião de arrancar-se contra ele, através de acusações e achincalhes.

Por outro lado, as condições orgânicas de Elisa pioravam, de dia para dia, e os seus esforços, no sentido de abeirar-se dela, redundavam quase nulos.

Preocupado com o rumo da situação, procurou Ribas, a quem expôs o problema, inquirindo por que motivo um Espírito sofredor e enrijecido nas ideias de vingança adquirira tamanho poder de penetração, a ponto de apontar-lhe as mínimas falhas de carácter.

— Ah! meu amigo, meu amigo!... confessou o Instrutor — nossos irmãos atrelados ao desespero e a revolta encontram razões para censurar-nos, sempre que preferimos desempenhar na Terra a função de personalidades-legendas.

— Como assim?
— Muita vez, somos no mundo titulares desses ou daqueles encargos, sem que venhamos a executá-los de modo efectivo.

Costumamos ser maridos-legendas, pais-legendas, filhos-legendas, administradores-legendas...
Usamos rótulos, sem atender às obrigações que eles nos indicam.

Entendeu?
Igualmente, já fui esposo-legenda na Terra, isto é, casei-me, abracei compromissos de família, mas acreditei que as minhas responsabilidades se limitassem a ostentar a chefia da casa e a pagar as contas de fim de mês.

A rigor, jamais compartilhei as inquietações da companheira, na educação íntima dos filhos e, que eu me lembre, nunca me sentei, junto de qualquer deles, para sondar-lhes as dificuldades e os sonhos, conquanto lhes exigisse conduta que me honrasse o nome.

Assinalando a delicada objurgação, Fantini viu-se mais uma vez espicaçado pela própria consciência.
Concluía, sinceramente, de si para consigo, que não fora o esposo e o pai que deveria ter sido.

Somente ali, naquela estância espiritual, depois da morte do corpo físico, percebia, nas duras refregas da auto corrigenda, que o dinheiro não faz o serviço do coração.

Sentindo-se rebaixado, triste, absteve-se de quaisquer divagações nos temas da consulta, ao passo que o mentor, risonho, deteve-se a confortá-lo nas despedidas:
— Nada de desânimo!...

Ouçamos os opositores nas críticas que assaquem contra nós, buscando aproveitá-las com humildade no que mostrem de verdadeiro e de útil.

Usemos essa chave, Fantini — a humildade —...
Ela funcionará com acerto na solução dos maiores enigmas.

Sejamos cristãos autênticos, amando, servindo, desculpando...

Atento às lições constantes do amigo, consagrava-se Ernesto, cada vez mais, aos misteres da fraternidade legítima, fosse tolerando as diatribes da mulher debilitada pelo sofrimento, ou suportando, com resignação heróica, os baldões do irmão infeliz, sempre disposto ao espancamento verbal.

Depois de vinte e seis dias de frequência correcta ao clima de serviço, verificou, surpreso, que Serpa, pela primeira vez, vinha ao encontro da futura sogra.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:36 pm

Muito bem apessoado, postou-se o causídico à frente da enferma, em sala particular, com o beneplácito da administração do instituto, pois, segundo anunciou, desejava colher impressões claras e pessoais, com alusão à doente, a fim de prestar informes positivos à noiva.

Em derredor de ambos, apenas os dois acompanhantes desencarnados, Desidério e Fantini, ambos ansiosos pelos resultados da entrevista.

Quando se acharam a sós, Elisa expôs, com palavras serenas de mãe, o desejo de abraçar a filha, a fim de que ela lhe testemunhasse a sanidade mental e lhe patrocinasse o regresso para a casa, sensibilizando tanto a Fantini quanto a Desidério, pela atitude humilde em que vazava as súplicas de mulher derrotada pelas circunstâncias.

Serpa, no entanto, contrariou-a, inflexível:
— Absolutamente, a senhora não terá alta, assim como pretende, pois os prognósticos a seu respeito não ajudam...

— Porquê?
— As informações relativas ao seu comportamento não nos autorizam a retirá-la.
— Comportamento? que comportamento?
— Continua chorando sem propósito, conversa sozinha, interpela sombras...

— Simplesmente, não sou compreendida, o que vejo, vejo...
— Vera telefona diariamente e os enfermeiros são concordes em declarar que as suas perturbações não diminuíram.

— Serpa — admoestou Elisa, carregando a voz de mal-estar —, apesar de tudo, insisto com o seu cavalheirismo, a fim de que me traga Vera...

— Para quê? para traumatizá-la com as suas fantasias?
Não acredita que sua filha já sofreu o bastante com os seus choros e noites em claro?

— Oh! Serpa!...
— A senhora sabe que já sou quase seu genro, tenho direito a interferir...

— Não sei quem teria o direito de interferir entre as mães e os filhos — reivindicou a enferma, agora suplementando cada palavra com inflexão de funda tristeza.

Não reclamo contra a sua ingerência nos negócios de minha casa, a ponto de me achar interditada, no tocante a emitir um simples cheque...

— Não se lamurie — atalhou Caio, agressivo —, aceitei o papel de seu procurador, por exigências de sua filha.
Tenho serviço que me baste e não disputaria a condição de seu empregado...

— Não lamento e conto com a sua honestidade para proteger os interesses de minha filha...
Quanto a mim...

— Que quer dizer?
— Quanto a mim, vocês dois não se afligirão por muito tempo.
Alguns palmos de terra...

— Porque fala nisso? que há de mais? a morte é o fim de nós todos, e, se a senhora se expressa dessa forma para comover-me, está muito enganada...

— Oh! meu Deus, só desejava ver minha filha!...
— Pois enquanto não se normalizar, enquanto não puder recebê-la sem causar-lhe impressões negativas, não conseguirá.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:37 pm

— Mas porque me impõe essa recusa, se sempre recebi você em minha casa, como se fosse meu próprio filho?

— Mentira! a senhora me detesta...
Não me expulsou, porque Vera não permitiu, porque sou o homem que ela escolheu para lhe dirigir o futuro...

E ante a penosa estupefacção da doente:
— E saiba que tanto ela quanto eu estamos fartos de saber que a senhora já viveu sua vida e que precisamos viver a nossa...

Não será uma sogra velha que frustrará nossos planos.

Inopinada revolta desanuviou o cérebro de Elisa, que se aprestou para a reacção, exclamando, frenética:
— Infame!...

Surgida a indignação, Desidério — o desencarnado que, a rigor, lhe controlava todas as faculdades — assenhoreou-lhe a mente, de forma espectacular, e a crise se desencadeou dominadora, terrível...

Elisa, possessa, investiu sobre o visitante, buscando asfixiá-lo, a meio de impropérios que se lhe estranhavam na boca.

Serpa recuou, sob indisfarçável espanto, dando lugar à paciente enfermeira que imobilizou a viúva, ao mesmo tempo que, de outro lado, Ernesto, a pulso, impedia os movimentos desordenados do companheiro.

Restabeleceu-se a ordem.
A moça de serviço reconduziu a doente para o quarto, apoiada no concurso de duas auxiliares, e voltou para as escusas.

— Não se aflija, doutor.
Foi uma crise como tantas... Isso passará.
— Compreendo — revidou Caio, gentil.
Dona Elisa sempre me tratou com carinhos de mãe.

Pobre amiga! tem os nervos positivamente destrambelhados.

Enquanto a conversa prosseguia, Fantini segurava Desidério, amistosamente, coadjuvado por outros tarefeiros desencarnados, em actividade no sanatório.

Um deles solicitava prisão para o agitado agressor, ao passo que os demais informavam que, desde a entrada de Elisa no estabelecimento, era ele um prestativo e pacato acompanhante da enferma, que encontrava nele um amparo e um amigo.

Ouvindo alusões a encarceramento provável, o pai de Evelina percebeu que se achava diante da possibilidade de perder-se da criatura querida, e serenou-se.

Valeu-se Ernesto da circunstância e o apresentou como sendo para ele um irmão caríssimo, no intuito de sossegar as sentinelas, acentuando que o pobre se desmandara ligeiramente, à vista de certas provações de família.

Entretanto, ele, Fantini, estava ali justamente a fim de ajudá-lo a se desenvencilhar de quaisquer lembranças destrutivas.

Dispersaram-se os guardas.
Depois disso, Ernesto convidou o rival a segui-lo, no que foi atendido, sentando-se ambos em espaçoso banco de jardim próximo.

Desidério chorava, colérico, impedido que se vira de surrar o advogado como desejara.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:37 pm

— Você viu que crápula? — explodiu, encarando Fantini com expressão menos cruel — não sei porque ainda não aniquilei esse pulha de Serpa!...

Primeiro, assassinou um colega, o advogado Túlio Mancini, depois matou minha filha aos poucos, e agora quer arrasar Elisa, após furtá-la, descaradamente...

O amigo fitou-o com bondade e ajuntou:
— Desidério, perdoe-nos por todo o mal que já lhe fizemos e escute-me!...
Acalme-se, por amor de Deus!

Não lhe peço isto por nós, mas por Elisa, a quem você ama tanto...
Presentemente, nada mais disputo senão a paz entre nós.

Tranquilize-se, para arrostarmos a realidade;
posso informar a você que a nossa enferma está no fim da resistência física!...

— Tenho alguma ideia disso — replicou Desidério menos hostil, patenteando intenções de acordo e entendimento, pela primeira vez —, mas lutarei como um touro para defendê-la. Darei a ela as minhas forças, minha vida.

Minha alma é a dela, assim como o corpo em que ela respira é o meu corpo...
Habitamos a mesma cela de carne, pensamos pela mesma cabeça!...

— Graças a Deus — concordou Fantini com humildade — compreendi que assim é e que assim deve ser...

Demonstrando o elevado grau da despersonalização que ia adquirindo:
— Desde que você me falou com clareza fraterna, em nosso primeiro reencontro, reconheci que Elisa descobriu em você a sustentação de que necessitava, e creia que, se actualmente algo aspiro em relação a ela, anseio vê-la feliz ao seu lado...

Estou convencido de que a nossa doente não perseverará mais por muitos dias no corpo terrestre e o choque de hoje, com certeza, pesará na balança...

— Ah! esse Caio, esse miserável...
— Não, Desidério! Assim, não...
Suplico a você paciência e tolerância...
Acaso, não estaremos cansados de rebeldia e de ódio?

Ante a minha falta, no propósito de suprimir você, amarguei a existência terrena, perdendo em remorso e fuga incessante de mim mesmo os melhores tempos da vida no mundo dos homens, e você, meu caro, por não haver desculpado a mim e ao nosso Amâncio, tem estado na selva das provações, que se reservam aos Espíritos impenitentes e sofredores...

O leito das lágrimas de Elisa não poderia ser o ponto terminal de nossos disparates?
o santo lugar de apaziguamento?

Elisa se libertará dos suplícios corpóreos, e nós, meu amigo?
que será de nós, se, largado o corpo de matéria pesada, continuamos de espírito atormentado nas ideias de culpa e condenação, crime e castigo?

Ela partirá...

Desidério, porém, transtornado pelos argumentos que lhe anunciavam separação, bradou, impulsivo:
— Elisa não partirá de meus braços, não me abandonará!... Não a deixarei!...
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:37 pm

— Inúteis, Desidério, quaisquer protestos nossos contra as forças da vida.
As leis de Deus se cumprirão.

Elisa sustenta-se em você, mas igualmente ama a filha, e, sabendo-se irremediavelmente afastada da ternura filial, inconscientemente aspira à morte e há de tê-la mais depressa, depois que se certificou das atitudes menos felizes de Serpa...

Com toda a certeza, a pobrezinha se deterá no pensamento da desencarnação, supondo-se no rumo directo de sua companhia;
no entanto, verificar-se-á o imprevisto...
A morte vai situá-la em pólo oposto ao seu...

Ela não tem a sua estrutura mental, nem a sua disposição para demorar-se nestes sítios...
Ressentida hoje contra o genro, amanhã saberá absolvê-lo e patrociná-lo, acomodando-se com os Mensageiros da Vida Maior, através da oração...

Apesar do temperamento irritadiço que lhe conhecemos, não odeia a ninguém e nunca demonstrou vocação para a vingança.

Desidério abaixou-se para o solo, agarrou a cabeça entre as mãos e desfez-se a prantear com maior desespero.

— Perdoe, meu amigo!... perdoe a nós todos, incluindo Caio em sua compaixão!...
— Nunca, nunca!...

— Sou eu quem reconhece as injustiças que perpetrámos contra você, sou eu quem lhe observa a nobreza de coração...

Revele-me e ouça!...
Agradeço o seu devotamento à mulher que eu não soube fazer feliz e a ternura pela filha, para a qual você se transformou em abnegado zelador...

Por tudo isso, peço-lhe ainda para que estenda até nós, os seus carrascos, as vibrações de sua piedade e de sua simpatia...

— Ah! Fantini, Fantini!... — rugiu o interlocutor, como a guerrear-se para não se render à emoção — porque me tenta assim a uma conciliação impossível?
que razões para tanto empenho em modificar-me?

— Desidério, no mundo físico, trabalhamos particularmente com a matéria pesada e transfiguramos pedras, metais, glebas, fontes...

Aqui na Espiritualidade, lidamos, de modo especial, com as forças do espírito e renovamos almas e consciências, a começar de nós mesmos..

Atenda-me!... Lembre-se de que Elisa possui muitos amigos para requisitá-la aos Planos Superiores, como os teve a sua querida Evelina!...

Por amor de Evelina, que você guarda na memória, à feição de um génio tutelar, não quererá você sublimar atitudes, principiando pelo perdão que imploramos e carecemos?...

— Evelina!... Evelina, minha filha!... — suspirou o desventurado em lágrimas copiosas — não, não posso imiscuí-la em nossa conversação!...

Evelina deve habitar na casa dos anjos!... que eu padeça no inferno, acalentado por mim mesmo, que eu me debata no lameiro que mereci, mas que a felicidade abençoe minha filha nos Céus!...

— E se ela própria vier, um dia, ao seu encontro para advogar nossa causa, amparar-nos, rogar a sua misericórdia de credor para nós outros, os seus devedores?
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jul 08, 2012 9:37 pm

Desidério esforçava-se para falar, rompendo a barreira de dor que lhe comburia o âmago da alma;
no entanto, compassivo assistente espiritual da instituição veio até aos dois para notificar-lhes o inesperado.

Finda a crise violenta de angústia, caíra Elisa em funda prostração, ante a ruptura de delicado vaso cerebral, prenunciando-se-lhe a desencarnação para breves horas.

Esqueceram-se ambos, para o socorro preciso.
Através de telefonemas à pressa, Vera e Serpa, alarmados, cientificaram-se quanto ao novo rumo que se imprimira à situação e, juntos, demandaram o estabelecimento, encontrando Elisa agonizante, em ambiente de tranquilidade e carinho.

O médico amigo, não obstante expender argumentos de consolo e esperança, foi claro no aviso:
«nada mais a fazer, senão aguardar.»

Vera Celina, em soluços, ajoelhou aos pés daquela cuja boca não mais se abriria para abençoá-la com os recursos do corpo terrestre.

Caio, evidentemente contrafeito, contemplava a cena, fumando cigarros sucessivos.

Enfermeiras iam e vinham, no afã de se fazerem mais úteis, e auxiliares espirituais formavam cadeias magnéticas de apoio à viúva Fantini, a fim de que o trânsito de um mundo para outro lhe fosse mais rápido e menos intranquilo.

Ernesto demandou a residência da Espiritualidade, a fim de colher as instruções de Ribas, diante da emergência, e Desidério se plantou à cabeceira, imerso em revolta e desesperação.

Durante oito horas consecutivas, o coração ainda sustentou o corpo tombado inerte.

Sobrevindo a madrugada, Elisa abriu as pálpebras, desmesuradamente, e tentou fixar os olhos na filha para endereçar-lhe a inexpressável despedida;
no entanto, descortinou a presença de Serpa, que a fitava, rente ao leito, e, não obstante incapaz de nutrir quaisquer resquícios de ódio no âmago da alma, cerrou o coração em densa nuvem de mágoa, pedindo mentalmente a Desidério que a resguardasse e defendesse.

Bastou essa deliberação irreflectida e, qual se lhe agarrasse, ávido, os pensamentos que lhe seriam os derradeiros, no envoltório carnal, o acompanhante colou-se a ela, dando a ideia de quem lhe sorvia todas as forças...

Vera pressentiu que a progenitora se rendia, por fim, ao grande repouso e, ansiosa, procurou debalde reanimar-lhe a vida orgânica, suplicando:
— Mãe! Mãe!... Minha mãe!...

Da boca hirta, contudo, não surgiu qualquer resposta.
Elisa Fantini pendeu a cabeça nos travesseiros, enquanto o corpo se lhe imobilizava para sempre.

Na enfermaria do sanatório, caía o pano da morte sobre aquela existência, fértil de tribulações e problemas, na ribalta do mundo;
todavia, por trás dos bastidores, na esfera espiritual, o drama não terminara.

Jungido à morta pela força dos últimos desejos que ela mesma enunciara, Desidério, inflamado em labaredas de ódio, retivera-lhe uma das mãos na destra rude, impedindo-lhe a retirada...

Elisa, embora semi-inconsciente, percebeu que se achava presa a ele e algemada ao cadáver, ouvindo o desventurado companheiro a repisar e repisar que jamais a deixaria.

Irmãos da Terra, em meio às vicissitudes da experiência humana, aprendei a tolerar e perdoar!...

Por mais se vos fira ou calunie, injurie ou amaldiçoe, olvidai o mal: fazendo o bem!...
Vós que tivestes a confiança traída ou o espírito dilacerado nas armadilhas da sombra, acendei a luz do amor onde estiverdes!...
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:22 pm

Companheiros que fostes vilipendiados ou insultados em vossas intenções mais sublimes, apagai as ofensas recebidas e bendizei os ultrajes que vos burilam o coração para a Vida Maior!...

Irmãs que padecestes indescritíveis agravos na própria carne, desprezadas pelos carrascos risonhos que vos enlouqueceram de angústia, depois de vos acenarem com mentirosas promessas, abençoai aqueles que vos destruíram os sonhos!...

Mães solteiras que fostes banidas do lar e batidas até a queda na prostituição, por haverdes tido suficiente coragem de não assassinar no próprio ventre os filhos de vossa desventura, com a insânia do aborto provocado, mães agoniadas às quais tantas vezes se nega até mesmo o direito de defesa, conferido aos nossos irmãos criminosos nas cadeias públicas, perdoai os vossos algozes!...

Pais que trazeis nos ombros escalavrados de sofrimento a carga dolorosa dos filhos ingratos, filhos que aguentais na carne e na alma o despotismo e a brutalidade de pais insensíveis e cônjuges flechados entre as paredes domésticas pelos estiletes da incompreensão e da crueldade, absolvei-vos uns aos outros!...

Obsidiados de todos os climas, tecei véus de piedade e esperança sobre os seres infelizes, encarnados ou desencarnados, que vos torturam as horas!

Criaturas prejudicadas ou perseguidas de todos os recantos do mundo, perdoai a quantos se fizeram instrumentos de vossas aflições e de vossas lágrimas!...

Quando sentirdes a tentação de revidar, lembrai-vos daquele que nos concitou a «amar os inimigos» e a «orar pelos que nos perseguem e caluniam»!

Recordai o Cristo de Deus, preferindo ser condenado, a condenar, porque, em verdade, quantos praticam o mal não sabem o que fazem!...

Convencei-vos de que as leis da morte não exceptuam ninguém e não vos esqueçais de que, no dia do vosso grande adeus aos que ficarem na estância das provas, somente pela bênção da paz e do amor na consciência tranquila é que podereis alcançar a suspirada libertação!...
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:22 pm

24 - Evelina em acção

Antes que o Sol reaparecesse, Ernesto, Evelina e alguns amigos do Instituto de Protecção Espiritual — dentre os quais se destacava o Irmão Plotino que, a pedido do Instrutor Ribas, chefiava a diminuta caravana socorrista — abordaram em São Paulo, no intuito de cooperarem com os assistentes espirituais, empenhados na libertação de Elisa, encerrada na prisão dos próprios restos.

Informados de que a filha determinara a remoção da morta para casa, demandaram Vila Mariana.

Evelina trazia o coração ensôfrego.
Veria o pai pela primeira vez.
Acariciava na memória a imagem dele, colhida em retratos de família.

Ansiava compreendê-lo, ampará-lo.
Ernesto encorajava-a.

Quase no limiar da residência, Plotino recomendou parada à equipe e comunicou que, primeiramente, ganharia o interior, desacompanhado, de maneira a efectuar ligeira inspecção, examinando o serviço a fazer.

Sob as atenções da filha que se apoiava em Serpa e em alguns amigos da vizinhança, tanto quanto guardada pela vigilância de vários benfeitores espirituais, Elisa, semidesperta, jazia no impasse, de vez que agarrada por Desidério por uma das mãos e alentada pelas forças dele, que lhe invadiam a alma, parecia comprazer-se com a estranha hipnose.

Às primeiras inquirições de Plotino, o piedoso enfermeiro desencarnado que se encarregaria do apoio magnético para exonerar a viúva dos despojos a que se imanizara, confessou o receio de que se via acometido;
se constrangesse a senhora Fantini a largar o carro físico inutilizado, não lograria violentar-lhe o pensamento perfeitamente lúcido.

Forçar-lhe-ia a retirada, mas não dispunha de meios para isolá-la mentalmente do acompanhante rebelde, a cujo patrocínio ela mesma se confiara.

Imprescindível a intervenção de alguém com suficiente poder de persuasão para compelir Desidério a mudar de atitude.

Irmão Plotino abeirou-se dele com delicadeza fraternal e suplicou-lhe o concurso para que Elisa fosse liberada e conduzida a mansões de refazimento.

Acomodado ao pé da morta, o interpelado se achegou ainda mais para ela e simplesmente rugiu em voz selvagem:
— Palhaços!... Não me tirarão daqui...
Que querem nesta casa? Ela é minha mulher...

Ninguém me demoverá com petitórios e ladainhas.
Tenho experiência!
Conheço os que não se separam nas furnas tenebrosas que recebemos por moradias...
Ninguém, mas efectivamente ninguém, me arrancará desta sala!...

— Alguém fará isso, irmão Desidério — enunciou Plotino sem alterar-se.
— Quem?... diga quem!...

O emissário sorriu paciente e murmurou apenas:
— Deus.

O inconformado amigo trovejou blasfémia terrível e Plotino voltou sobre os passos percorridos, pondo-se ao encontro dos companheiros.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:23 pm

Explicou-lhes o que se passava e imaginou as providências cabíveis.
Aquele era o momento para a intervenção pessoal de Evelina.

Todo o grupo persistiria em oração, a fim de apoiá-la, porquanto a companheira deveria entrar a sós, no refúgio doméstico, de modo a tentar a renovação do pai, que, decerto, não hesitaria em obedecer-lhe.

Viu-se, para logo, o prodígio dos pensamentos congregados em um só objectivo.

Sem qualquer indução à teatralidade, mas sim fundidos no só intuito, profundo e sincero, de projectar as energias do amor na obra socorrista, aqueles corações em prece lançaram vasto lençol de safirina luz sobre a porta de entrada, credenciando a companheira para a abençoada missão que se lhe delegara.

Espiritualmente ligada aos amigos que se lhe haviam metamorfoseado em base de equilíbrio e sustentação, Evelina penetrou o recinto, qual se fora uma estrela repentinamente transfigurada em mulher.

Desidério, aterrado, fixou a aparição e caiu de joelhos ....
Era ela, sim — pensou —, a sua filha, a sua amada filha que jamais lhe escapara da lembrança, mesmo quando se mergulhara em aventuras nas trevas mais densas!...

À medida que Evelina o fitava, entremostrando radiante e doce ternura, o infortunado progenitor contemplou-se no suave clarão que a mensageira irradiava...

Viu-se na penúria de um sentenciado que persistisse, por anos e anos, no fundo de um cárcere, sem o menor cuidado para consigo mesmo.

Qualificou-se por monstro, à frente de um anjo, e, à maneira de um cão batido e aviltado, intentou arrastar-se para fugir...

A moça adivinhou-lhe o propósito e falou, simples:
— Meu pai!...

Desidério sentiu que aquela voz lhe alcançava as entranhas...
Sim, aquelas duas palavras lhe vinham daquela alma querida que ele julgara nunca descesse do Céu para interpelá-lo...

Tornando a flectir os joelhos trémulos, o assombro se lhe rebentou no peito, numa explosão de lágrimas:
— Pois é você, minha filha, é você a quem Deus manda para me pedir o impossível?

Evelina abeirou-se dele, colocou-lhe a destra na fronte padecente, e o diálogo prosseguiu.
— Meu pai, decerto que Deus abençoa esta hora de reencontro, mas somos nós mesmos, o senhor e eu, os promotores, não do impossível, mas de nossa reaproximação, em nome dele mesmo, nosso Criador e Pai de Misericórdia...

— Que quer você de mim!...
— Venho convidá-lo a estar comigo...
Admitiria o senhor que o tempo desaparecesse, sem que eu sonhasse com este momento?

Atravessei a infância e a juventude, namorando seus retratos, casei-me, um dia, na Terra, rogando a sua bênção nas minhas orações e, quando os Desígnios Divinos me retiraram do corpo físico, formei o ideal de reencontrá-lo!...

O infortunado esboçou um gesto de auto-compaixão, e gemeu:
— Veja, minha filha, o que fizeram de mim, os criminosos que nos destruíram...

— Oh! meu pai, não acuse!...
O senhor terá sofrido, mas a dor é sempre bendita perante Deus, o senhor terá suportado provas difíceis;
no entanto, aprendemos, presentemente, que todo dia é ocasião de renovar e partir para destinos mais altos!...
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:23 pm

— Com certeza, nas Moradas Divinas, que você mereceu, ficou sabendo que não perdi meu corpo em acidente algum...

— Sim, conheço hoje toda a verdade a nosso respeito...
— Não pode, então, ignorar que os meus verdugos são igualmente os seus, nós dois fomos esbulhados pelos mesmos bandidos!...

Se no Céu não existe memória para o mal, é preciso recordar a você que Amâncio Terra, o celerado que se arvorou em seu padrasto...

Porque os soluços o compelissem a compridas reticências, Evelina aclarou com humildade:
— O senhor não se agastará comigo se disser que ele me quis bem e me respeitou sempre como sua própria filha...

Se é inegável que cometeu falta grave para com o senhor, diante das Leis Divinas, creio que o arrependimento que ele carrega, há mais de vinte anos, fala pela regeneração que fez dele um homem de bem...

— Você não pode esquecer que ele exilou você de casa, ainda em tenra idade...

— Enviou-me para a escola, meu pai.
Deu-me disciplinas que me livraram de tentações, nas quais eu teria sucumbido em muitos erros, durante a permanência no mundo;

nunca me regateou assistência e nem me contrariou os impulsos para o matrimónio;

em minha meninice, encorajava-me nos estudos, interessava-se por minhas notas, premiava a minha boa vontade com brindes e carinhos que somente o senhor me poderia dar...

É verdade que meu padrasto nunca substituiu o senhor em meu coração, meu pai, mas sua filha não deve ser ingrata a quem lhe deu tanto!...

Em casa, foi sempre um protector de nossa felicidade. ..
Nunca lhe vi o mínimo gesto de desconsideração para com minha mãe...

— Ah! não me fale de Brígida, aquela infame!...
— Oh! pai de meu coração, porque condenar aquela que nos uniu?

Que conseguiria fazer minha mãe ainda tão moça, a carregar-me nos braços, não fosse o apoio de um companheiro?

Aceitando a colaboração de Amâncio, ela não acolhia deliberadamente o desditoso caçador que lhe impusera a desencarnação, mas sim o amigo que o senhor mesmo, um dia, levou para a nossa casa, segundo as confidências de mãezinha, em suas horas de saudade e desolação...

Saiba que minha mãe sempre me ensinou a reverenciar a sua memória e a enobrecer o seu nome...

Ante a compreensão superior que a filha punha em evidência, Desidério chorava com mais força, em suas manifestações de auto piedade, dando a impressão de quem se propunha buscar, de qualquer modo, novas razões para ser infeliz.

- Você talvez não desconheça que me acho aqui, ao pé da família de outro inimigo que não posso exculpar, Ernesto Fantini, o traidor que intentou matar-me, dando a seu padrasto o figurino pelo qual me aniquilou...

Esta mulher cadaverizada, mas viva em minhas mãos, foi a esposa dele, pela qual, consumido de ciúmes, pretendeu ele assassinar-me, nada fazendo com isso, senão aproximar-me dela, já que o comportamento de Brígida me bania do lar...
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:23 pm

Pense no doloroso destino de seu pai!..
Expulso de minha casa, depois da morte do corpo, à face da influência de um perseguidor, tive de asilar-me em casa de outro, porque no pensamento da companheira, hoje morta para o mundo, encontrava o meu sustento!...

— Quem penetrará os desígnios de Deus, meu pai?
Não estaremos todos numa rede de testemunhos de amor, em vista de faltas e compromissos nas existências passadas?

Peço à Providência Divina abençoe nossa irmã Elisa e a recompense pelo bem que nos tem feito...

Quanto a Ernesto Fantini, a quem o senhor se refere, é forçoso lhe diga que ele tem sido para sua filha um devotado amigo na Vida Espiritual.

Muito antes de saber-me vinculada ao seu coração, rodeava-me de cuidados, restaurando-me as energias.
Em todos os lances da estrada nova, vem sendo para mim um apoio, um irmão...

— Você, querida filha, terá adquirido a visão dos anjos para enxergar benfeitores nesses canalhas, mas eu não consigo reconhecer as criaturas humanas com retinas celestes.

Sou um homem, simplesmente um homem infeliz!...
Apesar de tudo, não acredito que você possa guardar a mesma benevolência para com aquele que lhe foi carrasco, entre as paredes domésticas, este criminoso foragido do cárcere, que se apresenta mascarado, aqui mesmo, diante de nós... Caio Serpa...

— Que diz, meu pai?

E Evelina fez a voz mais compassiva:
— Caio foi para mim um guia generoso, auxiliando-me a entender a vida com mais segurança...
Nos dias da mocidade, propiciou-me sonhos de ventura que me ajudaram a viver...

Com ele imaginei o paraíso na Terra...
E, se na condição de esposo esperou de mim a felicidade que não lhe pude dar, será isso motivo para que venhamos a condená-lo?

Indiscutivelmente, assumiu compromisso para com Mancini que, decerto, resgatará em momento justo;
entretanto, porque desprezar os que se fazem objecto de nosso amor, quando nos certificamos de que não são tão felizes quanto supúnhamos?

Admite o senhor que os nossos irmãos delinquentes não são enfermos, carecedores de atenção?

porque não manifestar piedade, à frente das vítimas da loucura, qual o fazemos diante dos acidentados nos desastres que lhes furtam a existência?

Serão os mutilados de espírito, diferentes dos mutilados do corpo?

Os lamentos do progenitor inconformado se patentearam mais tristes:
— Ai de mim, que não sei perdoar!...
O carro da vida me esmaga por farrapo inútil!...

— Meu pai, não lhe ocorre que todos somos filhos de Deus, dependentes uns dos outros?
— Não posso!...
Não posso compreender como devo abraçar os que me espancam!...

— Não deseja caminhar adiante? ser livre e feliz?
— Oh! sim!...
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:24 pm

— Então, olvide todo mal.
Nunca reflectiu no poder do tempo?
O tempo nos auxilia a descobrir a fonte do amor que nos lava todas as culpas...

— O tempo, filha?
Para os Espíritos de minha espécie, o relógio é máquina de enlouquecer...

Anteontem, ontem e hoje padeço por abominar três lobos, Amâncio, Ernesto e Serpa, e sofro para defender três ovelhas, Elisa, você e Vera, já que arredei Brígida para longe de mim!...

Você não ignora que Vera se deixou magnetizar pelo tratante que foi seu marido!...

— Piedade, meu pai ....
Pensemos em Vera e Caio com os melhores sentimentos de que sejamos capazes!...

Reflictamos no futuro...
Amanhã, ser-nos-ão eles preciosos amigos, devotados protectores!...

— Você apenas enxerga o bem, eu vejo o mal que vence o bem...
— Não é isso.
O senhor se julga perfeitamente são de espírito, quando, na realidade, como acontece ainda comigo, precisa de assistência e reajuste.

Eu também, meu pai, de princípio, admiti-me espoliada pela vida!...

Aceitava mãezinha e meu padrasto, em muitas ocasiões, por adversários que me haviam desterrado propositadamente de casa, para que eu não lhes estorvasse a felicidade, mas na estância de recuperação a que me conduziram, por misericórdia de Deus, passei a abraçá-los por nossos reais amigos, de quem recebi todo o amparo que me foi possível assimilar...

Até nos dias últimos, quando reencontrei Caio mais fortemente encadeado a Vera Celina, esbati-me em mágoas arrasadoras, interpretando aquele que me foi o esposo terrestre por modelo acabado de ingratidão, ao mesmo tempo em que censurava Celina, por intrusa e ladra de meu tesouro afectivo;
entretanto, o orvalho da Bondade Infinita de Deus visitou a ressequida plantação de meus sentimentos pobres, através das lições de instrutores abnegados — médicos e enfermeiros da Compaixão Divina —, e reequilibrei-me, concluindo que Caio e Vera são nossos irmãos da alma...

Eles são como são, enquanto que somos como somos e Deus espera que nos amemos, assim como nos permite ser!...

Indispensável, meu pai, entender-nos, ajudar-nos reciprocamente e caminhar adiante!...
Caminhar sempre, resgatando os compromissos de ontem para que o amanhã seja melhor...

O Todo-Misericordioso semeou flores e bênçãos em todos os sítios da estrada a perlustrar...
Compreender é buscar a frente, auxiliar os outros será garantir-nos!
O amor não falha e Deus nos criou para o amor sem lindes!...

Desidério chorava, impossibilitado de emitir qualquer observação.

E Evelina:
— Analise com o seu próprio raciocínio. Naturalmente que o nosso irmão Ernesto, não obstante os conflitos íntimos que o afastavam espiritualmente do lar, consagra à nossa Elisa a afeição do homem de bem, e, por isso mesmo, com o discernimento que hoje possui, ter-lhe-á entregue, de todo o coração, o título de companheiro que tem sido e será para ela, perante Deus.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:24 pm

Porque não deveremos, de nosso lado, conferir a Caio o direito de dar-se a Vera, conquistando a felicidade que lhe não pude proporcionar, nem mesmo quando me achava no mundo físico?

— Ah! querida filha — alarmou-se o progenitor —, semelhante renúncia não significará destruir-nos em suicídio moral?
— Não, meu pai. O amor verdadeiro eleva-se de nível...

Hoje entendo que as afeições transviadas podem ser corrigidas no santo instituto da família, através da reencarnação...

Deus nos permite abraçar, como filhos, aquelas mesmas criaturas que não soubemos amar em outras posições sentimentais!...

Os nossos pensamentos de ternura, uns para os outros, um dia serão livres e puros, quais as fontes cristalinas que se irmanam no chão empedrado do Planeta ou como as irradiações dos astros, que se enlaçam sem perder grandeza e originalidade, nas imensas vias do Céu...

Depois de longa pausa, seguida pelo silencioso respeito dos amigos desencarnados, ali presentes:
— Se nuvens de mágoa lhe anuviam ainda o coração, lance-as fora e sigamos para a frente, aspirando à paz!...

Por agora, deixe que a nossa Elisa se distancie de quaisquer lembranças desagradáveis!
Liberte-a e verá que a mulher escolhida lhe pertencerá com mais força!...

Ajude-a para a ascensão a novos caminhos e ela voltará ao seu encontro!...
Não enclausure na masmorra de carne putrescível aquela que lhe merece a mais sagrada dedicação!

Elisa ser-lhe-á grata e, de nossa parte, prometemos solenemente ao senhor, perante a Infinita Misericórdia de Deus, que a reverá, em nossa própria moradia, onde se prepararão ambos, com o nosso carinho, para uma nova existência juntos, novamente juntos e mais felizes!...

Aceite meus rogos, pai querido!...

— Não, não!... — trovejou ele, em mais violenta crise de desespero — sou um réprobo, não posso fugir!...

Viu-se, então, o ponto mais alto e mais enternecedor do reencontro.

De mãos pousadas na cabeça do progenitor, Evelina lançou os olhos para o Alto e exortou:
— Oh! Deus de Bondade!... meu pai e eu somos dois remanescentes ainda unidos de grande família espiritual, presentemente dispersa!...

Concede, Ó Todo-Misericordioso, se é de tua vontade, que perseveremos em sintonia, no mesmo anseio de redenção!...

A voz, porém, esmorecera-lhe na garganta, asfixiada de dor, e, ao inclinar-se para a fronte paterna, as lágrimas que lhe perolavam a face, quais gotas de bálsamo divino, se precipitaram sobre o desventurado amigo, transfigurando-lhe o coração.

Tangido por energias recônditas, Desidério desferiu doloroso gemido e largou, de imediato, a mão da morta...

Abraçando os pés da filha, bradou com veemência:
— Ah! Evelina, Evelina!...
Minha filha, minha filha, leve-me para onde quiser!... Confio em você!...

Apague a fogueira de meu espírito que tem sabido tão-somente odiar!...
Socorro, meu Deus!... Socorro, meu Deus!...
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:24 pm

A moça, suplementada de força pelos companheiros que oravam, reergueu-o facilmente, como se tomasse de encontro ao peito uma criança abatida.

Acorreram enfermeiros desencarnados, desentranhando Elisa do corpo inerte, a lembrarem uma equipe de técnicos que operassem, rapidamente, para retirá-la de um vestido imprestável, e o Irmão Plotino, seguido pelos colaboradores, entrou em acção, acomodando Desidério, semi-inconsciente, na ambulância que o transportaria para o novo domicílio espiritual.

Alguém acompanhara discretamente connosco todo o diálogo.

Era o Instrutor Ribas que viera, de surpresa, ao lar de Vila Mariana, a fim de encorajar, em prece, a pupila do Instituto de Protecção Espiritual, no testemunho inesquecível...

Assim que a viu, ajudando a carregar o progenitor, em sublimada metamorfose, o venerado orientador, talvez rememorando acontecimentos de sua própria vida, afastou-se, em silêncio, com os olhos marejados de pranto que não chegava a se desprender das pálpebras molhadas.

Quanto a nós, de novo em plena rua, limitámo-nos pessoalmente a contemplar o firmamento, onde a aurora purpúrea, anunciando perpétua renovação, nos sugeria louvar a Ilimitada Misericórdia de Deus...

E oramos, sem conseguir articular palavra.
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Série André Luiz - E A VIDA CONTINUA... - Página 5 Empty Re: Série André Luiz - E A VIDA CONTINUA...

Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:24 pm

25 - Nova directriz

Após internarem Desidério e Elisa em organização hospitalar, sob assistência afectuosa, Ernesto e Evelina retornaram, na tarde do mesmo dia, a São Paulo, desejosos que se achavam de consultar a posição íntima de Vera, ante a nova situação.

Esclarecidos quanto ao futuro, em que a presença e a colaboração dela lhes seriam sobremaneira importantes à própria tranquilidade, identificavam-se no dever de ampará-la com mais calor de ternura.

A rendição de Desidério aos ideais renovadores que alentavam era igualmente um ponto fundamental no programa de trabalho a cumprir-se e esperavam reajustar as atitudes de Caio para que se lhes assegurasse mais ampla área de acção.

Encontraram Vera Celina marcada de lágrimas, apoiando-se em parentes e amigos.
Caio, taciturno, orientava o leme doméstico, dava ordens.

Estabelecido o cortejo fúnebre, os dois visitantes desencarnados, além de outros muitos amigos da Espiritualidade Maior, se instalaram no carro familiar, junto de Vera; entretanto, na chegada ao campo-santo, Ernesto escorou a filha, ao mesmo tempo que Evelina seguiu o ex-esposo, que se figurava distrair-se em quadra próxima àquela em que os restos da viúva Fantini descansariam.

Serpa fugia, intencionalmente.
Não queria ver a inumação.

Colhido em cheio pela influência da companheira que ele, antes, pouco mais de dois anos, levara ao sepulcro, pensava nela e, sem querer, lhe via mentalmente o semblante na tela da memória.

Não longe dele, Vera chorava nos braços dos amigos, enquanto ele mesmo, sorumbático, reflectia, reflectia...

Lembrava-se de quando deixara a mulher morta em outro cemitério, o da Quarta Parada (1), rememorava-lhe a partida, revisava na imaginação os incidentes havidos...

Era crepúsculo, qual ocorria ali, em Vila Mariana.
E as mesmas inquirições lhe vinham à cabeça...
A vida terminaria em montões de pedra e cinza?

Para onde se transfeririam os mortos, na hipótese de continuação da existência?
Onde estariam os pais que ele vira partir, nos dias da juventude?

Em que região andaria Evelina, a esposa que amara, desmedidamente, na primeira mocidade, e de quem a enfermidade e a morte o haviam separado?

Recordando-a, sentiu-se ligado a outra penosa reminiscência: Túlio Mancini...

O coração se lhe arrochava e passou a indagar de si mesmo por que motivo se confiara à loucura de assassinar estupidamente o colega...

O delito aflorou-lhe à memória com todas as minudências...

Propôs-se alijar as reflexões que lhe assomavam ao cérebro;
no entanto, sentia-se incompreensivelmente fisgado ao pretérito.

Não podia perceber que Evelina, em espírito, ali estava, rente a ele, diligenciando acordá-lo para a verdade.

— Caio, que fazes da vida? — Ela perguntou, docemente.
O advogado não registou a indagação com os tímpanos corpóreos, mas ouviu-a na acústica da alma e julgou monologar:
«Caio, que fazes da vida?»
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jul 09, 2012 8:25 pm

Repetiu, inconscientemente, as palavras da companheira desencarnada, no ádito da própria consciência, e passou a considerar que o tempo fugia sem que se desse conta de si mesmo...

Em que valores permutara o património das horas?
em que recursos convertia a saúde e o dinheiro?
que bênçãos já teria espalhado com o titulo académico que ostentava?

Na condição de amigo, exterminara um companheiro, na posição de esposo, não tivera coragem de ser bom para a mulher, quando sitiada pela doença!...

O olhar se lhe esbarrou, sem querer, no ritual do sepultamento de Elisa e inquiriu, de si mesmo, o que teria representado para a morta...

Sinceramente, não se sentia bem consigo próprio, realinhando na imaginação a impaciência e a dureza com que sempre a tratara, preocupado em arrebatar-lhe a ternura da filha...

Avaliando as péssimas notas que a consciência lhe conferia no educandário da existência, embora de longe, fixou Vera, a esquadrinhar-lhe o íntimo, através do semblante.

— Caio — assoprou-lhe Evelina aos ouvidos da alma —, pense nos teus compromissos...
É tempo de legalizar a situação da jovem que se entregou a ti sem qualquer restrição...

Convencido de que conversava de si para consigo, Serpa reproduziu a interpelação, no campo mental, em silêncio, sem perceber que a esposa desencarnada lhe colhia as respostas.

Supondo desenvolver tão-somente um processo de autocrítica, monologou sem palavras:
«legalizar a situação com Vera? casar-me? porquê?».

Sim, aprovava, prometera-lhe matrimónio, mas não se resignava a aceitar a medida sem maior observação.
Já fora homem preso a obrigações de marido e não se propunha a retomar afeição recheada a constrangimentos.

Além disso, matutava, dava-se por homem robustecido na experiência do mundo.
Escutara em sociedade muitas referências desprimorosas, ao redor da filha de Elisa, que não a recomendavam para esposa.

De rapazes diversos, obtivera apontamentos que lhe enodoavam a ficha de mulher.
Porque entregar seu nome a uma criatura tida por inconstante?

— Caio, quem és tu para julgar?
A interrogação de Evelina percutiu na alma dele em forma de ideia fulgurante que o enterneceu e assustou...

E qual se pensasse em voz alta, a falar espiritualmente para si próprio, recebia novas exortações, semelhando impactos da verdade a lhe atingirem o ádito do próprio ser:
— Caio, quem és tu para julgar?
Não és igualmente de ti mesmo, alguém onerado com débitos escabrosos perante a Lei?

A que título, condenar sumariamente uma jovem, prejudicada pelos enganos da sua condição de menina moralmente desamparada?...

Na base das advertências que lhe eram endereçadas, prosseguia indagando-se...
Seria justo abusar dela agora que se via praticamente só no mundo?

Se a desprezasse, para onde iria?
E quem era ele, Caio Serpa, senão um homem no rumo da madureza, reclamando a dedicação de alguém para que o comboio da vida se não lhe descarrilasse?
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Jul 10, 2012 9:27 pm

Conhecia ele toda a escala dos prazeres físicos e que lucrara finalmente com isso, se levava toda manifestação afectiva para o terreno da irresponsabilidade e do abuso?

que recolhera senão cansaço e desilusão das noitadas barulhentas, cheias de vozes e vazias de sentido? até ali, que lembrasse, nunca ajudara a ninguém.

Sabia ser afável até o ponto em que as circunstâncias não o descontentassem.

Bastava, porém, um ponto, um leve ponto a contrariá-lo, em quaisquer acontecimentos, para que se internasse nessa ou naquela escapatória, no claro intuito de não se incomodar.

Não teria chegado o momento de auxiliar a outrem, agir a favor de alguém?
De começo, empenhado à conquista, cumulara Vera de gentilezas, carinhos. Enredara-lhe as atenções.

Depois, o fastio daqueles que não mais sabem amar, quando a chama do desejo se lhes extingue na candeia da forma.
Entretanto, não lhe era lícito negar que a moça lhe dera os mais altos testemunhos de confiança.

Vera Celina se lhe entregara, de todo.
E, por fim, não vacilara humilhar a própria progenitora, a fim de colocar-lhe nas mãos todos os bens...

Serpa registava todos os argumentos da companheira desencarnada, à feição de uma lâmpada que se julgasse fonte da luz de que se beneficia, a ignorar que a recolhe da usina.

E opunha contraditas:
— Consorciar-me? prender-me? porquê? não tenho toda a satisfação do homem casado, sem as peias do matrimónio?

E a voz de Evelina a ressoar-lhe novamente no espírito:
— Sim, és o elemento-comando da união;
entretanto, como não te garantires contra as tentações do futuro, como não te imunizares contra as tuas próprias inclinações para a aventura, doando a ela — o elemento-obediência — a tranquilidade de que carece para servir-te?

Acaso te julgas livre das tendências à leviandade que te assinalam o campo afectivo?
Não será recomendável lhe assegures a paz, preservando a paz de ti mesmo, pela submissão às disciplinas justas da vida?

Pensa! Imagina-te à frente de tua própria mãezinha, já que quase todo homem procura na esposa, acima de tudo, o apoio maternal que a madureza furtou da infância...

Estimarias que um homem, na hipótese o teu próprio pai, lhe espancasse os mais puros anseios do coração?

Porventura não se tornaria ela mais digna do teu amparo e do teu carinho, se a visses brutalizada, desamparada, esquecida por aquele mesmo a quem se rendeu, confiante?

Porque alegares sofrimentos passados para menoscabar a criatura que amas, se semelhantes provações fazem dela alguém com mais acentuada necessidade de tua protecção e entendimento?...

Das admoestações própriamente consideradas, a ex-senhora Serpa se transferiu para reflexões de optimismo e esperança:
— Caio, medita!...
Vera não te confiou parcos recursos materiais à administração!
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Jul 10, 2012 9:27 pm

Dispões de património apreciável para organizar uma família...
Pondera quanto às bênçãos do futuro! Escuta!

Creias ou não em Deus e na sobrevivência do espírito, além da morte, carregas contigo um doloroso problema, até agora inarredável da mente:
o remorso pelo homicídio praticado, a lembrança de Túlio Mancini, abatido por tuas mãos!

Escapas, no rumo de prazeres que não te diminuem a mágoa, e tentas, em vão, bloquear reminiscências amargas que te assediam constantemente...

Ser pai, cuidar de filhos queridos, não te será na Terra a mais elevada compensação?

O matrimónio com Vera te investirá legalmente na posse de recursos a serem valorizados e aumentados, garantindo, aos filhinhos vindouros, segurança e conforto, alegria e educação!...

Um lar, Caio!... Um lar, onde possas descansar, renovar-te, esquecer!...
Filhos em que te revejas e o convívio de Vera, cuja presença te lembrará o refúgio maternal!...

Diante daquelas santas evocações de paz e ventura que jamais experimentara, pela primeira vez, depois de muitos anos, Serpa chorou...

Evelina continuava:
— Sim, Caio, lava o coração na corrente das lágrimas!...
Chora de esperança, de júbilo!
Confiemos em Deus e na vida!...

O Sol que hoje se põe, voltará amanhã!
Contempla estas lousas, fita os sepulcros à frente!

De todos os lados, explodem verdura e flor, a dizerem que a morte é ilusão, que a vida triunfa, bela e eterna!...

De um outro mundo, os que te amam regozijar-se-ão com os teus gestos de entendimento!

Túlio te perdoará, Elisa há de abençoar-te!... Coragem, coragem!...

O causídico, surpreso, incapaz de identificar-se visitado pelo espírito da companheira de outros tempos, reconhecia-se subitamente consolado e eufórico, tangido por suave renovação, nos recônditos do ser.

À maneira de um doente que encontrara o remédio providencial e a ele se agarrasse, na sede da própria cura, instintivamente decidiu-se a não perder o precioso momento de exaltação construtiva em que entrara.

— Vamos!... — insistiu Evelina — concede agora, mas claramente agora, a nossa Vera a certeza de que a protegerás num casamento digno!...

Sucedeu o inesperado.
Habitualmente agressivo e rebelde, Caio Serpa arrancou-se, humilde, do lugar em que se plantara, avançou sempre abraçado pelo espírito da ex-esposa, na direcção do grupo em que a jovem se apoiava...

Ali, de pensamento conjugado ao da mensageira espiritual, observou a moça sob novo prisma.
Pareceu-lhe que começava a amá-la de maneira diversa.
Viu-a mais cativante na dor que demonstrava, percebeu-lhe a solidão e a sede justa de companhia.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Jul 10, 2012 9:28 pm

Às súbitas, reconheceu-se também só, a requisitar-lhe mais intensivamente a dedicação e o carinho para viver.
Já não sabia, naquele inolvidável instante, se a queria com a impertinência de um homem ou com a ternura de um pai...

Abordando-a, tomou-lhe o braço, de leve, e comunicou-lhe, em voz alta, no propósito de alicerçar a própria declaração com o testemunho dos amigos presentes:
— Vera, não chore mais... Você não está sozinha!

Amanhã mesmo, cogitaremos de organizar a documentação precisa para casar-nos tão breve quanto possível!

A interpelada lançou-lhe um olhar significativo e agradecido...

E enquanto ambos se escoravam um no outro para o retorno a casa, Evelina e Ernesto, com os amigos desencarnados atentos às derradeiras homenagens à viúva Fantini, entraram em prece, agradecendo ao Senhor a bênção daquela transformação.

Mais um passo importante estava articulado para o futuro melhor...
Caio e Vera levantariam um lar com o Amparo Divino.

Túlio Mancini ressurgiria para a Terra, no tronco daquele mesmo que lhe subtraíra a existência, satisfazendo à Lei do Amor que determina sejam o ódio e a vingança para sempre banidos da Obra de Deus!...

Mais tarde, Elisa se lhes reuniria por filha bem-amada!...

Caio se reconfortaria e certamente seria outro homem, ao ver-se continuado na posteridade feliz, sob o olhar carinhoso de Vera, que o amava ardentemente...

Evelina cismava em tudo isso, incapaz de sofrear o pranto de júbilo...
Continuava amando o ex-esposo, porém, noutro nível, e, com toda a alma, agradecia ao Senhor a existência de Vera Celina, a quem passara a reverenciar e querer bem, na condição de protectora, cujos serviços se manteriam para ela irresgatáveis.

Em transporte de alegria, correu ao encontro dos noivos e, antes que Serpa se aboletasse no automóvel, junto da companheira, abraçou-o, reconhecida, e, pela primeira vez, bradou-lhe ao coração com a celeste emotividade do amor purificado a labaredas de sofrimento:
— Caio, meu filho! Meu filho!...
Sê feliz e que Deus te abençoe!...

Em seguida, inclinou-se para Vera e beijou-lhe a mão com enternecimento indescritível.
O auto rodou, de volta.

Evelina e Ernesto, por longo tempo, ainda se demoraram em oração, no tranquilo santuário da morte, transfigurado ali para os dois em pouso de reconhecimento e alegria, ante as primeiras estrelas que começavam a luzir na selva da noite, quais lanternas de fogo e prata, clareando o caminho para Deus, a pleno céu azul.

(1) Cemitério da capital paulista. — Nota do autor espiritual.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Jul 10, 2012 9:28 pm

26 - E a vida contínua...

O matrimónio de Caio e Vera trouxe a Ernesto e Evelina nova fonte de incentivo ao trabalho.

Túlio, algo melhor ante as promessas de futura assistência por parte daquela a quem amava tanto, concordou em matricular-se voluntariamente no Instituto de Serviço para a Reencarnação (1), internando-se, de pronto, num dos gabinetes de restringimento, entregando-se aos aprestos necessários.

Antecedendo, porém, a medida, certa noite, em que Serpa se ausentara do lar, foi levado à presença de Vera, para familiarizar-se, de algum modo, com aquela que o receberia nos braços de mãe.

Ao vê-la na costura, em sua casa de Vila Mariana, o moço, de imediato, simpatizou com ela.

Viu-lhe o semblante meigo, os olhos serenos de criatura sofrida, as mãos ágeis na tarefa, e respirou-lhe, encantado, o ambiente tranquilo.

Recomendou-lhe Evelina para que a abraçasse, nela venerando a protectora que o abençoaria por filho, em nome de Deus...

Mancini não apenas se confiou ao amplexo carinhoso, como também lhe osculou a fronte, enternecidamente.

A filha de Ernesto não percebeu aquela manifestação afectiva, em sentido directo;
no entanto, por alguns momentos, deixou que o cérebro divagasse, feliz.

«Como desejava obter um filhinho!...» — pensou.
— «Quanto anelava ser mãe!... »
Aguardava essa bênção do Todo-Misericordioso que, decerto, não a esqueceria!...

Por outro lado, não ignorava que o esposo ansiava acolher um herdeiro para o futuro e, por isso, nos sonhos que entremostrava, desperta, rogava conscientemente a Deus um menino!...

À medida que as doces prefigurações da maternidade se lhe esboçavam no imo da alma, sintonizava, mais intensamente, com Túlio, na mesma onda de esperança e regozijo, ambos experimentando santo prelúdio de inenarráveis alegrias...

Ao separar-se dela, às despedidas, formulou ele a pergunta esperada: quem lhe seria o progenitor? a quem chamaria por pai?

Evelina, porém, deu-se pressa em explicar que o dono da casa se achava distante e que ele, Mancini, o conheceria em momento oportuno.

Na base da verdade prometida, Túlio renasceria de Caio Serpa, absolutamente magnetizado pelo devotamento materno, a fim de se reaproximar do antigo adversário e metamorfosear ressentimento em amor, pela terapêutica do esquecimento.

Ante as realizações em processo, o tempo para Fantini e a companheira jazia repleto de obrigações agradáveis e belas.

Auxílio constante a Mancini, Caio e Vera, na formação do novo porvir, e amparo infatigável a Elisa e Desidério, convenientemente hospitalizados.

Ernesto, renovado pelo sofrimento, como que remoçara, enquanto que Evelina, modificada pelas novas experiências, parecia haver amadurecido, qual se os dois houvessem combinado operar um reajuste da forma, com vistas à harmonização em nível de idade semelhante de um para o outro.

Comungavam as mesmas ideias, partilhavam os mesmos serviços.

Impressionado com aquela conciliação gradativa, a surgir mecanicamente da associação sempre mais ampla e mais íntima dos dois, na obra da própria edificação espiritual, Ernesto procurou o Instrutor Ribas, inquirindo, respeitoso, se lhe seria cabível conhecer o passado, sem mais delongas, reavendo a memória de outras existências, ao que o mentor informou, sensato:
— Não, Fantini. Desaconselhável a providência, conquanto possível.
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