LUZ ESPÍRITA
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O PRÓXIMO MINUTO/Ângelo Inácio - Robson Pinheiro

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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Dez 25, 2017 10:07 am

SÃO PAULO
SÃO PAULO ESTAVA regurgitando de gente: era o dia em que ocorria a Parada Gay.
César chegara recentemente à cidade e ainda não se enturmara.
Hospedava-se em um hotel próximo à região central.
Deitara na cama mais simples do hotel que conseguira pagar com os escassos recursos financeiros trazidos de sua cidade natal.
Ainda não sabia se participaria ou não da Parada.
No entanto, mesmo que tivesse decidido, estava extenuado, muito cansado não somente com a viagem, mas porque a mente, excitada, fervilhava de ideias e emoções, naquele momento em que procurava se localizar, enquadrar-se na nova vida que esperava ter, a partir de então.
Deitou-se, como se deitara em tantas outras noites.
Mas hoje, especialmente, acontecia algo diferente.
Muito embora o barulho do lado de fora, na rua, da multidão que se reunia aqui e ali em alguns ambientes nocturnos, César conseguiu pegar no sono.
Mas não era um sono igual a outros sonos.
Percebia um ligeiro formigamento percorrendo o corpo, como se pequenas formigas caminhassem sobre sua pele.
Sentiu o braço direito parecendo levitar, de maneira que não conseguia coordenar os movimentos.
César definitivamente experimentava algo que jamais vivera, nem mesmo nas reuniões mediúnicas que costumava frequentar.
Estaria morrendo?
Quem sabe, tendo um AVC?
Não saberia dizer, pois o fenómeno era insólito e não havia experimentado nada parecido até então.
Seu corpo, agora, todo vibrátil, balançava-se de um lado para outro, como se estivesse deitado numa rede.
Ou não era seu corpo?
Seria seu espírito, que ensaiava projectar-se para fora do corpo, num fenómeno paranormal?
A sensação até poderia ser agradável, não fosse o pavor que o dominou.
Tentou a todo custo movimentar braços, pernas ou qualquer parte do corpo.
Em vão. Estava paralisado; parecia magnetizado de tal maneira que, àquela altura, já não era capaz de sentir-se a si mesmo.
Com certeza estava desencarnando.
E nem sequer conseguira experimentar nada de intenso na vida! - pensou.
"Será que mereço sair da vida assim, sem ao menos viver alguma coisa mais profunda?
E para onde irei? Para o umbral?"
O medo transformou-se em pânico e não pôde perceber a riqueza do fenómeno que ocorria consigo.
"Ai, meu Deus!
Será que vou pro inferno?
Pro umbral? Será que são meus obsessores que estão me arrastando para fora do corpo?
Valha-me, Deus!
Me ajude, Doutor Bezerra!..."
César esboçava um misto de grito e oração, acreditando, agora com absoluta convicção, que vivenciava o processo de desencarne.
A mente conturbada, cheia de culpas infundadas e baseadas unicamente na orientação espiritual deficiente, fez com que sofresse amarguras sem que tivesse feito algo para tanto.
A culpa, os problemas mal resolvidos da emotividade e os tabus incorporados às crenças pessoais formaram um clima mental complexo, que vinculou César a determinada situação ou condição.
Como semelhante atrai semelhante, ele foi arrastado magneticamente, algemado a certos problemas e à dimensão mental, energética ou outra qualquer, na qual encontraria outras pessoas que, como ele, precisavam de reflexões produtivas, a fim de amadurecer e despertar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Dez 25, 2017 10:08 am

NUM PLANO MAIS SUBTIL, invisível aos olhos humanos, diversos personagens se reuniam, nos bastidores da vida.
Poderiam ser classificados como espíritos-familiares, seres que não são nem santos, nem anjos, apenas humanos que vivem fora do corpo físico, no período entre vidas, mas ainda inseridos no panorama humano da civilização extra-física.
- Em breve veremos algumas almas se encontrarem para, juntas, desbravarem desafios íntimos em comum - disse certo mensageiro, que se reunia com amigos interessados na felicidade de determinado grupo de jovens.
- Parece que são mentes entrelaçadas por vivências em comum, culpas estilizadas nas máscaras que carregam até não aguentarem mais - observou um dos mensageiros, orientador particular de um dos personagens que desempenhava papel momentâneo no palco da vida, no mundo físico.
- Tenho minha atenção voltada para um deles, especialmente.
Temo que o estado emocional possa levá-lo a um provável suicídio.
Isso complicaria muito suas emoções, que, a esta altura, já estão comprometidas.
- Veremos o que é possível fazer.
Contudo, não devemos ignorar que nossos amigos têm de escolher os próprios caminhos; são eles que escreverão a história de suas vidas.
Embora caiba a nós prestar auxílio, não podemos impedir que vivam cada experiência, que sorvam cada gota do veneno ou experimentem o sabor do elixir que elaboraram.
Cada um precisa enfrentar-se.
Quem sabe, nesse encontro de almas, de seres em busca da própria felicidade, alguns deles possam encontrar o caminho melhor e mais excelente, aquele que os fará descobridores da felicidade?
- Não sei bem se nós mesmos encontramos a felicidade...
Talvez estejamos fadados a procurá-la por toda a eternidade, trocando de corpo, vida e experiência, até que algum dia possamos nos descobrir por inteiro.
Que possamos brilhar, enfim, sem este peso que algumas experiências na Terra trazem.
- Também sei que demandará longo tempo - falou outro espírito - até que tenhamos respostas satisfatórias para as questões concernentes à sexualidade.
Porém, como já caminhamos um pouco mais na compreensão de alguns desses problemas que afectam directamente nossos amigos na Terra, creio que podemos inspirá-los em seus desafios.
- Não podemos nos esquecer de que somos apenas espíritos familiares - lembrou um dos seres invisíveis.
Como tais, mesmo que tenhamos certa responsabilidade sobre a condução de nossos afectos, que enfrentam seus dilemas, temos de convir que nossas limitações são sérias.
Não somos anjos.1
- Quem sabe não é exactamente por isso que estamos aqui, observando e tentando auxiliados?
Exactamente porque não somos anjos nem conhecemos nenhum anjo do lado de cá da vida.
Possivelmente, tenhamos de ajudar nossos amigos, que vivem seus dramas e dilemas, justamente a se descobrirem humanos.
Afinal, não é para isso que todos nascemos na Terra, de modo que aprendamos a ser humanos, na mais exacta acepção da palavra?
- Concordo plenamente - revelou o outro ser.
Vamos observar, inspirar e ajudar quanto pudermos.
Devemos estar cientes de que cada um dos nossos pupilos, se assim posso dizer, traz uma marca íntima de sofrimento, decorrente de séculos de lutas, desacertos, construções e castrações mentais.
São espíritos que naturalmente reflectirão os padrões mentais forjados ao longo de sua trajectória, das experiências que cultivaram tanto durante a vida actual quanto nas muitas que tiveram.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Dez 25, 2017 10:08 am

Além do mais, deve ser bem claro para nós, a fim de ajudar adequadamente, que o sexo, neste momento histórico pelo qual passa a humanidade, é o grande desafio para o espírito inserido na experiência física.
- Não entendi o que quer dizer ou aonde deseja chegar com essa observação.
— E que, para essas pessoas com as quais lidamos de forma mais directa, o sexo e a sexualidade parecem ser um desafio muito maior e mais amplo até mesmo que o desafio da própria vida e da morte.
Estão atrelados ao passado, quando fizeram escolhas, elegeram determinada forma de viver que repercute ainda hoje, em pleno século xxi, na maneira de encararem o cotidiano.
Em certo sentido, pode-se afirmar que suas famílias, suas conquistas, seus ideais e sua religião resumem-se ao desafio do sexo.
Não quero, com isso, dizer que estão vivendo num circuito fechado de pensamentos, mas que as situações de sua vida não chegarão a bom termo, não encontrarão solução enquanto não resolverem essa espécie de nó cármico.
A vida sexual de todos eles parece representar muito mais do que uma simples vivência sexual, ou seja, é protagonista, e não secundária no cotidiano de cada um.
Veem-se repletos de tabus, preconceitos, ideias equivocadas e, por conseguinte, culpa, muita culpa, que foi gerada pela educação familiar, religiosa e social a que se submeteram.
- Você quer dizer que, enquanto não enfrentarem seus problemas e dificuldades de ordem sexual, naquilo que afecta directamente suas emoções, estarão fadados a repetir as mesmas experiências, até os resolverem?
- Não é bem assim. Tentarei explicar melhor.
Toda vez que qualquer um de nós, os seres humanos em geral, deixamos algo mal resolvido em nossa trajectória, parece que não conseguimos crescer.
Um homem começa a caminhada, seja na vida afectiva, profissional ou noutro âmbito qualquer; entretanto, quando falta pouco para atingir suas metas de felicidade e realização, algo parece dar errado e tudo desmorona.
Vez atrás de outra, a experiência se repete e vemos esse processo suceder com várias pessoas, em diversas partes do mundo.
Há quem julgue que é magia que fizeram contra ele, que o azar o persegue ou, ainda, que Deus não gosta dele.
No entanto, ao observarmos essa avalanche de situações conflituosas ocorrendo com diferentes indivíduos, podemos encontrar um denominador comum.
E que deixaram algo nitidamente mal resolvido em suas vidas, em sua caminhada.
Seja porque não se perdoaram por algo que julgam ter feito de maneira incorrecta ou anti-ética, seja porque deixaram de pedir perdão a alguém a quem prejudicaram e, para tais pessoas, esse pedido seria crucial.
Ou, então, trazem situações mais complexas que poderiam ter enfrentado, mas recuaram e desistiram.
- Compreendo - falou o companheiro do mundo invisível.
Então é a isso que você chama de nó cármico...
- Isso é apenas um termo do qual me utilizo, devido à precariedade do meu vocabulário.
Em resumo, é algo assim. Uma situação mal resolvida pode representar um nó, uma pedra no caminho da pessoa; enquanto ela não retorna, enfrenta o desafio e se recompõe intimamente, fazendo as pazes consigo mesma, não consegue avançar, atingir a felicidade ou a meta preciosa para sua alma.
No caso presente, nossos amigos têm algo em comum: a sexualidade.
E nós, também, temos algo em comum com eles, do contrário não estaríamos aqui, auxiliando-os da forma como podemos.
- Entendo, meu amigo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Dez 25, 2017 10:08 am

Olhando para mim mesmo, sei que deixei algumas questões, digamos, em aberto, pois me faltam elementos para poder enfrentá-las.
Sei que assim permanecem, até uma próxima reencarnação, quando, quem sabe, terei mais condições de retomar meus projectos de vida.
- Eu também - falou o outro espírito.
Vim da última experiência terrena com alguns desafios; não soube reunir forças nem conhecimento a fim de superá-los.
- Vejam que os integrantes deste grupo de encarnados que reunimos apresentam situações semelhantes entre si.
Neste momento, por mais desafiadoras que sejam suas lutas e guerras íntimas, são apenas humanos.
Estão em busca de felicidade e realização.
Alguns deles, por caminhos mais longos e, quem sabe, mais sinuosos.
Mas, como diz um companheiro mais experiente:
"Não estão sós aqueles que amam".
E eu acrescento:
Não importa o tipo de amor, ou 97 a forma de amar.
0 que importa é que amem; que continuem na busca pela felicidade, como nós.
De nossa parte, precisamos apenas amparados, sem coagi-los, sem tentativas de doutriná-los ou, até, enquadrá-los de acordo com esta ou aquela opinião.
Que cada qual descubra o próprio caminho, que o conduzirá à realização interior, independentemente de sua forma de conceber a felicidade.
Em dado momento da conversa entre os habitantes do Invisível, um dos integrantes do grupo perguntou:
- Qual sua opinião, caro Samuel, sobre os espíritos que, ao estagiar no corpo físico, passam pela experiência da homossexualidade?
- Este é um tema delicado, meu caro Nestor.
Creio, sinceramente, que merece profundo respeito de nossa parte ao abordá-lo.
Antes de tudo, carece da compreensão de alguns termos, a fim de que não geremos mais dúvidas ou mesmo recaiamos em erros de interpretação, tão comuns a quem se mantém na superficialidade do assunto.
Primeiro, alguns termos empregados como sinónimos de homossexualidade precisam ser bem compreendidos, pois não são adequados, já que se referem a outros tipos de comportamento ou identidade energético-espiritual.
- Você disse energético-espiritual?
Nunca vi esse termo antes.
Poderia esclarecer?
- Pois bem, meu amigo.
Na Terra, entre os mais experientes no assunto ou mais esclarecidos, é comum distinguir entre identidade sexual e orientação sexual, que são duas coisas diferentes.
A identidade sexual diz respeito a como o indivíduo se sente em relação ao sexo morfológico.
Ele pode se ver em descompasso ou se sentir em harmonia com o tipo biológico do corpo que habita temporariamente.
"Explico melhor.
Quando o espírito reencarna num corpo masculino, por exemplo, mas se sente um ser feminino, sua identidade sexual difere, portanto, da identidade física ou biológica.
Diz-se haver aí um conflito de género.
De outro lado, quando a alma reencarna num corpo feminino e seu psiquismo também se reconhece como um ser feminino, podemos dizer que a identidade sexual se iguala à morfológica, do seu corpo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Dez 25, 2017 10:08 am

Portanto, a identidade do ser psíquico pode, em alguns casos, ser diferente daquela apresentada pelo corpo em que habita.
Já a orientação sexual pode ser entendida como sendo o direccionamento do desejo sexual e da afectividade para parceiros do mesmo sexo ou do sexo oposto.
Quando falo em identidade energético-espiritual, refiro-me a algo muito mais profundo do que os sinais meramente físicos e psicológicos; reporto-me a todo o arsenal de conhecimentos arquivados no corpo mental do indivíduo."
- Então, pode-se entender que alguns nascem com a identidade energético-espiritual diferente da identidade física e que isso pode ser algo programado anteriormente, isto é, no período entre vidas, também denominado erraticidade?2
— Pode ser que sim, pode ser que não, meu amigo Nestor.
Nem tudo é programado.
Como regra geral, pelo menos ante o que temos ouvido do lado de cá, da parte de benfeitores mais experimentados, a programação reencarnatória3 ocorre sim, mas obedece a certos factores.
Entre eles, o esclarecimento e o mérito do espírito reencarnante, além da tarefa específica que o indivíduo deve realizar na sua próxima etapa na Terra, se é este o caso.
Do contrário, é preciso refletir.4
"Imagine um espírito comum, que não tem nenhum conhecimento de questões espirituais mais amplas e, talvez por isso mesmo, nenhuma actividade programada.
Em determinada ocasião, ele se aproxima de um casal em plena realização do ato íntimo; dois parceiros sexuais, portanto.
Muitas vezes, esse espírito é, por assim dizer, capturado magneticamente pelas forças sexuais que são exsudadas ali; nesse enlace magnético, vê-se cativo das energias geradoras do corpo físico, em plena acção no útero feminino.
A verdade é que milhares de seres encontram-se nessa condição de uma concepção mais automática, mais da lei e menos fruto de intervenção e programação espirituais.
Eles nascem, morrem e reencarnam, sem ao menos ter consciência do processo pelo qual estão passando.
São como sonâmbulos, que vivem do lado de cá da vida, mas não sabem que já morreram ou desencarnaram.
Nascem no mundo das formas por imperativo da lei de atracção dos corpos, segundo o mecanismo das leis divinas, em grande parte direccionados pelas leis físicas, inscritas e sintetizadas no ADN dos pais.
"Ante essa realidade, podemos observar espíritos comprometidos na área da sexualidade que precisam reencarnar e acabam atraídos para a formação de novos corpos.
Eles não chegaram a escolher, pelo menos não conscientemente, o tipo de corpo ou a experiência pela qual passarão.
Eis que nesses casos, meu caro Nestor, as leis físicas que regem o nascimento biológico já entraram em acção, e a mãe, por exemplo, poderá conceber um corpo masculino de um bebé saudável, do ponto de vista biológico.
Mesmo assim, o espírito que se aproximou, naquele momento do enlace magnético sexual, poderá ser um espirito de mentalidade, experiências e psiquismo feminino.
Embora entendamos que tudo que ocorre no mundo está dentro do planeamento divino e nada seja alheio à sua vontade, esse tipo de reencarnação não obedece a um planeamento efectivo de alguma entidade mais esclarecida ou dos prováveis mentores do espírito reencarnante.
Houve mais o cumprimento de uma necessidade do que a execução de um planeamento detalhado.
"Resultado: quando o espírito abre os olhos e toma consciência da nova vida, já ocorreu a união inevitável do espírito com a matéria.
E ele nasce com a morfologia em dissonância com o psiquismo."
- Puxa, Samuel!
A situação pode ser muito mais complexa do que imaginamos ou do que normalmente se ventila por aí.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:11 am

Posso entender, então, que nem sempre há um planeamento reencarna tório e que a maioria dos seres que reencarna no planeta pode nem saber o que se passa?
- Sim, provavelmente se possa afirmar que mais de 50% - isto é, a maioria — dos seres que desencarnam e reencarnam hoje, na Terra, nem sabem o que se lhes ocorre.
Permanecem tão mergulhados em interesses próprios da esfera material que, ao chegarem do lado de cá da vida, continuam acreditando que estão vivos entre os vivos.
E ao renascer, a maior parte nem cogita a reencarnação, tampouco compreende o que sucede.
São os conhecidos sonâmbulos.
Andam, vivem e caminham entre os desencarnados num plano bem próximo ao da matéria; por isso, dada a semelhança entre esse plano e o da matéria, não sabem distingui-los, pois o plano material é a única coisa que conhecem.
Nem sequer tiveram o mínimo interesse em perceber e se esclarecer a respeito dessas diferenças.
"Sendo assim, como podemos imaginar, simplesmente, que haja um processo reencarnatório programado para todos os seres, sem levar em conta o esclarecimento, o comprometimento e a maturidade psíquica de cada um?
Planeamento efectivo existe, é claro, mas me aventuro a afirmar que esse tipo de planeamento é para quem tem uma tarefa a desempenhar, seja no campo espiritual, científico, artístico ou outro qualquer, que mereça um investimento mais detalhado e exija um programa reencarnatório, a fim de oferecer recursos à realização de um trabalho divinamente inspirado e preparado.
É para quem deixará as marcas na história do mundo, da humanidade, mesmo que seja sem grande notoriedade, numa comunidade familiar ou outra do género.
Enfim, é para quem conquistou esse tipo de interferência espiritual pormenorizada ou para quem é alvo da intervenção de alguém de mais amplos recursos, que lhe abonou ou avalizou a reencarnação."
- Mas não existe o caso de algumas pessoas, reencarnadas como homossexuais, em que houve planeamento para que a experiência se desse nessas circunstâncias?
-E claro que sim, amigo!
Mas podemos entender que foram factores distintos, a depender da época e da cultura, que levaram este ou aquele espírito a optar por uma vivência assim.
Primeiro porque, quando o espírito é consciente de sua realidade íntima, ou um pouco mais lúcido a respeito, sabe de antemão que, em determinada época da humanidade, ele terá este ou aquele tipo de prova ao escolher renascer como gay, homossexual, bissexual ou transgénero.
Por exemplo, aqueles que viveram a condição homossexual nos anos 1920 ou 1930 experimentaram desafios bastante diferentes daqueles espíritos que a mesma condição viveram ao reencarnar nos anos 1980, sobretudo em sociedades ditas ocidentais.
Paralelo semelhante pode ser feito ao se comparar a condição social do homossexual na Roma ou na Grécia antigas e, no extremo oposto, em países de maioria islâmica, na actualidade.
"Portanto, podemos entender que, se algum espírito optou por um corpo morfologicamente em desacordo com o psiquismo, mesmo renascendo em culturas de menor tolerância, é porque julgou que a experiência lhe serviria como factor reeducativo. Enfrentar as dificuldades inerentes à sociedade e à religião naquele contexto poderia actuar como forma de limitar seus impulsos, caso tenha chegado à conclusão de que tais impulsos mereciam reajuste.
Porém, certamente não são as mesmas razões que o movem na hipótese de reencarnar no século xxi ou mesmo nas últimas décadas do século xx, a não ser numa cultura mais isolada e tradicional.
Como sabemos, a partir dos anos 1990, e talvez desde uma ou duas
décadas antes, houve relativa abertura mental, social e mesmo religiosa, tendendo para a aceitação daquilo que a sociedade condenava, de modo geral, e até via como doença."
- Agora compreendo melhor, Samuel!
Então, podemos afirmar que os espíritos que renascem na época actual, em circunstâncias semelhantes, têm outros objectivos, ao menos nos casos em que houver planeamento reencarnatório.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:11 am

- E isso aí!
De qualquer modo, na actualidade existem desafios os mais diversos acerca da sexualidade, os quais podemos analisar por outro prisma.
Um dos maiores problemas nos dias atuais, principalmente entre espiritualistas, são certos conceitos disseminados de forma irresponsável, sem levar em conta os transtornos e males que, de modo lento e progressivo, vêm causando e causarão, em médio e longo prazo.
Dando um tempo maior para a reflexão oportuna, a fim de que os outros espíritos pensassem, juntamente com Nestor, Samuel prosseguiu:
- Falo de médiuns, oradores e dirigentes espirituais que divulgam ou tentam incutir na mente de seus admiradores e do público em geral que são assexuados, que nunca fizeram sexo na vida ou que sublimaram as energias sexuais.
Tal atitude é objecto de preocupação de elevados mentores da espiritualidade, tendo em vista o erro que significa a mera repetição do discurso de castidade da igreja tradicional, propalado por expoentes de ideias que deveriam ser renovadoras, e não conservadoras.
"Advindos de um passado em que se comprometeram demasiado com desvarios, que enchem suas mentes de culpa, e nas quais ainda ecoam os conceitos religiosos repressivos, excludentes e erróneos cultivados, esses expoentes tentam dar a impressão de que são diferentes alguns, até, missionários ilibados - e por isso não fazem sexo.
Como se aqueles que fazem sexo, sejam homossexuais ou heterossexuais, estivessem, por essa razão, distantes de uma espiritualidade erroneamente concebida nas mentes de pretensos missionários da infelicidade humana.
Ou como se praticar sexo fosse uma coisa imunda, indesejável ou impura, alimentando, assim, a arcaica mentalidade medieval, infelizmente ainda tão em voga, que divide o mundo entre sagrado e profano e associa o sexo ao profano.
Ora, o celibato do discípulo foi posto em xeque desde Lutero, desde o advento do protestantismo, no século xvi; vamos assistir a um retrocesso desses em pleno século xxi?"
Respirando fundo, como se quisesse conter a indignação com a difusão de um equívoco desse porte, continuou:
- Com esse tipo de desinformação que prestam ao movimento espiritualista, tais lideranças acabam por sustentar e fomentar ideias distorcidas sobre a sexualidade humana.
Muita gente aporta nos templos espiritualistas cheia de conflitos íntimos e em franco desequilíbrio emocional, que advêm da ignorância sobre este e outros temas.
Lá chegando, percebe que a comunidade tem como parâmetros a castidade ou a sublimação, quando não ouve recomendações veladas ou explícitas de que o melhor é reprimir seus impulsos sexuais.
Como resultado, acaba por aprofundar suas dúvidas, acentuando culpas e fortalecendo ideias erróneas acerca da sexualidade.
- Fico pensando, Samuel - disse agora outro dos invisíveis, Arthur.
Se esses expoentes estiverem mesmo falando a verdade, isto é, que nunca tiveram experiências sexuais, chego a imaginar se não precisam é de tratamento psiquiátrico ou acompanhamento psicológico.
Pois é muito difícil de acreditar nisso que contam e divulgam; no fundo, deve ser apenas para parecerem diferentes ou mais elevados.
- Esse papo de terem sublimado as energias sexuais é algo descarado, descabido.
0 que isso quer dizer, afinal?
Que a libido foi totalmente canalizada para outros aspectos e, portanto, não há relacionamento, masturbação e nem sequer desejo?
E isso é tido como saudável, no actual contexto da experiência humana?
Imagine só!
Recordo o que dizem os orientadores evolutivos da humanidade, sobre o sexo ser a última coisa que conseguiremos elaborar plenamente, a fim de conviver com essa força de maneira harmoniosa e pacífica, ao longo dos futuros milénios.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:11 am

Então, só me resta concluir que essas pessoas querem, com suas afirmações, é sugerir que estão mais evoluídas, à frente da maioria.
-É como disse, certa vez, um expoente das ideias espíritas:
"O espiritismo é religião de católicos fracassados".
Entendo essa afirmativa, sobretudo quando sei que quem propala irreflectidamente coisas assim, defendendo uma santidade irresponsável e compulsória, na maior parte das vezes é Ex religioso, ex-freira ou ex-padre reencarnado.
Não se contentando em atrapalhar a vida dos antigos pupilos e paroquianos com os abusos praticados e os conceitos retrógrados e 109 deturpados que difundiram sobre sexo e, também, sobre a falsa virtude dos santinhos forjados
pela Igreja, reencarnaram para continuar prestando um desserviço à causa de Jesus.
Como outrora, querem alimentar a crença na superioridade e na santidade de lideranças religiosas, que, exactamente como no caso de sacerdotes, bispos, cardeais e papas, não resiste ao mínimo exercício do bom senso e da razão.
Agora, respirando mais fundo ainda, Samuel retomou o pensamento:
- Precisamos, então, encarar a sexualidade humana, em suas variações e formas de manifestação, como algo natural, e não emprestar peso tão grande à questão, gerando culpa e acentuando os dramas daqueles que estão a caminho do descobrimento interior.
Sexo, homo-afectividade, homossexualidade, masturbação, bissexualidade, erotismo:
nada disso jamais foi pecado nem tampouco atrai obsessores, como afirmam alguns, até porque pecado é uma concepção católica, forjada com o intuito de coibir o pensamento, a análise, a consciência e as atitudes humanas daqueles que se submetem à influência dessa expressão de religiosidade.
De forma equivalente, usam o conceito e a existência de obsessores - isto é, de espíritos que estabelecem relações infelizes com encarnados - exactamente como os padres de antigamente utilizavam a figura do diabo, com o no objectivo de coibir a liberdade de expressão e a felicidade alheia, já que se sentem infelizes, de alguma maneira.
Mas, convenhamos, a idade da ignorância já passou há muito!
A idade da manipulação mental, emocional e cultural por parte dos religiosos foi algo marcante na história medieval; porém, estamos em pleno século xxi...
Muito embora ainda haja espiritualistas usando as mesmas máscaras de séculos atrás, paralisados e engessados no tempo.
- É possível compreender essa postura tão ultrapassada, presente em algumas pessoas, quando consideramos o peso da culpa que acompanha a tradição judaico-cristã, ao longo de mais de 2 mil anos - falou Arthur.
— E quando comparamos esse tempo com os menos de dois séculos de espiritualismo, num sentido mais amplo, é possível entender por que a maioria dos que hoje coordenam muitos movimentos de esclarecimento da humanidade ainda precisa se libertar de conceitos obsoletos, que embotam a mente tanto quanto a caminhada de muita gente.
Voltando-se para Nestor, Samuel falou, da forma como se fala, sem barreiras, a um amigo de longa data:
- Todos trazemos o passado comprometido com as questões da sexualidade, seja como heterossexuais, bissexuais ou homossexuais que são condições nas quais transitamos ao longo das existências.
Não há santos entre os desencarnados, por mais que esse facto decepcione número tão grande de espiritualistas.
Nem mesmo entre os chamados mentores, que muitos médiuns e adeptos parecem ter beatificado e canonizado, de modo a dar mais status a seus dirigentes espirituais e sugerir que são mais elevados que os demais.
Somos todos apenas humanos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:11 am

"Muito discurso que se ouve aqui, do lado de cá da vida, principalmente entre espíritos ainda apegados ou afeitos ao modo de vida católico ou religioso extremista, talvez até possa soar bonito, mas apenas como discurso, em si.
Porém, sinceramente, quero ver quando esses mesmos espíritos, santificados compulsoriamente pelos valores que lhes foram imputados por seus médiuns, estiverem reencarnados.
Como dizem na Terra: na prática, a teoria é outra..."
Continuando a fala, agora mais recheada de emoção, para seus ouvintes do Invisível, Samuel prosseguiu:
- Eu mesmo, como bem me lembro - e como me lembro! -, trago da minha última existência na Terra muitas lembranças difíceis, que remontam aos meus primeiros momentos de infelicidade, naquela encarnação, quando confrontado com as deturpações e os preconceitos da crença neopentecostal, da forma como era cultivada no círculo familiar em que me criei.
Ao longo do tempo, inconformado com as directrizes que recebera e que me marcaram profundamente a existência, modifiquei o rumo de minha vida, absorvendo os ensinamentos do moderno espiritualismo, na interpretação do Evangelho segundo a óptica espírita.
Só então é que consegui relativa liberdade mental e certa tranquilidade, embora ainda permanecesse agrilhoado a determinados conceitos difundidos por alguns expositores daquelas ideias renovadoras.
Os novos ensinamentos que absorvi demoraram a criar massa crítica em mim, de forma a capacitar-me a reconhecer onde terminava a ideia espírita e começava o ponto de vista a respeito dela, nem sempre enriquecedor.
- Quer dizer, então, que você nem sempre esteve na posição em que se encontra hoje? - questionou Nestor.
- Que posição, amigo?
Aqui sou apenas mero aprendiz; nada mais.
Não sou mentor, segundo o termo que se emprega no movimento espiritualista...
Graças a Deus!
Assim, me sinto mais livre, mais humano e igual aos outros, com quem convivo.
Sou um espírito familiar, apenas isso.
Aliás, a maioria dos chamados mentores não passa de espírito familiar, que deseja o bem daqueles que lhe são caros, os quais ficaram na outra margem da vida.
Tanto quanto você e os demais, vejo-me como alguém simplesmente humano, que precisa se dedicar, e muito, ao estudo, a fim de praticar aquilo que aprende na escola da vida.
- Ah! Mas você é diferente.
Já estudou muito mais do que a maioria de nós aqui; isso está implícito em suas palavras.
Não pode negar que já é um instrutor de um grupo de espíritos, do lado de cá da vida.
- Instrutores não são anjos nem santos, Arthur!
Trata-se apenas de um papel que desempenho, de uma palavra que define meus encargos por aqui.
Nada além disso!
Todos trazemos desafios, problemas, complexos ou mesmo obstáculos criados em nossas experiências.
E conhecimento, pura e simplesmente, não significa elevação.
Quem muito conhece, muito está comprometido, ou muita responsabilidade tem.
Sem colocar um ponto final no assunto, mas apenas dando uma pausa para melhor observar os amigos encarnados com os quais lidavam de forma mais directa, Samuel encerrou a etapa de discussões com o comentário:
-E preciso concentrar nossa atenção nos dramas de nossos amigos encarnados.
Eles estão em situação delicada e merecem nosso concurso, embora devamos permanecer ocultos, por enquanto, observando o que fazem e o que está por trás de suas palavras, intenções e atitudes.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:12 am

Eles precisam se encontrar, ou ao menos parar de fugir com tanto ímpeto, mas, para isso, o caminho pode ser longo.
Pode ser de apenas um minuto...
Quem sabe nesse minuto a eternidade se esconda, o tempo pareça dilatado e as oportunidades se renovem?
Vamos, observemos o que ocorrerá no próximo minuto das vidas de nossos amigos.

1 Cf. KARDEC, Allan. 0 livro dos espíritos. IA ed. esp. Rio de Janeiro: FEB. 2005. p. 317-330, itens 489-521.
2 Cf. ibidem, p. 197, item 224.
3 Cf. ibidem, p. 216-226, itens 258-273.
4 A leitura apressada do texto indicado na nota anterior pode levar a uma interpretação errónea, tomando-se o princípio geral como sendo válido para qualquer caso.
Em resposta à primeira questão de Kardec sobre a escolha das provas, lê-se:
"Ele próprio [o espírito] escolhe o género de provas por que há-de passar e nisso consiste o seu livre-arbítrio".
A partir disso, há quem acredite que sempre se planeja a reencarnação.
Adiante, Kardec mesmo rejeita essa hipótese, que lhe parece insensata, ao indagar:
"Como pode o Espírito, que, em sua origem, é simples, ignorante e carecido de experiência, escolher uma existência com conhecimento de causa e ser responsável por essa escolha?".
Os espíritos lhe esclarecem, confirmando que tudo depende da maturidade do ser:
"Deus lhe supre a inexperiência, traçando-lhe o caminho que deve seguir, como fazeis com a criancinha.
Deixa-o, porém, pouco a pouco, à medida que o seu livre-arbítrio se desenvolve"
(ibidem, p. 216, 219, itens 258, 262. Grifo nosso).
5 " [Deus] pode impor certa existência a um Espírito, quando este, pela sua inferioridade ou má vontade, não se mostra apto a compreender o que lhe seria mais útil, e quando vê que tal existência servirá para a purificação e o progresso do Espírito" (idem. item 262a).
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:12 am

AMBIENTE ESPIRITUAL fora esculpido pelo calor e ardor das emoções conturbadas daqueles espíritos.
Medos, angústias, sentimentos, esperanças e expectativas de cada um deles contribuíram para plasmar a atmosfera psíquica na qual se viam envolvidos.
Prisioneiros das próprias dificuldades íntimas, da culpa abrigada na mente, elaboraram inconscientemente o ambiente espiritual ou fluídico ao derredor.
Afinal, a substância plástica da matéria astral assume a forma que a mente e as emoções lhe imprimem.
Tanto o aspecto purgatorial quanto o celestial, assim como as cadeias que agrilhoam a criatura no Além, constituem meros reflexos de sua mente.
Quanto mais se crê, mais se vê.
Contudo, as paisagens paradisíacas ou infernais, sensíveis ou grosseiras não reflectem uma realidade permanente. Tudo é passageiro.
Tudo é projecção das sombras ou das luzes que irradiam do ser.
A mente prisioneira da culpa, do remorso ou das angústias de uma existência mal definida ou mal resolvida exterioriza a paisagem íntima em torno de si.
Da mesma forma, a mente sadia, que se esforça por cultivar emoções enobrecedoras e elevadas, projecta ao redor as imagens condizentes com a qualidade da vida mental superior.
Através de mil formas, de mil vidas, o ser eterno vai aprimorando o psiquismo em meio às contingências da vida material, social e familiar.
Detentor de uma riqueza interior inestimável, o espírito investe nas sucessivas vidas, estagiando nas diversas expressões da forma, conforme a necessidade particular do momento evolutivo que atravessa.
Homem e mulher são apenas aspectos exteriores necessários ao mundo da forma,1 e nem sempre a fisiologia representa o ser psicológico aprisionado nos limites do corpo.
0 sexo, património sagrado do espírito, é expressão da polaridade íntima e aguarda os séculos e milénios para ser compreendido.
A vivência da sexualidade será, dessa forma, uma questão comportamental profundamente ligada às matrizes psicológicas construídas ao longo das vidas sucessivas.
Não há como padronizar o comportamento como expressão do ser imortal, uma vez que a variedade tão grande de criaturas e de experiências não nos permite uma visão acertada, ampla e profunda da situação íntima de cada um.
Tampouco é possível estabelecer regras rígidas para comportamentos, ideias e pontos de vista, classificando-os entre o que é e o que não é normal ou aceitável.
Não há como dizer que este tipo energético ou aquela identidade afectiva e sexual seja a mais correta ou a única forma de expressão do ser.
Em cada vivência, um aprendizado; em cada atitude, uma experiência.
Bem e mal deixam de ter a conotação moralista e legalista para ceder lugar ao comportamento ético dos seres que se emancipam mais e mais na escola da vida.
Muitas vezes, indivíduos veem-se reféns de medos, angústias e pesares; outros, em plena fase de aprimoramento íntimo, libertam-se de tabus e preconceitos, ampliam conceitos e, assim, elaboram o clima mental e emocional em que viverão, de acordo com a maneira como transitaram na última existência física.
As prisões invisíveis - porém, reais - que cerceiam a pretendida liberdade são apenas a projecção do lado obscuro, que emerge do inconsciente profundo.
Tal projecção determina o limite de acção de cada um.
Eis por que o ambiente espiritual, físico ou social é o reflexo vivo do mundo íntimo.
Sem escapar a essa realidade universal é que Patrícia, Paloma, Hugo, Ronie, César e Adir aportaram em outra dimensão da vida, embebidos em lembranças, crenças, dúvidas e conquistas pessoais.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:13 am

Estavam numa espécie de transição entre as dimensões da vida; localizavam-se num plano onde, devido à sua extrema maleabilidade, a realidade interior se fazia facilmente palpável.
Um sétimo personagem se encontrava ali, e outros mais, invisíveis, imperceptíveis, com o intuito de recebê-los ou, quem sabe, compartilhar suas experiências.
Sentindo-se prisioneiros, embora sem celas nem grades, mas também sem nenhuma possibilidade de fuga perceptível naquele momento, pouco a pouco foram se revelando intimamente.
Como que envolto numa rede invisível, numa espécie de teia de aranha, que o cerceava por inteiro e coibia movimentos mais amplos, ouviu-se a voz, quase um grito, do rapaz:
- Onde estou?
Que desgraça é esta que me aprisiona? - perguntou Ronie, ainda com fortes imagens mentais do que lhe ocorrera.
- Quem são vocês? - gritava, sem obter resposta imediata.
Ao examinar a substância que o envolvia, concluiu que se tratava de algo parecido com uma teia de aranha, porém feita de material pegajoso.
Somente com grande dificuldade conseguia se desvencilhar da matéria que o dominava, mas parecia-lhe que uma força descomunal o arrastava de novo para aquela armadilha.
Porém, a força parecia não ser externa, mas interna.
Era algo que emanava dele próprio, pôde notar.
Tomado de imensa angústia, logo percebeu que não estava sozinho ali.
Havia vultos - outras pessoas ou outras almas.
Em determinado lugar, em meio ao lusco-fusco do ambiente, jazia Patrícia, deitada em posição fetal, gemendo baixinho.
Ajoelhado mais além, Adir, o pastor, parecia balbuciar algo com os lábios, acostumado a fazer uma oração puramente mecânica.
0 desespero íntimo parecia se avolumar.
- Onde estou?
Será isto aqui o portal do inferno?
Não pode ser! Não pode!
Eu fui salvo.
0 Senhor está testando a minha fé...
Adir saía correndo de um lado para outro, na tentativa de sair daquela situação, encontrar uma porta, uma resposta ou explicação em seus conhecimentos limitados. Em vão.
Hugo parecia estar prestes a perder o juízo.
Vez ou outra dava gargalhadas, que se seguiam logo após intenso pranto.
Paloma, quieta, cabisbaixa, parecia mergulhada em seus próprios pensamentos e recordações.
Não sabia onde estava.
Não queria saber.
Tinha a mente funcionando em circuito fechado:
pensava na própria vida. Reflectia.
Em pé, alguém os observava.
Seria apenas uma pessoa a mais, ou várias que os observavam?
Não podiam precisar.
Pelo menos, não por enquanto.
Não viam o vulto, o ser directamente, mas o percebiam.
Sabiam que eram observados.
Era apenas uma sombra? Uma aparição?
Todos pressentiam sua presença, mas ninguém o conhecia, também não se conheciam.
Mas será que queriam se conhecer?
- Quem são vocês?
Onde estou? - continuava Ronie a gritar, a se exasperar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:13 am

Tomando uma atitude, levantou-se meio cambaleante; segurando as pessoas ao redor, sacudia um a um seus companheiros, estranhos entre si.
- Acordem, reajam!
Estamos todos metidos neste lugar e vocês aí, parados? - berrava, agitava-se e exprimia seu inferno interior através das atitudes violentas.
Tentava a todo custo obter uma reacção daquelas pessoas que estavam com ele, compartilhando o espaço.
Ou não seria um espaço, seria uma situação? Não importa.
Naquele momento, nem Ronie nem os demais sequer sonhavam com o que estava acontecendo.
Não haviam se preparado para essa realidade.
Em meio às tentativas de despertar aquelas pessoas, um suspiro foi ouvido.
Um suspiro profundo, alto, perceptível, que mexeu com todos.
Ficaram apavorados diante do desconhecido.
E como não viam a pessoa da qual partiu o suspiro, o temor aumentou exponencialmente.
Um misto de medo e pavor pareceu acordar alguns, enquanto Ronie parou, silenciou, tentando perceber mais alguma coisa.
-0 sangue de Jesus tem poder! - bradou Adir, alto e bom som.
- Só faltava essa! - disse Ronie, entre o deboche e o desespero.
Um religioso, talvez um crente miserável preso aqui comigo...
Eu tenho que aguentar cada uma, viu?
Numa desgraça dessas e ainda me vem um maldito crente...
- Você ouviu aquele suspiro profundo? perguntou Adir.
- Claro que ouvi!
Não estou surdo!
Pensando um pouco mais, complementou:
- Ou melhor, não sei se ouvi ou se percebi.
Mas foi algo assustador.
Patrícia, recolhida em seu mundo particular, ameaçou despertar, erguendo a cabeça, para logo depois deitar-se novamente.
Ou melhor, cair sobre aquele solo indefinível.
Ela sentia um odor dificilmente suportável; lembrava fezes, podridão, algo assim.
Mas será que os outros também sentiam a mesma coisa?
Hugo parou em meio a uma gargalhada; petrificado, acordou do seu transe privado.
De onde viera a gargalhada?
De que local? De quem?
Não sabia se o que ouvira era real ou um trote de seu subconsciente.
-0 que está acontecendo? Onde estou?
Olhou à volta e só então percebeu os outros.
Corrigiu-se:
- Onde estamos?
Que lugar é este?
Ronie adiantou-se:
- Onde estão as paredes deste lugar?! - falou, perguntando a qualquer um, apontando para o pastor Adir.
Já notaram que aqui não tem paredes?
- Sim - respondeu alguém.
Já tentei ultrapassar certo limite, mas não consegui.
Sempre que penso chegar a um lugar, estou de volta ao ponto de partida.
Que lugar é este afinal? 0 que nos aconteceu?
Paloma foi a próxima a se manifestar, quase lentamente, depois de despertar de suas reflexões.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:13 am

- Acho que morremos todos.
Somos almas do outro mundo, e isso aqui é o purgatório...
Ou - falou agora mais pausadamente e quase muito baixo - o inferno particular de cada um de nós.
- Mais uma... - ouviram Ronie debochar.
Perceberam logo a presença de Paloma, que se erguia consertando a peruca.
Adir imediatamente interferiu na fala de Paloma:
-0 purgatório não existe.
A Bíblia não fala dele.
Mas acho que algo grave nos aconteceu.
Mas não morremos, não.
Se estamos todos conscientes...
- Quem é você? - perguntou Hugo.
- Meu nome é Paloma.
Não sei ao certo como vim parar aqui, mas de uma coisa tenho certeza:
estamos fora do mundo.
Talvez mortos, talvez sonhando; quem sabe num pesadelo?
A voz de Paloma dava a impressão de ser um misto de voz de homem e de mulher.
Um tom mais grave que o habitual, que ela conseguia disfarçar apenas levemente.
Mas isso não passou despercebido de Hugo e Ronie.
-E um travesti... - murmurou Hugo para Ronie.
0 desgraçado é um boiola mesmo.
- Então ele está certo - respondeu Ronie com um olhar de deboche para Paloma e quase ignorando a observação do companheiro de infortúnio.
Estamos mortos, e no inferno!
0 comentário e a atitude dos dois reflectiam o desprezo e, ao mesmo tempo, o preconceito.
Paloma levantou-se cambaleando e foi em direcção a Patrícia, que jazia deitada, ainda.
Passou a mão em seus cabelos, sacudiu-a levemente, na tentativa de acordá-la.
Neste instante, novo suspiro se fez notar.
Dessa vez, mais profundo, mais forte e perceptível do que antes.
A reacção de todos foi do mais puro e autêntico pânico.
Correram a esmo, para lá e para cá, na tentativa de se libertarem daquela situação.
Porém, retornavam sempre ao mesmo lugar. Pareciam imantados àquele ambiente diferente, surreal.
Seria aquela uma prisão espiritual?
Talvez, o portal do inferno de cada um?
Ou foram abduzidos, de alguma forma que não sabiam explicar?
Quanto mais corriam de um lado para outro, tentando encontrar uma saída possível, mais se deparavam consigo mesmos e chegavam a lugar nenhum.
Talvez estivessem todos reféns de suas memórias, de sua própria mente?
Mas, se era assim, como se encontraram todos, sem que nem sequer se conhecessem antes?
Quem os reunira ali?
Ainda não haviam atentado para certos detalhes.
Não sabiam que todas as pessoas ali reunidas traziam uma característica em comum.
Aliás, sabiam muito pouco de si mesmos.
Enfim, não adiantava correr, pois não havia saída, seja lá o que fosse aquele local ou aquela dimensão.
De qualquer modo, o medo, o pânico tomara conta de todos ou quase todos.
A presença de alguém mais, que apenas podiam perceber através de outros sentidos, por sensações incomuns, era quase algo palpável, real, mas não perceptível pelo olhar; pelo menos ainda não.
A visão de todos estava restrita, profundamente restrita a si próprios, e suas percepções, estritamente ligadas aos problemas e limitações de cada um.
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Mensagem  Ave sem Ninho Ter Dez 26, 2017 10:13 am

Mas o medo pairava como um fantasma, e a dúvida, como um vulto, perseguia a todos.
Num recanto qualquer ou numa situação semelhante, de repente, quase num passe de mágica, apareceu um rapaz, não se sabe de onde.
Era César, que parecia haver sido abduzido, transportado para o local comum ou a dimensão mental da qual todos se encontravam cativos.
Chocado, apavorado, sentia-se deslizar, quase escorregar pelo solo invisível.
Aliás, ninguém ainda havia percebido um solo, um chão, no sentido literal.
Sabiam caminhar ou deslizar sobre determinada superfície; entretanto, o que era em cima e em baixo naquela situação?
César chegou e trouxe mais pânico ao contexto em que todos se viam.
A forma como se materializou no ambiente dava a impressão de que ele era um fantasma, uma aparição que, de um momento para outro, transformou-se em alguém tangível, palpável, mas não menos assustador.
Havia algo diferente em César.
Ele, quase sem sentidos, quase sem se dar conta do que ocorria, ousou perguntar.
E a voz que emitiu foi uma voz diferente, também.
Gutural, era quase um sussurro:
- Onde estou? Estarei morto?
Quem são vocês, que se arrastam por aqui?
Meu Deus, estou perdido, num limbo? No umbral?
- Outro perdido, como nós.
Pensei que apareceria uma alma penada que esclarecesse a situação que estamos vivendo - queixou-se Hugo, exalando desespero, mágoa profunda e raiva incontida.
- Mas, não! Outro miserável que aparece do nada pra atormentar ainda mais nossa vida.
- Quem são vocês?
De onde vêm? - perguntou o recém-chegado.
- Somos como você:
miseráveis, perdidos ou, então, um bando de gente abduzida por algum ET desgraçado que nos jogou aqui e deu o fora.
Adiantando-se aos demais, Paloma se apresentou, oferecendo uma ideia que talvez pudesse ajudar:
- Sou Paloma.
Somos sete pessoas ao todo, com você.
Também não sabe como chegou aqui?
Tem alguma ideia de como veio para este lugar?
Quem sabe pode nos ajudar?
Quem sabe se tentarmos recordar o que aconteceu connosco poderemos nos auxiliar?
Pelo menos tentar lembrar as últimas coisas que nos ocorreram antes de virmos para cá.
Balbuciando, quase chorando, o rapaz respondeu, prestes a clamar por socorro:
- Meu nome é César.
E, sinceramente, não sei como vim parar neste lugar.
Vocês não têm nenhuma ideia?
Se chegaram aqui antes de mim, talvez saibam de coisas que não sei ainda...
- Lembro-me de ter saído da boate onde eu trabalhava.
Eu sou um artista, um transformista, e trabalho na noite para arrecadar fundos e manter algumas pessoas necessitadas de auxílio.
Além disso, gosto muito do que faço.
Me realizo nos palcos.
- Travesti! Você é uma traveca, é isso.
Conheço bem esse tipo... - falou Ronie, agredindo Paloma.
Parece que ele adoptava um tom mais agressivo toda vez que se dirigia a ela.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:43 am

- Pára com isso, ô grandão! - protestou Hugo, embora não nutrisse nenhuma simpatia por Paloma.
Você fala o tempo inteiro contra travestis, contra quem você nem conhece ainda e vive gritando.
Afinal, se é tão correto assim, tão santinho e macho como quer fazer parecer, por que se inquieta tanto?
Por que fica atirando pedras, agredindo?
Não estamos todos na mesma?
Não estamos tentando entender o que se passa por aqui, entre nós?
- Isso mesmo! - falou César entrando na conversa, a princípio timidamente.
Quem sabe tentando recordar, refazer os passos de cada um antes da chegada neste lugar não possamos juntar os pedaços de recordações e formar uma ideia mais exacta do que é este lugar ou no que estamos metidos?
Olhando para Paloma, que estava quieta, quase cabisbaixa, pois sentira-se agredida mais uma vez, César prosseguiu:
- Continue a falar.
Vamos, talvez encontremos um denominador comum nas histórias de cada um aqui.
- Boiolas!... - resmungou Ronie, calando-se em seguida.
- Bem, como eu dizia antes, sou artista.
Mas também trabalho como estilista numa empresa de moda, numa grife conhecida da capital paulista.
Lembro-me apenas que ia saindo do meu ambiente de trabalho e não tive tempo sequer de trocar de roupa ou retirar a maquiagem.
Recebi um telefonema de uma das meninas que tento auxiliar.
Ela estava desesperada, precisando de socorro, pois havia tomado uma dose excessiva de droga.
Estava caída num canto de rua de uma região horrorosa da cidade.
Eu me dirigia para lá, por isso nem pensei em retirar a peruca, a maquiagem ou as roupas que fazem parte de um personagem que represento.
Assim que virei a segunda esquina, ouvi tiros e um monte de pessoas fugindo, gritando feito loucas.
Nunca havia passado ali naquela hora, principalmente a pé; jamais pensei em transitar naquele local.
Foi então que fui agredida por um guarda, um policial.
Caí no chão, e o restante ocorreu tão depressa que nem me dei conta dos detalhes.
Senti algo no peito, alguma coisa que rasgava o meu peito.
0 interessante é que me toquei, procurei a possível ferida e não encontrei nada em meu corpo que explicasse aquela sensação.
Sei apenas que dormi, ou desmaiei, para acordar, logo em seguida, neste lugar, junto de vocês.
Quase em pranto, Paloma foi logo perguntando, talvez para si mesma:
- Será que morri?
Será que morremos?...
Foi o que me perguntei o tempo todo, desde que cheguei.
Não sei quanto a vocês, mas, quanto a mim, tenho convicção de que não estou mais no mundo dos vivos.
- Está louca!
Você está drogada, por acaso?
Se você está morta ou se sente como tal, então quer dizer que todos nós estamos?
Não pode ser!
Jamais! - falou Adir, quase aos prantos, pois agora parecia que o desespero vencera a barreira da sua fé, da sua máscara de fé ou de culpa.
- Claro que esta... - começou Ronie, corrigindo-se ante o olhar de censura dos demais.
Claro que Paloma pode estar certa.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:43 am

Eu me lembro também:
estava num bar, fui correndo ao encontro de um cliente que queria um programa de última hora...
- Programa? - perguntou Hugo, ao mesmo tempo que Paloma.
Que tipo de programa o levaria a um bar?
Por acaso...
- Não! Vocês não entenderam.
Não é isso que pensam... - tentou disfarçar Ronie.
Sou um executivo e trabalho com prestação de serviços a alguns ricaços da capital baiana...
- Peraí! Então, você veio de Salvador? - perguntou Hugo, profundamente inquieto, relacionando o que Ronie e Paloma haviam dito.
Se Paloma veio de São Paulo, eu vim do Rio de Janeiro e você, de Salvador, como pode?
Viemos todos de lugares diferentes e estamos presos na mesma situação?
0 silêncio se fez de repente, como se todos estivessem pensativos ou tentando entender o quebra-cabeças.
- Eu vim de Curitiba - falou César.
Quer dizer, me mudei para São Paulo recentemente.
E os outros?
- Já verifiquei com os outros - disse Paloma.
-0 pastor Adir é da Baixada Fluminense.
Sobre Patrícia, não consegui saber.
Ela está numa espécie de coma.
Rompendo o silêncio que novamente se estabelecera, Ronie continuou o relato:
- Eu me lembro de uma briga no bar onde estava.
Depois, em meio a toda confusão, parece que minha mente viajou feio e senti alguma coisa penetrando-me, uma bala, um disparo de alguma arma, além de pedaços de memórias ainda relativas à briga em que me envolvi.
Nada mais!
- Afinal, o que você estava fazendo, mesmo?
Disse que era um programa qualquer?
Por acaso você é garoto de programa?
E isso? - perguntou Hugo, visivelmente interessado na história de Ronie, encarando-o firmemente.
O interlocutor ficara totalmente indefeso ante o olhar inquiridor de Hugo e os olhares dos demais, que o encaravam.
Não conseguia responder; não conseguia negar.
E isso foi o bastante para que todos soubessem que estava mentindo.
- Então, você é garoto de programa!... É isso! - falou Hugo, num tom inconfundível de reprimenda, de acusação.
- E por que, então, você tentava o tempo inteiro me recriminar, me discriminando e me confundindo com um travesti?
Mesmo que eu fosse um travesti, mesmo que vendesse meu corpo, como é que você se acha na condição de apontar meus possíveis erros se você próprio vende o corpo?
E ainda se diz executivo... - falou Paloma, agora num tom mais intenso, numa forma de se expressar antes não percebida nela.
- Eu sou o que sou e ninguém tem o direito de me punir, de desrespeitar meu estilo de vida.
Ninguém aqui pode me censurar.
Eu vendo o que é meu, o que me pertence e pronto - falou batendo no peito várias vezes, fazendo gestos e vociferando palavrões, como se isso fosse inspirar mais respeito.
0 pastor Adir, aproveitando as revelações de cada um, não perdeu tempo para emitir seu juízo e dar sua interpretação da situação:
- São todos uns perdidos!
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:44 am

São pecadores, prostitutos e sodomitas, filhos do pecado e da maldição.
Só não entendo o que ocorreu comigo.
Por que Deus me puniu me deixando aqui, preso com uma gente do demónio, filhos do pecado, como vocês?
- Ora, ora, engula suas palavras, crente dos infernos! - vociferou Ronie, que parecia não ter travas na língua.
Se você está aqui e se estamos todos mortos, como diz essa bichinha, então é porque você é tão pecador quanto nós.
E em meio a gargalhadas, mais de desespero e nervosismo, mas também como defesa, Ronie perguntou, em tom de provocação, tentando tirar a atenção de si:
-E qual é o seu pecado, santinho do pau oco?
Qual a sua culpa para estar atrelado a nós?
- Eu fui baptizado no sangue de Jesus.
Eu tenho minha alma lavada no sangue do Senhor.
Após breve silêncio constrangedor, todos escutaram um suspiro, um fôlego de alguém que parecia ouvir a todos e que certamente registrara o que Adir havia dito.
0 pavor novamente tomou conta de todos, inclusive de César, que havia chegado há pouco.
E novamente o silêncio, a aparente calmaria, que escondia as tormentas de cada um, o medo que os dominava.
Rompendo o silêncio, talvez para se distrair do temor pelo desconhecido, Adir tomava a palavra, quem sabe envergonhado por haver se portado de maneira tão pretensiosa perante os demais, talvez para disfarçar a falta de equilíbrio, de compreensão do momento pelo qual todos passavam, quem sabe...
- Eu senti dores no coração.
Desde muito tempo vinha sofrendo com a angina e pensei sinceramente que Deus haveria de me curar.
Sempre acreditei e preguei que Jesus cura e liberta... mas eu não fui curado! - demonstrava sua amargura e decepção num pranto quase convulsivo.
Pensei que, me entregando ao Senhor, ele me livraria da enfermidade.
Não queria procurar um médico, pois, se eu o procurasse, isso significava atestar a impotência da minha fé e do poder de Deus de curar e libertar.
Não procurei nenhuma ajuda humana, pois acreditei que o poder do Espírito Santo me curaria e o sangue de Jesus me lavaria de todo o mal.
Ah! Como eu estive enganado! novamente, o pranto convulsivo.
Senti a morte chegar bem perto, senti que a vida ia embora do meu corpo, mas eu sei que não morri.
Eu estou vivo, aqui, conversando com vocês; portanto, não posso ter morrido.
Além disso, se estamos juntos, tem algo de muito errado nesta situação.
-E o que está errado, pastorzinho? O quê?
- interferiu Ronie de maneira sarcástica, esbarrando em Adir propositalmente.
-É que a Bíblia promete o paraíso para quem aceitar Jesus!
E se nós morremos de verdade, o que eu faço aqui, junto com pecadores?
Com pessoas perdidas, com os filhos do inferno, do Satanás?
- Acontece, meu amigo - interferiu agora o recém-chegado César - que me parece que todos aqui temos um denominador comum, ou ao menos a maioria, já que nem todos falaram ainda.
Temos algo muito mal resolvido com relação às nossas vidas.
Ao que parece, ao menos Paloma e Ronie têm algo em comum, alguma coisa que os mantêm prisioneiros a este local.
Só precisamos saber se os outros de nós também temos os mesmos motivos ou as mesmas coisas em comum a serem resolvidas.
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O PRÓXIMO MINUTO/Ângelo Inácio - Robson Pinheiro - Página 2 Empty Re: O PRÓXIMO MINUTO/Ângelo Inácio - Robson Pinheiro

Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:44 am

- E o que teríamos em comum, conforme você pensa?
0 que você tem em comum connosco?
- Não sei bem ainda, mas acho que temos de descobrir.
E descobrir nossas pendências talvez seja a chave para nos compreendermos e compreender o que está se passando.
Quanto a mim, sou espírita, ou fui espírita, caso esteja morto, como talvez esteja.
E sei que tenho muitas coisas não resolvidas dentro de mim.
Principalmente em matéria de sexo, que sempre foi algo carente de resolução em minha vida religiosa.
Sempre encarei o sexo como algo complicado e me privei de inúmeras oportunidades de me relacionar com outras pessoas.
Eu me puni não me permitindo viver a minha sexualidade.
E, agora que talvez esteja morto, não há como esconder mais.
Não há como não admitir para mim mesmo o quanto me castrei em nome da interpretação doutrinária à qual me habituei.
- Então você acha que todos nós estamos aqui porque temos alguma pendência na área sexual?
É isso mesmo que acha? - perguntou Hugo interessado no assunto e já um tanto preocupado consigo mesmo.
- Não sei se todos têm algo em comum nessa área, mas, quanto a mim, precisava desabafar.
0 impacto do desencarne, as sensações pelas quais passei, vendo-me sair do meu corpo...
Foram muitas as tentativas de mexer os braços e as pernas, de conseguir falar ou gritar, me comunicar de algum jeito.
Essas tentativas se mostraram infrutíferas; não pude mover o corpo e, enfim, me vi flutuando fora dele, como se eu fosse um fantasma.
- Eu vi você se materializando diante de nós.
Parecia uma fumaça, uma aparição ou, quem sabe, uma mecha de algodão mais subtil que foi se juntando e formando o seu corpo actual, a sua aparência... - interferiu Paloma, convicta de que todos estavam desencarnados, mortos, e eram almas do outro mundo.
- Então é isso mesmo!
Estou morto, desencarnado, e todos aqui também.
Não há como duvidar.
E uma vez que estou desencarnado, sinto uma grande angústia, uma espécie de cobrança interna ou culpa.
Parece que não vivi plenamente e que deixei algo muito precioso passar despercebido.
- Vocês são do inferno, isso sim! - interveio o pastor Adir, num tom de reprimenda.
- Você é que parece do inferno!! - sentenciou Hugo quase aos berros.
Você é o que mais acusa a todos, o único que se considera santinho e bem-resolvido.
Fala, pastor, fala o que o prende a nós.
Pense bem e diga-nos:
qual a culpa que você traz escondida dentro de você? - desafiou-o, agarrando o pastor pelo colarinho e jogando-o no chão ou naquilo que se assemelhava a um solo.
Paloma tentou socorrer o missionário morto, desencarnado, como acreditava, mas ele se recusou.
- Não! Não me toque, sua pecadora, seu pecador desviado de Deus!
Parece meu filho Carlos.
Afastou-se de Deus e agora quer parecer boazinha, bonzinho.
Me deixa que eu não mereço conviver com pecadores como você.
-0 que aconteceu com seu filho Carlos?
Fale, antes que eu o faça morrer uma segunda vez.
Fale, crente das profundezas! - gritou Hugo, sendo contido por Paloma, que o agarrou firmemente, impedindo que fosse mais agressivo com Adir.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:44 am

- Pare, Hugo! Você não pode ficar tão revoltado assim...
Ainda não sabemos tudo o que precisamos saber.
Você precisa se controlar.
Hugo derramou-se em pranto convulsivo.
Chorou muito e deixou-se sentar no chão à frente de Paloma, que o amparava nos braços enquanto ele se desfazia em lágrimas.
Adir levantou-se e, erguendo a cabeça numa atitude visivelmente orgulhosa, declarou:
- Eu o expulsei de casa.
Carlos foi a vergonha da família.
Ele desviou-se dos planos do Senhor; mesmo com todas as correntes de oração e jejum, mesmo com as unções do Espírito Santo, ele não foi curado.
Tive de mandá-lo embora de casa, senão ia comprometer a obra do Senhor, o meu ministério.
- Então você expulsa o próprio filho de casa e ainda se diz um pastor, um representante de Jesus?
Possui um ministério divino?
Que desgraça é essa de ministério que você representa?
- Ele era sodomita.
Carlos gostava de outros homens.
Era um pecador declarado; mesmo que ainda não tivesse completado a maioridade, já estava predestinado ao fogo do inferno.
Eu não poderia permitir que ele maculasse a família nem o trabalho que eu realizava na igreja.
- Meu Deus! Então eu sei, agora, o que nos une a todos.
A culpa, as coisas não resolvidas que deixamos para trás, as escolhas e decisões que geraram as culpas que carregamos...
César tinha razão! - falou Paloma, levantando-se e deixando Hugo no local onde estivera chorando.
- Que culpa que nada!
Eu não tenho culpa nenhuma, não me sinto culpado.
Eu fiz o que era correto.
Sinto às vezes é a falta do Carlos... confessou Adir.
- Falta ou culpa?
Você por acaso sabe onde ele se encontra?
Procurou saber para onde seu filho foi depois que o abandonou, ou melhor, que o expulsou de casa?
Tem ideia da tormenta pela qual ele pode ter passado ou passa ainda, por ter sido desprezado, devido ao seu preconceito miserável? - perguntou Paloma, manifestando sua indignação ante o que ouvira de Adir.
- Então é isso mesmo!
Talvez seja a culpa o que nos une, ou as questões sexuais não resolvidas que deixamos para trás.
- Eu não sinto culpa nenhuma - repetiu o pastor.
Nenhuma! Essa coisa de culpa é invenção de gente perdida.
0 sangue de Jesus me lavou de todo pecado, de toda culpa...
- É... Talvez isso seja verdade, pastor Adir.
Talvez você esteja apenas com remorso e não se sinta culpado, ainda...
Abandonar o próprio filho, ser homofóbico, fazer acepção de pessoas e ter um deus que escolhe quem vai ser salvo baseado na sua cartilha pessoal, num sistema de crenças bastante ultrapassado e, acima de tudo, excludente...
Quem sabe seja isso mesmo! - falou César, revoltado com a posição e a arrogância do pastor.
- Eu, por mim - complementou Paloma -, jamais ia querer ser salva.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:44 am

Prefiro o inferno mil vezes, caso ele exista, do que ter de conviver com pessoas salvas e com esse tipo de pensamento como o seu, Adir.
Viver num céu cheio de crentes homofóbicos, preconceituosos, arrogantes e intolerantes, sem nenhuma consideração para com as pessoas da própria família?
Não, pra mim não serve.
Prefiro ficar no inferno cuidando dos oprimidos e daqueles que foram rejeitados pelo seu deus, ou melhor, pelos que se dizem eleitos...
Adir calou-se, ao que tudo indicava, sentindo-se mal com as palavras que proferira.
E também bastante incomodado com as que ouvira.
Parecia nascer um sentimento de revolta contra si mesmo.
Começava a se esboçar nele um pouco de remorso, e as lembranças do filho perdido vinham-lhe à memória.
Um pouco mais de tempo e todos presenciaram o pastor romper os limites do próprio orgulho, da prepotência e da presunção e cair em lágrimas.
Mas estava sozinho.
Ninguém ali se atrevia a ampará-lo, agora.
Ele alimentara nos companheiros um sentimento de aversão contra a sua pessoa.
0 remorso agora se instalara definitivamente, e o pranto descia intenso, sem impedimentos.
Aproveitando que ocorrera com Adir a revelação dos mais secretos sentimentos, Hugo também rompeu a sequência de fatos intragáveis.
Abriu-se, por sua vez, provavelmente inspirado pelas histórias ali partilhadas.
Ainda abalado com a possível condição de morto, com as histórias, ou melhor, os dramas de cada um, aventurou-se a falar:
- Vivi toda a minha adolescência revoltado comigo mesmo.
Tive uma aproximação quase sexual com um primo - falou com a voz entrecortada pelo pranto, num misto de vergonha e alívio.
— Porém, criei uma aversão tão grande, por puro orgulho, por medo de a família e a sociedade me tacharem de gay, que me deixei afundar nas baladas, nas noitadas cheias de bebida e droga, a fim de disfarçar meus desejos— estranhos desejos -, entregando-me a mulheres e mais mulheres.
Toda vez que sentia dentro de mim o desejo por outro homem - agora chorava profusamente -, eu me envolvia com sexo e mais sexo, de modo que as mulheres passaram a ser objecto sexual para mim, apenas isso.
Sentia até raiva delas e passei a ser agressivo no sexo, porque não resolviam minha atracção por caras, por mais que transasse com elas.
"Tentei a todo custo abafar meus sentimentos, minhas tendências, e para isso usei como arma a agressão contra todos os gays.
Cheguei a participar de alguns grupos que batiam em gays.
Ficávamos à espreita em alguma rua próxima de baladas ou de algum barzinho onde se reuniam e, quando um ou outro saía, os seguíamos.
Aí eu descarregava todo o meu ódio, toda a revolta contida dentro de mim, devido à covardia perante a necessidade de admitir meus desejos mais íntimos e secretos.
Espanquei diversos rapazes e via nisso uma forma de punição por eu mesmo ser assim e não admitir."
Hugo chorava e era de tal maneira franco, que agora Paloma e Ronie se deixaram comover pela história do rapaz, amparando-o nos braços.
Hugo lamentava verdadeiramente as ocorrências das quais fora protagonista.
Arrependido, tardiamente, segundo acreditava, diluía-se em dor, angústia e pranto convulsivo.
Passado algum tempo, que todos souberam respeitar, em profundo silêncio, e enquanto Adir chorava por sua vez, sozinho num canto qualquer, Hugo continuou:
- Fui tão miserável comigo mesmo, que noites e mais noites usei drogas, somente com a esperança de abafar esses desejos e sentimentos que emergiam dentro de mim.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:45 am

Criei uma situação complicada entre mim e meu primo, que veio nos visitar há alguns dias.
Descontei nele toda a revolta por haver me iniciado nesse tipo de sentimento, segundo sempre pensei.
Chorava agora ainda mais intensamente, desolado.
- Não se machuque assim, Hugo - disse Paloma, quase maternal.
Ninguém merece um sofrimento tão grande.
E Hugo, entre soluços e arrependimento, prosseguiu:
- Eu espezinhei o Ralph, meu primo, e disfarcei minha atitude com o discurso de machismo, de ciúmes dele com minha irmã.
0 pior é que ele não foi o culpado de nada.
Fui eu quem me atirei sobre ele e roubei um beijo.
Eu que tomei a iniciativa, e não o contrário.
Agora, depois de morto, tenho de admitir que sou e estou apaixonado por ele.
Eu me odeio!...
Paloma abraçou Hugo, conduzindo-o a um lugar próximo.
Afagava-o, tentando consolá-lo, mas parecia que a dor do arrependimento havia se instalado nele.
Paloma soube interpretar aquele momento dramático e deixou que Hugo se recompusesse no próprio ritmo.
César, agora profundamente emocionado com tudo que ouvira, com a história de vida de cada um, deixou-se derramar por inteiro, falando mais para si do que para quem estivesse ao seu lado:
- Passei inúmeras noites sem sono, cheio de desejos.
Tentei falar com meus pais, mas não consegui; eles não queriam tocar no assunto.
Sexo era tabu, e falar de meus desejos, então, nem se fala.
Eles preferiram ignorar que tinham um filho gay...
Minha mãe até tentava conversar com meu pai, mas ele se recusava terminantemente a tocar no assunto.
Fui criado participando da evangelização infantil no centro espírita, tomando passes e mais passes, me submetendo ao tratamento de desobsessão todos os meses, para "tirar a pombajira de mim" - assim meus pais queriam e exigiam.
Foi desse jeito até eu atingir a maioridade.
Transformei-me numa pessoa religiosa, quase fanática na tentativa de abafar meus instintos, que eu aprendera a identificar desde os 10 anos de idade.
Cabisbaixo, quase lento, César falava pausadamente, dando tempo de Ronie ouvi-lo, de Adir prestar alguma atenção e de Paloma escutar sua história, seu drama pessoal, muito embora permanecesse ao lado de Hugo.
- Fui informado ou formatado, por um dos oradores espíritas que esteve em minha cidade, de que não deveria nem mesmo me masturbar.
Que masturbação atraía obsessores, que erotismo era porta aberta para a influência espiritual.
Aí entrei num processo de repressão sexual, dos instintos mais básicos, e sentia uma culpa persistente, porque vez ou outra me dava conta de que não conseguiria reprimir a energia sexual por completo.
Resultado: acabava me masturbando e, logo após, me lavava, tomava banho e esfregava meu corpo até arder...
Tinha vergonha de mim mesmo e afastava-me por períodos cada vez mais longos dos trabalhos espirituais aos quais estava acostumado, sentindo vergonha de minha conduta.
Não tive com quem conversar sobre o assunto, a não ser uma amiga que deixei em minha cidade, a Patrícia.
A tristeza parecia marcar o semblante de César, apenas um jovem cheio de culpas e de ideias equivocadas que lhe foram impingidas, insufladas por pessoas de religiosidade contagiosa, cuja visão engessada da vida as faz amordaçar os sentimentos mais profundos daqueles que encontram em seu caminho.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:45 am

Fazem os outros de vítimas de sua própria infelicidade, e tudo em nome do bem e da luz.
Tão logo escutou César pronunciar o nome de Patrícia, Paloma acercou-se dele, deixando Hugo um pouco a sós em suas reflexões.
- Você por acaso falou Patrícia?
É isso mesmo que ouvi?
- Sim! Patrícia era uma amiga com quem eu conversava frequentemente sobre nossas dúvidas, desabafando.
Ela mesma vivia dramas incríveis, pois teve uma educação muito castradora; ela também não se aceitava como era.
Eu a deixei numa cidade vizinha a Curitiba e não tive mais notícias dela. Mas sinto saudades de nossas conversas.
Sondando mais um pouco e estimulando César a continuar falando sobre a amiga e sua relação com ela, Paloma atreveu-se a mencionar a pessoa quase em estado de coma, ou desmaiada num recanto qualquer daquele lugar insólito, que eles ainda desconheciam do que se tratava exactamente e onde se localizava.
- Chegou junto connosco uma moça; desde que a vimos, está numa espécie de coma.
Acorda vez ou outra e pronuncia algumas palavras desconexas, para depois lançar-se novamente a um estado meio cataléptico.
Entre as poucas coisas que falou, disse-me que se chamava Patrícia.
Será que você poderia vir comigo e dar uma olhada nela?
Quem sabe pode ser sua conhecida?
César saiu imediatamente da aparente tristeza que o dominava, quase uma depressão.
Arrancando forças não se sabia de onde, levantou-se e seguiu Paloma.
O curioso é que, à medida que caminhavam, constatavam que o lugar não tinha limites; voltavam ao ponto de partida, não importava para que lado fossem.
Tudo levava a crer que estavam prisioneiros da própria mente.
Vez ou outra, imagens fugidias, sons estranhos, como se fossem os próprios pensamentos, apareciam e desapareciam como por encanto.
Uma espécie de bruma ou neblina estava presente em todo lugar para onde iam.
Paloma se lembrava do gelo seco, da fumaça a que estava habituada nos palcos onde actuara.
Num canto, Hugo continuou engatinhando, refém das recordações, emoções e mistérios que povoavam sua intimidade.
Adir falava sem cessar, recitando algum salmo ou oração de forma mecânica, entre um gemido e outro, demonstrando que ainda chorava.
Ronie xingava, falava palavrões, sacudia ora Adir, ora Hugo e, mesmo nessa situação, procurava a todo custo censurar Paloma, querendo massacrá-la com os mais baixos adjectivos, que usava a fim de diminuí-la.
Dizia que ela estava tirando proveito da fragilidade dos outros, tentando tirar uma casquinha, aproveitar-se da infelicidade alheia e obter algum estímulo sexual...
Enfim, o quadro era verdadeiramente confuso, intrincado, pois cada um, a sua maneira, externava emoções, sentimentos contraditórios, culpas, complexos e autopunições.
Só não conseguiram ouvir Patrícia, que estava em algum ponto ali mesmo, junto de todos, porém prisioneira de seus pesadelos, num coma induzido pela culpa e pela infelicidade com a qual convivia e na qual mergulhara.
César não sabia o que fazia ali.
Cada vez mais, pensava estar morto, desencarnado, como Paloma mesmo acreditava e, até certo ponto, fizera os outros acreditarem também.
Paloma procurava por Patrícia no intuito de apresentá-la a César e verificar se era a mesma pessoa a quem ele se referira em sua história.
Contudo, por mais que caminhassem, pareciam voltar sempre ao lugar de origem.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:45 am

De repente, Paloma teve a ideia de sair correndo em direcção ao local onde pensava ter deixado Patrícia pela última vez.
E assim fez.
Saiu em disparada, como se estivesse numa corrida.
Em determinado momento, teve a impressão de que havia rompido alguma barreira.
Não regressara ao lugar de antes.
Encontrava-se só, sem notar a sua volta aqueles companheiros que conhecera nesta aventura estranha, bizarra, inexplicável.
Ao redor, imagens, sons, músicas, que se alternavam, em diferentes estilos.
Nas imagens que apareciam e desapareciam, Paloma pôde identificar algo de sua própria vida.
Tentava ver-se, perceber seu corpo, mas apenas sentia-se viva; não conseguia ver a própria forma, embora vez ou outra se percebesse projectada em meio à fumaça, à nuvem estranha que envolvia e preenchia aquele novo ambiente, cada vez mais exótico.
Estaria prisioneira da própria mente?
Não saberia dizer.
Era refém de uma dimensão atemporal?
Chegou a pensar assim, pois parecia que ali o tempo não passava.
Poderiam estar naquela dimensão ou situação há apenas uma hora ou há meses e anos.
Não havia como mensurar o tempo.
Sabia apenas que as imagens, sensações e impressões eram oriundas da própria mente.
Subitamente, uma vez mais se viu de volta ao ambiente inicial.
Estava perto de Ronie, e o encontrou desesperado, com a fisionomia quase irreconhecível.
Parecia que o garoto de programa estava com a aparência muito modificada ou se modificando a cada instante.
Aquilo era um pesadelo?
Era uma peça teatral que algum maluco havia escrito ou era produto das culpas e memórias de cada um deles?
Ronie estava apavorado e, quando Paloma tentou aproximar-se ainda mais, começou a xingá-la, a berrar, descarregando toda a raiva e a fúria sobre ela.
Paloma ficou petrificada ao perceber a mudança que se operava na aparência de Ronie.
Ele estava desfigurado.
Todos perceberam, todos ficaram boquiabertos, sem saber o que dizer ou fazer.

1 Cf. ibidem, p. 173-174, itens 200-202.
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Mensagem  Ave sem Ninho Qua Dez 27, 2017 10:46 am

QUE É A MENTE?
Ainda faltam estudos entre os encarnados para definir o que ocorre nos escaninhos da vida mental e emocional.
Por mais que a ciência tenha progredido, definindo alguns conceitos e situações, compreendendo certos factos e ocorrências, a mente humana permanece uma incógnita em inúmeros aspectos.
Como campo vasto a ser desbravado, representa o próximo grande passo nas pesquisas, uma vez que, para devassar essa dimensão na amplitude de suas peculiaridades, é preciso sensibilidade e novos sentidos, novos instrumentos e metodologias, ambos de ordem psíquica, mas que a ciência actual rejeita ou teima em desprezar, ao menos em âmbito oficial.
Perante a dimensão mental, o leigo muito provavelmente a descreveria como um local onde tudo pode ocorrer, ou quase tudo.
Todas as coisas que se imaginam possíveis no universo realmente ocorrem nessa dimensão.
A mente humana não consegue conceber aquilo que é inconcebível, que não pode existir ou realizar-se.
Essa afirmação pode ser refutada, reinterpretada ou mesmo considerada absurda, mas facto é que a mente é um campo pouco pesquisado, pouquíssimo explorado e largamente desconhecido.
A tal ponto que se torna aventureiro atestar, com absoluta segurança, que na mente não ocorra este ou aquele fenómeno, ao menos sem estudo mais acurado, taxando-o apressadamente de impossível, tendo em vista ali operarem leis que constituem verdadeiro mistério a desvendar, pois em tudo diferem daquelas que regem os planos físico e mesmo extra-físico, na região mais próxima à Crosta.
Quem pode garantir que, nessa dimensão, nesse mundo de pensamentos, de formas mentais, de emoções mais subtis e habitantes sem forma, não se vejam determinadas situações e não gozem de existência real certos dramas e histórias de vida, sujeitos a leis que lhe são próprias?1
Quando refém da culpa e de memórias traumáticas e recalcadas, bem como de emoções não elaboradas nem resolvidas, de fundo mais complexo, a mente humana pode se sentir prisioneira num tempo determinado, num minuto, num segundo, apenas nessa dimensão não física, muito embora, para a pessoa envolvida, tais instantes pareçam dramas inesgotáveis, quase eternos.
Ou seja, um minuto na dimensão mental pode significar um tempo bem mais dilatado para quem vivência experiências nesse universo estranho, insólito, inexplorado e desconhecido da massa de humanos.
Um minuto, segundo o ponto de vista de quem se movimenta e actua no plano mental, pode diferir radicalmente da representação temporal desse mesmo minuto na vida habitual, no mundo das formas.
0 tempo é tão-somente um conceito, ainda que a acção e as impressões que produza no cérebro ou na mente do indivíduo possam ser perpétuas, possam se afigurar duradouras, difíceis de explicar ou compreender.
Em suma, a dimensão mental age de forma directa no cérebro humano e na mente, de acordo com o panorama que o ser apresenta em seu mundo íntimo.
Dependendo das impressões causadas pelas experiências do quotidiano e da cota de culpa que o sujeito carrega, assim como das crenças pessoais, que impregnam a mente de ideias, conceitos, opiniões e substâncias não físicas, mas reais, tal será a percepção do contacto ou da imersão nesse universo mental.
Aquelas impressões, sobretudo quando geradas em meio a estados de embriaguez dos sentidos e quando guardam relação com vivências que deixaram profundas marcas na alma, definem o padrão no qual a mente vive, age e reage.
Influência semelhante também se verifica nas experiências extravagantes ou extremamente violentas, que costumam acarretar culpa e, como consequência, engendram métodos e sistemas de auto-punição nos escaninhos da memória espiritual.
Não há como a realidade mental do espírito passar incólume e deixar de sofrer transformações associadas a tais factores da história pessoal.
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