LUZ ESPÍRITA
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Série Lúcius - EXILADOS POR AMOR / Sandra Carneiro

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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:02 am

EXILADOS POR AMOR
Psicografia de Sandra Carneiro

Espírito de Lúcius

OBS: Os direitos desta obra foram doados às obras assistenciais do Grupo Cristão Assistencial Casa do Pão XXXI, Atibaia, SP.

As pessoas que leram esta obra digitalizadas podem fazer uma contribuição directamente visitando:
http://www.vivaluz.com.br/vivaluz/casa-do-pao.html

Prefácio

Pesquisa liderada por James Hansen, da NASA, publicada em outubro de 2006 na revista PNAS (da Academia Nacional de Ciências dos EUA), constata que nas últimas três décadas a Terra esquentou mais do que em toda a era industrial. O aumento foi de 0,2°C por década, uma aceleração sem precedentes que põe fim à esperança de estabilização do clima.

O pesquisador afirma que, se o aquecimento alcançar mais 2°C ou 3°C, provavelmente veremos mudanças que tornarão a Terra um planeta diferente do que conhecemos hoje.
A última vez que ela esteve tão quente foi no Plioceno, há 3 milhões de anos, quando o nível do mar era 25 metros mais alto que hoje.

Já o Relatório Stern, comandado por Nicholas Stern (ex-economista chefe do Banco Mundial), divulgado em outubro de 2006, mostra que as evidências científicas do aquecimento global são impressionantes e decisivas.
Segundo o relatório, a elevação da temperatura global e o consequente aumento do nível do mar, devido à expansão do oceano e ao derretimento de geleiras de terra firme, poderão causar inundações que obrigarão até 100 milhões de pessoas a abandonarem regiões costeiras.

No outro extremo, o aumento das secas em determinados países também poderá criar milhões daquilo que o estudo chama de refugiados do clima.

O primeiro-ministro britânico Tony Blair, que encomendou o relatório, afirmou:
"Este desastre não vai acontecer em um distante futuro de ficção científica, mas ainda durante a actual geração".

A ciência apenas comprova, dia a dia, o que diversos textos bíblicos, profecias e mensagens mediúnicas já alertaram quanto às calamidades que se abaterão sobre a Terra, trazendo dias de tormento e perplexidade:
"Porque haverá então grande aflição, como nunca houve desde o princípio do mundo até agora, tampouco há de haver" (Mateus, 24:21)
"E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz e as estrelas cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas" (Mateus, 24:29)
"Eu vi um novo céu e uma nova terra, porque o primeiro céu e a primeira terra desapareceram, e o mar j á não existia" (Apocalipse, 21:1)

"Os períodos de expurgo estão também prescritos nesse planeamento imenso.
Quando os orbes se aproximam desses períodos, entram em uma fase de transição durante a qual aumenta enormemente a intensidade física e emocional da vida dos espíritos encarnados ali, quase sempre de baixo teor vibratório, vibração essa que se projecta maleficamente na aura própria do orbe e nos planos espirituais que lhe são adjacentes;
produz-se uma onda de magnetismo deletério que erige um processo, quase sempre violento e drástico, de purificação geral.

Estamos agora, em pleno regime dum período desses"
(Trecho de mensagem mediúnica, extraído do livro Exilados da Capela, de Edgard Armond - Editora Aliança)

"Ele era a luz dos homens, a luz resplandeceu nas trevas e as trevas não a receberam" (João, 1:4-5)

Compreendemos, portanto, diante dos acontecimentos que envolvem nosso mundo, que é imprescindível despertar.
Jesus continua com seus amorosos braços abertos, a esperar por nós, pela nossa decisão de segui-lo e amá-lo, resgatando nossas almas e construindo definitivamente um futuro de glória.

Não nos demoremos mais;
não desperdicemos o precioso tempo, a grande oportunidade que Deus nos oferece, aqui e agora.
Está em nossas mãos, amigo leitor, a decisão de partilharmos com o Mestre Divino a construção do Reino de Deus sobre a Terra, poupando-nos de maiores dores e sofrimentos.

Ele nos quer ao seu lado, mas para isso é preciso combater em nós aquilo que nos afasta do Criador e de suas leis perfeitas, que o Bom Pastor veio exemplificar.

É preciso transcender o momento presente e enxergar, um pouco mais além, nossa origem divina e nossa destinação gloriosa.

Lucius
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:02 am

1ª. Parte

“Há muitos milénios, um dos orbes do sistema da estrela Capela, na Constelação do Cocheiro, localizado a cerca de 42 anos-luz da Terra, atravessava importante momento de transformação, passando da posição de mundo de expiações e provas para a de mundo de regeneração.

Através de incessantes esforços evolutivos, o povo atingira um novo estágio para o orbe, que não mais poderia abrigar aqueles que insistiam em opor-se ao bem e à luz.
Esses espíritos rebeldes e recalcitrantes no mal - milhões deles - foram então, por decisão de entidades elevadas que dirigem o Cosmo, exilados de seu mundo e enviados para a Terra, um orbe primitivo e em início de desenvolvimento.

Na Terra, essas almas que haviam recusado render-se diante do Criador do Universo teriam nova oportunidade - através da dor e do sofrimento a que seriam submetias pelas condições naturais do planeta em formação - de lapidar seus sentimentos e, finalmente, aceitar sua destinação gloriosa, no caminho para Deus”



CAPÍTULO 1

Não bastasse aquele corre-corre a que se habituara, Ernesto assumia ainda mais actividades.

Constantemente, a família reclamava-lhe a presença;
Elvira pedia toda manhã:
-Volte mais cedo hoje.
Seria possível, querido?
Os meninos têm sentido muito a sua falta e eu também...

- Como você choraminga, Elvira!
Temos estado juntos todos os finais de semana; tenho procurado dar maior atenção aos nossos filhos.
- Seja honesto consigo próprio, querido!
Seus finais de semana são sempre ocupados com reuniões de negócios, seja com o pessoal do escritório ou com o pessoal do laboratório;
estamos sempre cercados de outras pessoas!
Seus filhos sentem falta de você, querido, da sua companhia!

Ernesto beijava-lhe a mão e sorria, sem dizer nada.
Descia pelo elevador expresso, directo para o carro aéreo, e seguia para a fundação que presidia.
Ele estava completamente absorvido pela inquieta aspiração de encontrar um modo de extinguir o maior sofrimento humano: a morte.

Esse era o objectivo final de suas pesquisas e experimentos.
Médico brilhante e bem-sucedido, há muito trocara o jaleco branco dos hospitais pelo pesado avental do laboratório que o protegia das radiações.
Não atendia mais os pacientes sofredores, e sim participava de intermináveis reuniões com os pesquisadores e accionistas da organização.

Desde que obtivera sucesso com a clonagem de seres humanos, os convites se somavam em sua mesa e em seu aparelho de intercomunicação; ele já nem os atendia mais.
No entanto, foi do centro de pesquisas em que trabalhava que recebeu o convite mais tentador: realizar toda e qualquer experiência com a clonagem humana, sem limites de recursos e com protecção legal de um séquito de advogados bem-sucedidos e até mesmo de juízes, para não ser incomodado pelas instituições que protestavam em oposição aos experimentos que utilizavam embriões humanos, entre outros.

Na noite em que acertou os últimos detalhes da nova empreitada, chegou em casa eufórico.

- Prepare-se, Elvira, vamos comemorar.
- E o que aconteceu de tão especial?
- Eu consegui, Elvira, finalmente consegui!
- O que, Ernesto? Vai começar outra experiência?
- Muitas, minha querida!
e facto, vou presidir a maior organização de pesquisas médicas do mundo!
Sem restrições e com total liberdade para expandir minhas experiências ao infinito.

Ela empalideceu e sentiu fugir-lhe o sangue da face.
Apoiou-se no primeiro móvel que tinha à frente, quase a desfalecer.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:02 am

Ernesto socorreu-a:
-O que foi? O que está sentindo?

Elvira não podia falar.
Auxiliada pelo esposo, sentou-se no sofá e apoiou a cabeça nos joelhos.
Ernesto fez-lhe algumas massagens na nuca e ela recobrou a cor.

-O que aconteceu?
Não vá me dizer que está grávida outra vez.
Séria, ela fitou-o fundo nos olhos e respondeu:
-Você sabe o que penso sobre suas atuais actividades, Ernesto.
Jamais concordei com elas e jamais haverei de concordar, nem que viva mil anos.

Só Deus tem poder sobre a vida e a morte.
Suas experiências com clonagem já foram contra a minha vontade.
Mas agora é muito pior: sei de suas intenções.
Quantos embriões serão utilizados para tentar impedir o acontecimento absolutamente inevitável para todo homem?
Afinal, por que a morte o assusta tanto, Ernesto?

- Do que você está falando?
A morte não me assusta em nada.
- Como não? Por que deseja impedi-la a qualquer custo?
A morte não é ruim, Ernesto, é apenas uma mudança de estado energético.
Você sabe que a alma continua vivendo...

-Lá vem você outra vez com essas estórias de faz-de-conta.
Eu é que deveria estar cobrando.
Você deixa de me apoiar, a mim, o mais reconhecido pesquisador científico da actualidade, aclamado pela imprensa e por toda a classe médica como o maior realizador do século, homenageado pelo mundo inteiro por aquilo que conquistei.
Nem sequer me acompanha aos eventos de que participo, onde usualmente sou prestigiado e aguardado.
E por quê? Para ir a essas suas reuniões místicas.

Agora o olhar de Elvira se tornara triste e lágrimas se formavam em seus lindos olhos castanhos.

Ela encarou o marido com extremada ternura e disse:
- Ernesto, Ernesto, você brinca com fogo;
sabe muito bem do que eu participo.
Foi você mesmo que me levou lá.
- Mas foi há muito tempo e já mudei de opinião, evoluí!
Não creio mais em nada daquilo.

- Como pode dizer isso?
O que foi que cegou você, querido?
O que aconteceu com aquele jovem sonhador que conheci, cheio de esperança e vontade de mudar o mundo?
-E você quer mudança maior do que dominar a morte?
Ter poder sobre ela?

Ignorando o que o marido dizia, Elvira prosseguiu:
- Eu me lembro bem da indiferença que sentia quando entramos naquele núcleo de estudos pela primeira vez.
Havia estudado quase todas as religiões e nenhuma delas me atraía.
Não havia encontrado nada que me respondesse às indagações mais profundas da alma.
Então você me convenceu, com seu habitual entusiasmo, sua persistência em argumentar...
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:03 am

— Já conversamos sobre isso antes.
Agora preciso me deitar porque tenho obrigações me aguardando amanhã.
De novo ela o ignorou:
- Mas quando entrei naquela pequena sala, senti algo especial.
Sei que abri minha alma à verdade e ela me iluminou a consciência.

- Já basta, Elvira. Chega!
- Nunca mais fui a mesma pessoa, Ernesto.
A paz que me envolve é enorme.
Sei que a morte é apenas uma transformação pela qual passamos e, muito embora nos separe temporária e fisicamente daqueles a quem amamos, continuamos a nos encontrar em sonhos, em espírito, enfim...

-Boa noite, Elvira. Essa conversa já me aborreceu!

Ernesto virou as costas e, deixando a mulher com as últimas palavras a lhe morrerem na garganta, sumiu no longo corredor que terminava no quarto do casal.
Elvira viu com profunda tristeza o marido sair da sala.
Limpou as lágrimas que agora lhe desciam pela face, juntou as mãos e chorou amargamente por algum tempo.

Alheia, não percebeu que o filho de quinze anos a observava.

Foi somente quando sentiu sua mão carinhosa a tocar-lhe os cabelos que ergueu o rosto, banhado pelo pranto:
- Não chore, mãe, não vai adiantar.
Ele está completamente cego.
Pensa que pode brincar de Deus...

- Não fale assim, Henrique.
- Mas é verdade. Você sabe que é verdade.
Ele está enlouquecendo!
- Ele conquistou muitas coisas...
- E isso o fez pensar que pode avançar mais e mais, sem parar?
Mãe, ele já foi longe demais, você sabe disso.
Fomos avisados. Se não mudar, nada poderá ajudá-lo.

Abraçando-se ao jovem, Elvira disse entre soluços:
-Temos de fazer algo, filho, precisamos ajudá-lo!
- Mãe, acalme-se.
Sei o quanto o ama e eu também, mas não temos forças para lutar contra sua crença cega!

- Deve haver alguma forma de tocá-lo;
afinal, ele já acreditou tanto nas coisas boas, em Deus, no bem!
Deve haver um jeito de fazê-lo reencontrar-se com a verdade, com o amor, com o equilíbrio...

Henrique abraçou-a forte, depois a segurou pelas faces e disse:
- Dona Elvira, você nunca desiste dele, não é?
- Enquanto eu puder lutar...

- Há quantos séculos será que vocês estão juntos, mãe?
- Há pelo menos cinco, disso eu tenho certeza.
- Cinco séculos!
- Seu pai é um homem que tem princípios...
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:03 am

- Mãe, não tente atenuar os defeitos dele;
é claro que tem suas qualidades, porém o orgulho o cega cada vez mais.
Infelizmente ele acha que pode tudo!
Além disso, você percebe como a cada dia mais se afasta de nós?

Elvira concordou com a cabeça e o filho continuou:
- Só parece satisfeito quando está sob os holofotes, diante do público, sendo aplaudido e elogiado.
- Ele é um homem tão inteligente, Henrique...
- E de que isso tem adiantado, mãe?
Eu acho até que o está prejudicando...

Enlaçando suas mãos nas do filho, Elvira silenciou entristecida.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:03 am

CAPÍTULO 2

Os dias iam passando e Ernesto cada vez se afastava mais do ambiente familiar.

Primeiro, começou a acordar bem cedo e sair antes que a família estivesse em pé.
Do mesmo modo, à noite retornava muito tarde, evitando encontrar a esposa.
Elvira mais e mais se preocupava com a conduta do marido.
Ele já estivera distante em outros momentos.

Quando prestes a obter sucesso com a clonagem humana, ficara duas semanas no laboratório trabalhando dia e noite.
Mas ao menos se comunicava de vez em quando, dando notícias.
Agora parecia que algo estava diferente; era como se Ernesto não quisesse contacto com ela.

Na semana seguinte, ausentou-se de casa durante seis dias.
Elvira não aguentou, fez o que detestava fazer: arrumou-se e foi até o laboratório.

Ferdinando, o assistente, entrou na sala de testes e disse próximo ao ouvido de Ernesto:
- Sua esposa está aí fora.
Sem tirar os olhos do que fazia, o cientista respondeu:
- Mande-a embora, diga que estou muito ocupado e que falo com ela à noite.

- Acho melhor atendê-la.
Tentei dizer que você estava muito ocupado, mas ela insistiu em vê-lo de qualquer modo.
Não consegui dissuadi-la.
Você conhece sua esposa melhor do que qualquer um.
Elvira é muito decidida;
quando coloca alguma coisa na cabeça, ninguém tira.
Às vezes, nem mesmo você!
- Pois vá até lá e diga que estou ocupado, se quiser, que espere.

Ferdinando transmitiu o recado.
Entretanto, não convenceu Elvira a ir embora.

Ela insistiu:
- Eu espero o tempo que for necessário.
Uma hora ele terá de sair de lá para comer, ir ao banheiro...
Não é possível que passe todo o tempo dentro da sala de testes...
- Ernesto está muito envolvido com sua pesquisa.
Tem certeza de que em breve encontrará a chave que abrirá os conhecimentos para derrotar a morte.

-Você sabe que isso é impossível!
-Não, eu não sei.
Se ele foi capaz de clonar com sucesso um ser humano, quem sabe do que mais aquela mente brilhante é capaz?
E não sou só eu que aposto em Ernesto.
Os accionistas da indústria farmacêutica que controla a fundação estão investindo milhões, talvez bilhões, nessas experiências.
Eles também acreditam.

- E quanto vão lucrar com o remédio que acabará com a morte?
Ora, você bem sabe como são esses homens de negócios: insensíveis e ambiciosos.
Só pensam no dinheiro e mais nada.
Não pode ser assim, Ferdinando. E a ética?
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:03 am

- Que ética, Elvira?
As pessoas estão morrendo e querem deixar de morrer.
Você imagina um produto que venda mais do que este?
Se Ernesto conseguir seu intento, será o homem mais poderoso do mundo.
Todos se curvarão diante dele.

- Os donos do negócio, sim, é que serão ainda mais poderosos.
- E o que você acha que Ernesto é?

Elvira espantou-se com a pergunta.

Reflectiu por alguns instantes, tentando entender a que Ferdinando se referia; depois respondeu:
- Um médico, cientista e pesquisador.
Ferdinando sorriu, irónico:
- Vejo que desconhece seu marido, minha prima.

Ligeiramente impaciente com as sucessivas ironias do rapaz, ela indagou:
- Se você o conhece tanto assim, o que sabe mais do que eu?
- Ernesto tornou-se importante accionista da indústria que controla a fundação.

- Como assim? E onde ele arranjou dinheiro?
- Minha ingénua priminha, Ernesto associou-se ao negócio autorizando a utilização de todos os resultados de cada etapa das pesquisas, como bem quiserem os demais investidores.

Ela empalideceu e silenciou.
Ferdinando esperou por uma resposta, mas Elvira se calou.

Recostou-se no confortável sofá da sala do marido e, depois de longa pausa, reafirmou:
- Vou ficar até que ele retorne.
Uma hora isso tem de acontecer.

Satisfeito com o que causara, Ferdinando saiu.
Elvira aguardou horas, sentada ou andando de um lado para outro da sala.
Foi várias vezes até o corredor, sem ver sinal de Ernesto.

Por fim, adormeceu no sofá.
Nem percebeu por quanto tempo dormiu.

Despertou ouvindo vozes no corredor, vozes que sussurravam:
- Traga-me mais esta, vou precisar.
- Ela está no quinto mês de gestação, é perigoso.
- Não se preocupe, Ernesto sabe o que está fazendo.
Já fez isso antes.
Ela não quer a criança, quer?

- São gémeos.
— Tanto melhor. Assim ganhamos tempo.
- Insisto que é arriscado;
vamos esperar que chegue outra no começo da gestação.
- Nem pensar.
Precisamos de material para continuar os testes.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:04 am

— Está bem, mas a responsabilidade é toda sua.
- E nossa.
Não adianta esquivar-se, pois é responsável também.

Elvira conhecia uma daquelas vozes, mesmo sussurrada: era Ferdinando.
Ao notar que vinham em sua direcção, desesperou-se.
Não podia deixá-los saber que ouvira tudo.

Ainda que totalmente atordoada com o que acabara de escutar, ela tentava pensar e pedia baixinho:
— Meu Deus, por favor, me ajude.
Não permita que me descubram aqui, por favor, me ajude.

Agachou-se atrás do sofá e ficou imóvel.
Alguém tocou na maçaneta da porta, e já ia abri-la, quando Elvira viu sua bolsa em cima da mesa do marido.
Num ímpeto, saltou por sobre o sofá e deitou-se, fingindo dormir.
Rapidamente, enquanto Ferdinando acendia a luz da sala, fez alguns exercícios de relaxamento e controle mental que conhecia muito bem e num segundo atingiu um estado semelhante ao de sono profundo.

Ao acender a luz, Ferdinando viu a prima.
Desconfiado, aproximou-se cauteloso, buscando sinais de que ela realmente adormecera.
Ao chegar bem perto, convenceu-se de que dormia como um bebé.

Pegou sua bolsa na mesa e vasculhou-a.
Olhou o intercomunicador e verificou se havia feito ou recebido alguma ligação.
Tudo estava tranquilo.

Elvira devia estar dormindo há muito tempo, pensou ele;
afinal, já era quase manhã.

Sentou-se perto da prima e sacudiu-a sem dó:
- Elvira, acorde, acorde! Vá dormir em casa!

Elvira fez que despertava lentamente e sentou-se.

Ele então a levantou, colocou a bolsa em seus braços e disse:
- Vamos, tem de ir para casa.
Ernesto não volta tão cedo para esta sala.
Está atolado em afazeres e vai passar o resto do dia trabalhando.

E, puxando a prima pelo braço, finalizou:
- Meu motorista vai levá-la para casa.
— Mas, meu carro...
- Ele leva mais tarde para você.

Elvira acatou e entrou no elevador.

As portas estavam se fechando, quando Ferdinando as segurou e disse:
- Não venha mais ao centro de pesquisas, Elvira.
Agora Ernesto é um homem importante demais para ficar perdendo tempo com uma mulher que não o apoia.
Se mudar de ideia quanto às experiências, me avise;
caso contrário, deixe-o trabalhar em paz.

Ele soltou as portas, que se fecharam, barulhentas.
Enquanto o elevador descia, Elvira sentia todo o corpo tremer.
No entanto, dominou-se, ciente de que o prédio era controlado por circuito interno de televisão.

O retorno para casa foi longo e doloroso.
Somente quando o motorista do primo sumiu na esquina foi que ela, entrando em casa, se entregou a sentido pranto, aliviando a dor que a sufocava.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:04 am

CAPÍTULO 3

Elvira entrou em casa e, mal podendo andar, foi directo para seu quarto.
Fechou a porta atrás de si e sentou-se na cama, tentando colocar alguma ordem na mente agitada.
Ficou quieta por alguns instantes, depois se levantou, foi até a janela e observou o novo dia que raiava.

No horizonte a gigantesca Capela despontava radiante, acompanhada por outra estrela menor, orbitando ao seu redor.

Elvira, então, respirou fundo e ergueu os olhos ao firmamento, suplicando:
- Deus misericordioso e cheio de bondade, agradeço a beleza deste dia que começa, e lembra ao meu coração que a sua generosidade também se renova a cada instante.
Sei que posso contar sempre com o seu amparo e a sua luz, Criador de amor;
por isso rogo neste momento que venha em meu auxílio.

Ampare meu querido Ernesto, Pai eterno, ajude-o Senhor da vida, tenha misericórdia, Senhor!

Sua voz sumiu, cortada pela angústia e pela dor.
Nesse momento, suave melodia se fez ouvir no quarto da bela mulher, enquanto intensa luz tomava conta do cómodo confortável.

Uma figura iluminada se fez visível;
envolvendo Elvira com emanações de amor e paz, falou:
- Não se angustie tanto, irmã.
De que adiantará ficar assim desesperada?
Acha que poderá auxiliar Ernesto nessas condições?

Elvira, sem tirar os olhos da luminosa figura, chorou por alguns instantes.

Depois, cercada pela energia restauradora daquele ser que a visitava, acalmou-se e, refeita, agradeceu:
- Obrigada pelo seu socorro, querido amigo.
O que seria de mim sem a sua companhia constante?
- Sabe que trabalhamos juntos, Elvira, e que igualmente tenho por você elevado apreço.
Agora peço que se mantenha serena;
de nada adiantará alimentar o desespero.

- Tem toda a razão, meu bom Jonefá.
É que fiquei tão chocada com o que ouvi naquele laboratório...
Não esperava que Ernesto estivesse envolvido desse modo...
- Tem certeza, Elvira?
Acho que bem no fundo você sabia.
O que realmente queria era confirmar...

Ela assentiu:
- Acho que tem razão.
Eu tenho esse pressentimento, esse medo a me rondar como uma sombra escura.
Sinto que a cada dia Ernesto se distancia mais do bem e da luz; e isso há muito tempo.

- Você está consciente de que fez tudo ao seu alcance para ajudá-lo?
- Sim, porém não foi o bastante.
Não consegui inspirá-lo como deveria...
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:04 am

- Apazigúe seu coração, minha irmã.
Ernesto teve oportunidades abundantes na presente existência.
Tudo foi cuidadosamente preparado:
sua mente brilhante foi contida pela pobreza e pelas dificuldades;
a aspereza da infância e da adolescência associou-se à sua lucidez mental e à sua sensibilidade para fazer com que ele dobrasse um pouco seu tremendo orgulho.

Depois, a paixão por você e o casamento ainda muito jovem vieram protegê-lo de outros tantos enganos...
Sua companhia dedicada e amorosa o preservou até onde foi possível, bem como a chegada dos filhos, espíritos tão queridos.
Vocês todos reunidos o envolveram em afecto e carinho, para tocá-lo nas fibras mais profundas e ajudá-lo a reconhecer o que de facto tem valor.

Mas nem com todo o esforço que você e seus filhos empreenderam, aliado à dedicação de nossas equipes espirituais, foi possível afastá-lo daquilo que tem dentro de si;
Ernesto só poderá vencer o orgulho que o ofusca, experiência após experiência, se efectivamente abrir a alma a Deus e se render à sua grandeza e ao seu amor.

Enquanto não se reconhecer como criatura limitada, dependente do Criador, ele viverá iludido e emaranhado em suas mentiras interiores, em suas ilusões, dando abertura para que sua inteligência impressionante o afunde ainda mais no lodo do orgulho e da prática do mal.

E ajoelhando-se respeitoso diante de Elvira, que sentada à beira da cama o ouvia em atento silêncio, o amigo espiritual prosseguiu:
- Receio que pouco se poderá fazer por ele agora, Elvira.
Os pesados compromissos que está assumindo com seus actos nefastos extinguiram de vez a luz que ainda restava acesa em sua consciência.
Ernesto mergulhou nas trevas do próprio coração.
É noite escura para nosso amigo e melhor será que abandone o corpo físico o mais breve possível, para que cesse o mal que tem causado a tantos espíritos que tentam regressar ao nosso mundo.

Elvira balançou a cabeça, concordando com o amigo.

E levando as duas mãos ao rosto, em longo suspiro, perguntou:
- Quanto tempo ele terá?
- Muito pouco, Elvira.
Terá de deixar o corpo imediatamente.

- Ainda hoje?
- Será o melhor.
Ele não pode realizar o aborto que planeia fazer esta noite.
As almas que ameaça deter precisam regressar ao orbe;
são espíritos de luz que chegam ao lar difícil para ajudar antiga companheira.
Ernesto não pode interromper aquela gestação.

- Eu compreendo.
Gostaria de estar presente...
- Poupe-se, minha irmã.
Ore por ele aqui mesmo, durante o dia de hoje.
Sustente-o com seu amor, como sempre fez.

-E o que será dele depois?
Quando poderei reencontrá-lo?
Jonefá, amoroso, disse:
- Muitos lhe agradecem alegres pelo trabalho que vem realizando, Elvira.
Você tem servido ao bem com devotamento e abnegação...
Gostaria de poder ajudá-la mais com Ernesto;
todavia, nada se pode fazer sem que ele queira.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:04 am

- Eu sei, Jonefá.
Sei quanto auxílio ele tem recebido e as muitas oportunidades que tem desperdiçado.
Muito me empenhei em ajudá-lo, mas também meus esforços foram em vão...
Ernesto terá de recomeçar e sabe-se lá em que condições...

Jonefá fitou Elvira com extremado e paternal carinho e afirmou:
- Deus jamais nos abandona.
Um dia, Ernesto haverá de compreender a grandeza e o amor de Deus e retornará aos braços do Criador.

O gigantesco sol que iluminava o orbe brilhava então com toda a intensidade e Jonefá despediu-se:
-Preciso partir.
Elvira, apesar do coração magoado pela dolorosa situação do companheiro, sorriu e agradeceu:
-Uma vez mais, Jonefá, obrigada pelo socorro e pelo amparo tão amorosos.

Jonefá desapareceu de sua vista e ela, resignada, permaneceu em oração pelo marido que tanto amava.

Enquanto isso, no laboratório da fundação, Ernesto se preparava para dar sequência a suas actividades criminosas.
Ao ver o sol se erguendo imponente no horizonte, resolveu subir até a cobertura do prédio para contemplar o belo dia que surgia.
Antes, porém, procurou por Ferdinando e pediu que providenciasse um refresco e frutas.

O assistente trouxe pessoalmente a bandeja:
- Aqui está, Ernesto.
Não seria bom você descansar um pouco, para depois seguirmos com a agenda de hoje?
Parece cansado.
- Não quero parar agora, Ferdinando.
Sinto que algo está prestes a acontecer e quero que aconteça logo!

Ferdinando sorriu discretamente e disse, ao fechar a porta atrás de si:
- Você é quem sabe, Ernesto.
Se precisar de mim, estarei por perto.

Ernesto tomou a bandeja nas mãos e subiu.
Acomodou-se no conforto do espaçoso sofá que ficava no centro da cobertura e, concentrando-se no grande e pesado tecto de vidro, abriu-o usando apenas o pensamento.

O frescor da manhã dominou seu rosto e seu corpo, dando-lhe uma sensação de satisfação e bem-estar.
Naquele momento, sentia-se imensamente poderoso.
Sorveu o suco devagar e saboreou as frutas, uma a uma, enquanto planeava os próximos passos que deveria dar para atingir o sucesso com seus experimentos.

Ainda estava longe da resposta que desejava, mas sabia que poderia obtê-la;
afinal, já alcançara tantos outros sucessos...

A uma ordem de sua mente, os objectos se movimentavam até onde ele desejasse.
Sua força mental era enorme, e ele praticara sem cessar.
Agora, com os conhecimentos que adquirira, não só em relação à medicina, como também à manipulação da energia, Ernesto se dedicava arduamente a desvendar os mistérios da energia condensada;
sabia que por esse caminho haveria de descobrir o princípio da vida e, então, poderia controlá-la, como fazia com os objectos, e mesmo com as pessoas de mente um pouco mais fraca, através da telepatia.

Nada o deteria;
seu poder seria ilimitado.
Seus conhecimentos eram vastíssimos e ele se orgulhava deles.
Dedicara anos a fio a estudar, a experimentar o que aprendia e a usar a intuição na consecução de seus objectivos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:04 am

Estava satisfeito com o andamento de seus projectos.

Entretanto, bem no fundo, algo o incomodava, sem que se desse conta.
Ao observar a imensidão do armamento, ele pensou em Elvira.
Forte aperto no peito o assaltou.

Levantou-se enérgico e expulsou do pensamento a delicada figura da esposa, dizendo em voz alta:
- Não é hora para sentimentalismos!

Ao levantar-se, porém, sentiu intensa dor, agora no peito e na cabeça.
De súbito, violenta tontura o fez sentar-se de novo na poltrona.
Ernesto não compreendia o que se passava.

Nunca sentira aquele mal-estar.
Lutou para se levantar, mas não teve forças e permaneceu sentado, quase deitado, com o rosto voltado para o céu.

O sol vibrante banhava-lhe a face e ele mal podia mover-se.
Apenas respirava, e com dificuldade.
Queria gritar, mas não conseguia.
Esforçava-se para se levantar, e o corpo o desobedecia.

Num impulso inimaginável, procurou dominar o pavor que sentia, diante de situação tão inesperada, e acalmar-se para raciocinar e compreender o que estava ocorrendo.

Tampouco a mente o obedecia.
Ele, então, pensou em Ferdinando, desejando chamá-lo.
Decorridos alguns instantes, notou que algo encobria o sol, sombreando seu rosto.
Percebeu que a sombra se aproximava, e viu que era Ferdinando.

Num supremo esforço, tentou comunicar-se mentalmente com o assessor:
-Ferdinando, ajude-me.
Algo está acontecendo.
Não consigo me mover, tenho uma dor intensa no peito e...
- Na cabeça. - completou Ferdinando, aproximando-se mais de Ernesto - Eu sei, o veneno causa essa sensação.
E também a morte lenta e dolorosa.

Ernesto arregalou os olhos, apavorado, e continuou a comunicar-se mentalmente com Ferdinando:
- Do que está falando?
Sentando-se no espaçoso sofá, bem ao lado do cientista, o assistente prosseguiu:
- Poupe suas derradeiras energias.
Não há nada que possa fazer.
O veneno bloqueia sua capacidade mental e energética;
não adianta tentar comunicar-se com ninguém, nem mesmo com Elvira - aliás, principalmente com Elvira.
Sinto-lhe a presença aqui hoje, claramente, mas ela não poderá mais interferir nos acontecimentos...

Interessante... Ernesto não conseguia articular sequer um pensamento completo.
A dor aumentava, dominando seu corpo inteiro.
Incapaz de pensar, ele olhava Ferdinando, estupefacto.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:05 am

E este confessou:
- Há muito venho planeando livrar-me de você.
Só precisava que confiasse em mim o suficiente para me transmitir todos os seus conhecimentos.
Agora que já tenho acesso a quase tudo, não preciso mais de você.

Vou terminar suas pesquisas, obter o resultado e receber todos os louros, que de facto mereço.
Se não fosse por mim, você jamais teria realizado a clonagem, muito menos chegado até aqui.
O serviço sujo quer que eu faça, e os resultados ficam sempre exclusivamente com você - ou melhor, ficavam.

Usando a força da mente em Ernesto, o assessor o fez erguer-se lentamente no ar e volitar até alcançar o parapeito do prédio.

Então, ergueu-se do sofá e, mantendo a concentração inalterada, caminhou lentamente até onde estava o médico e disse:
- Eu assumo daqui por diante.
Adeus, Ernesto.

Foi sem nenhuma resistência que Ferdinando empurrou o corpo imobilizado de Ernesto prédio abaixo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:05 am

CAPÍTULO 4

Elvira ainda estava em seu quarto, meditando e orando, quando Henrique bateu à porta:
-Mãe, venha depressa.

Embora totalmente preparada, Elvira sentiu sumir-lhe o sangue do corpo.
Seu coração batia descompassado;
suas mãos suavam e sua boca estava seca.

Mesmo assim, levantou-se devagar e atendeu ao chamado:
- O que foi, meu filho?
- É da fundação. Pediram que fosse depressa até lá.
Parece que algo muito sério ocorreu com papai.

- Acalme-se, meu filho.
Lembremos que a Providência Divina jamais nos desampara.
- Por que está falando assim?
Sabe de alguma coisa?

Elvira o olhou fixamente e não respondeu.

O jovem, que conhecia bem a mãe, disse entristecido:
- Você já sabe o que está acontecendo, não é?
Foi avisada, mãe?
- Hoje pela manhã.
- E o que houve com ele?

- Tenha fé em Deus, Henrique.
Ele nunca nos abandona.
Mesmo quando o momento é difícil, de dor, de sofrimento, continua querendo o melhor para nós.
Você sabe disso, não é?
Precisamos estar confiantes e unidos, mais do que nunca, filho.
Seus irmãos ainda não têm capacidade de compreender como você e precisarão de nosso apoio.

Henrique fitou a mãe, preocupado, e uma vez mais questionou:
- Mas, afinal, qual é o problema?
- Não sei maiores detalhes, filho.
Apenas fui informada de que seu pai teria de deixar a encarnação prematuramente, por não ser mais possível sua permanência no corpo denso.
Suas escolhas estão prejudicando muitas vidas e a espiritualidade superior não teve alternativa, senão permitir que se encerrasse esta oportunidade a ele concedida.

Henrique suspirou, desolado:
- Que tristeza, mãe!
Sabemos o quanto ele pediu para voltar, o quanto prometeu que se esforçaria para acertar desta vez.
Quanto tempo foi preciso para que todos nós pudéssemos estar juntos de novo!...
Especialmente você, mãe.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Jun 08, 2014 9:05 am

Elvira o encarou com doçura e disse:
- Deus respeita nossas escolhas, filho;
embora tudo tenha limite, quando estas vão contra as suas leis perfeitas.
Seu pai falhou, porém terá nova oportunidade...
- Sabe-se lá quando...

- Vamos acreditar, Henrique, confiemos em Deus.
Nesse instante, Felipe, o filho mais velho, bateu à porta desesperado:
- Mãe, venha depressa!
Aconteceu uma desgraça! O papai, ele...

Imediatamente Elvira abriu a porta e abraçou o filho, que tremia:
- Uma desgraça, mãe! Ele morreu!

Elvira continuou enlaçada ao filho, enquanto pesadas lágrimas lhe desciam pela face.
Henrique abraçou-se aos dois e chorou com eles.
Assim permaneceram longo tempo, até que todos se acalmassem.

Então, Elvira limpou os olhos húmidos e vermelhos e pediu:
- Fique aqui, Felipe, e espere pelo seu irmão, que em breve chegará.
Ainda é muito pequeno e precisa que cuide dele...
Felipe não deixou a mãe terminar:
- Não, quero ir com você. Quero ver meu pai...

Elvira segurou carinhosamente a face do filho ao dizer:
- Seu pai já não está connosco.
O que se pode ver é apenas a vestimenta física, material, que ele usou no tempo que esteve entre nós.
Seu pai está agora em outra dimensão, iniciando uma nova fase em sua existência...
Não há nada para você ver. Fique aqui.

- Só se o Henrique ficar também.
Elvira olhou suplicante para Henrique, que perguntou:
- Pode mesmo ir sozinha, mãe? Vai ficar bem?
Eu posso ficar com o Felipe e o Lucas, mas seria bom se você fosse com alguém...
- Eu não estarei sozinha, pode ficar tranquilo.

Enquanto conversava com os filhos, Elvira viu a figura amiga de Jonefá, que se mantinha a certa distância, respeitoso.
Henrique assentiu com a cabeça, entendendo que a mãe estava em companhia espiritual que a ampararia naquela hora.

Elvira saiu depressa.
Assim que chegou ao prédio do centro de pesquisas, teve de enfrentar o assédio dos repórteres que se aglomeravam atrás de um cordão de isolamento.
Ela se identificou e conseguiu andar até onde estavam alguns funcionários da instituição, junto com policiais e investigadores.

Um dos funcionários logo a identificou:
-Elvira, eu sinto muito.
Estamos todos comovidos.
Sabíamos que doutor Ernesto estava sob forte pressão, mas jamais poderíamos imaginar que fosse capaz de fazer algo assim...
- E o que houve, Marcelo?
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:42 am

- Ainda não sabe, Elvira?
- Só sei que ele está morto.
- Não sabe como aconteceu?
- Por favor, conte-me. Como foi?
- Doutor Ernesto atirou-se da cobertura do prédio; ele se suicidou.

Elvira sentiu as pernas fraquejarem.
Confiava profundamente em Deus, mas aquela notícia a tomara de assalto.

- Tem certeza, Marcelo? Como sabe?
- Ele estava sozinho na cobertura;
as câmaras de segurança não registaram mais ninguém subindo.
- Não poderia ter sido um acidente?
Será que ele não se distraiu, pensando em suas experiências, e caiu?

- Tudo indica que não, Elvira.
Sei que é muito difícil aceitar...
Especialmente de alguém tão confiante e seguro como doutor Ernesto.
- Por isso mesmo, Marcelo.
Não posso imaginar Ernesto, empolgado como estava com seus experimentos, dando fim à vida, quanto se sentia tão perto de concretizar seus planos...

- É mesmo sem sentido, mas foi o que disseram os primeiros policiais.
Elvira despediu-se e foi à procura do investigador responsável.
- Seu marido foi levado ao hospital.
- Vão fazer autópsia?
- Vai ser difícil, senhora. Estão tentando.

- Qual a provável causa?
- Ainda não sabemos; mas presumimos ser suicídio.
- Não é possível! Tenho certeza de que isso não aconteceu!
- Seu depoimento será importante para nós;
logo que estiver mais calma, poderemos conversar - concluiu o investigador, atendendo ao chamado de alguns colegas que o requisitavam.

Elvira afastou-se do aglomerado e foi para o hospital.

No caminho meditava e conversava mentalmente com seu amigo e protector, que insistia em dizer-lhe:
- Fique tranquila, Elvira.
Esse crime ele não cometeu.

Os dias que se seguiram foram de intensa dor para Elvira e seus familiares.
Todos suportaram interrogatórios intermináveis, em meio ao doloroso sepultamento do chefe da família.
Elvira era assediada por amigos, curiosos, parentes e admiradores do marido, que queriam detalhes sobre o falecimento e as investigações.

Sentia-se atordoada e cansada.
Em meio a tamanho tumulto, tinha pouco tempo para estar consigo própria e reflectir sobre o ocorrido - e, principalmente, para orar pelo marido. Isso era o que mais a entristecia.

Enfim, depois de algumas semanas, o ambiente começou a se acalmar e no final do segundo mês Elvira experimentou relativo alívio.
Após refazer-se física, emocional e espiritualmente, passou a pedir a Deus pelo companheiro, a quem amava com desvelo.
Sabia que sua situação no mundo espiritual seria difícil e queria ajudar em tudo o que lhe fosse possível.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:42 am

Em uma noite calma, seu fiel amigo espiritual Jonefá veio falar-lhe, durante o sono.

Desprendida do corpo físico, recebeu-o ansiosa:
- Meu amigo, como é bom vê-lo!
Tem notícias de Ernesto?
Preciso muito estar com ele!

O amigo, contudo, estava sério.

- Não creio ser este o melhor momento para vê-lo, Elvira.
Ele não passa bem e você ainda está abalada.
Descanse, serene seu coração e, em ocasião oportuna, poderá encontrá-lo.
- Esteve com ele?

- Eu o vi.
- Onde ele está?
-No momento certo saberá, Elvira.
Agora descanse. Seus filhos precisam muito de você.

Impondo as mãos sobre o corpo físico de Elvira, que permanecia igualmente inquieto na cama, Jonefá procurou auxiliar a amiga a refazer-se.

Em alguns instantes, ela dormia profunda e mansamente.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:42 am

CAPÍTULO 5

Enquanto dormia, Ferdinando debatia-se, agitado:
-Vá embora!
Livrei-me de você, o que ainda faz aqui?
Suma, vamos!

De um salto, sentou-se na cama, apavorado.
Tomando consciência de que acabava de acordar e pensando que tivera um pesadelo terrível, levantou-se e caminhou até a janela.

Entreabriu a elegante cortina e observou a cidade a seus pés.
Poucos eram os transeuntes e veículos que se moviam.
Tudo estava calmo.
A cidade era de uma beleza estonteante.

Apesar dos recursos tecnológicos de que dispunha - permitindo, por exemplo, que os veículos se movessem sem tocar o solo e alcançarem rapidamente o destino desejado - a movimentação era organizada e sincronizada.

Os condutores educados e cuidadosos dirigiam sempre com muita gentileza e cortesia, ao menos na grande maioria.
O combustível utilizado era a energia solar armazenada, o que garantia que o ar se mantivesse limpo e puro.

As ruas eram bem cuidadas, limpas e arborizadas.
Tudo evidenciava as transformações que se vinham acentuando naquele belo e rico mundo.
Ferdinando respirou longamente, sentindo o aroma delicado no ar da madrugada.

Depois, voltou a se deitar e disse a si mesmo, como para se convencer:
- Preciso descansar. Foi só um pesadelo.
Se bem que se repita quase toda noite, é apenas um sonho.

Quando se deitava, procurando a melhor posição no travesseiro, alguém o espreitava, atento:
- Pode tentar se enganar quanto quiser, meu caro, mas não vou deixá-lo em paz até acabar com sua vida!
Confiei em você, Ferdinando;
confiei-lhe meus mais preciosos segredos e você, o que fez?

Destruiu-me. Eu estava tão perto...
Mas você me paga! Vai se ver comigo.
Não sossego enquanto não o destruir também.

Ferdinando se remexia na cama, sem conciliar o sono.
Embora não escutasse Ernesto, que em espírito estava agarrado fortemente ao seu pescoço, registava-lhe as palavras, pois não conseguia relaxar.

Virava-se de um lado para o outro, inquieto, sentindo faltar-lhe o ar.
Noite após noite, Ferdinando rolava na cama, buscando em vão o repouso.
Quando chegava a adormecer, dava com a figura raivosa de Ernesto, tentando enforcá-lo, sem que ele nada pudesse fazer.

Acordava então sobressaltado, angustiado, e o medo o impedia de voltar a dormir.
Naquela manhã, no laboratório, Ferdinando mal conservava os olhos abertos.
Estava exausto, sem forças para prosseguir os experimentos.
A pressão dos accionistas por algum progresso era constante e Ferdinando não podia mais sequer raciocinar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:42 am

Ele sabia que havia algo errado; aqueles sonhos eram muito reais.
Mesmo assim, insistia em não pensar naquilo e concentrar-se no trabalho a fazer.
Tão logo souberam da morte de Ernesto, o presidente e os accionistas da indústria farmacêutica controladora da fundação se preocuparam em encontrar um sucessor para o renomado cientista.

Ferdinando, rapidamente, tratou de assegurar-lhes que possuía todas as informações e os planos que Ernesto estava desenvolvendo - como seu assessor directo, tinha acesso a tudo, quase ao que ia na mente do grande médico e cientista.

Não foi difícil convencê-los e sem demora ocupou o lugar que pertencera a Ernesto.
O rapaz, ambicioso e audacioso, havia premeditado tudo com muito cuidado.

Relembrando os esforços que empreendera para chegar até aquela posição, Ferdinando deu um soco na mesa e gritou como se falasse directamente com Ernesto:
- Nada vai me impedir de obter meus intentos!
Nada! Não importa que eu não durma pelo resto da vida.
Vou conseguir tudo o que desejo. Tudo!

Cerrando o punho, ia socar novamente a mesa, quando o telefone tocou.
O rapaz atendeu, e do outro lado da linha o telefone estava mudo.
A cena se repetiu por cinco vezes, até que Ferdinando ignorou o toque e se levantou irritado.
Andou de um lado para outro na sala, cada vez mais enervado com aquele som que não cessava.

Aproximou-se do aparelho, arrancou-o com toda a força e o lançou à parede, despedaçando-o.
Em seguida foi seu intercomunicador que começou a chamar sem parar.
Não encontrando ninguém na linha, ele desligou.
O toque recomeçou.

De novo ele atendeu e foi então que escutou claramente a voz de Ernesto:
-Desta vez não vai conseguir livrar-se de mim!

Ferdinando atirou o aparelho na parede e saiu da sala, em desespero.

Passou pela assistente como um furacão e, ao invés de tomar o elevador, desceu as escadas apavorado, gritando:
- Eu já me livrei de você, Ernesto!
Desapareça! Vá embora!

Gritava e descia as escadas cada vez mais depressa, como se visse nitidamente Ernesto correndo atrás dele.

A assistente acompanhou, assustada, o comportamento do chefe.
Há dias vinha estranhando as atitudes de Ferdinando, inclusive já havia comentado com vários colegas que ele parecia ter perdido o juízo.
Ao constatar seu estado naquele dia, não teve dúvidas:
ligou para o hospital psiquiátrico que mantinha convénio com a fundação e informou o que estava acontecendo.

Ao chegar no andar térreo, Ferdinando estava lívido e completamente sem fôlego.

Sem forças, confuso e aturdido, sentou-se no meio do saguão principal do prédio e se pôs a chorar, bradando:
-Por favor, vá embora! Não me atormente mais!
Por favor! Deixe-me em paz!

Não demorou muito e uma ambulância encostou à porta do prédio.
Três homens trajando branco se dirigiram para Ferdinando, que já chorava como criança.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:43 am

Quando viu que se aproximavam, foi se arrastando pelo chão, encostado à parede, enquanto gritava:
- Não, por favor, afastem-se de mim!
Não me toquem! Não! Não!

Incapaz de se controlar, teve de ser imobilizado e sedado pelos enfermeiros, sob a ordem do médico que os acompanhava.
Foi levado ao hospital psiquiátrico e, após minucioso exame, considerado portador de distúrbio mental grave.

Imediatamente os responsáveis pela fundação iniciaram a busca de outro cientista que pudesse dar andamento às pesquisas;
candidatos não faltavam e logo encontraram outro médico que se dispôs prazerosamente a prosseguir as análises de onde Ernesto e seu assistente haviam parado.

Passados alguns meses Ferdinando não falava nem andava mais, paralisado no leito, de onde nunca saiu, até ser encontrado pela enfermeira, sem respirar, com os olhos arregalados, como se o tivessem asfixiado.

Ao desprender-se do corpo físico, a dor de Ferdinando foi ainda maior.

Em seus derradeiros instantes ele gritava:
- Pare, por favor! Não consigo respirar!

E o drama não cessou com o desenlace.
Seu corpo espiritual continuava agarrado por Ernesto e ambos, perseguido e perseguidor, foram sugados para o espaço ao redor do orbe, arrastados para tenebrosa região de dor e sofrimento.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:43 am

CAPÍTULO 6

Elvira, não obstante recuperada por completo do momento difícil pelo qual passara, continuava extremamente preocupada com a situação espiritual de Ernesto.

Ela conhecia bem a condição das almas que deixam o mundo sob o domínio do orgulho e do egoísmo e, sobretudo, longe de Deus.
Inabalável, intercedia por ele em oração, rogando ao Pai que o auxiliasse.

Ao deitar-se, noite após noite, pedia ao bom amigo Jonefá que a conduzisse até onde estava o marido.
Naquela noite, Elvira se deitou e, entre lágrimas, suplicou a Deus que ajudasse Ernesto a reerguer-se da sombra onde provavelmente se encontrava.

Jonefá, afável e amoroso, apareceu no quarto, dizendo:
- Minha querida irmã, precisa ter paciência e aguardar confiante a restauração espiritual de seu companheiro.
Deus nos deu o livre arbítrio e infelizmente, por ora, Ernesto preferiu o caminho que o afastou do bem e da luz.

Quanto a você, minha irmã, tem usado suas oportunidades para fazer o bem e acender a luz divina ao seu redor e dentro de seu coração.
Por isso, não poderão estar juntos por enquanto.

- Eu desejo ajudá-lo, Jonefá.
Não me peça para ficar longe dele.
Sabe há quanto tempo o acompanho, encamação após encarnação.
-Sim, Elvira, eu sei.
Contudo, vocês escolheram caminhos opostos, e para Ernesto o regresso levará muito tempo.
Assim, vocês terão de ficar separados por um período.

-Mas ele precisa de mim...
Envolvendo-a carinhosamente em intensa luz, Jonefá prosseguiu:
- Prepare-se. Em breve virei buscá-la para um encontro que a ajudará a entender melhor o que estou falando.
-Vai me levar até ele?
- Nós vamos tentar.

Elvira olhou para o amigo e, intrigada, perguntou:
- Como "tentar"? Não sabe onde ele está?
Sei que deve ser um lugar triste e sombrio, mas quantas vezes o acompanhei a tais ambientes, para resgatarmos irmãos em situação semelhante à do meu querido Ernesto?

- Acontece, Elvira, que agora é diferente.
Estamos diante de um momento singular para o nosso mundo.
O resgate não será mais tão simples...

Elvira, séria, silenciou por instantes.

Depois questionou:
- Do que está falando, Jonefá?
- É chegado o momento de se consumar a transformação pela qual tanto temos ansiado.
O orbe está se modificando e, em breve, será um mundo de regeneração, onde somente as almas mais conscientes e afeiçoadas ao bem poderão habitar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:43 am

Elvira encarou Jonefá enlevada.
Seu rosto doce e meigo cintilava e dele emanavam luzes radiantes.
De seu peito, luzes azuis e rosadas se expandiam ao infinito.
Sua beleza espiritual era encantadora.
Seus olhos brilhavam como estrelas no firmamento.

Ela não conseguia falar.
Sentia o coração pulsar num misto de júbilo e tristeza.

Jonefá tocou-lhe os cabelos ternamente e acrescentou:
- Sim, querida irmã, chegou a hora de se completar a mudança.
Veremos por fim a violência dar lugar à paz; o ódio ser trocado pelo amor;
o orgulho ceder vez à humildade;
e o mal, enfraquecido, ser vencido pelo bem.
É o triunfo de Deus nos corações dos homens de nosso mundo!

Elvira fitou Jonefá com emoção, sorrindo.

Depois, como a se lembrar de algo, estremeceu e perguntou:
- E o que será de Ernesto, justamente agora?
Sabíamos que seria sua última chance.
O que vai acontecer com ele?

- Entendo sua angústia, minha irmã, e por isso obtive autorização para levá-la comigo a importante reunião no plano espiritual, para que possa compreender o destino de nosso irmão.
- E acha que verei Ernesto, nessa reunião?

- Elvira, não há como ter certeza.
Mas insisto em que descanse e se prepare;
é possível que encontremos Ernesto entre aqueles que irão participar desse encontro especial.
Em breve virei buscá-la, durante o sono físico.

Movendo a cabeça em sinal afirmativo e sorrindo com doçura para Jonefá, ela concordou:
- Haverei de estar pronta, com a graça de Deus, meu bom amigo.
Aguardo-o com o coração preparado.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:43 am

CAPÍTULO 7

A vida fluía com toda a intensidade naquele orbe admirável, cujas belezas o colocavam entre os mais lindos do Universo.

A movimentação era grande nas ruas e nos prédios;
homens e mulheres iam e vinham;
jovens e crianças se dedicavam com alegria às suas actividades.

A humanidade estava optimista.
Nunca antes um governo mundial tivera tanta confiança e credibilidade por parte das populações.
Pela primeira vez na história, os povos tinham um só governo para todos os países.
As barreiras entre as diferentes nações haviam caído e uma ampla coalizão política fora capaz de eleger, num esforço gigantesco, um governo único.

Havia os que resistiam;
muitos interesses se opunham a esse avanço.
Não obstante, com o crescimento económico unindo as nações, derrubando taxas e impostos entre os povos, a economia global se consolidara e de tal modo se fortalecera igualmente seu órgão representativo (constituído de enviados de todos os países) que fora possível convencer a colectividade a eleger um governo centralizado.

As populações estavam cansadas da violência e das guerras sucessivas;
famílias incontáveis haviam sido dizimadas e as pessoas ansiavam por alguém em quem pudessem confiar;
esperavam por uma transformação;
desejavam como nunca antes que houvesse paz, finalmente, entre todos os homens.

O governo único se iniciara há alguns anos e os resultados se faziam notar em toda parte:
o mundo, outrora à beira da destruição em consequência do contínuo desrespeito e das agressões sofridas por seus habitantes, atravessava uma fase de harmonia e restauração, ainda que lenta e gradual, de suas reservas naturais.

Nenhuma árvore fora derrubada nos últimos anos, nenhuma sequer.
E novas reservas florestais vinham sendo cultivadas, dia após dia.
Eram grupos enormes de jovens, estudantes, que deixavam as salas de aula e iam às áreas completamente destruídas para, sob a orientação de técnicos agrónomos, começar o reflorestamento das extensões devastadas.

A princípio, muitos acharam que os esforços seriam em vão - nada mais poderia ser feito para salvar o mundo.
Muitos acreditavam mesmo que a destruição total era inevitável.

No entanto, passados alguns anos, eles viam reflorir a esperança, nos grandes parques que se formavam em toda parte.
As árvores nativas de cada região eram semeadas e, com a vegetação pouco a pouco recuperada, ia também ressurgindo a fauna original.

Nas cidades, abandonadas e empobrecidas, destituídas de beleza, a mudança fora ainda mais radical:
o governo vinha actuando directamente na educação da população e já o próprio povo, consciente e esperançoso, buscava alternativas para melhorar os centros urbanos.

Grandes mutirões se realizavam com frequência, entregues à tarefa de elevar a qualidade de vida nas regiões mais pobres das cidades.
A população, outrora esmagada pela desesperança, pela pobreza e pela fome, agora respirava aliviada, cheia de optimismo e confiança.
Investimentos constantes em pesquisas, com resultados bem direccionados, traziam avanço tecnológico para todas as áreas.

O orbe experimentava um progresso jamais visto em todos os seus sectores de actividades.
Os interesses pessoais, aos poucos, cediam lugar ao bem comum, graças à consciência recta e ao amor, que prevalecia invariavelmente, inclusive nas almas daqueles que governavam.
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Série Lúcius - EXILADOS POR AMOR / Sandra Carneiro Empty Re: Série Lúcius - EXILADOS POR AMOR / Sandra Carneiro

Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:44 am

O respeito ao próximo e a Deus era assunto rotineiro nas reuniões políticas.
Entretanto, havia os que ainda se opunham duramente, ignorando ou mesmo rejeitando os resultados que se vinham obtendo;
viam, mas não queriam aceitar que aos poucos brotava uma nova civilização.

Não cediam às evidências, contrariados em seus interesses particulares.
Dentre esses grupos que se opunham ao progresso, havia um em especial, constituído de importantes figuras sociais e políticas:
eram homens de negócios, que viam seus lucros diminuírem por conta da mudança de hábitos das populações.

Dentre eles, muitos também tinham forte influência junto a membros do governo único.
Esse pequeno mas poderoso grupo se reunia tentando, sucessivamente, diversas acções para desestabilizar o governo e tomar o poder nas próprias mãos.

Eles estavam adoptando estratégias cada vez mais agressivas e naquela tarde, discutiam, ardorosos, como haveriam de proceder com relação às últimas propostas do governo.

Marcelo, um dos mais poderosos, dizia:
- Não concordo em absoluto!
Temos de tomar providências.
Se deixarmos que continuem, perderemos de vez o controle.

- Que se há-de fazer, Marcelo?
Eles agora são maioria! - redarguiu Felício, dividido entre o bem-estar que constatava no povo e os interesses de seus amigos, que vinham sendo afectados.
- Que nada! Um bando de frouxos, isso é o que eles são.
Tão ingénuos...

Nesse ponto Maurício interveio, convicto:
- Olhe, Felício, se não tomarmos atitude agora, ficará cada vez mais difícil.
Tenho conexões no mundo inteiro, com aqueles que continuam insatisfeitos com o rumo que as coisas estão tomando.

- Temos apoio em todo lugar.
É só mover um dedo (e muito dinheiro) e poderemos insuflar metade da população do globo contra o governo. - desta vez foi Rodolfo quem tomou a palavra.

Felício argumentou, receoso:
- Porém não poderemos saber quais as consequências dessa nossa atitude...
Parece que as coisas estão indo realmente bem.
- Felício, você sempre esteve do nosso lado;
mas, se ainda tem dúvida, por que não tira umas férias?
Não tem de participar, se não quiser.

O homem de seus cinquenta anos calou-se, pensativo.

A reunião já durava horas quando Marcelo sugeriu aos participantes, que somavam mais de meia centena:
- Vamos dominar um dos submarinos nucleares e ameaçar explodi-lo.
O pânico será geral e ficará muito fácil tomarmos o poder, com o apoio de todas as facções que se opõem ao governo actual.

A sala explodiu em discussões.
Todos falavam ao mesmo tempo, uns mais receosos do que outros.

Marcelo pediu:
- Senhores, vamos manter a ordem.
As manifestações devem ser enviadas ao nosso telão;
caso contrário não conseguiremos chegar a um consenso.
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Mensagem  Ave sem Ninho Seg Jun 09, 2014 8:44 am

Perguntas e sugestões se somavam.
Depois de muitas horas de acalorada discussão, finalmente a maioria concordou:
tomariam o controle de um dos submarinos nucleares mais potentes do mundo.

Essa seria a mensagem directa ao governo de que ele não tinha o poder absoluto - eles, sim passariam a ter.
Era uma medida drástica.
Outras menores já haviam sido tentadas, sem êxito.

Actos terroristas tinham sido incentivados em diversas partes do globo, mas o povo contribuía, os casos eram solucionados e os executantes dos crimes, quase sempre presos, estavam começando a delatar a procedência das ordens.

Marcelo representava grande número de interessados em refrear a qualquer custo o progresso que se via de forma generalizada.
Eles simplesmente não queriam viver sem o controle que sempre haviam detido.
Sentiam-se ameaçados pela força que a população global vinha demonstrando e tudo fariam para que o progresso fosse impedido.

Algumas semanas se passaram.

Aquele dia amanheceu com frescor incomparável e Felício - que depois da conturbada reunião decidira afastar-se temporariamente de suas actividades - olhava pela janela o tráfego das crianças indo para a escola.
Sentia-se profundamente incomodado naquela manhã.

Observava tudo e pensava em como as coisas haviam chegado àquele ponto, quando a esposa chegou, pálida e ofegante, quase sem conseguir falar:
- Venha ver... Felício!
É uma... catástrofe de dimensões incomparáveis!
- O que aconteceu, Melissa?
- Ligue a televisão.

Felício empalideceu também.
Lembrou-se de que aquele deveria ser o dia da acção que seu grupo planeara.

Ligou a televisão, que noticiava em todos os canais:
"A poeira radioactiva alcançará algumas cidades.
Aqueles que têm abrigo nuclear devem buscá-lo imediatamente".

Felício passou de um canal a outro, atrás de mais informações:
"O mais poderoso submarino nuclear afundou e em seguida explodiu, gerando onda gigantesca que encobriu grande parte dos continentes.
Houve destruição maciça.
Segundo informações colhidas com diversas áreas de controle e operações, tudo indica ter sido uma acção terrorista sem precedentes".

Sem esboçar reacção, completamente atónito, Felício olhava para a mulher, que chorava desesperada.

Naquela mesma hora, longe dali, Elvira igualmente assistia ao noticiário, incrédula, junto dos filhos, que assustados perguntavam:
- E agora? O que vai acontecer?
Vai morrer muita gente?
Henrique questionou:
- Como é que pode ser isso?
Esse submarino era de segurança máxima, utilizado apenas para pesquisa em águas profundas...

Elvira respirou fundo e respondeu:
- Eu não sei o que dizer, meu filho.
Agora que nosso mundo parecia definitivamente melhor, vemos esse desastre monstruoso...
Não sei, Henrique, não sei mesmo o que dizer...
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