LUZ ESPÍRITA
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Um dia e Uma noite - Wilson Frungilo Júnior

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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Fev 14, 2020 12:10 pm

Um dia e Uma noite

“O AMANHA COMEÇA HOJE

Wilson Frugildo Jr.
Nascido em Araras, Estado de São Paulo, em 22 de janeiro de 1949, é funcionário aposentado do Banco do Brasil e Presidente do Instituto de Difusão Espírita desde o ano 2000.
Sua formação universitária é na área de Ciências.
Casado com Neuza Maria Zani, possui dois filhos, Samuel e Mariana, genro, nora, e netos.
Ingressou no Espiritismo em 1974 e, desde 1984, vem se dedicando à divulgação da Doutrina Espírita, através de vários romances de sua autoria e, actualmente, da administração da IDE Editora e de seu parque gráfico.

A VIDA TEM O PODER DE NOS SERVIR COM SEUS DIAS, COM SEU PRECIOSO TEMPO, E MUITA COISA PODE ACONTECER EM POUCAS HORAS.
Dalton tinha quase um dia pela frente, que parecia ser longo por tudo que ele ainda teria de realizar, porém o inesperado veio tirá-lo de sua rotina, e uma avalanche de situações fez com que ele sentisse o tempo correr, apesar de algumas horas lhe parecerem intermináveis.
Em menos de sessenta minutos, ele sentiu-se acuado, assustado, e com medo do desconhecido, de um mundo que não combinava em nada com o seu; depois, passado mais algum tempo, vivenciou, de olhos bem abertos, o que sempre aprendera e acreditava, sentindo-se feliz em poder ser útil e ajudar o próximo; de qualquer forma, nada poderia ser comparado ao alívio do reencontro, da felicidade em estar vivo e da alegria do recomeço.
Tudo em Um dia e Uma Noite, em menos de vinte e quatro horas, deixando-lhe a certeza de que O Amanhã começa Hoje.

Este livro faz parte de uma colecção denominada “Um dia e Uma noite", com histórias independentes e personagens distintos, não possuindo sequência entre elas.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Fev 14, 2020 12:10 pm

1 - O CONVITE
- NARINHA INSISTE EM FALAR COM a senhora, doutora.
A médica que gratuitamente atendia, uma vez por semana, as crianças que, em período integral, frequentavam aquela instituição religiosa e filantrópica de ensino, sorriu ao ouvir o nome da menina de oito anos de idade.
Com trinta e dois anos, Magda, médica pediatra, era uma linda moça, porte elegante, cabelos castanho-claros até os ombros, grande desenvoltura para se expressar, e com muitos pretendentes, mas que ainda não encontrara o eleito de seus sonhos, apesar de ter tido alguns relacionamentos, que pouco tempo duraram, talvez até pelo facto de sua grande dedicação à Medicina, com pouco tempo para o lazer e passeios.
Apesar de seu empenho ao trabalho, possuía enorme desejo de ter filhos, pois não fora por acaso que escolhera essa especialização.
Detinha enorme amor e interesse pelas crianças, principalmente às mais carentes, que estudavam nessa instituição espírita, num bairro afastado do centro da cidade.
Os medicamentos, as empresas de seu pai patrocinavam, junto a diversas farmácias daquela região, bastando que as mães levassem uma receita, que deveria estar assinada por Magda, além de enumerada e já liberada através de um site próprio.
Magda, assim que chegava à instituição, era abraçada com muito carinho pelos alunos, que percebiam nela uma alma generosa e curadora de seus problemas físicos.
Ela se transformara na solução de seus problemas, desde uma simples dor de cabeça ou outros males, até pela maneira doce com que os examinava e, acima de tudo, por dar- lhes atenção e palavras de carinho.
A odontologista Raquel também lá dedicava muitas horas daquele dia da semana para lhes tratar os dentes e, principalmente, passar-lhes noções dos cuidados necessários da higiene bucal.
Raquel era sua amiga desde a infância e, confidentes, praticamente decidiam juntas as melhores soluções ou, pelo menos, as mais corretas para os diversos problemas do dia a dia, fossem eles profissionais ou dos sentimentos e aspirações da vida.
A única diferença entre elas era que, enquanto Raquel tinha uma índole mais recatada, mais circunspecta, Magda era mais expansiva, sorridente, e sua alegria interior era facilmente notada em seu olhar.
Extremamente justa e franca, sabia expor suas opiniões, utilizando-se do linguarar próprio dos que, ao conversarem, denotam imensa vontade de ouvir e, se fosse o caso, de mudarem suas ideias, na constante procura do que seria mais verdadeiro e justo.
E Magda, sem atinar bem com o porquê, detinha especial carinho àquela menina que, havia apenas dois anos, perdera a mãe, vítima de um acidente cardiovascular repentino.
Na época em que a mãe de Narinha falecera, ainda não prestava serviço voluntário nessa instituição, pois começara esse trabalho havia apenas oito meses.
Sabia que a garotinha morava com o pai num bairro próximo dali e que a pequena o adorava, tendo sempre algo para narrar a respeito dele, dos passeios que faziam, das brincadeiras, e era muito feliz, agora já bastante recuperada da perda da mãe.
Inclusive, a Directora da escola levara ao seu conhecimento que a menina chegava a impressionar por sua inteligência, tendo em vista a facilidade com que aprendia as matérias.
Quando Magda começou a atender nessa instituição, a menina ainda trazia muitos resquícios de saudade e falta da mãe, na maneira como se comportava, sempre retraída, introspectiva mesmo, solitária, pouco se relacionando com as outras crianças.
Mas a partir do momento em que começou a ser atendida por Magda, iniciou-se na menina uma enorme transformação, facto que não passou despercebido pelos professores e até mesmo pela médica, que não negava a simpatia e o carinho que tinha por ela.
Pelas outras alunas, ficara sabendo que o sorriso de Narinha somente era visto no momento em que o pai vinha buscá-la, abraçando-a com muita atenção e alegria.
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Também assim se comportava quando ela a atendia no consultório da instituição.
- Onde ela está, Lurdes? - perguntou Magda, que já estava se preparando para sair, pois já havia atendido algumas crianças.
Normalmente, nos dias em que ia até a escola, mesmo não havendo nenhuma necessidade, fazia questão de conversar com dois ou três alunos, num atendimento preventivo, no qual não somente os examinava, como lhes dava conselhos quanto aos bons hábitos de higiene.
-Ela está aí na ante-sala e ainda tem quinze minutos de intervalo para recreação.
-Pois, por favor, mande-a entrar.
Lurdes, a inspectora de alunos, abriu a porta e chamou a menina que, imediatamente, entrou toda sorridente, indo abraçar Magda.
Era uma garotinha miúda, muito bonita e meiga, cabelos escuros, curtos e encaracolados, olhar vivo e de grande expressividade.
- Bom dia, Narinha.
Dona Lurdes disse que deseja falar comigo.
Está sentindo alguma coisa, alguma dor?
-Não, senhora. Eu queria...
E a menina interrompeu a sua fala, olhando para a inspectora que ali permanecera.
-É segredo, Narinha? - perguntou Lurdes.
-E... - respondeu, meio constrangida.
-Está bem, vou deixá-las a sós, mas não tome muito tempo da doutora.
Ela tem de voltar para o seu consultório.
-Pode deixar, Lurdes.
Eu administrarei o tempo dela - disse Magda, sorrindo.
Assim que a mulher deixou a sala, a médica ficou a espera do que a menina tinha para lhe dizer, e Narinha, meio sem jeito, parecendo não estar tendo muita coragem para falar, sentou-se numa maca, subindo por pequena escada ao lado do móvel, ficando com as pernas balançando.
-E, então, minha princesa?
Pode falar.
A menina olhou para as próprias mãozinhas, cruzando-as, típico gesto de nervosismo.
-Fale, filha.
- Filha...?
-É... Maneira de dizer.
Narinha sorriu de leve e perguntou:
-Posso me sentar no seu colo?
-No meu colo...?
Pode... Venha cá.
Então, a garotinha rapidamente aninhou-se à doutora, encostando sua cabecinha em seu ombro, o que a fez emocionar-se, ao perceber a necessidade do carinho materno de que ela carecia.
Com certeza, esse gesto tinha sido provocado por tê-la chamado de “filha”.
Acariciou-lhe os cabelos e perguntou:
-O que você quer falar, princesa?
-E que... nós... nas aulas de trabalhos manuais, estamos fazendo o presente para o Dia das Mães e... é muito bonito... a senhora precisava ver... é...
Não posso falar agora, vai ser surpresa para as mães...
Magda sentiu forte aperto no coração ao ouvir as palavras daquela aluna, por quem possuía muito carinho.
Nunca havia pensado no que uma criança órfã sentiria no momento em que suas coleguinhas de classe começassem a fazer esse tipo de presente.
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-E, então...? - perguntou, com a voz já embargada e fazendo o possível para conter insistente lágrima a lhe brotar de um dos olhos, enquanto o outro se marejava.
“Não posso chorar” - pensou.
“Preciso disfarçar e ficar firme”.
-Então... é que eu gostaria de participar também.
No ano passado, eu não vim na festinha porque, a senhora sabe, eu não tenho mãe... quer dizer... não tenho na minha casa... porque... ela foi para o Céu.
Minha professora conversou comigo, dizendo que eu poderia trazer o meu pai ou outra pessoa no lugar dela, mas eu preferi não vir, achando que papai fosse ficar chateado no meio de tantas mães.
E os olhos de Narinha se encheram de lágrimas e Magda não conseguiu mais conter as próprias, enxugando-as rapidamente com um dos punhos do jaleco branco.
Tossiu para disfarçar e perguntou:
-E o que pretende fazer, princesa?
-Este ano, eu tive uma ideia e papai concordou.
Eu gostaria que a senhora fosse a minha mãe nesse dia.
Eu ficaria muito feliz em lhe dar o presente que estou fazendo na aula.
Acho que minha mãe Eunice iria ficar também, lá no Céu.
A senhora poderia ser minha mãe nesse dia?
Magda abraçou-a com muito carinho e, olhando nos seus olhinhos, perguntou-lhe:
-Não seria melhor se você convidasse uma tia sua, ou uma de suas vovós?
-Eu não tenho nenhuma tia.
Papai é filho único e mamãe só tem um irmão.
Meus avós, do lado do papai, já morreram.
-E da parte de sua mamãe?
-Eles estão vivos, mas moram em outra cidade, um pouco longe daqui.
Eles têm uma fazenda muito bonita e só irei visitá-los com papai no Natal.
Acho que seria um pouco complicado minha avó vir até aqui só para isso e a festa já vai ser na semana que vem.
-Bem, nesse caso, eu ficarei muito feliz em representar sua mamãe Eunice e tenho certeza de que ela também ficará.
-Que bom! - exclamou a menina, descendo do colo da doutora.
Vou correndo contar para minhas amigas.
-Vá, sim, mas antes quero um beijo bem gostoso.
NARINHA BEIJOU-LHE O ROSTO e saiu da sala apressadamente.
Logo em seguida, Lurdes entrou.
-A doutora está chorando? - perguntou.
Magda balançou os ombros e, sorrindo, respondeu:
-De emoção, Lurdes. De emoção.
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2 - Um dia e Uma noite
ERA UMA SEXTA-FEIRA, Imediatamente anterior ao domingo que seria o Dia das Mães, e a quadra do colégio se encontrava lotada pelos alunos e por suas mães.
Magda se sentara ao lado de Narinha, assim como as outras mães, junto aos filhos.
Os pais que puderam ir até o colégio permaneciam nos degraus da pequena arquibancada de alvenaria.
As crianças procuravam-nos com os olhos e, assim que os viam, acenavam contentes.
- Doutora Magda - chamou a menina, com grande alegria estampada no rosto -, quero dizer, mamãe Magda... pelo menos, hoje, não?
Veja! Meu papai está lá em cima! - e acenou com a mão.
Magda olhou na direcção para a qual a menina acenava, mas não conseguia descobrir qual dos homens, dentre os que ali estavam, poderia ser o pai de Narinha, pois todos se encontravam acenando.
-Qual deles é o seu pai, Narinha?
-Aquele lá, de camisa amarela xadrez, calça jeans.
Está vendo?
Bem ao lado daquele extintor de incêndios.
A moça firmou o olhar e pôde ver o rapaz, aparentando possuir trinta e poucos anos e dono de um largo e envolvente sorriso que endereçava tanto para a filha quanto, pelo menos era o que parecia, para ela.
-Ele está acenando para a senhora.
Acene para ele.
-Mas eu nem o conheço.
-Não tem importância.
É o meu pai, e, hoje, a senhora é minha mãe.
De mentirinha, mas...
-Está bem - concordou Magda, acenando para o pai que, percebendo, acenou com mais vigor.
- BOA TARDE A TODOS OS presentes.
Boa tarde às crianças, às suas mães e aos pais que aqui puderam vir.
Como directora deste colégio, dou por aberta esta tarde festiva em homenagem a todas aquelas que cuidam de nós com todo carinho e desprendimento, às quais chamamos de mãe.
E, para iniciar, peço à professora Elza que comece a anunciar as apresentações infantis.
E, assim, alunas, previamente ensaiadas, realizaram as homenagens através de danças, coral e até de uma pequena peça teatral, numa festa de muita alegria para as mães e principalmente para as crianças, que vibravam com cada apresentação e batiam muitas palmas, da mesma forma aplaudidas quando participavam de algum quadro artístico.
- E AGORA O GRANDE MOMENTO - anunciou a directora.
Assim que começar a tocar, através dos alto-falantes, a música dedicada às mães, cada criança entregará para sua mãe o presente que elas mesmas confeccionaram com muito carinho durante as aulas.
E suave e emocionante música, entoada por famoso coral, invadiu o ambiente e os alunos passaram a entregar o presente que já traziam consigo.
Narinha, muito feliz, entregou o seu para Magda, beijando-lhe o rosto.
-Para a senhora, hoje, minha mãe, um presente que é também para a minha mãe verdadeira que está no Céu.
E seus olhos novamente se humedeceram, o mesmo ocorrendo com a médica.
-Muito obrigada, Narinha.
Tenho certeza absoluta de que sua mamãe está nos vendo neste momento - disse Magda, beijando a menina no rosto e abraçando-a.
-A senhora não vai abrir o presente?
Mamãe vai ficar muito contente, lá no Céu.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Fev 14, 2020 12:12 pm

-Oh, sim - respondeu, começando a retirar o papel que o envolvia.
A menina ficou a observá-la, extasiada de alegria.
Seu pensamento ia do rosto da médica à imagem da própria mãe, que ainda guardava na memória, eternizada pela lembrança de uma das fotos que possuía.
-Meu Deus, como é lindo!
Foi você quem o fez? - perguntou ao ver um porta-retratos feito de papelão reciclado, pintado pela própria menina e com uma pequena rosa de plástico em um de seus cantos.
Não possuía vidro, apenas uma foto.
- Esta linda mulher é sua mãe, Narinha? - perguntou ainda, olhando a foto em que o pai e a mãe abraçavam a menina.
-Mamãe e papai!
Minha mamãe se chama Eunice, e papai, Dalton.
Realmente, a mãe da menina era muito bonita e, assim como seu pai, estampava largo e marcante sorriso de alegria, bem como a menina.
Uma foto que bem representava a alegria familiar.
-Muito bonita mesmo a sua mãe! - tornou a dizer Magda, apesar de ter o olhar mais atraído para o rosto de Dalton, o pai de Narinha.
Rapaz ainda, de forte expressão, daquelas que dá para facilmente perceber uma pessoa de bem com a vida.
- Mamãe era muito bonita, assim como a senhora, hoje, minha mãe.
Magda sorriu ao perceber que a menina repetia sempre “hoje, minha mãe”.
-Papai também é muito bonito, não é?
-Sim, sim.
Seu pai também é muito bonito - respondeu, procurando localizá-lo no mesmo lugar onde o vira antes, sentindo inexplicável desapontamento ao verificar que ele não mais se encontrava lá no alto da arquibancada.
-Papai! - exclamou Narinha, fazendo com que Magda voltasse o olhar para ela e ficasse surpresa ao ver que o pai já se encontrava ao lado da menina, abraçando-a.
Com certeza, pensou, ele viera pelo outro lado.
-E, então, minha princesa?
Está contente? - perguntou Dalton, surpreendendo Magda pelo facto de ela também tratar a menina por essa expressão.
Na verdade, era a única das alunas daquele colégio que ela tratava assim.
-Estou muito contente, papai.
E, virando-se, disse, segurando com a mãozinha o braço da doutora.
-Esta é a doutora Magda, papai!
Ela está sendo, hoje, minha mãe.
Eu não lhe disse que ela é muito bonita?
-Muito bonita, sim, filha - respondeu, estendendo a mão para cumprimentar a médica.
Muito prazer em conhecê-la, doutora, e quero dizer que lhe sou muito agradecido por realizar esse desejo da Narinha, fazendo o papel de sua mãe nesta festa.
Ano passado, ela ficou muito triste por não poder participar.
A senhora foi muito generosa para com ela e hoje vejo muita alegria nos olhos de minha filha.
Que Deus a recompense por esse ato de bondade.
Narinha fala muito sobre a senhora.
-Pois saiba que também me sinto muito contente.
E uma boa menina e tenho me afeiçoado muito a ela.
Ela também tem falado muito a seu respeito.
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- O senhor já veio me buscar, papai?
Não vai mais haver aula.
- Eu ainda tenho de terminar um trabalho, mas não vai demorar muito, e você pode vir comigo.
Assim que eu terminar, iremos para casa.
Antes que a menina respondesse, Magda olhou para ela e dirigiu-se a Dalton:
-Desculpe-me, mas gostaria de lhe pedir algo.
-Pode pedir, doutora.
O que quiser.
Será uma ordem, não é, Narinha?
' - É sim, papai.
-Bem... eu gostaria de levar sua filha para tomar um sorvete.
Para comemorarmos este acontecimento.
-Deixa, papai? - perguntou a menina, entusiasmada.
Gostaria de tomar um sorvete com ela, hoje, minha mãe.
-Por mim, tudo bem, mas não irá atrapalhá-la, doutora?
-Terminei as minhas consultas mais cedo para vir à festa e, até agora, está tudo muito calmo, pelo menos, minha secretária não me ligou.
-E como farei para apanhá-la?
-Vamos fazer o seguinte:
leve este cartão em que consta o número de meu telefone celular e, assim que o senhor estiver em casa, bastará me ligar que eu a levarei.
Moram aqui perto, não?
Foi o que Narinha me disse.
-Sim, e minha filha sabe ir até lá, a partir deste colégio.
Eu nunca permiti que fosse sozinha para casa, mas tive a preocupação de, pelo menos, ensinar-lhe o caminho, para o caso de haver alguma necessidade.
-E eu sei o nome da rua e o número da minha casa.
Também decorei o número do telefone celular do papai.
Em seguida, continuaram conversando enquanto se dirigiam até o estacionamento de veículos da escola, onde Magda, de mãos dadas com Narinha, despediu-se, dizendo expansivamente e mais à vontade:
- Até mais, então, Dalton.
Gostaria de chamá-lo somente pelo nome, se não se importa, e desde que me chame apenas por Magda.
Tudo bem?
-Perfeito, Magda, até mais - respondeu o rapaz, alegremente.
-Você está a pé? - perguntou a médica ao vê-lo dirigir-se para fora do estacionamento.
- Posso levá-lo até o seu trabalho.
-Muito obrigado, doutora... quero dizer, Magda...
Há uma estação de metro aqui perto.
Será mais rápido por causa do trânsito.
Até mais.
-Até mais.
-Tchau, papai.
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3 - O FURTO
NESSE MESMO HORÁRIO, NO CENTRO da cidade...
- Alô, senhora Claudete?
Desculpe-me a demora para atendê-la.
Eu me encontrava em outra sala...
Como vai? E seu António?
Há tempos não os vejo.
Algum problema que eu possa resolver?
-Tudo bem, Doutor Lacerda... quer dizer... quase.
É que fui roubada e gostaria de ir até a Delegacia, conversar com o senhor.
Doutor Lacerda era um delegado de polícia e a Delegacia situava-se a poucas quadras do sumptuoso prédio de apartamentos onde residia a senhora Claudete, em sua cobertura.
-Roubada?
Poderia entrar em maiores detalhes?
-Um anel de grande valor, não só material como, e principalmente, sentimental, foi-me roubado.
-A senhora tem certeza disso?
Quero dizer, sobre o roubo?
-Tenho, Doutor Lacerda, e até tenho um forte suspeito.
-E quando isso aconteceu?
-Hoje, pela manhã.
-Pois, então, vamos fazer o seguinte, dona Claudete, até mesmo porque, este ambiente não é muito apropriado para a senhora:
eu irei até sua residência, a senhora me relata o que aconteceu e, talvez, possamos resolver tudo sem a necessidade de muitas formalidades.
E gostaria de ir agora mesmo, pois, se a senhora já possui algum suspeito, o tempo é de suma importância.
-Tudo bem, Doutor Lacerda.
Ficarei aguardando-o e comunicarei a sua chegada à recepção do prédio.
-Serei bastante discreto para não chamar a atenção dos moradores com o veículo da Delegacia.
E levarei Oliveira, um de meus investigadores mais eficientes.
-Eu agradeço por sua atenção e preocupação.
-Já estou indo para aí.
A SENHORA CLAUDETE ocupava todo um andar dúplex em nobre rua da capital do Estado.
Seu marido António, rico empresário na área têxtil, desdobrava-se em atenções com a esposa e a presenteara com aquele valioso anel no dia em que completaram trinta e cinco anos de casados.
Ela, com cinquenta e oito, e ele, sessenta e um anos de idade, não aparentavam a idade que possuíam, dedicados que eram a actividades físicas e a uma saudável alimentação, programada por uma nutricionista de inteira confiança que, diariamente, administrava a alimentação junto a excelente cozinheira.
Eram perto de onze horas da manhã quando o delegado entrou no apartamento de dona Claudete, juntamente com o investigador.
-Muito obrigada por terem vindo, Doutor Lacerda.
-Este é Oliveira, o investigador.
-Queiram sentar-se, por favor.
Desejam tomar algo?
-Agradecemos muito, mas penso que não temos tempo a perder.
Por favor, dona Claudete, narre o que aconteceu, e gostaria que realmente estivéssemos a salvo dos ouvidos de algum serviçal.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sex Fev 14, 2020 12:13 pm

-Podemos falar tranquilamente, Doutor Lacerda.
Ninguém nos ouvirá.
-Pois bem.
Conte-nos, então, o que aconteceu.
-O que ocorreu foi que eu e António resolvemos colocar mais um armário em nosso doset e contratamos uma empresa para confeccioná-lo.
Eles vieram aqui, tomaram todas as medidas, escolhemos a madeira, enfim, encomendamos o armário.
Depois de pouco mais de um mês, ele ficou pronto, e marcamos o dia em que um marceneiro, contratado por eles, viria montá-lo no lugar.
O senhor sabe, um armário desse tamanho é montado no próprio local.
-Sei, sim, dona Claudete.
Conforme o tamanho, ele não passaria pelas portas.
-Isso mesmo.
Então, há dois dias, veio um rapaz para fazer o serviço e eu o deixei à vontade no meu quarto, tendo o devido cuidado de trancar todos os outros armários.
Quando ele ia embora, eu destrancava as portas dos que eu necessitava abrir, para apanhar alguma roupa ou qualquer outra coisa que necessitasse naquele momento.
Mas, de manhã, antes de ele chegar, eu trancava tudo novamente.
Não que eu estivesse desconfiando dele, mas até por uma precaução a favor dele mesmo.
O senhor entende, não? Afinal de contas, eu nunca o tinha visto e não o conhecia.
Até pareceu-me um bom rapaz...
-Compreendo perfeitamente, dona Claudete, e a senhora fez muito bem em tomar essa providência.
-Bem, ele terminou o serviço hoje, por volta de umas onze horas, e apenas ficou faltando colocar uma peça de uma das dobradiças que não veio junto com as demais.
Então, ele ficou de me trazer essa peça hoje à tarde.
Perdoem-me se estou sendo muito detalhista...
- Muito pelo contrário -- disse o Delegado -- a polícia necessita mesmo é dos detalhes.
Continue, por favor.
-E o que aconteceu foi o seguinte:
ontem à noite, quando retornei de um restaurante, onde eu e meu marido fomos jantar, tirei o anel do dedo e o coloquei na gaveta de uma penteadeira que tenho no quarto.
-Seu quarto fica no andar de cima?
-Sim. Querem subir até lá?
-Foi de lá que sumiu o seu anel, não?
-Isso mesmo.
-Gostaria de ver o local, dona Claudete.
Já no quarto...
-Esta é a penteadeira? - perguntou o Delegado.
-Sim.
-E ela não estava trancada?
-Vou lhe contar.
Quando ele foi embora, prometendo retornar à tarde para trazer a peça da dobradiça... venham ver.
E dona Claudete os fez entrar pela porta do closet para lhes mostrar o novo armário, voltando ao quarto em seguida.
-Como eu estava dizendo, assim que ele se foi, eu gentilmente o acompanhei até a saída e, retornando para cá, vi que a chave desta gaveta da cómoda se encontrava nela e percebi, então, que eu, distraidamente, não a tinha trancado.
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-E aí a senhora constatou que o anel não se encontrava mais na gaveta?
-Isso mesmo.
E só posso imaginar que ele o tenha roubado, pois ninguém, a não ser ele e eu, entrou aqui.
-E a senhora acredita que foi esse marceneiro quem o roubou...
-Pois só pode ter sido ele, Doutor Lacerda.
-Ninguém mais entrou em seu quarto, dona Claudete, desde que a senhora se lembra de ter guardado o anel?
-Apenas minha arrumadeira, mas ela é de minha total confiança.
Ela se chama Doroty e está connosco há mais de dez anos, doze, penso eu.
E nunca tranco as portas para ela.
-Alguém mais?
-Apenas eu e meu marido.
-Podemos falar com Doroty a sós?
-Podem... mas, por favor, Doutor Lacerda, não a assustem.
-Fique tranquila, senhora - afirmou o investigador -, seremos educados.
-Quer que eu a chame?
Ela deve ter chegado, pois precisou sair um pouco e disse que já voltava.
-Peça para ela vir até aqui e, por favor, aguarde do lado de fora.
Não nos leve a mal.
É apenas nossa rotina de trabalho.
-Compreendo.
Alguns minutos se passaram, e a arrumadeira entrou no quarto.
-Senhora Doroty? - perguntou o delegado.
-Sim, senhor...
-Preciso lhe fazer algumas perguntas.
-Pois não.
Dona Claudete me pediu que eu lhe respondesse o que o senhor me perguntasse.
-Muito bom.
Diga-me uma coisa, Doroty:
a senhora arrumou este quarto hoje de manhã?
-Arrumei, sim, senhor, quer dizer, apenas tirei o pó e arrumei a cama.
Havia um rapaz terminando de montar um novo armário no closet.
-E a senhora notou que esta gaveta da penteadeira estava com a chave?
-Não, senhor.
Dona Claudete também já fez essa pergunta para mim, antes do almoço.
-O senhor António almoçou em casa hoje?
-Não, senhor.
Não é todos os dias que ele almoça em casa.
Na verdade, são poucas as vezes que ele faz isso.
O delegado, então, demonstrando-se satisfeito, com um leve menear positivo de cabeça, perguntou-lhe, apontando-lhe a penteadeira:
-E esta gaveta?
A senhora a abriu ontem, depois que sua patroa chegou do jantar?
Ela nos disse que foi a um restaurante com seu António.
-Eu não estava aqui ontem à noite, senhor.
Não durmo aqui.
Na verdade, vou-me embora por volta das dezanove horas.
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Um dia e Uma noite - Wilson Frungilo Júnior Empty Re: Um dia e Uma noite - Wilson Frungilo Júnior

Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:50 am

-A senhora conhecia o rapaz que fez a montagem do armário?
-Não, senhor.
Nunca o tinha visto antes.
-Muito obrigado, senhora Doroty.
Pode retirar-se.
-Com licença.
Após pequeno intervalo de tempo, desde que Doroty saiu do quarto, dona Claudete retomou.
-E agora, Doutor Lacerda?
O que o senhor irá fazer?
Quais as próximas providências?
-Bem... por enquanto, não temos provas contra o rapaz, afinal de contas, para a lei, seria a palavra dele contra a da senhora.
O que poderemos fazer, por enquanto, é registar a queixa e tentar um mandado de busca e apreensão na residência dele, apesar de que, neste momento, com certeza ele deve ter escondido o produto do furto, se realmente o furtou..
-E como prestar queixa?
-A senhora teria de ir até a delegacia para prestá-la.
Será um pouco constrangedor, mas terá de ser feito lá, junto ao escrivão de polícia.
-E quanto mais cedo melhor, não?
-Com certeza, dona Claudete.
-O problema é que o meu motorista particular saiu para levar nossa governanta até um local da cidade, ainda não voltaram e, após o almoço, terei um compromisso difícil de ser adiado.
-Se a senhora não se importar, poderemos levá-la e trazê-la de volta em pouco tempo.
Darei prioridade à prestação da queixa para que o escrivão da polícia preencha o boletim de ocorrência que a senhora deverá assinar.
- Se não for incomodá-los, não tenho a menor objecção de ir com os senhores, afinal de contas, onde uma senhora estaria mais bem protegida, não é?
E os três riram daquela observação
-Vejo que a senhora continua com o seu senso de humor até nos piores momentos.
-O que se pode fazer?
O meu problema nem é tanto pela jóia em si, apesar de que ela representa importante momento de minha vida e do meu marido, mas é que não suporto transgressões, principalmente roubos.
Considero o furto, como o senhor melhor qualificou, como algo abominável e incompreensível, pois não consigo aceitar alguém tomar o que não lhe pertence.
-Podemos ir, então?
-Imediatamente.
-Gostaria de lhe perguntar mais uma coisa, dona Claudete - diz o investigador.
-Pois não...
-A senhora teria, por acaso, algum documento da compra desse anel?
- Tenho sim, senhor Oliveira.
Só um momento...
Dizendo isso, Claudete dirigiu-se até outro cómodo, ao lado do quarto utilizado como escritório e, abrindo um cofre de parede, localizado por detrás de alguns livros de uma estante, de lá retirou uma pequena caixa de madeira.
Abriu-a e separou, dentre vários envelopes, um em particular.
Fechou novamente o cofre e retornou ao seu quarto.
-Neste envelope, estão os documentos de compra, a garantia e uma foto de vários ângulos da jóia.
O investigador examinou os papéis, a foto, e os entregou ao delegado.
-Isto é muito bom, dona Claudete, principalmente a fotografia.
Podemos levar connosco?
-Podem, sim.
-Então, vamos.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:50 am

4 - NA SORVETERIA
AINDA NO COLÉGIO, ANTES DE Entrarem no carro de Magda...
-Com quem você fica quando seu pai vai trabalhar e não tem aula, Narinha?
-Eu fico na casa de uma vizinha, brincando com a Meire.
Ela estuda na minha classe e a mãe dela é muito legal para mim.
-Que bom, Narinha.
E do que vocês mais gostam de brincar?
-A Meire gosta de brincar com o computador, mas eu gosto mais de brincar com bonecas.
No Natal, papai me deu uma, bem bonita.
Ela bebe água e faz xixi.
Tenho até fraldinhas para trocar.
Também tenho um fogãozinho e uma geladeira.
De brinquedo, claro.
Nesse momento, um garoto da classe de Narinha, acompanhado pela mãe, aproximou-se e disse:
-Narinha, eu vi a sua mãe.
-Você viu minha mãe?
-Vi. Ela abraçou você e a doutora Magda.
-Meu filho, eu já lhe disse para não ficar falando para as pessoas o que vê.
Nem todas acreditam...
Magda olhou para a mãe do garoto, curiosa.
Foi quando a mulher apressou-se em lhe explicar:
-Meu filho Orlandinho tem mediunidade de vidência e ele diz ter visto a mãe da menina.
-E onde ela está agora? - perguntou a menina.
-Ela sumiu.
-Sumiu?!
E a mãe do garoto voltou a explicar.
-O que acontece, Narinha, é que o Orlandinho vê apenas por alguns segundos e depois o Espírito desaparece.
-Espírito?
Você viu o Espírito de minha mãe, Orlandinho? - perguntou a garotinha.
Mas como você sabe que era ela?
Você nunca a viu.
-Ela falou que era sua mãe.
-Falou? - foi agora a vez de Magda perguntar.
-Falou. Ela estava com um vestido branco de listras verdes e usava brincos também verdes, bem redondos.
Magda, que abraçava o porta-retratos contra o próprio peito, virou-o e perguntou ao garoto:
-Era esta a mulher?
O menino olhou, sorriu, e respondeu:
-Ela mesma.
Veja, ela está com o vestido e o brinco que eu falei.
-Você tinha visto a foto antes? - perguntou Magda.
-Não - respondeu Narinha -, ele nunca viu esta foto.
Eu a coloquei no porta-retratos em minha casa e depois o trouxe embrulhado.
-Parabéns, Narinha - cumprimentou a mãe de Orlandinho.
Sua mãe veio vê-la.
As mães estão sempre por perto.
-Minha senhora, faz tempo que o seu filho vê Espíritos? - perguntou a doutora, curiosa.
-Ele começou a ter essas visões há cerca de um ano.
-E você não tem medo, Orlandinho?
-Não, doutora.
Eu só vejo Espíritos bons e é sempre tudo muito rápido.
-Nós somos espíritas, doutora.
Agora, se nos dá licença, temos de ir e, mais uma vez, parabéns, Narinha.
- Obrigada - respondeu a menina, muito contente, sendo novamente abraçada por Magda.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:50 am

NA SORVETERIA...
-A senhora acha mesmo que Orlandinho viu minha mamãe?
No colégio, nós temos aula de religião e a professora fala sempre de Deus, de Jesus, e dos Espíritos.
Ela diz que todos nós somos Espíritos e que, quando uma pessoa morre, foi só o corpo dela que morreu e que essa pessoa, que é Espírito, vai para um lugar numa outra dimensão.
-Você sabe o que é dimensão, Narinha?
-Mais ou menos.
Eu já assisti a um filme, na televisão, que tinha duas dimensões, só que na história as pessoas passavam para essa outra dimensão numa máquina que um cientista inventou e, nesse lugar, essas pessoas se viam, conversavam, moravam em casas, com ruas, trabalhavam, como se estivessem aqui na Terra.
E lá era mais adiantado, com aparelhos que ainda não conhecemos.
-E mais ou menos isso que a sua professora fala?
-É quase a mesma coisa, mas não tem máquina.
O Espírito vai para lá quando o corpo morre.
E ela disse que tem lugares mais avançados, onde os Espíritos são mais inteligentes e bons.
-E os Espíritos podem vir para cá e podem nos ver?
-Isso mesmo.
Eles nos vêem, mas nós, não.
E que só pessoas que têm mediunidade podem vê-los, como é o caso do Orlandinho.
Esse meu amigo vê por pouquinho tempo, mas ela disse que têm médiuns que vêem por muito mais tempo.
A senhora acredita que tem gente, que é médium, que consegue falar ou escrever o que um Espírito quer comunicar?
-Já ouvi falar, Narinha, e até acredito um pouco, sim.
E agora mais ainda, já que o Orlandinho viu sua mamãe e a ouviu confirmar que era ela.
-E ainda a viu com a roupa que ela estava na fotografia, sem ter visto a foto, não é?
Que bom que a senhora acredita!
-E o que mais a sua professora de religião fala? - perguntou Magda, agora interessada no assunto, até porque não imaginava que falassem sobre isso com as crianças.
-Espere aí, deixe eu arrumar este pedaço de sorvete, senão vai cair.
Eles encheram muito o copinho, não?
O que foi mesmo que a senhora perguntou?
Eu estava distraída com o sorvete.
Está muito delicioso!
Magda sorriu ao ver que a menina se encontrava muito alegre, com certeza pelo facto de ela estar ali fazendo o papel de sua mãe.
-Pode tomar seu sorvete sossegada, Narinha.
Eu apenas queria saber o que mais a sua professora de religião fala para vocês.
-Isso mesmo...
Uma das coisas que ela nos ensinou é que, se existem pessoas que sofrem muito, e outras, pouco, ou quase nada, alguma razão deve ter para isso, porque Deus, que nos criou, não iria fazer umas sofrerem e outras não.
Por exemplo, eu não tenho mais minha mamãe, mas a maioria das crianças tem.
Magda ficou impressionada com a inteligência das crianças de hoje em dia, na figura de Narinha, pois, para a menina, tudo parecia muito natural e também por ter assimilado tudo aquilo de uma forma bastante compreensível para uma garotinha de apenas oito anos de idade.
Pensou em lhe fazer uma pergunta, mas teve receio de colocar uma dúvida em sua cabecinha de criança.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:51 am

Narinha, por sua vez, a surpreendeu ao, voluntariamente, falar-lhe sobre o assunto, o qual Magda teve receio de lhe questionar.
- A senhora gostaria de saber o que a professora disse quando lhe perguntei por que a minha mamãe morreu?
“Meu Deus, essa menina fala desse assunto com muita naturalidade” - pensou a doutora, antes de confirmar:
-Eu gostaria muito de saber, Narinha.
-Bom... Primeiro, ela me disse que eu não deveria ficar tão triste com a partida de minha mamãe porque ela iria ficar também muito triste se me visse chorando de saudade.
-Isso é verdade, minha princesa.
-E, então, ela me explicou que eu tinha de passar por tudo isso para que eu aprendesse a viver sem minha mamãe por algum tempo e que, quando meu corpo morrer, vou encontrá-la outra vez.
-Quando você morresse?
-Sim, mas que isso somente iria acontecer quando meu corpo morresse porque tinha de morrer.
E por isso que ninguém pode se matar.
Entende?
-Estou entendendo, sim - respondeu Magda, visivelmente impressionada com a garotinha.
Narinha permaneceu por alguns segundos calada, saboreando o sorvete.
Estavam sentadas a uma das mesas da sorveteria, local onde muitas outras pessoas também se encontravam, até que rompeu o silêncio:
-A senhora gostaria que eu lhe falasse mais sobre o que estamos aprendendo?
-Eu gostaria muito, minha princesa...
-Só que tem uma coisa.
-O que é?
-A professora disse que o que ela está nos ensinando é próprio para a nossa idade, para crianças, e que nós poderemos aprender muito mais quando crescermos.
-Eu entendo.
E o seu papai?
O que ele diz sobre isso que você aprende?
-Papai gosta de ler livros espíritas.
-Ele lê?
-Papai está sempre lendo quando não está trabalhando ou brincando comigo.
Ele é espírita desde criança porque vovô e vovó já eram e chegou até a frequentar a mocidade espírita.
Papai é muito inteligente, sabe?
Ele não fez Faculdade, mas gosta de ler e estudar sobre tudo.
Ele apanha livros na Biblioteca.
-Na Biblioteca?
-Ele já me levou lá.
É muito grande!
Papai também tem livros infantis que ganhou quando era criança e faz questão que eu leia.
Eu também gosto muito de ler.
Magda se enternecia em ver a admiração que a menina tinha pelo pai.
- Papai conhece muito.
As vezes, ele é até procurado para dar explicações sobre algum assunto mais complicado, e o presidente do Centro Espírita insiste muito para que ele dê palestras, mas papai não tem muito tempo.
A médica sorriu e, entusiasmada com as palavras da criança, pediu-lhe para que continuasse:
-Que mais você poderia me ensinar, Narinha?
Estou interessada em ouvi-la.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:51 am

-Bem... Nós aprendemos que existem muitos lugares como a Terra, porque esse céu que enxergamos não termina até onde nós conseguimos enxergar.
As estrelas... que vemos à noite...
A senhora sabia que, mesmo que viajássemos por toda a nossa vida num foguete, não conseguiríamos chegar até uma estrela bem distante?
-Sei, sim.
-Então...
A professora nos disse que os Espíritos ensinam que Deus não iria criar somente a Terra, e apenas os planetas de que temos conhecimento, num lugar que não tem fim.
E não é verdade?
-Eu acredito nisso.
-Pode acreditar - disse a garotinha, com firmeza.
E ela ainda disse mais. Quer saber?
-Lógico que quero - respondeu Magda, encantada com a menina.
-Ela nos disse que Deus está sempre criando Espíritos e que esses mais novos, um dia, vão nascer num corpo aqui nesta Terra, assim como nós nascemos.
E que esses Espíritos terão que aprender tudo o que nós já aprendemos em todas as nossas vidas.
-Em todas as nossas vidas?
-Isso mesmo... Epá!
O sorvete está querendo cair deste lado também!
Espere um pouco.
E Narinha tratou logo de salvar um pouco do sorvete que, derretendo, teimava em se desprender.
-Pronto... ufa!... salvei...
Agora posso continuar.,
-Você estava falando das várias vidas...
-Sim... A professora disse que, para que a gente possa aprender tudo o que é preciso para podermos ir morar nesses mundos melhores, uma só vida no corpo não é suficiente, porque ela é muito curta.
Não é verdade?
E lógico que é verdade.
Se não fosse, minha mamãe não teria tido tempo para aprender tudo.
_ ?
-A senhora não está conseguindo entender?
Vou explicar melhor:
minha mamãe pôde voltar para a outra dimensão porque já viveu muitas vidas e já não precisava viver mais tanto aqui.
Talvez... só faltasse esse pouquinho de tempo.
Também a professora me falou, e isso ela falou só para mim, longe das outras crianças, que mamãe, talvez, ainda precise voltar a viver aqui na Terra mais vezes para aprender o que ainda não tenha aprendido, mas que só Deus é quem sabe.
De qualquer maneira, eu ainda vou me encontrar com ela, nem que eu já esteja velhinha.
E mesmo que eu já esteja caduca, como a dona Vivinha, que mora perto da minha casa, quando eu chegar lá, vou voltar a entender tudo.
Deus não é bom?
-Deus é muito bom, Narinha - concordou Magda, mais impressionada ainda com as suas palavras.
-Mas eu ainda não falei tudo.
Acho até que a senhora pode estar perguntando por que eu precisei chorar tanto de saudade de minha mamãe.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:51 am

Não é o que a senhora está pensando?
Pelo menos, eu imagino...
-Eu estava pensando, sim.
-A professora me explicou que é porque eu tinha que aprender isso que eu ainda não tinha aprendido. Entendeu?
-Penso que sim, mas você poderia me explicar melhor?
-Aprendido a perder uma mamãe, só sentindo saudade, mas sem ficar chorando a toda hora, e aprendido a acreditar que mamãe não morreu e que ela estará sempre do meu lado e que até posso me encontrar com ela quando durmo.
-E você já se encontrou com ela?
-Muitas vezes.
Antes de a professora me ensinar tudo isso, eu acordava chorando porque achava que era só um sonho e sentia muita saudade dela.
Agora que sei que não é só um sonho, acordo contente.
Quase não lembro muito bem do que sonhei, mas sei que sonhei com ela.
De outras vezes, lembro que brincamos muito e que ela me deu muitos beijos e abraços.
Magda, mais uma vez, viu-se tomada de profunda emoção diante da pureza de coração da menina e da sua compreensão simples.
Simples, mas de uma lógica a ser considerada, e ainda raciocinada.
-Você gostaria de tomar mais um sorvete, Narinha?
-Obrigada, doutora “hoje, minha mãe”, já tomei bastante - respondeu, rindo, fazendo com que Magda também achasse graça.
-E um lanche, hein?
-Só se a senhora comer metade.
Um lanche é muito para mim.
-Eu como a metade.
Do que você prefere?
-Gostaria de comer um com queijo, presunto e tomate.
-Pois vamos ao lanche, então.
E a médica fez o pedido, procurando continuar a conversa sobre aquele assunto.
Gostava de ouvir Narinha.
-E o que mais você pode me ensinar sobre o Espiritismo?
- Deixe-me ver.,.
E, entrecerrando os olhos, começou a pensar, até que, poucos segundos depois, disparou:
-A senhora acredita em inferno?
-Inferno?
Esse com um diabinho espetando a gente num caldeirão de água quente? - perguntou, brincando.
-É... mais ou menos...
-Não creio muito, não.
Mas você tem uma explicação para isso?
-E muito simples - respondeu a garotinha, aparentando divertida esperteza.
- Pelo que a professora nos ensinou, até existe algo parecido, mas isso é outra coisa que iremos aprender quando estivermos maiores.
O que ela afirmou é que ninguém ficará lá para sempre.
- Não?
-Não, e quer saber por quê?
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:51 am

-Claro que quero saber.
-Porque Deus é nosso pai e não faria nenhum de nós sofrer para sempre.
Eu vou explicar melhor.
Se uma criança fizer uma coisa errada, que o papai ou a mamãe disse para não fazer, eles podem nos colocar de castigo, mas não vão deixar a gente de castigo para sempre, não é?
-Isso é verdade.
-Se Deus não fizesse assim também, o pai ou a mãe da gente seria melhor do que Deus.
E isso não pode ser verdade.
-Você tem razão, Narinha.
- E a professora falou que o mais importante é a gente se arrepender de ter feito uma coisa que não devia, e não fazer mais.
Que o mais importante é a gente entender que não deve deixar o papai nem a mamãe tristes, porque, senão, que graça vai ter a vida para nós e para eles...?
-Você acredita em Deus, não é, Narinha?
-Eu acredito.
-E você poderia me dizer por que acredita?
A menina olhou fixamente para Magda e lhe perguntou:
-A senhora não acredita?
-Acredito, sim, mas gostaria de saber por que você acredita.
Só isso. Queria ouvir você falar.
Narinha sorriu, pensou um pouco, e disse:
-Vou lhe dar um exemplo.
Um dia, nossa professora nos levou para passear numa pracinha que existe em frente da escola.
- Eu sei qual é...
-Essa pracinha tem muitas árvores, não tem?
-Tem, sim, muitas árvores e canteiros de flores.
-E quem criou as árvores e as flores que existem na Natureza?
Não foi a gente.
As pessoas só conseguem plantar as sementes das árvores e das flores, não é?
A gente não consegue criar uma árvore do nada.
E quem criou? Foi Deus.
-Você tem razão.
-A professora também cavoucou um pedacinho da terra e nos mostrou as minhocas.
A senhora sabia que as minhocas são muito importantes?
-Já ouvi dizer, sim.
Elas cavam túneis na terra e esses túneis deixam essa terra mais fofa, facilitando a entrada do ar, e as minhocas também comem terra e fazem um cocô que fertiliza a própria terra.
-Isso mesmo, minha “hoje, mamãe”! - vibrou a menina, contente e rindo, no que foi acompanhada por Magda, mais deslumbrada ainda com a garotinha.
E quem criou a minhoca?
Foi Deus também.
E por que Ele criou a minhoca?
-Para melhorar a terra - respondeu a médica.
-Deus é sábio, não?
A professora disse que, há muito tempo, mas muito tempo atrás, as pessoas pensavam que minhoca só servia para pescar.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:51 am

E as duas caíram na risada.
-E papai me falou que existem lugares, fazendas, que criam minhocas para trabalharem a terra.
-Já vi isso na televisão, Narinha.
-E a professora também nos falou sobre o coração.
- Sobre o coração?
- Isso. Ela disse que somente Deus poderia criar o nosso coração, que bate por muitos e muitos anos sem que a gente precise fazer alguma coisa para isso.
E é ele que faz a gente viver, não?
- Muito boa essa sua professora, Narinha, e você é muito inteligente, pois soube me explicar direitinho.
Agora, Narinha, gostaria que me dissesse por que me convidou para representar sua mamãe.
A menina olhou para Magda, pensou um pouco, como se estivesse escolhendo as palavras, e lhe respondeu:
-Porque quando a senhora fala comigo, eu me lembro dela.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:52 am

5 - A PRISÃO
Defronte do prédio, os três entraram na viatura:
dona Claudete no banco de trás e os dois homens na frente.
O investigador foi dirigindo.
Após transitarem por apenas algumas ruas, dona Claudete exclamou:
-É ele, Doutor Lacerda!
É aquele rapaz!
E está saindo de uma joalharia!
Será que foi vender a jóia?!
-Pare a viatura, Oliveira, e vamos abordá-lo.
O investigador, então, habilmente, treinado que era, accionando dois toques na sirene, estacionou bem ao lado do rapaz que, assustando-se com o barulho, fez menção de se afastar. No mesmo instante, Oliveira e o Dr. Lacerda saltaram do carro e lhe ordenaram:
-Um momento, senhor!
Queremos lhe falar.
Somos da Polícia!
O moço olhou para os lados e para trás como que a procurar alguém que fosse o motivo daquela solicitação, um tanto ríspida dos policiais, até perceber que era com ele que falavam.
-Senhor, por gentileza, vire-se de frente para a parede e coloque as duas mãos sobre ela!
-O que está acontecendo?
-Trata-se apenas de uma rotina investigatória.
Por favor, faça o que lhe estou pedindo.
O suspeito, então, obedecendo ao delegado, posicionou-se como solicitado.
-Temos de revistá-lo, senhor.
-Revistar-me?!
E, sem mais delongas, o investigador começou a apalpá-lo e, verificando que ele não possuía nenhuma arma, fez outra verificação numa bolsa que o marceneiro trazia consigo, encontrando, em seu interior e em bolsos laterais, apenas ferramentas e objectos pertinentes à sua profissão.
Feito isso, permitiu que ele se voltasse, frente a eles, e perguntou-lhe:
-O que o senhor estava fazendo nessa joalharia?
-Estava olhando a vitrina à procura de uma pulseira para presentear...
-Mas o senhor saiu de lá de dentro.
-Como nada encontrei na vitrina, fui perguntar ao dono da loja e ele me mostrou algumas, bem como os preços.
Mas nada comprei, pois pretendo comprar somente no mês que vem.
-Ou você veio vender alguma jóia para ele?
-O senhor deve estar me confundindo.
Eu não vendo jóias.
-Eu não estou me referindo à venda de jóias, mas, sim, a uma em particular.
Mais precisamente um anel.
-Eu não tenho nenhum anel, senhor.
Mas o que é que está acontecendo?
-Vamos entrar na loja.
E, dizendo isso, o investigador e o Delegado entraram na casa comercial, levando o rapaz com eles.
Um senhor de meia-idade os atendeu.
-Pois não, senhores.
Ah, o senhor resolveu voltar? - perguntou o comerciante para o marceneiro.
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Mensagem  Ave sem Ninho Sáb Fev 15, 2020 11:54 am

-Você não fala nada - ordenou o Delegado ao marceneiro.
-Em que posso lhes ser útil? - insistiu o lojista, já com receio de tratar-se de um assalto.
-Somos da polícia, senhor.
-Da polícia?
-O senhor conhece este homem?
-Não. Ele estava agora mesmo aqui procurando por uma pulseira, não é mesmo?
-Ele não estava querendo lhe vender uma jóia, senhor?
-Não. Eu nem o conheço.
O delegado, já meio aborrecido com tudo aquilo, resolveu levar os dois para a delegacia, mesmo sob protesto, e, como estava com dona Claudete na viatura, chamou reforço policial, que rapidamente estacionou à frente da loja, visto estar fazendo ronda por aquelas imediações.
E os dois, acomodados no banco traseiro da segunda viatura, olhavam-se, parecendo nada entender sobre o que lhes estava acontecendo.
-Você fez alguma coisa de errado? - perguntou o lojista.
Cometeu algum roubo ou furto?
-Eu nunca roubei nada na minha vida – disse o marceneiro.
Eles estão se referindo ao roubo de um anel...
-O que você faz?
-Monto móveis em casas ou apartamentos para diversas lojas ou empresas moveleiras.
-Será que não roubaram algum anel de uma das casas em que você esteve trabalhando e estão pensando que foi você?
-Não é possível...
Eu não estou entendendo nada.
E a viatura rapidamente chegou à Delegacia, sendo seguida pela do delegado, juntamente com o investigador e dona Claudete.
A que conduzia o suspeito e o lojista entrou por um portão lateral e a do Delegado estacionou defronte da repartição policial.
Quando os detidos chegaram à sala do delegado, lá se encontravam o Doutor Lacerda, o investigador Oliveira, um escrivão, já a postos, e dona Claudete, agora bastante nervosa, pois não imaginava que teria de ficar frente a frente com o rapaz.
-A senhora não é a dona Claudete? - perguntou o marceneiro, mais para ter uma confirmação de sua surpresa, pois a conhecia suficientemente bem para não reconhecê-la.
-Sou eu, sim, meu rapaz.
-E o que a senhora está fazendo aqui?
Por acaso... Não...
Não acredito que a senhora tenha me acusado de algum roubo no seu apartamento...
Eu não mexi em nada, somente montei o armário e estava, agora mesmo, indo até lá para colocar a peça que faltou hoje de manhã.
No caminho, como ainda era um pouco cedo, passei na joalharia deste homem aqui para ver o preço de uma pulseira que quero dar de presente.
-E eu?
O que estou fazendo aqui?! - foi a vez de o lojista externar a sua indignação.
Eu apenas atendi esse senhor e lhe mostrei alguns modelos e preços de pulseiras.
Pelo que ele me disse, nem iria comprar nada hoje.
-Bem, silêncio agora.
Eu tenho que interrogá-los e tomar o depoimento desta senhora.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Fev 16, 2020 11:00 am

Na verdade, vou primeiro tomar o depoimento de dona Claudete e depois falarei com vocês, que deverão aguardar numa sala no fundo do corredor.
Por favor, Clemente, leve-os para lá e lhes explique que estão sob custódia da justiça até que eu possa resolver que rumo tomar neste caso.
-Doutor delegado - disse o rapaz -, eu preciso dar um telefonema.
-Para seu advogado?
-Que advogado?
Eu não fiz nada e não necessito de um advogado!
O que eu preciso é ligar para minha casa!
-Vocês vão aguardar numa outra sala.
Já vamos atendê-lo e o senhor poderá fazer as ligações que julgar necessárias!
-Mas...
-Leve os dois, Clemente.
-Venham!
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Fev 16, 2020 11:01 am

6 - A FUGA
APÓS TOMAREM O SORVETE, E, COMO Dalton, com certeza, ainda demoraria um pouco para ligar, Magda resolveu levar a menina até um Shopping Center, onde passearam alguns minutos, mas, com a ideia de permanecer um pouco mais com a menina, resolveu ligar para o rapaz para saber por quanto tempo ainda poderiam passear.
Encontrava-se deslumbrada com aquela criança, tão meiga e inteligente, que não se cansava de chamá-la de “hoje, minha mãe”.
Ligou várias vezes para o número que Narinha lhe havia dito, mas não obtinha resposta e agora a garotinha parecia estar cansada e com sono.
-Papai não atende?
-Não. Ele deve estar muito ocupado trabalhando.
Mas tive uma brilhante ideia, Narinha.
-E qual?! - perguntou a menina, parecendo despertar.
-Você não gostaria de conhecer onde moro?
-Sua casa?
-Sim. Moro num apartamento não muito longe daqui.
Podemos ir até lá e, assim que o seu pai telefonar, dizendo que está voltando, eu a levo para a sua casa.
-Eu quero conhecer onde a senhora mora!
Quero, sim!
Mora com seu pai e sua mamãe? - perguntou, radiante.
-Isso mesmo - respondeu, emocionada novamente, ao perceber que a menina usou de muito entusiasmo ao falar “sua mamãe”.
“Ela deve mesmo sentir muita falta de um carinho materno” - pensou.
-Então, vamos.
Mais uma vez, apanharam o carro de Magda, um modelo novíssimo, na cor branca, e partiram em direcção à moradia da moça.
***
NA DELEGACIA...
-Doutor Lacerda, eu preciso telefonar para o meu marido.
Não imaginei que tudo seria tão traumático para mim.
-Pode usar o meu telefone, dona Claudete.
-Com licença.
Alguns segundos se passaram, e a secretária do empresário António atendeu:
-Não, senhora Claudete, seu marido está indo para sua residência.
Ele ainda não chegou?
-Eu não estou em casa, mas pode deixar.
Vou ligar para lá.
Mais alguns segundos...
-Alô, Doroty?
É Claudete.
Meu marido já chegou?
-Já, sim, e eu lhe disse que a senhora tinha ido para a delegacia, e ele já está se dirigindo para aí; assim que lhe contei sobre o ocorrido com o anel, ele até tentou lhe falar, mas a senhora deixou o celular aqui.
-Está bem, Doroty.
Eu vou esperá-lo. Até mais.
***
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Fev 16, 2020 11:01 am

QUANDO O RAPAZ E O lojista entraram no cómodo no fim do corredor, sentiram um verdadeiro calafrio a subir-lhes pela espinha.
Ali também se encontravam detidos três homens, cada um deles algemado, por um dos pulsos, a uma barra de aço disposta ao longo de uma parede.
-Sentem-se aí - pediu o carcereiro, apontando-lhes um banco de madeira.
Não vou algemá-los como a esses outros, mas não tentem nada porque estamos vigiando esta porta.
Nesse momento, o último dos homens algemados deixou-se cair ao chão, de joelhos, revirando os olhos e enrijecendo o corpo.
-O que está acontecendo?! - perguntou o policial.
Ei, você!
-Ele tem ataque epiléptico! - gritou um deles.
Você precisa ajudá-lo!
Segure a língua dele ou ele vai morrer asfixiado!
O carcereiro, ignorando que eles poderiam estar mentindo, correu para fazer o que lhe pedia o outro.
Mas tudo não passava de uma farsa, de um fingimento, pois assim que o funcionário aproximou-se, o prisioneiro, homem muito forte, enlaçou o pescoço dele, na tentativa de estrangulá-lo, enquanto o que se encontrava mais próximo, correndo a algema pelo tubo, aproximou-se também e o desacordou com violento soco no queixo.
O marceneiro e o comerciante intentaram levantar-se para sair da sala, mas uma ameaça os deteve.
-Parados aí, ou levam um tiro! - ordenou o que havia fingido o ataque, já com a arma do carcereiro apontada.
Venham até aqui, rápido, e nada lhes acontecerá!
Venham!
O marceneiro tomou a frente.
-O que quer que eu faça?
-Procure a chave das algemas no bolso da camisa dele.
Eu vi quando as colocou lá. Depressa!
Se chegar algum policial, vou atirar!
-Esta? - perguntou o rapaz.
-Abra a minha algema e depois as dos outros.
E a chave realmente era aquela
Livres, o que socara o homem deu a ordem, apontando para o rapaz e o comerciante:
-Vocês dois irão à frente.
Nós iremos atrás, encostados em vocês dois.
Vamos tentar sair pelos fundos.
Mas não tentem nada ou morrerão!
Eu lhes juro!
Você - disse, dirigindo-se ao lojista -, abra a porta e saia para o corredor.
Se alguém o vir, diga que está com sede e volte para dentro.
Daí, você me diz quantos há aí fora e mudarei o plano.
Se não tiver ninguém, dê-me um sinal.
O lojista obedeceu, abriu a porta e, olhando para fora, deu um sinal positivo com as mãos, o que significava que não havia ninguém no corredor.
-Vamos! - ordenou o homem e todos saíram correndo.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Fev 16, 2020 11:01 am

ALGUNS MINUTOS ANTES da fuga, António entrou no gabinete do delegado, que já havia tomado o depoimento de dona Claudete.
-O que aconteceu, Claudete?
Doroty me disse que você saiu com o Doutor Lacerda e um investigador, e que viriam para a Delegacia prestar queixa sobre o roubo de um anel.
-Sim, António.
Foi o marceneiro quem o roubou.
-Como assim, Claudete?
O anel está aqui comigo - revelou o homem, tirando-o do bolso.
-Como está com você?
Ele sumiu da gaveta que eu esqueci aberta...
-Pois é. Hoje de manhã, antes de sair, eu passei pelo quarto e vi que a gaveta da penteadeira estava com a chave do lado de fora.
Eu a abri e vi lá o seu anel.
Então, imaginando que você se esquecera de trancá-la, ao invés de fazer isso, apanhei-o para entregá-lo a você, colocando-o no meu bolso, mas acabei me esquecendo e fui para o escritório com ele no bolso.
-Quer dizer que ele não foi roubado, então?
Meu Deus!
Delegado, o senhor precisa soltar o rapaz e o lojista!
Preciso desculpar-me com os dois.
Deus meu! - exclamou Claudete.
-Lojista?!
-Depois eu lhe explico tudo, António.
Oh, meu Deus! - exclamou a mulher, levantando-se, muito nervosa.
NESSE INSTANTE, OUVIRAM-SE tiros, uma gritaria nos fundos do prédio e, em seguida, um veículo que, com os pneus cantando, saiu em disparada para a avenida.
O delegado saltou de sua cadeira, como se fora dela ejectado, e, seguido pelo casal, partiu em velocidade para fora do prédio, já encontrando viaturas saindo em disparada pelo portão.
-O que está acontecendo por aqui?! - berrou para um dos que permaneceram.
-Aqueles três presos, não sabemos como, evadiram-se e, pelo jeito, levaram um suspeito como refém.
-Estão levando o marceneiro, doutor - explicou o lojista que, por não terem tido tempo de alojá-lo no veículo, fora abandonado.
E, trémulo, contou ao delegado o que acontecera.
-E o Clemente?!
Vá ver como ele está, Oliveira! - berrou para o investigador que também ouvira toda a história.
Dona Claudete, por sua vez, precisou ser amparada pelo marido, ao saber que bandidos levaram o rapaz como refém.
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Mensagem  Ave sem Ninho Dom Fev 16, 2020 11:02 am

7 - MAGDA E NARINHA
ALGUNS MINUTOS ANTES, MAGDA, aproximando-se da Delegacia de Polícia, que se situava a caminho de seu apartamento, e diminuindo a velocidade por causa de um semáforo que se fechara logo à frente, viu seu pai estacionar o carro e descer apressado em direcção àquele prédio.
“Meu pai?!
Entrando apressado nesse distrito policial?! - perguntou-se, surpresa e procurando estacionar também numa vaga, poucos metros adiante.
-E aqui que a senhora mora? - perguntou a menina.
-Venha, Narinha.
Preciso falar com uma pessoa.
Venha comigo.
A garotinha desceu e, no preciso momento em que se aproximavam de um dos portões daquele distrito policial, Magda identificou o som de tiros vindo do estacionamento daquele prédio.
Instintivamente, puxou a menina, abraçando e protegendo-a contra a parede, no mesmo instante em que uma viatura saiu em disparada, cantando os pneus.
Quatro homens se encontravam em seu interior.
- É o papai! - gritou Narinha, ao ver o marceneiro pela janela traseira do veículo.
Magda, por sua vez, muito assustada, apenas conseguiu reconhecer a camisa xadrez amarela, que o pai da menina estava usando quando se encontraram na festa do colégio.
“Mas o que está acontecendo?!” - pensou Magda.
-Era seu pai, Narinha?
-Era o meu pai, sim!
O que ele estava fazendo no carro da polícia?
Em poucos instantes, outras viaturas saíram pelo portão, parecendo segui-lo ou persegui-lo.
-A senhora não viu o meu pai?!
-Tenha calma, filha - pediu a médica, continuando abraçada a ela.
Já vamos ficar sabendo.
-Telefone para ele, doutora!
Telefone para ele! - pedia a garotinha, muito assustada.
Não deram tiros?!
-Não foram tiros, Narinha - mentiu Magda.
-Foi barulho do escapamento do carro.
-Será...?
-Tenho certeza.
Eu conheço esses barulhos -reforçou, tentando disfarçar.
-Mas telefone para ele.
-Vou telefonar - concordou, mas não conseguiu efectuar a ligação telefónica.
Não atende, Narinha.
A menina a olhou com olhar amedrontado.
Poucos segundos haviam se passado, e Magda, volvendo o olhar para a frente da Delegacia, pôde avistar alguns policiais, o Dr. Lacerda, que ela conhecia, e seu pai e sua mãe.
-Venha, Narinha.
São meus pais.
Vamos ver o que aconteceu.
-Magda?! - exclamou dona Claudete ao ver a filha.
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